Acórdão nº 896/11.0PAMGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelALBERTO MIRA
Data da Resolução29 de Fevereiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório: 1.

No 3.º Juízo do Tribunal Judicial da Marinha Grande, após julgamento em processo sumário, o arguido A...

, residente na Rua … Marinha Grande, foi condenado, por sentença publicada e depositada em 17-10-2011, pela prática do crime que lhe está imputado, ou seja, de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, na pena principal de 90 (noventa) dias de multa, à razão diária de €10,00 (dez euros) e na pena acessória de “inibição” de conduzir veículo motorizado pelo período de 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias.

* 2.

Inconformado, o arguido interpôs recurso da sentença, tendo extraído da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: A. Com o presente recurso sobre a reapreciação da prova gravada relativamente à motivação e circunstancialismo da prática do pretenso crime bem como sobre matéria de Direito, no tocante ao não preenchimento dos requisitos objectivos para a punição, aplicabilidade de pena acessória e medida da condenação, não se pretende colocar em causa o exercício das mui nobres funções nas quais se mostram investidos os Ilustres julgadores, mas tão-somente exercer o direito de “manifestação de posição contrária” ou “discordância de opinião”, traduzido no direito de recorrer, consagrado na alínea i) do n.º 1 do art. 61.º do CPP e no n.º 1 da CRP.

B. No presente processo sumário veio a ser proferida oralmente douta sentença condenatória ao abrigo do disposto no art. 389.º-A CPP, tendo-se tal norma legal possibilitadora de “sentença na hora” por inconstitucional por violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade, garantias de defesa do arguido e respeito devido aos Tribunais enquanto órgãos de soberania e ideia de justiça ponderada e em si mesmo individualizadora pois cada caso será um caso que se não poderá subsumir a um modelo automático ao jeito do precedente da justiça anglo-saxónica! C. Tem-se a douta sentença recorrida por nula por ausência de fundamentação ao nível da determinação da medida das penas, que parecem resultar de um “acto intuitivo ou puramente mecânico” de mera arbitrariedade do Tribunal, sendo patente na gravação a hesitação que inexistiria caso não se mostrasse imposta a “sentença na hora”.

D. Padece ainda do vício da nulidade por partir da premissa errada de que se tratou de confissão integral e sem reservas, decisão que não se aceita e da qual se recorre, olvidando que o mesmo, além de confessar o facto da condução após o consumo de álcool, admitiu apenas como possível uma eventual condenação, tendo oportunidade de afirmar tratar-se de um acto isolado e não ser pessoa de beber, retratar o circunstancialismo em que o fez (para auxiliar um tio que vive no Brasil e se mostrava de visita a regressar a sua casa, tomando a A8!), pouca distância percorrida e autuação já perto de sua casa, terminus do percurso, sem colocação em perigo de qualquer passageiro (passagens 04:56 a 05:36 e 06:20 a 06:32).

E. Ao dispensar a única testemunha presencial arrolada pela douta acusação pública, perdeu o Tribunal a hipótese de, no âmbito do princípio da investigação tendente à descoberta da verdade material, colocar em crise tal explicação justificante da condução, tendo de a aceitar ou, pelo menos, justificada e fundamentadamente, afastá-la, bem como aquilatar dos sinais de embriaguez, estado da condução do arguido, suas demais características, eventual colocação em perigo ou violação de outras regras de segurança rodoviária, etc., tudo essencial para aquilatar da medida da pena principal e necessidade e medida da pena acessória; F. Atendendo a que a douta sentença se mostra omissa (a cominar vício de omissão de pronúncia!) face a tal factualidade bem como em relação à subsunção dos factos ao Direito, olvidando a existência da causa de exclusão da culpa ou da ilicitude, atento o dever de auxílio que pendia sobre o arguido, a justificar a sua absolvição ou, no limite, uma atenuação especial, tem-se a mesma por nula, por ausência de fundamentação e preterição das garantias do arguido uma vez que, além do seu defensor presente na audiência (que não o signatário!) sempre recai sobre o Tribunal e o Ministério Público tal salvaguarda! G. Da mesma forma que não cuidou o Tribunal de aquilatar da real condição económica do arguido, não cuidando de averiguar os seus encargos (desde logo o relatado pelo arguido sobre a sua sogra na passagem 08:01 a 08:14) levando sequer à douta sentença os seus rendimentos, mas apenas a consideração cada vez mais perene de “emprego estável” e rendimentos da esposa, levando a que a condenação se venha a repercutir sobre terceiros, ao arrepio da intransmissibilidade das penas, podendo até ter recorrido à elaboração e relatório social, uma vez que a Lei fundamental faculta o auxílio por outras entidades; H. O entendimento da pena de proibição de conduzir como acessória, pese embora se afigure errado em razão da proibição da dupla valoração, e sempre aplicável à condução em estado de embriaguez por constituir “uma especial censurabilidade, cuja razão político-militar é demasiado óbvia para precisar de ser explicitada” coloca sobre o arguido um peso acrescido em termos de culpa (uma presunção ilícita e inconstitucional!), que assim poderá ser maior que a real ou efectiva, à imagem do já feito em sede de douta sentença recorrida relativamente à escolaridade, devendo tal necessidade ser casuisticamente aquilatada! I. Deveria haver a coragem política e jurisprudencial suficientes a ponto de elevar tal pena dita acessória a principal uma vez que se tem inconstitucional, por violação dos princípios da legalidade, igualdade, ne bis in idem e proporcionalidade, a aplicação simultânea de duas penas bem como igual punição para a actuação dolosa e negligente, atenta a forma como se mostra recortado o art. 292.º CP, sendo que in casu não deixará de ser sobremaneira prejudicial ao arguido e de ser sentida pelo mesmo, atenta o facto de se tratar de condição essencial ao desempenho da sua actividade profissional; J. Terá de ser buscada a existência ou não de especial censurabilidade, que necessariamente terá de decorrer das especiais circunstâncias de prática dos factos e personalidade do agente, que in casu, tal como se afirmou, foram olvidadas, tendo-se por inconstitucional a norma legal que prevê tal pena dita acessória sempre e quando interpretada, em violação do art. 9.º do C.C., no sentido de não se ter de avaliar e ponderar em conjunto todo o circunstancialismo de prática dos factos e personalidade do agente, trabalho a cargo do Tribunal no âmbito do princípio da livre investigação e poderes que lhe assistem, podendo ser coadjuvado por outras entidades, nos termos do n.º 3 do art. 202.º da C.R.P., para feito de avaliação de especial censurabilidade que justifique tal acréscimo punitivo.

K. A própria inexistência de uma cláusula geral de salvaguarda de não aplicabilidade ou efectivação, subjacente a suspensão ou substituição inerente ao cumprimento de injunções ou regras de conduta, que expressamente se peticiona, é em si mesmo razão suficiente para que seja decretada a inconstitucionalidade de tal norma legal, por violação dos arts. 13.º, 18.º, n.ºs 2 e 3, 30.º, n.º 4, 32.º, n.ºs 1 e 5, 202.º, n.º 2, 204.º e 205.º da CRP, convocando-se o exemplo do aniversariante supra referido em sede de motivação recursória para demonstrar clara e suficientemente a perniciosidade inerente a tal entendimento, sempre tendo de haver uma especial censurabilidade a acrescer ao cometimento do ilícito.

L.

In casu não foi problematizada nem a aplicabilidade da pena acessória nem a medida da mesma, havendo uma vaga referência à taxa de álcool e a tal decisão mecânica e automática, com insuficiência da matéria de facto provada para tal condenação, ao arrepio do n.º 4 do art. 30.º da C.R.P., quando todos os preceitos constitucionais integram normas que fornecem os parâmetros de interpretação recta do Direito que lhe está infra ordenado, devendo assim lançar-se mão do princípio da interpretação conforme a Constituição da República Portuguesa não sendo a progressividade mais do que a densificação do conceito de justiça proveniente da igualdade material, princípio base de todo o Direito, pressupondo um conceito de democraticidade: a lei penal é igual para todos! M. Entende o arguido que a motivação de prática do facto e demais circunstancialismo sempre serão fonte de exclusão da ilicitude (ao abrigo de direito de necessidade) e/ou da culpa (ao abrigo de estado de necessidade desculpante) a justificar a sua absolvição uma vez que apenas agiu por forma a auxiliar um seu tio que se via numa cidade desconhecida e sem saber como apanhar a A8 para regressar, estando assim no cumprimento de um dever legal de auxílio e mesmo num quadro de conflito de deveres, não se mostrando ainda justificada a convocação do Direito Penal; N. Para mais quando, por não ser consumidor habitual de bebidas alcoólicas, a justificar assim a não habituação do seu organismo traduzido na taxa de álcool acusada, sempre desconhecia em concreto que a sua actuação fosse ilícita, agindo assim sem culpa ao abrigo do art. 17.º CP, dado que, ao ingerir as bebidas alcoólicas já não fazia intenção de sair de casa e consequentemente pegar no carro e conduzir, pelo que, afastado o dolo, poderá estar em causa quanto muito, a negligência, sempre tendo a douta condenação a existir, de atender a tal...

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