Acórdão nº 4078/10.0TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 31 de Janeiro de 2012
Magistrado Responsável | FONTE RAMOS |
Data da Resolução | 31 de Janeiro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I. E (…), intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário[1], contra C e CN (…) Unipessoal, Lda., pedindo que os Réus sejam condenados, solidariamente, a restituir-lhe a quantia de € 20 000 - ou caso assim se não entenda, que o 1° Réu seja condenado a restituir-lhe tal quantia -, e a pagar-lhe os juros vencidos e vincendos até efectivo pagamento.
Alegou, em síntese, que a Ré sociedade (2ª Ré), em 23.02.2007, outorgou um contrato-promessa de compra e venda com a sociedade D (…), Lda., na qual prometia comprar a esta um imóvel; em meados de Abril de 2007, encetou contactos com a 2ª Ré tendo em vista a futura aquisição desse mesmo imóvel, ficando em aberto a possibilidade da Ré adquirir primeiro o imóvel à sociedade D (…), Lda., ou até de ser esta sociedade a escriturar directamente com a A.; em 11.6.2007, como sinal e princípio de pagamento, entregou ao Réu a quantia de € 20 000, tendo a A. passado a residir no imóvel em finais de Julho de 2007; os Réus comprometeram-se a encontrar uma instituição de crédito que lhe concedesse um empréstimo para a dita aquisição e a devolverem-lhe os referidos € 20 000 se não fosse concedido; o referido empréstimo não lhe foi concedido e os Réus nada fizeram; em Maio de 2008, os Réus cortaram a água e a luz do imóvel, forçando-a a sair de casa, sem que lhe tivessem devolvido o referido valor, enriquecendo, assim, à sua custa e sem causa justificativa.
Os Réus apresentaram contestação conjunta, alegando, em resumo, que a 2ª Ré foi promitente compradora no contrato-promessa de compra e venda descrito na petição inicial (p. i.) e no qual foi promitente vendedora a sociedade D (…), Lda.; através do referido contrato, a 2ª Ré prometeu adquirir o identificado prédio pelo preço de € 117 500, tendo pago à sociedade D (…) Lda., a quantia de € 2 500, a título de sinal e princípio de pagamento; em Abril/Maio de 2007, a A. manifestou interesse em adquirir o dito prédio, pelo que, entre a A., 2ª Ré e a sociedade D (…) Lda., foi ajustado que a A. adquiria directamente o imóvel à sociedade D (…), Lda., pelo preço de € 100 000, a liquidar integralmente no acto da escritura; a A. pagaria à 2ª Ré € 20 000, por conta do sinal já prestado por esta última à sociedade D (…), Lda. e da entrega e fornecimento de equipamentos a que se comprometeu; com a celebração de um outro contrato-promessa, a A. passaria a ocupar imediatamente o imóvel prometido vender até à data da outorga da escritura pública de compra e de venda; em compensação da ocupação e após o recebimento da quantia de € 20 000, a 2ª Ré pagaria à sociedade D (…), Lda., a importância de € 12 500, a título de reforço de sinal e a 2ª Ré comprometia-se a adquirir e a custear determinados acabamentos e equipamentos; a D (…), Lda., reduzia o preço de venda à A. em € 2 500, tendo presente a obrigação assumida pela 2ª Ré de fornecer os equipamentos; tudo o que foi acordado foi cumprido pela 2ª Ré e pela sociedade D (…), Lda., conforme decorre do contrato-promessa de compra e venda, datado de 11.5.2007, reproduzido a fls. 54; nunca celebraram com a A. qualquer contrato-promessa de compra e de venda, decorrendo do exposto que a 2 ª Ré “cedeu” ou prescindiu da sua posição no contrato-promessa de compra e venda a favor da A. que posteriormente celebrou contrato de idêntica natureza com a vendedora, sendo que o “ganho económico” da 2ª Ré seria de € 5 000 (€ 20 000/recebidos da A., deduzidos dos € 15 000 entregues de sinal à D (…)Lda.), deduzido do custo de aquisição dos acabamentos e equipamentos a que se obrigou e cumpriu; a A. ocupou a moradia, desde 11.5.2007 até 08.5.2008, sem que tenha logrado obter financiamento bancário, e a 2ª Ré apenas se comprometeu a diligenciar e a colaborar com a A. no sentido da sua obtenção, sendo falso o demais alegado; a A. confrontada com a possibilidade de lhe não ser concedido um empréstimo bancário, abandonou a moradia; a 2ª Ré é alheia ao facto da A. ter incumprido o contrato-promessa que celebrou com a sociedade D (…), Lda.; o Réu é parte ilegítima, dado que nada contratou a título pessoal e particular com a A., tendo agido sempre na qualidade de legal representante da 2ª Ré, pelo que deverá ser absolvido da instância; a A. ocultou factos e contratos, no sentido de fazer vingar pretensão que bem sabia carecer de fundamento e de razão, e alegou factos que sabia serem falsos.
A 2ª Ré deduziu reconvenção pedindo a condenação da A. a pagar-lhe a quantia de € 34 011,69 e juros de mora desde a data da notificação da reconvenção e até efectivo pagamento, alegando que a mesma, quando abandonou o imóvel, levou consigo e fez seus diversos bens e equipamentos que identificou (e que a 2ª Ré repôs e pagou) e deixou-o danificado (efectuando a 2ª Ré as necessárias reparações), sendo que o imóvel ficou desvalorizado em cerca de € 17 500 (inclusive, em razão da ocupação por parte da A.) e a A. ocupou gratuitamente a moradia e não pagou os consumos de água e luz que efectuou.
Concluiu pela procedência da matéria de excepção e pela improcedência da acção e pediu ainda a condenação da A. em multa e indemnização, como litigante de má fé.
A A. replicou mantendo o alegado na p. i. e pugnando pela improcedência da matéria de excepção, da reconvenção e do pedido de condenação como litigante de má fé.
A reconvenção foi admitida parcialmente (quanto ao pedido de condenação da A. nas despesas suportadas no valor de € 9 311,69/fls. 79).
Foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a excepção de ilegitimidade e seleccionou-se, sem reparo, a matéria de facto (assente e controvertida).
Realizada a audiência de discussão e julgamento e decidida a matéria de facto, o tribunal recorrido julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Ré a pagar à A. a quantia de cinco mil euros (€ 5 000), acrescida de juros de mora, à taxa de 4 %, desde a citação até integral pagamento, absolvendo os Réus quanto ao demais pedido, e julgou parcialmente procedente o pedido reconvencional e, em consequência, condenou a reconvinda/A. a pagar à reconvinte/Ré a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, relativamente ao valor dos equipamentos identificados em 23) dos factos provados[2], com o limite de quatrocentos e setenta euros e noventa cêntimos (€ 470,90), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4 %, desde a citação até integral pagamento, absolvendo a reconvinda quanto ao restante pedido reconvencional.
Inconformadas com o decidido, a A. e a 2ª Ré interpuseram recursos de apelação.
A 1ª, reafirmando o peticionado na p. i., formulou as seguintes conclusões: (…) A 2ª, pedindo a revogação da sentença recorrida e a total improcedência da acção e a condenação da A. como litigante de má fé, formulou as conclusões que assim vão sintetizadas: (…) A A. respondeu sustentando a improcedência do recurso da Ré.
Atento o referido acervo conclusivo (delimitativo do objecto do recurso - art.ºs 684º, n.º 3 e 685º-A, n.ºs 1 e 3, do Código de Processo Civil, na redacção conferida pelo DL n.º 303/07, de 24.8), coloca-se, sobretudo, a questão de saber qual o enquadramento a dar à relação contratual estabelecida entre as partes [maxime, se teve lugar cessão da posição contratual eficaz entre a 2ª Ré e a A.] e as consequências advindas para a respectiva esfera patrimonial e, ainda, se é admissível o recurso (e a condenação) quanto à invocada litigância de má fé.
* II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: a) Em 23.02.2007, por escrito designado de “Contrato Promessa Compra e Venda”, a 2ª Ré declarou prometer comprar D (…), Lda., o prédio resultante da construção de uma moradia para habitação, sito na freguesia de ..., concelho de Leiria, descrito na Conservatória do Registo Predial (CRP) de Leiria sob o n.º xxxx... e inscrito na matriz predial urbana com o art.º zzzz.... (A) b) Mais declararam que: “Quarta O preço global da venda é de € 117 500 (cento e dezassete mil e quinhentos euros).
Este preço é inalterável e não sujeito a qualquer correcção, será pago pelo segundo outorgante à primeira, da seguinte forma: - Como sinal e princípio de pagamento o...
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