Acórdão nº 840/21.7T8ACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Abril de 2022
Magistrado Responsável | MARIA JOÃO AREIAS |
Data da Resolução | 26 de Abril de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Processo nº 840/21.7T8ACB.C1 – Apelação Relator: Maria João Areias 1º Adjunto: Helena Melo 2º Adjunto: José Avelino Gonçalves Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO S..., Lda., veio, ao abrigo do disposto no artigo 222.º-A, do CIRE, intentar o presente Processo Especial de Revitalização (PER).
Admitido liminarmente o requerimento e nomeado Administrador Judicial Provisório, por este foi junta aos autos a lista provisória de créditos prevista no artigo 17º-D, nº3, do CIRE.
Apresentado acordo de pagamentos, e submetido a votação, recolheu o voto favorável de credores cujos créditos representam 77,62% da totalidade dos créditos relacionados com direito de voto.
Não foi solicitada a não homologação do plano por qualquer interessado (artigos 17º-F, nº7 e 216º do CIRE).
Pelo juiz a quo foi proferido o Despacho, de que agora se recorre, a reconhecer que o mesmo se mostra aprovado pela maioria legalmente necessária, homologando o acordo de pagamentos respeitante à devedora.
* Inconformado com tal decisão, o credor Instituto de Segurança Social I.P., Centro Distrital de Segurança Social de ..., dela interpôs recurso de Apelação, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões: 1.ª – No presente processo, o Instituto da Segurança Social, I.P. / Centro Distrital de Segurança Social de ... é credor sobre a devedora S..., Lda. da importância de €13.555,98, acrescida de juros.
2.ª – Por credores reclamantes de créditos seus numa percentagem de 77,38 % dos votos emitidos, foi aprovado o plano de recuperação conducente à revitalização da referida devedora, tendo o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., entidade competente para votar efetivamente, proferido voto contra esse Plano Especial que previa o pagamento em 40 prestações mensais do débito devido ao ora Recorrente.
3.ª – O Meritíssimo Juiz “a quo”, pela douta sentença recorrida julgou válido o Plano mencionado, homologando-o.
4.ª – Não só o recorrente não aprovou esse Plano de recuperação – manifestando voto contra – como também não houve a competente autorização com vista ao pagamento em prestações.
5.ª – E não o aprovou por ter considerado ficar em posição desfavorável relativamente ao outro credor público presente no plano, designadamente a Autoridade Tributária e Aduaneira.
-
- Foi deste modo considerado que o princípio da igualdade que implicava que Instituto da Segurança Social, I.P. e Autoridade Tributária e Aduaneira deveriam efetuar os respetivos pagamentos em número diferenciado de prestações, foi posto em crise.
-
- De facto, em face da diferença existente ao nível dos montantes em dívida, o número de prestações previstas, igualmente 40, para o Instituto da Segurança Social, I.P. se revelava excessivo, por comparação com o outro ente público.
-
- Uma vez que não foi dado consentimento expresso relativo ao credor aqui Recorrente atinente à modificação e redução dos seus créditos, também o imposto pelo artigo 30.º da Lei Geral Tributária terá sido contrariado 9.º - Assim, é entendimento do ora Recorrente que o Plano de Revitalização não lhe será aplicável pelos motivos explanados, pelo que pretende, com o presente Recurso, que o mesmo não lhe seja oponível.
10.ª- Termos em que com o douto suprimento de V/ Exas., se deve julgar o recurso procedente, declarando-se a ineficácia do Plano de recuperação em presença relativamente ao aqui Recorrente.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deverá ser dado provimento ao presente recurso, determinando-se a ineficácia do plano de revitalização face ao credor Instituto da Segurança Social, I.P..
* Não foram apresentadas contra-alegações.
Dispensados que foram os vistos legais, ao abrigo do disposto no nº4 do artigo 657º do CPC, cumpre decidir do objeto do recurso.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639, do Novo Código de Processo Civil –, as questões a decidir são as seguintes: 1.
Se deve ser decretada a ineficácia do plano relativamente à Apelante: a. Pelo facto do credor ISS, I.P., ter votado contra a aprovação do plano, não tendo autorizado o pagamento em prestações previsto no plano relativamente ao seu crédito; b. A sujeição a um pagamento em 40 prestações, tal como foi previsto para o crédito fiscal, quando o montante do seu crédito é inferior, envolve a violação do princípio da igualdade ínsito no artigo 194º, nº1 CIRE.
III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Na apreciação das questões suscitadas na presente apelação, teremos por relevantes os seguintes factos que emergem dos elementos constantes dos autos: 1. Por requerimento de 24 de abril de 2020, S..., Lda., veio manifestar a sua vontade de encetar negociações conducentes à sua revitalização por meio da aprovação de um plano de recuperação, requerimento igualmente subscrito pelo credor AA; 2. Apresentada lista provisória de créditos pelo Administrador Judicial provisório nomeado, a mesma não foi objeto de qualquer impugnação.
-
Apresentado acordo de pagamentos e submetido a votação, recolheu o voto favorável de 77,38% da totalidade dos votos emitidos da totalidade dos créditos relacionados com direito de voto.
-
O credor Instituto de Segurança Social, I.P., fez anexar declaração de voto com o seguinte teor: “Considerando que: a. O plano de revitalização prevê a regularização da dívida à segurança social nos seguintes termos que se transcrevem: “A dívida à Segurança Social reconhecida no presente PER será regularizada através de plano prestacional a autorizar em 40 prestações mensais e sucessivas, no âmbito da execução fiscal; O pagamento da 1ª prestação deverá ocorrer em datas idênticas para os credores da Segurança Social e AT.
Isenção da prestação de garantia, nos termos do nº13 do artigo 199º do CPPT As Ações Executivas pendentes para cobrança de dívida à Segurança Social não são extintas mantendo-se suspensas após aprovação e homologação do plano de revitalização até integral cumprimento do plano de pagamentos que venha a ser autorizado”.
O plano de revitalização é penalizador para a segurança social por contraponto com a autoridade tributária, sendo nessa medida, violador do princípio da igualdade previsto no artigo 194º do CIRE uma vez que o número de prestações previsto para regularização da dívida à segurança social afigura-se excessivo quando comparado com o número de prestações proposto para a regularização da dívida à autoridade tributária e o valor dos respetivos créditos.
Neste contexto, o plano de revitalização não acautela os interesses da Segurança Social.
Delibera-se o seguinte: 1. A Segurança Social vota contra o plano de revitalização apresentado.
-
Caso o plano de revitalização seja aprovado e homologado, o mandatário da segurança social deve interpor recurso da sentença de homologação, requerendo a declaração de ineficácia do plano face à segurança social uma vez que este credor não deu o seu consentimento expresso à modificação e redução dos seus créditos, situação que viola a legislação específica da segurança social, bem como a legislação tributária, designadamente o artigo 30º da Lei Geral Tributária, que refere que os créditos da segurança social são indisponíveis.” 5. O plano de revitalização apresenta o seguinte plano de reembolso dos credores do Estado, que aqui se reproduz na parte com interesse para a questão objeto de recurso: “Instituto de Segurança Social a. A dívida à Segurança Social reconhecida no presente PER será regularizada através de plano prestacional a autorizar em 40 prestações mensais e sucessivas, no âmbito da execução fiscal; b. O pagamento da 1ª prestação deverá ocorrer no mês seguinte ao da homologação do Acordo de pagamento; (…) Autoridade Tributária A dívida será enquadrada nos termos dos ns. 2 e 3 do art. 30º e nº3 do art. 36ºda LGT e arts. 196º e 199º do CPPT, e irá receber os seus créditos, isto é, a quantia exequenda, custas e juros de mora, em regime prestacional, o que, de acordo com o regime legal aplicável aos créditos tributários a regularização dos mesmos deve obedecer, cumulativamente: Pagamento em regime prestacional, nos termos do artigo 196º do CPPT, ou seja: a) As prestações mensais, iguais e sucessivas, vencendo-se a 1º até ao final do mês seguinte ao terminus do prazo previsto no nº5 do artigo 17º-D do CIRE; b) Número máximo de prestações: 40 prestações mensais, não podendo nenhuma delas ser inferir a 10 unidades de conta (atualmente € 1020); (…)”.
-
À Autoridade Tributária foi reconhecido um crédito de impostos no valor de 41.954,57 €, e ao ISS., IP, um crédito no valor de 13.555,98 €.
* 1. Se deve ser decretada a ineficácia do plano relativamente ao Instituto de Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de ....
O tribunal a quo veio a proferir despacho de homologação do plano aprovado pelos credores, nos seguintes termos, que aqui se reproduzem: “ (…) No tocante ao conteúdo material do plano, há que concluir que se entende que a Processo Especial de Revitalização (CIRE) proposta é lícita, adequada e equilibrada, não beneficiando injustificadamente qualquer credor.
Quanto aos créditos titulados pela Autoridade Tributária e Aduaneira e pelo Instituto da Segurança Social, I.P., o tratamento dispensado pelo acordo de pagamento em análise justifica-se pelo interesse público inerente aos referidos créditos, pela especial natureza destes créditos e ainda pelo princípio geral da indisponibilidade dos créditos fiscais e para-fiscais (art. 30.º, n.º 2 da Lei Geral Tributária).
Assim, não ocorre violação não negligenciável de normas procedimentais ou aplicáveis ao conteúdo do plano que impeça a sua homologação, não prevendo o plano quaisquer condições suspensivas ou quaisquer actos ou medidas que devam preceder a respectiva homologação e execução (arts. 17.º-F, n.º 7, e...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO