Acórdão nº 1417/08.8TALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelELISA SALES
Data da Resolução29 de Fevereiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - RELATÓRIO A...

veio interpor recurso da sentença que o condenou pela prática de um crime de falsificação de documento p. e p. pelo artigo 256º, nº 1, al. a) e n.º 3 do Código Penal, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 6,00 o que perfaz a quantia de € 600,00.

Na procedência parcial do pedido de indemnização civil deduzido pelos demandantes B.... do .e C...., foi ainda o arguido condenado no pagamento de € 1.500,00 a título de danos não patrimoniais.

*A razão da sua discordância encontra-se expressa nas conclusões da motivação de recurso onde refere que: I. O presente recurso tem como objecto toda a matéria do acórdão condenatório proferido nos presentes autos, II. Com o devido respeito, os factos dados como provados na douta sentença a quo, padecem na sua maioria duma grave falta de precisão, sendo que alguns dos factos provados não têm assento em qualquer prova directa nem mesmo indirecta, não foram fundamentados, não podendo servir, como, mau grado, serviram, para formar a convicção do tribunal, o que só pode ter tido como justificação a insuficiente prova produzida, a que o recorrente é totalmente alheio.

  1. Não vislumbra o recorrente a que prova o Exmo. Sr. Juiz a quo se socorreu para sustentar as afirmações dos pontos 3) e 4) da douta sentença a quo.

    Conforme consta na motivação da douta sentença, a testemunha B..., "...

    não sabe se foi o arguido que preencheu" (cfr. gravação do dia 30-03-2011 (Toda a prova gravada que é citada na presente peça foi gravada na audiência de Julgamento do dia 30-03-2011), de 14:28:51 a 14:51:32, especificamente aos 13:50 a 14:10, da gravação desta testemunha) IV. Nenhuma prova foi produzida quanto às escritas constantes do impresso e da livrança. Remetendo para o relatório do exame pericial, o mesmo teve como quesitos, única e exclusivamente, a escrita manual de assinaturas, ao contrário do que se encontra disposto no ponto 4) dos factos provados, pelo que o mesmo nunca poderia ter sido dado como provado.

  2. Do depoimento da testemunha, B... parece ficar a dúvida sobre se o impresso já ía preenchido ou por preencher, não sendo o depoimento suficientemente preciso quanto a esse ponto (cfr. gravação do dia 30-03-2011, de 14:28:51 a 14:51:32, especificamente aos 02:40 a 03:15, da gravação desta testemunha).

  3. Quanto ao facto provado n.º 3, importa afirmar que a probabilidade de alguém assinar um documento é perfeitamente autónoma da decisão da sua realização, impondo-se a sua concreta prova, não podendo, pelo contrário, inferir-se probabilidades de outras probabilidades, sob pena de se cair na pura ficção.

  4. Quanto ao teor dos pontos 6) a 8) dos factos provados, relevará necessariamente o relatório de exame pericial, pelo que, quanto ao ofendido B... ., não se pode admitir que se dêem como provados tais factos, porquanto não se obtiveram quaisquer resultados conclusivos relativamente a quem assinou pelo ofendido, não havendo sequer uma mera probabilidade! (cfr. fls.133 e 134 dos autos) VIII. Quanto à Ofendida C...., decorre do relatório de exame pericial, que é meramente "provável", que a sua assinatura seja da autoria do arguido, frisando-se que este conceito se afasta e muito, do conceito de "muitíssimo provável" referido quanto ao facto de não terem sido os Ofendidos a apor as suas próprias assinaturas nos documentos, resvalando, deste modo, a dúvida suficiente, sobre a culpabilidade do arguido.

  5. No que respeita ao teor dos pontos 9) e 13) da matéria de facto dada como provada na douta sentença, incorre necessariamente em lapso notório, o Meritíssimo Juiz a quo, porquanto é certo, como resulta da prova produzida em audiência, que o crédito não foi concedido ao arguido, mas aos ofendidos B... e C....

    , ainda que com um eventual abuso das suas assinaturas (cfr. facto provado n.º 12 da douta sentença a quo).

  6. Quanto ao facto provado constante do ponto 14) da douta sentença, a ilação da carência de meios para a compra do empilhador, carece em absoluto de, fundamento e de prova, não podendo servir para formar a convicção do tribunal a quo.

  7. Relativamente aos factos dados como provados nos pontos 15) a 17) da douta sentença a quo, concretamente, quanto à intenção que necessariamente subjaz a prática do crime em assunto, nenhuma prova foi produzida nesse sentido na audiência de julgamento, sem denegar a vontade profissional do arguido de celebrar negócios lucrativos no âmbito do seu ramo profissional, e que por si só, não pode seguramente ser censurável, como parece ter sido! XII. Ainda que, por mero exercício de raciocínio, se admitisse que o arguido tivesse actuado com o objectivo de obter um ganho, por força da matéria dada como provada no ponto 12), esse ganho nunca poderia consubstanciar o valor total do financiamento obtido de €35.000.00 [cfr. ponto 11) e 15) dos factos provados da douta sentença a quo], mas uma eventual margem de lucro, que não se apurou em audiência de julgamento, uma vez que se trata de um negócio com prestações bilaterais, e foi vendida uma empilhadora, tendo esse bem um custo.

  8. Não foi apurado no presente processo, quem pagou o referido financiamento. Logo, não se provou qualquer interesse especial do arguido na celebração deste contrato.

  9. Não obstante, a testemunha/Ofendida C..., afirma ter sido contactada por ter prestações em atraso, pelo que certamente já teria ocorrido o pagamento de algumas prestações (cfr. gravação do dia 30-03-2011, de 14:51:36 a 15:18:37, especificamente aos 13:45 a 15:30 e 15:45 a 16:30, da gravação desta testemunha).

  10. Estranho é que a testemunha, questionada sobre um empilhador e posteriormente sobre o motivo porque associaram a comunicação da prestação em atraso com o arguido A…, refere que o contacto telefónico foi feito pela "W...", quando o contrato de financiamento que está em causa nestes autos, foi feito com o "Z..." - cfr. pontos 5 e 9 dos factos provados da sentença a quo, XVI. Pelo que, com o devido respeito, incorre em erro notório e gritante, o Exmo. Sr Juiz a quo, quando na motivação descreve que esta testemunha "relatou que lhe ligaram de uma financeira dizendo que tinham prestações em atraso e que acto contínuo, o marido ligou ao arguido que lhe respondeu que "foi só um problema e que não se preocupasse ". A referida testemunha não se refere a ligações telefónicas feitas por uma qualquer financeira, mas ao longo do seu discurso refere-se sempre à "W...", pelo que o seu depoimento em nada poderá relevar para a questão em apreço, que se concretiza na falsificação de um contrato de financiamento com o "Z...

    ".

  11. Da análise da matéria de facto dada como provada na douta sentença a quo e da respectiva fundamentação, por si só e conjugada com a prova produzida em audiência e com as regras da experiência comum, decorre um cabal erro de Julgamento, padecendo a douta decisão dos vícios invocados e previstos no n.º 2 do art. 410° do Cód. Proc. Penal, concretamente, o constante na al. a), de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; e o constante na al. c) de erro notório na apreciação da prova, nos termos supra descritos.

  12. Quanto aos elementos objectivos do tipo legal de crime em análise, concretamente, o abuso das assinaturas de outras pessoas para elaborar documento falso, não há nos presentes autos qualquer prova directa da sua realização por parte do arguido, sobretudo quanto ao ofendido B... .; ao contrário do constante na fundamentação do enquadramento jurídico-penal, da douta sentença, que assume como referente aos dois Ofendidos, a conclusão do abuso provável, no relatório pericial, esta probabilidade cinge-se apenas à assinatura da ofendida C.....

  13. Pelo que as conclusões do Exmo Juiz a quo, patentes na douta sentença, quanto à culpabilidade e autoria do arguido na falsificação da assinatura do referido Ofendido B...são, com o devido respeito, que é muito, totalmente carecidas de fundamento e de prova.

  14. A douta decisão, é totalmente omissa na sua fundamentação quanto ao dolo específico, ou seja, à intenção do arguido de obter um benefício ilegítimo determinado, desconhece-se o processo lógico dedutivo e meios probatórios que o tribunal a quo ponderou para atingir essa convicção quanto ao elemento subjectivo do ilícito.

  15. E, a questão não pode, certamente, ser ultrapassada pelo recurso às regras da experiência, que eventualmente sustentaram a determinação do ponto 15) dos factos provados, porquanto, resta saber, que benefício concreto seria esse, e se o mesmo era para o próprio arguido ou para terceiro (!).

  16. A douta sentença, na parte penal, carece de fundamentação de direito, atento o disposto no art. 379°, n° 1, al. a) do C.P.Penal, incorrendo em nulidade insanável, por não conter as menções referidas no...

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