Acórdão nº 471/09.9PBTMR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelLUÍS TEIXEIRA
Data da Resolução21 de Março de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I - Assistente A..., melhor id. nos autos.

- Arguidos: B... e C..., ambos melhor ids. nos autos.

* 1.

Nos presentes autos, a assistente A... apresentou queixa contra C... e B... por factos susceptíveis de integrar um crime de dano.

2.

Findo o inquérito, pelo Ministério Público foi proferido despacho que determinou o arquivamento do inquérito nesta parte.

3.

Não se conformando com o teor deste despacho, requereu a assistente a abertura de instrução, pugnando pela pronúncia dos arguidos pela prática em co-autoria de um crime de dano previsto e punido pelo artigo 212º, nº1, do código Penal.

4.

Foram realizadas as diligências requeridas e procedeu-se ao debate instrutório findo o qual foi proferida decisão instrutória que pronunciou os arguidos por aquele crime de dano.

5.

Desta vez são os arguidos que, não se conformando com o teor da decisão, dela recorrem, formulando as seguintes conclusões: 1. A... apresentou queixa contra os ora recorrentes afirmando que estes, em 18 de Setembro de 2009. haviam ordenado a destruição parcial de um muro existente na sua propriedade situada em … , Tornar. 2. Tais factos são susceptíveis de integrar a prática de um crime de dano, p.p. pelo Art,° 212°, n.° 1 do Código Penal. 3. Realizado o Inquérito, entendeu o Ministério Público proferir douto despacho de arquivamento, nesta parte. por entender não terem sido recolhidos indícios suficientes da prática do aludido crime. 4. Inconformada com tal decisão, a assistente A... requereu então a abertura de instrução. 5. Realizada a instrução, pela MM. Juiz a quo foi proferido douto despacho que pronunciou os ora recorrentes pela prática de um crime de dano. imputando-lhes os factos constantes do douto requerimento de abertura de instrução. 6. Os ora recorrentes entendem que não deviam ter sido pronunciados j á que não foram, durante as fases de inquérito e instrução, recolhidos indícios suficientes quer da propriedade da assistente sobre o muro em causa quer da ilicitude do acto de destruição parcial desse muro e, muito menos, que a arguida B... ao ordenar essa destruição o tivesse feito com a consciência de estar a destruir coisa alheia e que tal destruição lhe fosse vedada pela ordem jurídica e portanto, ilícita.

7.

Nos termos do disposto no art.° 308° do mesmo Código se, até ao encerramento da instrução tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança. o juiz. por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos, sendo que. caso tal não se verifique. profere despacho de não pronúncia. 8. O art.° 283° do CPP dispõe que só poderá ser deduzida acusação se durante o inquérito tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se ter verificado crime e de quem foi o seu agente. entendendo-se por indícios suficientes aqueles que impliquem uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada. em julgamento, uma pena ou medida de segurança.

9. Na douta fundamentação do despacho recorrido, não se faz qualquer referência aos elementos que inequivocamente, pudessem demonstrar, sem margem para dúvidas, que a assistente é de facto a proprietária do muro e, aliás, tais elementos não existem nos autos. 10. Só em acção de reivindicação se poderá fazer a prova dos limites dos prédios através e determinar a quem pertence a propriedade do terreno e muro nela implantado. 11 .Não se encontra, portanto, demonstrado nos autos a quem pertence a propriedade do terreno onde foi construído o muro pelo que é obvio que não foram recolhidos indícios suficientes do carácter alheio do bem destruído. 12.Os arguidos não reclamam sobre o terreno em causa um mero direito de passagem mas, antes, reclamam o próprio direito de propriedade e a posse sobre esse terreno. 13.No terreno em causa, foram construídos dois muros, um por volta de 2006, posteriormente deitado a baixo e reconstruído em 2009. desta feita ilicitamente dentro dos limites do terreno pertencente aos arguidos B... e C.... 14.Existem nos autos elementos de prova que indiciam que o muro que a arguida B... mandou destruir parcialmente foi construído em inícios de 2009 e não há cinco anos como consta da decisão instrutória, pelo que não se indicia minimamente que a assistente exerceu a posse sobre o muro e o terreno em questão com duração superior a um ano. 15.Decorre do Art.° 31°. n.°s 1 e 2 al. b) do Código Penal que o facto não é punível quando a sua ilicitude for excluída pela ordem jurídica considerada na sua totalidade e que nomeadamente não é ilícito o facto praticado no exercício de um direito. 16. Por seu turno, os Artigos 1277° e 1314° do Código Civil permitem a defesa da propriedade e da posse por meio de acção directa. 17. Existe uma grande probabilidade de serem os ora recorrentes os titulares da propriedade e os possuidores do terreno. 18. Nestes termos assistia-lhes o direito de defenderem a posse e a propriedade por meio de acção directa e foi precisamente esse o direito que a arguida B... exerceu ao ordenar a destruição parcial do muro.

19. Tal destruição foi necessária pois a passagem pelo terreno onde ilicitamente foi construído o muro era essencial para se poder por aí passar com os materiais para uma obra, sendo certo que o recurso aos meios judiciais para defesa da posse e propriedade do terreno, pela sua morosidade, não permitiam exercer, em tempo útil, a possibilidade de transitar pelo terreno durante o decurso das obras. 20. Acresce que a arguida apenas ordenou que fossem realizadas no muro duas aberturas com cerca de 80 centímetros, de modo a permitir tal trânsito, pelo que não excedeu o estritamente necessário para evitar o prejuízo. 21 . Não foram recolhidos indícios de que a arguida B... tenha praticado um acto ilícito, já que existe nos autos uma forte possibilidade de, ao ter ordenado a destruição parcial do muro, o tenha feito no exercício de um direito. 22.Nessa medida, e tendo em conta que os arguidos se afirmam proprietários do terreno em questão, apresentando elementos de prova nesse sentido nunca poderíamos concluir, de forma plausível. que a arguida B..., ao ordenar a destruição parcial do muro, o tenha feito de forma livre, voluntária e consciente com intenção de estar a actuar sobre coisa alheia e com consciência da ilicitude da sua conduta. 23.Também, não foram...

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