Acórdão nº 5805/19.6T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução26 de Abril de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

AA propôs contra BB a presente ação com processo especial de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge.

Pediu: Seja decretado o divórcio entre a autora e o réu e declarado dissolvido o seu casamento.

Alegou: Que os cônjuges se encontram separados desde 21 Julho de 2019, altura em que a autora pretendeu regressar a casa depois de um internamento iniciado a 28.06.2019, tendo sido impedida pelo réu de entrar em casa por ter trocado as fechaduras.

E sendo que, desde então, nunca mais viveu em comunhão de leito, teto e mesa com o réu, não existindo qualquer convívio, entreajuda ou partilha entre ambos.

Em virtude da ocorrência do óbito da autora e do réu, foram habilitados a suceder-lhes na demanda, como sucessora da falecida autora, a sua filha CC, e como sucessores do falecido réu, os seus filhos DD, EE e FF.

Não foi apresentada contestação.

2.

Prosseguiu o processo os seus termos, tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido: «…julgo totalmente procedente por provada a presente acção e, em consequência, decreto o divórcio entre a autora e o réu, com a consequente dissolução do casamento celebrado entre ambos no dia 2.12.1973 (assento de casamento nº 2600 do ano de 2014 da Conservatória do Registo Civil ...).».

3.

Inconformados recorreram os réus habilitados.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. Com o devido respeito pela douta Sentença da 1ª instância aqui em crise, que é muito, mas, o certo é que, entende o ora Recorrente, que o Meritíssimo Juiz a quo não enuncia quais os concertos meios de prova em que se suportou para a sua formação, nem efectuou a análise crítica dos mesmos; 2. A fundamentação utilizada na decisão sobre a matéria de facto ora recorrida que, por isso, não constitui um exemplo feliz de fundamentação motivadora do julgado; 3. A sentença recorrida não faz indicação acerca do concreto teor dos depoimentos que erigiu como relevantes, quem disse o quê, de modo a escrutinar a razão de ciência de cada testemunha, ou seja, as circunstâncias em que lhes adveio o conhecimento directo dos factos que manifestaram na sua inquirição, nem quais os factos conheceram, em que momento conheceram esses factos, o que determinou esse conhecimento e, assim expostos e detalhados, aferir da força probatória dos depoimentos e da pertinência dos factos revelados para a decisão da causa; 4. A sentença recorrida limitou-se a fundamentar o julgamento da matéria de facto com base em afirmações genéricas e conclusivas, que não substanciou com pormenor e referência aos depoimentos prestados em sede de julgamento; 5. A apontada falta de fundamentação da sentença recorrida, a manter-se, compromete em absoluto o direito ao recurso da matéria de facto e, nessa perspectiva, contende com o acesso à Justiça e à tutela efectiva, consagrada como direito fundamental no artigo 20º da Constituição da República; 6. Pelo que deverá o Venerando Tribunal Conimbricense concluir pela omissão de fundamentação da decisão de facto e falta de exame crítico dos meios de prova e decidir pela anulação da sentença a quo por violação do artigo 615º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil. Quanto ao segmento decisório do douto despacho recorrido que tem por objecto a impugnação da matéria de facto: 7. O presente recurso de apelação tem por objecto, por um lado, a reapreciação de alguns aspectos da matéria de facto, considerada provada e não provada pelo Tribunal a quo, e por outro, a reformulação e reapreciação do direito aplicável; 8. Com o mais elevado respeito, o Recorrente não se pode conformar com a decisão proferida pelo Tribunal, porquanto aquele interpretou de forma manifestamente incorrecta e incoerente a prova produzida nos autos; 9. Na modesta opinião da ora Recorrente, foi incorrectamente julgado o ponto 9) da matéria de facto dada como provada, o que expressamente se impugna pelo presente recurso, pois está em desconformidade com a prova testemunhal produzida em julgamento e aquela que consta dos demais elementos dos autos; 10. No que concerne ao Ponto 9 da matéria de facto dada como provada resulta dos elementos de prova constantes dos autos (mormente, do teor dos depoimentos prestados pelos sucessores habilitados CC e EE), o Tribunal não poderia ter dado como provado que, nas circunstâncias de modo e lugar supra enunciados, não foi facultada qualquer chave à Autora tout court; 11. Assim, e em face dos identificados meios probatórios, a decisão que recaiu sobre o referido ponto 9 dos Factos Provados que ora se impugna, ser alterada e, em consequência, substituída por outra de onde passe a constar o seguinte: “9) No dia 21.07.2019, a autora pretendeu entrar na casa de morada da família e não conseguiu aceder ao interior da mesma, por terem sido trocadas as fechaduras, não se encontrando ninguém no interior da casa”; 12. Existe ainda, no entender do Apelante, uma deficiência por omissão na matéria de facto apurada que a douta decisão posta em crise nem sequer elencou; 13. A douta decisão recorrida omite factos necessários relevantes para a correcta decisão da causa e justa composição do litígio – factos que resultam da prova produzida nos autos e que o Tribunal ignorou; 14. O Tribunal a quo omitiu da factualidade dada como provada o motivo real que levou o Réu a mudar as fechaduras da casa de morada de família, falamos da sua suspeita quanto ao facto de a sua filha CC se ter apropriado de dinheiro depositado numa conta bancária de que era titular, bem como de vários objectos seus que se encontravam no interior da casa de morada de família; 15. Essa omissão fáctica resulta evidenciada, desde logo, do teor dos depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento pelos sucessores habilitados DD, FF, EE e pela própria CC; 16. Considerando o supra exposto, deverá ser proferida a alteração da decisão da matéria de facto, nos precisos termos da presente alegação e aditado o seguinte facto que se nos afigura importante para a boa decisão da causa: 15) O Autor apresentou uma queixa-crime contra a sua filha CC em virtude de alegados furtos de bens do interior da casa de morada de família, bem como de quantias em dinheiro; 17. Ainda quanto à prova gravada, da análise ponderada dos depoimentos prestados pelas três sucessoras habilitadas (DD, FF e CC) o Tribunal Recorrido omitiu factualidade relevante para a decisão da causa, em particular, a motivação do Autor relativamente à mudança das fechaduras da casa de morada de família que o Tribunal a quo qualificou como sendo um caso de “esbulho violento”; 18. A decisão em crise deveria conter o circunstancialismo fáctico relativo à motivação do ora Apelante para a mudança das fechaduras da casa de morada de família em consequência da suspeita dos alegados furtos de objectos do interior da mesma de quantias em dinheiro que teriam sido cometidos pela sua filha CC, e não propriamente por motivo de qualquer desentendimento, desavença ou discórdia com a Autora; 19. Como é bom de ver, esta factualidade assume especial relevância, sobretudo, para a resposta negativa ao tema da prova que foi enunciado pelo Tribunal Recorrido quanto à questão de saber se devido a desentendimentos do casal, desde 21.07.2019 a autora esteve impedida pelo réu de aceder à casa de morada da família; 20. Esta ampliação da matéria de facto será decisiva, desde logo, para a revogação da da sentença por erro de julgamento quanto à verificação da situação de ruptura definitiva da vida comum do casal; 21. Deverá ser proferida a alteração da decisão da matéria de facto, nos precisos termos da presente alegação e aditado o seguinte facto que se nos afigura importante para a boa decisão da causa: 16) Com a troca de fechaduras mencionada em 8) o Autor pretendeu apenas impedir a entrada da sua filha CC na casa de morada de família em virtude dos alegados furtos por si cometidos; 22. A par disso, existe material probatório bastante nos autos recorridos que permite a ampliação da matéria de facto relativamente ao desconhecimento pelo Réu do paradeiro da sua mulher (Autora); 23. Esta matéria factual é susceptível de determinar decisão diversa da recorrida, desde logo, no que toca ao contexto em que Apelante e Apelada deixaram de coabitar e conviver entre si e, consequentemente para prova da inexistência de uma situação de ruptura da vida em comum entre ambos; 24. Considerando o supra exposto, deverá ser proferida a alteração da decisão da matéria de facto, nos precisos termos da presente alegação e aditada o seguinte facto que se nos afigura importante para a boa decisão da causa: “17) Desde o referido de 10) a 13), o Autor tentou apurar o paradeiro da sua Mulher;”; 25. Outro ponto da matéria de facto que o Tribunal Recorrido omitiu na decisão em crise e que assume especial relevância para a boa decisão da causa, contende com o facto de, a partir de 15 de Janeiro de 2020, o ora Apelante ter sido institucionalizado no Lar da Santa Casa da Misericórdia da ..., em razão da sua dependência, por necessitar do auxílio de terceiros para as suas actividades quotidianas, como se alcança do teor dos depoimentos prestados pelas sucessoras habilitadas DD e FF; 26. Considerando o supra exposto, deverá ser proferida a alteração da decisão da matéria de facto, nos precisos termos da presente alegação e aditada o seguinte facto que se nos afigura importante para a boa decisão da causa: “18) A partir de 15 de Janeiro de 2020, o ora Apelante ter sido institucionalizado no Lar da Santa Casa da Misericórdia da ..., em razão da sua dependência carecendo do auxílio de terceiros.” 27. O Tribunal da Primeira Instância omitiu na factualidade dada como provada a circunstância de o Apelante ter padecido de várias incapacidades físicas e mentais, na fase final da sua vida; 28. Deverá o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra ordenar alteração da decisão da matéria de facto, nos precisos termos da presente alegação e aditado o seguinte facto que se nos afigura...

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