Acórdão nº 1363/09.8TBMGR-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ANTUNES
Data da Resolução17 de Janeiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

Relatório.

O executado, A…, apelou da sentença da Sra. Juíza de Direito do 3º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca da Marinha Grande que julgou improcedente a oposição que deduziu contra a execução para entrega de coisa imóvel arrendada, com processo especial, que contra ele e o seu cônjuge, M…, foi promovida por P… e R...

O recorrente extraiu da sua alegação as conclusões seguintes: … Não foi oferecida resposta.

  1. Factos relevantes para o conhecimento do objecto do recurso.

    2.1. O executado alegou nos artºs 54º e 55º da petição inicial da oposição, respectivamente, que:

    1. Em 2010/06/11, pela executada foi depositado, na conta bancária indicada no contrato de arrendamento para tal efeito, o valor de 175 €, relativos a renda de Junho de 2010.

    2. Mostrando-se pagas, até à presente data todas as rendas vencidas, que procedeu hoje, ao depósito, na mesma conta bancária indicada no contrato de arrendamento para depósito das rendas, do montante de 1 575,00 €, respeitante à indemnização igual a 50% das rendas referidas que não foram atempadamente pagas, ou seja sobre todas as rendas excluindo a do mês de Março de 2010, paga atempadamente em 03/05/2010, relativamente à qual não é devida qualquer indemnização.

    2.2. Os exequentes não impugnaram a alegação referida em 2.1., tendo-se limitado a afirmar que a problemática expressa nos artºs 44º a 57º do requerimento inicial – que contém a alegação dos factos relativos depósitos das rendas em dívida e da indemnização - é alheia à natureza da questão que se discute neste apenso.

    2.2. O executado ofereceu, logo com o articulado de petição inicial da oposição, sob os nºs 11 e 12, cópia dos depósitos referidos em a) e b), que os exequentes não impugnaram.

    2.3. O Tribunal de que provém o recurso decidiu, na sentença final, a matéria de facto, nestes exactos termos: (dos FACTOS ASSENTES)

    1. Foi dada à execução instaurada em 5-5-2010 pelos Exequentes a sentença judicial que faz fls. 32 e segs. da acção declarativa a que estes também se mostram apensos.

    2. Nessa mesma acção declarativa foi junta com data de 6-10-2009 nota de citação efectuada ao R. na terceira pessoa, de M…, mulher do aqui Oponente, em 1-10-2009, tendo sido deixado aviso com indicação para a sua citação com dia e hora certa, tendo ficado consignado que ao acto se realizaria às 19 h do dia 1-10-2009. Nessa mesma nota a M… declarou estar em condições de receber a citação e que ficou ciente de quer (sic), nos termos do art. 240/4 do Código de Processo Civil constituía crime de desobediência a conduta de quem, tendo recebido a citação, não entregue logo que possível ao citando os elementos deixados pelo funcionário que a realizou, de que foi advertida.

    3. Com data de 14-1-2010 foi expedida nota de citação nos termos do art. 241 do Código de Processo Civil, conforme cópia de fls. 15.

    4. Em 24-5-2010 foram recebidas por E… as cartas registadas com aviso de recepção expedidas para citação dos Executados nos autos de execução e a estes foram entregues.

    5. Foram efectuados, até hoje, pela executada M…, os depósitos de rendas na conta bancária indicada no contrato de arrendamento para tal efeito, discriminados nos subsequentes assim discriminados (sic).

    6. Em 2009/09/04, o valor total de 1.562,10 €, destinado ao pagamento das seguintes rendas: a) 162,10 €, relativos ao pagamento do remanescente em dívida da renda respeitante a Dezembro de 2008; b) 1.400 €, relativos ao pagamento integral das rendas relativas aos meses de Janeiro a Agosto de 2009, inclusive (175 € x 8 meses). (Doc. n.º 2).

    7. Em 2009/09/10, o valor de 175 €, relativos à renda de Setembro de 2009 (Doc. n.º 3).

    8. Em 2009/10/12, o valor de 175 €, relativos à renda de Outubro de 2009 (Doc. n.º 4).

    9. Em 2009/11/12, o valor de 175 €, relativos à renda de Novembro de 2009 (Doc.n.º 5).

    10. Em 2009/12/14, o valor de 175 €, relativos à renda de Dezembro de 2009 (Doc. n.º 6).

    11. Em 2010/02/11, o valor de 175 €, relativos à renda de Janeiro de 2010 (Doc. n.º 7).

    12. Em 2010/03/05, o valor de 350 €, relativos à renda de Fevereiro e Março de 2010 (Doc.n.º 8).

    13. Em 2010/04/12, o valor de 175 €, relativos à renda de Abril de 2010 (Doc. n.º 9). O) Em 2010/05/10, o valor de 175 €, relativos à renda de Maio de 2010 (Doc. n.º 10).

      (Da BASE INSTRUTÓRI

    14. P) A Executada M… não entregou ao aqui Oponente a carta que se alude em B) supra.

    15. Nem a que se refere em C) supra.

    16. Nem a carta para notificação da sentença a que se alude em A) supra.

    17. A Executada M… coabitava à data de 1-10-2009 com o Executado A… aqui Oponente.

  2. Fundamentos.

    3.1.

    Delimitação objectiva do âmbito do recurso.

    Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (artº 684 nºs 2, 1ª parte, e 3 do CPC).

    Nas conclusões da sua alegação, é lícito ao recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso (artº 684 nº 2 do CPC). Porém, se tiver restringido o objecto do recurso no requerimento de interposição, não pode ampliá-lo nas conclusões[1].

    Tendo em conta a vinculação temática desta Relação à alegação do recorrente e ao conteúdo da decisão recorrida as questões concretas controversas que importa resolver são a de saber se:

    1. O tribunal de que provém o recurso incorreu, na decisão da matéria de facto num error in iudicando, e, correspondentemente, se esse julgamento deve ser modificado; b) A sentença judicial em que se baseia a execução é intrinsecamente inexequível pela verificação de um facto extintivo da obrigação exequenda; c) A sentença que serve de título executivo é extrinsecamente inexequível por um vício da acção declarativa em que se formou esse mesmo título - a falta ou nulidade da citação, para aquela acção, do executado.

    A resolução destas questões concretas controversas vincula, naturalmente, ao exame, ainda que pouco detido, dos poderes de controlo desta Relação sobre a decisão da matéria de facto, da caducidade do direito à resolução do contrato de arrendamento, com fundamento na falta de pagamento da renda, pelo pagamento, depósito ou consignação em depósito das rendas devidas e da indemnização moratória, e do regime da falta e da nulidade da citação.

    3.2.

    Parâmetros de controlo desta Relação relativamente à decisão da matéria de facto da 1ª instância e reponderação do julgamento correspondente.

    A apelação, dado o seu carácter de recurso global, destina-se também a facultar o controlo da decisão do tribunal de 1ª instância relativamente à matéria de facto e, pode, de resto, ter por único fundamento, um error in judicando dessa matéria.

    Um tal error in iudicando da matéria de facto pode, todavia, radicar em duas causas diversas: pode tratar-se de um erro na apreciação dessa prova ou mais simplesmente de um erro na selecção do objecto da prova.

    Um primeiro caso em que a Relação pode ser chamada a censurar o julgamento da matéria de facto realizado na 1ª instância não respeita à violação dos critérios de apreciação da prova – mas à infracção das regras relativas à selecção da matéria de facto. Não se trata, portanto, de controlar a correcção do procedimento de apreciação da prova da matéria de facto – mas a exactidão da operação de selecção dessa matéria.

    Sempre que considere deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre determinados pontos de facto ou quando considere indispensável a ampliação da matéria de facto – por se ter omitido o julgamento de um facto relevante – a Relação anula a decisão da 1ª instância e reenvia-lhe o processo para que proceda a novo julgamento (artº 712 nº 4, 1ª parte, do CPC)[2].

    A decisão da matéria de facto é deficiente sempre que o julgamento, não cubra a matéria de facto alegada pelas partes, relevante segundo a única solução plausível da questão de direito, i.e., segundo o único enquadramento jurídico possível do objecto da causa.

    Por outras palavras: a decisão da matéria de facto é deficiente quando determinado ponto da matéria de facto ou algum segmento dela não tenha sido objecto de resposta positiva ou negativa[3].

    O julgamento do recurso de harmonia com o modelo de cassação justifica-se pelo facto de a decisão da matéria de facto se encontrar ferida de um erro de julgamento, mas de este erro não resultar de um erro na apreciação da prova - mas de um erro sobre o objecto dessa prova.

    Um dos fundamentos do recurso consiste na incorrecção, por omissão, do julgamento, de dois pontos de facto alegados pelo recorrente na petição inicial da oposição.

    O recorrente alegou, na verdade, na petição inicial da oposição que a co-executada havia procedido, no dia 11 de Junho de 2010, ao depósito, na conta bancária indicada no contrato para esse efeito, da renda relativa ao mês de Junho de 2010 e que, mostrando-se pagas até à data do oferecimento do articulado da oposição, todas as rendas vencidas, procedeu ele mesmo, ao depósito, na mesma data e na mesma conta, da indemnização correspondente a 50% do valor das rendas vencidas que não foram tempestivamente pagas. O recorrente apresentou, para prova destes factos, os documentos comprovativos dos depósitos. Os exequentes não impugnaram nem aqueles factos nem estes documentos.

    Todavia, os factos contidos naquelas alegações do recorrente -notoriamente relevantes segundo os vários enquadramentos jurídicos possíveis do objecto da oposição – não foram seleccionados, nem para a factualidade assente nem para a base instrutória, nem foram utilizados, na fundamentação de facto, pela sentença impugnada.

    Omissão tanto mais inexplicável quanto é certo que todos os demais factos contidos em alegações homótropas do recorrente, relativas aos demais depósitos rendas efectuados, para demonstração dos quais foi oferecida uma prova...

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