Acórdão nº 2725/08.3TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Abril de 2012
Magistrado Responsável | CARLOS QUERIDO |
Data da Resolução | 24 de Abril de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório J (…) intentou a presente acção declarativa de condenação com forma de processo ordinário demandando M (…) e mulher E (…) formulando os seguintes pedidos: 1- que sejam os réus condenados a reconhecer que: a) “o espírito da cláusula 16 da alteração ao contrato de arrendamento, bem como da declaração por si emitida é a autorização do autor a realizar quaisquer obras no local arrendado de adaptação do mesmo às leis vigentes para os sector de serviços de restauração e bebidas ou, para quando assim, se não entender, sem conceder”; b) as obras realizadas pelo autor no local arrendado são legais e necessárias ao normal desenvolvimento da actividade do autor, actividade esta que ambas as partes acordaram que aí fosse exercida na data da celebração do contrato de arrendamento e consequentemente que o autor se considera autorizado a realizar as mesmas; 2- que sejam os réus condenados a diligenciarem junto da Câmara Municipal de Leiria requerendo e assinado tudo o que necessário for para que: a) seja emitida a licença de serviços de restauração e bebidas para o local que deram de arrendamento ao autor; b) o estabelecimento implementado no local arrendado não seja encerrado pelos motivos constantes do documento que junta com o nº 19 e/ou quaisquer outros relacionados com o processo de obras 189/03, ou qualquer outro processo de obras que se mostre necessário dar entrada e que vise a adaptação do estabelecimento às leis vigentes; 3- que sejam os réus condenados a indemnizar o autor por todos e quaisquer prejuízos que a sua actuação, por não diligenciarem pela obtenção de licença para serviços de restauração e bebidas para o local arrendado, causar, incluindo o pagamento de coimas e/ou multas que venham a ser aplicadas e pagas pelo autor, por quaisquer entidades e, bem assim, a ressarcirem o autor de todos e quaisquer prejuízos que se venham a apurar, quer por perda de clientela, quer por eventual encerramento do estabelecimento, tudo a liquidar em execução de sentença.
Como fundamento da sua pretensão, alega em síntese o autor: tomou de arrendamento aos réus um estabelecimento comercial denominado CN.... que, à data do contrato de arrendamento, possuía alvará de licença sanitária emitido em 21-5-1991; o regime de licenciamento de estabelecimentos de restauração e bebidas foi objecto de diversas alterações o que determina a realização de obras para que o alvará de licença sanitária seja substituído pela, actualmente exigida, licença de utilização; daí que o referido contrato de arrendamento foi, em 16-3-2004, objecto de alteração por sentença homologatória de transacção judicial, sendo realizadas obras pelo autor e outras pelos réus; quando a transacção teve lugar já se encontrava pendente processo de obras a pedido do autor, tendo-se os réus, na sequência do referido acordo, comprometido a assinar e requerer junto de qualquer entidade o que fosse necessário para realização efectiva das obras; para melhor esclarecimento dos réus e antes de estes subscreverem qualquer declaração de autorização o autor facultou-lhes os elementos do referido processo de obras e deu-lhes conhecimento das alterações que iam ser requeridas; como o autor, por dificuldades financeiras, não iniciou de imediato as obras e por estarem descontentes com tal atraso os réus desenvolveram um conjunto de iniciativas – acção judicial visando o despejo e requerimentos/exposições junto da Câmara Municipal invocando a falta de autorização o denunciando a ilegalidade das obras – sempre visando o encerramento do estabelecimento do autor; tais diligências conduziram a que o autor tenha sido notificado para encerrar o estabelecimento por o ocupar sem a necessária licença, licença que não é emitida por o autor não apresentar declaração de autorização dos réus para a realização das obras; sucede que todas as obras realizadas pelo autor estão compreendidas na autorização concedida pelos réus na já referida transacção, revelando-se, no que concerne às não mencionadas na dita transacção, obras essenciais ao funcionamento do estabelecimento e ao cumprimento das exigências legais de refrigeração e ventilação do mesmo, constituindo obras de conservação ordinária; as diligências dos réus conduziram a que o estabelecimento esteja a laborar sem para tal se encontrar licenciado, tendo determinado diversas autuações do autor e consequentes aplicações de coimas, sendo que o enceramento do estabelecimento determina a perda de clientela pelo autor e consequente prejuízo da responsabilidade dos réus.
Regularmente citados vieram os réus contestar e reconvir, concluindo pela improcedência da acção e pedindo: 1- a declaração de resolução do contrato de arrendamento por incumprimento do autor; 2- A condenação do autor no pagamento do valor da diferença de rendas vencidas desde Agosto de 2006 até à entrega efectiva livre e devoluta do estabelecimento, valor acrescido de juros de mora até efectivo e integral pagamento; 3- a condenação do autor no reconhecimento da resolução do contrato e no consequente despejo do locado no prazo máximo de um mês após a data da sentença; 4- a condenação do autor como litigante de má-fé em multa e indemnização.
Em síntese, alegam os réus: nos termos do contrato de arrendamento todas as obras de conservação/reparação que o locado interiormente carecer ficam a cargo do inquilino e este não poderá fazer no locado quaisquer benfeitorias sem autorização escrita do senhorio, não lhe assistindo qualquer direito de retenção ou indemnização pelas benfeitorias realizadas; a transacção não visou qualquer alteração do contrato de arrendamento mas tão só a desistência do embargo pelo autor e a desistência pelos réus de um pedido de demolição de um anexo que haviam apresentado junto da Câmara Municipal; na referida transacção estavam apenas em causa as obras de legalização do anexo, que passou a fazer parte do contrato de arrendamento, e as diligências necessárias à mesma junto das entidades competentes, mantendo-se inalterado o referido no contrato quanto às obras e à necessidade de autorização do senhorio para sua realização; os réus cumpriram a sua parte do acordado na transacção ao contrário do sucedido com o autor que realizou obras que alteram a fachada do estabelecimento; as obras que o autor se propunha realizar eram as necessárias à adequação do estabelecimento ao disposto no DL 168/97 e o autor realizou obras para além do que constava no projecto aprovado; os réus apenas autorizaram as obras que haviam sido aprovadas, tendo o autor realizado obras que não constavam do projecto inicialmente aprovado nem eram estritamente necessárias à adaptação das exigências do DL 168/97, sendo por tal, por sua exclusiva culpa, que não logrou obter a licença de utilização; as obras, não autorizadas, que o autor realizou no locado alteraram a fachada do edifício e a morfologia do locado, ampliaram o mesmo, violando o disposto no art. 1074º nº 2 do Código Civil; o autor mantém em funcionamento no locado um estabelecimento comercial sem a necessária licença – cuja falta lhe é totalmente imputável – e o referido estabelecimento, seja pelo seu horário de funcionamento, seja pelo sistema de refrigeração utilizado, gera ruído que coloca em causa as regras de sossego e boa vizinhança; acresce que o autor nunca liquidou o acréscimo de renda que se havia obrigado na transacção efectuada, encontrando-se em mora no pagamento no pagamento da renda; todos estes factos constituem conduta grave e reiterada do autor que fundamentam a resolução do contrato; com a presente acção o autor altera a verdade dos factos, deduz preensão cuja falta de fundamento não pode ignorar pelo que deve ser condenado como litigante de má-fé e em indemnização a favor dos réus/reconvintes.
Na resposta, o autor: arguiu a inadmissibilidade da dedução de pedido reconvencional por falta de verificação dos requisitos do art. 274º nº 2 do Código de Processo Civil; impugnou a existência de qualquer situação de mora no pagamento da renda; excepciona o incumprimento dos réus quanto às suas obrigações na transacção que justificam e determinam tal aumento de renda; cautelarmente deposita o valor que os réus acusam estar em falta acrescido da indemnização legal; negou que o estabelecimento por si explorado produza ruído que perturbe o descanso e sossego dos réus; alega que todo o equipamento instalado se encontra devidamente homologado e conjugado com as exigências legais da Lei do Ruído; quanto à falta de licenciamento do estabelecimento defendeu que se trata de uma obrigação/dever do proprietário pelo que não podem os réus, com tal fundamento, pretender a resolução do contrato; quanto às obras cuja realização os réus acusam excepciona a caducidade de qualquer pedido de resolução com fundamento nas mesmas; impugna que as mesmas careçam de autorização dos réus ou que tenham alterado a estrutura do locado; alega que a única ampliação que teve lugar se reporta ao anexo que foi objecto da transacção judicial e que os réus expressamente consentiram; termina concluindo pela improcedência do pedido reconvencional, sem prejuízo da sua inadmissibilidade, e pedindo a condenação dos réus como litigantes de má-fé e em indemnização por deliberada e consistentemente alterarem a verdade dos factos, justificando a sua pretensão com base em factos dos quais são os únicos responsáveis.
O tribunal fixou o valor da causa (despacho de fls. 273) e admitiu parcialmente o pedido reconvencional, na parte em que se reporta ao pedido de despejo do locado com base na realização...
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