Acórdão nº 711/09.5TBMGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelARTUR DIAS (POR VENCIMENTO)
Data da Resolução29 de Fevereiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

RELATÓRIO S…, solteira, maior, residente na Rua …, intentou, em 17/04/2009, acção declarativa, com processo comum e forma ordinária, contra o Instituto de Segurança Social, I.P.

, com sede no Campo Grande, nº 6, 1749-001 Lisboa, pedindo que: (a) se reconheça judicialmente que a Autora viveu com o falecido F…, beneficiário da Segurança Social nº … em condições análogas às dos cônjuges desde o ano de 1997 e até à morte deste (25/04/2008); (b) seja atribuído à A. o direito a pensão por morte do seu companheiro; (c) seja reconhecido o direito da A. a receber as despesas com o funeral e bem assim as respectivas prestações por morte do malogrado F…; (d) seja reconhecido que os familiares da A., irmãos e ascendentes, não têm condições económicas para lhe prestar alimentos.

Alegou para tanto, em síntese, que viveu em união de facto com F…, beneficiário da Segurança Social, desde Novembro de 1997 até 25/04/2008, data em que ele faleceu, no estado de divorciado; que desse relacionamento existem dois filhos; e que necessita de alimentos, não podendo obtê-los da herança do falecido nem dos familiares a que aludem as alíneas a) a d) do artº 2009º do Código Civil.

O Instituto de Segurança Social contestou por excepção e por impugnação, alegando, no essencial, que desconhece, sem obrigação de conhecer, se correspondem à verdade os factos articulados pela A. na petição inicial.

Saneada, condensada e instruída a acção, iniciou-se, em 04/07/2011, a audiência de discussão e julgamento, logo tendo sido proferida a sentença de fls. 139 a 144 julgando aplicáveis as alterações introduzidas pela Lei nº 23/2010, de 30/08, à Lei nº 7/2001, de 11/05 e, por via disso, extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

Inconformado, o R. recorreu, encerrando a alegação apresentada com as seguintes conclusões: (...).

A apelada não respondeu.

O recurso foi admitido.

Nada obstando a tal, cumpre apreciar e decidir.

Tendo em consideração que: - O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (artºs 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do Código de Processo Civil[1]); - Nos recursos se apreciam questões e não razões; - Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as duas questões a decidir são as de saber se (1) o novo regime de atribuição das prestações por morte de beneficiário da segurança social não casado ou judicialmente separado de pessoas e bens à pessoa que com ele vivesse em união de facto há mais de dois anos, introduzido pelas alterações da Lei nº 7/2001 de 11/05 operadas pela Lei nº 23/2010 de 30/08, é ou não aplicável ao caso dos autos e (2) se da aplicação desse regime resulta inutilidade superveniente da lide e, consequentemente, a extinção da instância.

2.

FUNDAMENTAÇÃO 2.1.

De facto A factualidade e incidências processuais relevantes para o conhecimento e decisão do recurso são as que decorrem do antecedente relatório que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

2.2.

De direito 2.2.1.

Aplicabilidade do novo regime A A. fundamentou juridicamente o seu pedido no regime de acesso às prestações por morte dos beneficiários da segurança social instituído no Decreto-Lei nº 322/90, de 18/10, no Decreto Regulamentar nº 1/94, de 18/01 e na Lei nº 7/2001, de 11/05.

O Decreto-Lei nº 322/90 definiu e regulamentou a protecção na eventualidade da morte dos beneficiários do regime geral de segurança social (artº 1º, nº 1), consubstanciando tal protecção, em termos gerais, na atribuição das prestações pecuniárias denominadas pensões de sobrevivência e subsídio por morte (artº 3º, nº 1) aos cônjuges e ex-cônjuges, descendentes, ainda que nascituros, incluindo os adoptados plenamente, e ascendentes (artº 7º, nº 1).

No artº 8º estendeu aquele diploma o direito às prestações por morte dos beneficiários da segurança social às pessoas que se encontrem na situação prevista no nº 1 do artº 2020º do Código Civil, subordinando a prova da verificação daquela situação e a determinação das condições de atribuição das prestações a um processo a definir através de decreto regulamentar.

O nº 1 do artº 2020º do Cód. Civil estabelecia que “aquele que, no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, vivia com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges, tem direito a exigir alimentos da herança do falecido, se os não puder obter nos termos das alíneas a) a d) do artigo 2009º”.

As alíneas a) a d) do nº 1 do artº 2009º indicam a ordem das primeiras[2] pessoas obrigadas a alimentos, a qual começa pelo cônjuge ou ex-cônjuge [a)], abrangendo seguidamente os descendentes [b)], os ascendentes [c)] e os irmãos [d)].

O processo a que faz menção o artº 8º, nº 2 do Decreto-Lei nº 322/90 foi definido pelo Decreto Regulamentar nº 1/94. Aí se reiterou que tem direito às prestações por morte a pessoa que, no momento da morte de beneficiário não casado ou separado judicialmente de pessoas e bens, vivia com ele há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges (artº 2º), ficando a respectiva atribuição dependente de sentença judicial que lhe reconheça o direito a alimentos da herança do falecido nos termos do disposto no artigo 2020º do Código Civil (artº 3º, nº 1). No caso de não ser reconhecido tal direito, com fundamento na inexistência ou insuficiência de bens da herança, o direito às prestações depende do reconhecimento judicial da qualidade de titular daquelas, obtido mediante acção declarativa interposta, com essa finalidade, contra a instituição de segurança social competente para a atribuição das mesmas prestações (artº 3º, nº 2).

O requerimento das prestações por morte, a conceder ao abrigo do diploma em análise, deveria ser acompanhado de certidão da sentença judicial que fixasse o direito a alimentos ou declarasse a qualidade de titular das prestações por morte (artº 5º).

A situação foi objecto de nova abordagem legislativa através da Lei nº 135/99, de 28/08, em cujo artº 3º, al. f) se reafirmou que quem vive em união de facto tem, entre outros, direito a protecção na eventualidade de morte do beneficiário, pela aplicação do...

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