Acórdão nº 912/05.5TBTMR-C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Janeiro de 2012

Data24 Janeiro 2012
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I A...

instaurou, na comarca de Coimbra, a presente declarativa, com processo sumário, contra B...

, C...

e D...

, S.A., pedindo a condenação destes no pagamento de € 11 928,25, acrescidos de juros vincendos.

Alegou, em síntese, que no dia 23 de Junho de 2003, pelas 15h, na Rua ... em Tomar, o réu B...estava a descarregar de um veículo vários caixotes que se destinavam a uma sapataria da ré D..., aí situada, e que o fazia por conta e direcção dos réus C... e D.... Nessa tarefa o réu B...atirava caixotes para o chão, tendo um deles atingido a autora, que por aí passava, na sua perna esquerda. Em consequência disso a autora sofreu lesões que implicaram internamento hospitalar e que se submetesse a uma intervenção cirúrgica e a posteriores tratamentos. Essas lesões causaram-lhe sessenta dias de doença com incapacidade para o trabalho e uma IPP de 5%. Mais alega ter tido despesas com as deslocações ao hospital e em medicamentos que teve que tomar.

O réu B...foi citado editalmente, tendo o Ministério Público contestado em sua representação, afirmado desconhecer se os factos alegados correspondem à verdade.

O réu C... não contestou.

A ré D... contestou dizendo, em suma, que o réu C... é empresário em nome individual e exerce a actividade de transporte público ocasional de mercadorias. Este réu era seu fornecedor habitual de serviços de transporte, tendo-o incumbido do transporte da mercadoria, que este aceitou, que no dia 23 de Junho de 2003 estava a ser descarregada na Rua .... Mais afirma que não teve conhecimento do acidente de que foi vítima a autora e que o réu C... lhe debitou o serviço de transporte que nesse dia efectuou, não tendo com este qualquer relação de trabalho.

Respondeu a autora alegando que não foi celebrado qualquer contrato de transporte e que se está na presença de uma relação de comissão, entre os réus C... e D..., nos termos previstos no artigo 500.º do Código Civil.

Proferiu-se despacho saneador, fixaram-se os factos assentes e elaborou-se a base instrutória.

Realizou-se julgamento e foi proferida sentença em que se decidiu: "Pelo exposto, julgo parcialmente procedente por provada, a presente acção e em consequência, condeno os Réus D..., S.A., C...e B..., a pagar à autora A..., a título de indemnização civil pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por esta sofridos, em consequência do acidente com a queda de caixotes de sapatos ocorrido em 23.06.2003, em Tomar, no montante global de 6.598,94 € (seis mil, quinhentos e noventa e oito euros e noventa e quatro cêntimos).

No que os condeno a pagar e de forma solidária.

Vão ainda condenados no pagamento dos juros de mora, os quais são devidos desde a data da citação para a presente acção, até integral e efectivo pagamento pelos Réus.

De resto, vão os Réus absolvidos do demais peticionado pela autora.

" Inconformada com tal decisão, a ré D... dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação e com efeito meramente devolutivo, concluindo a respectiva motivação com as seguintes conclusões: Primeiro: A Ré D... e o Réu C..., no exercício das respectivas actividades profissionais, celebraram um contrato, entre si, pelo qual este se obrigou a efectuar o transporte por terra, das mercadorias, na data, e entre os lugares referidos na “guia de transporte” junta com a contestação como documento n.º 1; Segundo: A Ré D... é uma sociedade comercial anónima que se dedica ao comércio de calçado, nos diversos estabelecimentos que possui e explora em diferentes localidades do país; e o Réu C...é um empresário em nome individual que se dedica à actividade profissional de Transporte Público Ocasional Rodoviário de Mercadorias, tem estabelecimento próprio e é titular do respectivo número de identificação fiscal.

Terceiro O contrato de transporte celebrado entre a Ré D... e o Réu C...é um acto comercial, objectiva e subjectivamente, que assenta numa relação de recíproca independência, e não subordinada, como é próprio da intrínseca natureza jurídica do respectivo contrato.

Quarto: O acto é comercial por natureza (absoluto), porque o contrato de transporte celebrado entre ambos estava regulado nos art.ºs 366.º do Código Comercial, então, vigente; deve a respectiva comercialidade à sua natureza intrínseca; e a própria Lei assim o caracteriza - art.º 230.º do Código Comercial e art.º 1.º do Decreto-Lei n.º 366/90 de 24 de Novembro.

Quinto: O acto é bilateralmente comercial, porque a Ré D... e o Réu C...são comerciantes e celebraram o contrato de transporte, entre si, no exercício das respectivas actividades profissionais. – Art.ºs 2.º, 13.º, 230.º e 366.º do Código Comercial.

Sexto: A independência e não subordinação da relação contratual estabelecida entre a Ré D... e o Réu C..., para além decorrer da própria natureza jurídica do contrato de transporte que, entre si, celebraram, foram também afirmadas pelo Réu C..., na prática, pois executou o transporte e fez a entrega das mercadorias na data e na hora que ele próprio decidiu, e não na data e na hora pretendidos pela D... e estabelecida na “guia de transporte”. - “O Réu C... carregou os 238 pares de sapatos, no veículo 88-39-PR, no local indicado, às 11 horas e 15 minutos do dia 21-06-2003, mas só fez a entrega dos mesmos, no local do destino, no dia 23 de Junho de 2003, muito embora estivesse prevista a entrega, no próprio dia 21 de Junho, pelas 13,15 horas” conforme respostas aos quesitos de fls. 550.

Sétimo: Aliás, pela própria definição legal da sua actividade – Transporte Público Ocasional de Mercadorias (art.º 1.º do Decreto-Lei n.º 360/90) - o Réu C...pode transportar, e normalmente transportará, mercadorias de diferentes expedidores, no mesmo camião, o que o obriga a organizar e a programar os horários das cargas e das descargas e os percursos a efectuar, para conciliar os diversos interesses dos expedidores e do próprio transportador, facto que supõe, necessariamente, o exercício livre, independente e responsável da sua actividade, até porque é responsável pelo pagamento da competente indemnização, se não fizer a entrega dos objectos nos prazos convencionados com os expedidores, como dispõe o art.º 382.º do Código Comercial.

Oitavo: A relação contratual que se estabeleceu entre a Ré D..., como expedidor, e o Réu C..., como transportador público ocasional de mercadorias, rege-se Lei Comercial – art.º 1.º - concretamente, pelas regras próprias do contrato de transporte previstas nos art.ºs 366.º e seguintes, todos do Código Comercial, e não se confunde com qualquer relação de comissão prevista no art.º 500.º do Código Civil, tratando-se, como se trata, de relações jurídicas distintas, por natureza, e que, reciprocamente, se excluem.

Nono: O transportador pode efectuar o transporte directamente por si, seus empregados e instrumentos, ou por empresa, companhia ou pessoas diversas, e responderá pelos seus empregados, pelas mais pessoas que ocupar no transporte dos objectos e pelos transportadores subsequentes a quem for encarregando do transporte, como dispõem os art.ºs 367.º e 377.º do Código Comercial.

Décimo: “In casu”, o Réu C... executou o transporte e nele ocupou o seu empregado ou colaborador B..., e o acidente dos autos ocorreu quando ambos movimentavam as caixas de calçado, executando este a sua tarefa por conta e sob a direcção daquele.

Décimo Primeiro: Não existe relação contratual de qualquer natureza entre o Réu B... e a Ré D..., e a presença e a intervenção daquele no dia, hora e local dos autos deveu-se, exclusivamente, à relação de comissão que...

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