Acórdão nº 409/11.4GBAND-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Março de 2012
Magistrado Responsável | MARIA JOSÉ NOGUEIRA |
Data da Resolução | 28 de Março de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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Relatório 1. No âmbito do Processo sumário n.º 409/11.4GBAND da Comarca do Baixo Vouga – Anadia – Juízo de Instância Criminal, por sentença de 25.08.2011, foi a arguida A..., melhor identificada nos autos, condenada pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 1, do D.L. n.º 2/98, de 3/01 na pena de 50 [cinquenta] dias de multa, à taxa diária de € 5,00 [cinco euros].
Mais foi a arguida condenada no pagamento das custas do processo.
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Em 7.10.2011, o Ministério Público promove no processo que ao apoio judiciário requerido pela arguida e deferido pela Segurança Social fosse declinado, no âmbito dos autos, a produção de quaisquer efeitos, com as legais consequências – [cf. fls. 20 a 24].
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Após exercício do contraditório, sobre o assim promovido recaiu o despacho judicial de 11.11.2011, no qual foi desatendida a pretensão do Ministério Público.
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Inconformado recorre o Ministério Público, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1.ª Após a publicação da sentença condenatória dos autos, a qual não foi objecto de recurso, mas ainda antes do trânsito, a arguida requereu perante a Segurança Social e viu deferida a concessão de apoio judiciário, nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de pagamento da compensação de defensor oficioso.
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Tal decisão administrativa, que ignorou o estado dos autos a que respeita, não pode ter qualquer repercussão nas custas e demais encargos da responsabilidade da condenada, de que o Estado é credor.
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Na verdade, ao demandar o benefício de apoio judiciário a arguida, ora condenada, não quis aceder ao direito e aos tribunais, cfr. art. 20º da CRP; não quis conhecer, exercer ou defender os seus direitos, cfr. art. 1º da L. 34/2004 de 29.7 mas, tão só e apenas, livrar-se/eximir-se do pagamento das custas e demais encargos a que dera lugar a sua condenação.
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O despacho recorrido aceitou formal e acriticamente a citada decisão administrativa, ainda que a arguida se tenha conformado com a sentença, não curando de saber se ela pretendia aceder ao direito e aos tribunais ou conhecer, exercer ou defender os seus direitos, tal a matriz, a génese e a finalidade do instituto.
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Tal despacho colide de modo ostensivo com a filosofia do instituto, já não como um instrumento/regime de acesso ao direito e aos tribunais, já não para conhecer, exercer ou defender direitos, como claramente resulta da letra e do espírito da lei, mas antes, como meio expedito de perdoar/branquear/amnistiar os encragos de um processo já exaurido para o requerente, onde, em suma, o ius dicere já teve lugar, ademais por via administrativa e à custa dos cada vez mais esforçados contribuintes …! 6.ª Para significar que o termo final (meramente formal) previsto no citado art. 44º - 1 “… devendo o apoio judiciário ser requerido até ao trânsito em julgado da decisão final.” no que tange à oportunidade do pedido não pode ser desligado dos fundamentos materiais e da finalidade subjacentes ao requerimento e à concessão do benefício em causa, para não o desvirtuar completamente.
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Em processo penal a protecção jurídica só pode requerida até ao trânsito em julgado da decisão final e desde que o requerente pretenda aceder ao direito e aos tribunais, ou seja, conhecer, exercer ou defender os seus direitos, sendo esta, cremos bem, a única interpretação (restritiva9 da lei que respeita a previsão do art. 9 do CC., ora reproduzido e a génese e finalidade do instituto.
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Pelo que, a decisão administrativa que lhe concedeu o apoio judiciário nenhuma repercussão pode ter na sua responsabilidade tributária nestes autos.
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O despacho recorrido violou, entre outros, os artºs. 20.º da CRP e 1º, 18.º, 39.º a 44.º todos da L. 34/2004, de 29/07 na redacção da L. 47/2007, de 28/08.
Nestes termos e nos mais de direito, se Vas. Exas. Derem provimento ao recurso, revogando o despacho recorrido e mandando-o substituir por outro que decline a produção de efeitos nos autos do concedido apoio judiciário, será feita a habitual, Justiça.
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Ao recurso respodeu a arguida, concluindo: 1. A arguida discorda veemente da interpretação dada ao dispositivo legal em análise, bem como de toda a argumentação aduzida.
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Não corresponde de todo à verdade que a pretensão da arguida é apenas “livrar-se do pagamento da responsabilidade tributária”.
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A execepção concedida ao processo penal, no art.º 44.º, n.º 1, Lei 34/2004, de 29.07, tem precisamente em vista os casos, como o dos autos, em que o requerente do apoio judiciário não tem forma de requerer o benefício antes da primeira intervenção processual.
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O próprio recorrente admite que a formulação do pedido e a sua decisão são formalmente tempestivos.
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A concessão de apoio judiciário requerido após prolação da sentença e no decurso do prazo do recurso da decisão em primeira instância abrange as custas em que a mesma foi condenado na sentença.
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A interpretação restritiva que o M.P. defende levaria a que os arguidos detidos em flagrantre delito nunca pudessem beneficiar de apois judiciário, o que seria a completa denegação de justiça. Ainda, os arguidos à luz do R.C.P, encontram-se dispensados do pagamento prévio de qualquer taxa de justiça, pelo que a ser assim nunca em processo penal haveria lugar à aplicação do instituto de apoio judiciário, não podendo ser este o espírito da lei! 7. Outrossim, na vigência da Lei 30 – E/2000, de 20 de Dezembor, uma vez que o apoio judiciário poderia ser requerido “em qualquer estado da causa”, a jurisprudência veio a fixar-se no entendimento que o apois judiciário só operava para o futuro. Ora, esse entendimento já não poderá ser válido, uma vez que se estabeleceu um regime diferente.
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O acesso ao direito é universal e uma vez verificada a insuficiência económica para o pagamento das despesas judiciais pela entidade competente – Segurança Social – não faz qualquer sentido obstaculizar a materialização dos efeitos do apoio judiciário, com fundamento em razões de forma.
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O pedido de apoio foi deferido por quem tinha competência para o fazer.
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Pelo que o Tribunal a quo decidiu bem e em conformidade, de resto, com o entendimento da jurisprudência recente.
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Sendo o apoio requerido antes do prazo fixado no referido artigo 44.º, não pode o tribunal vedar o acesso a esse benefício devido a um entendimento diferente sobre as...
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