Acórdão nº 940/19.3T8VIS-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução05 de Abril de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Na execução para pagamento de quantia certa movida por N..., S. A., contra AA, e outros, instaurada a 18.02.2019, suscitada pela Agente de Execução (AE) a questão relativa ao levantamento da penhora que incide sobre o prédio adjudicado à interessada BB, ex-cônjuge do executado AA, a Mm.ª Juíza a quo proferiu o seguinte despacho (a 17.11.2021): «Ressalvando sempre melhor juízo, entendemos que assiste razão à exequente.

De acordo com o disposto no artigo 740º, n.º 2 parte final do CPC a penhora permanece até à nova apreensão dos bens do executado, ou seja, a garantia do exequente mantém-se até que possa ser substituída por outros bens que tenham cabido ao executado nessa partilha.

Ora, de acordo com a certidão judicial junta aos autos, o executado celebrou um acordo de partilha com a sua ex-cônjuge do qual resulta ter aceite que todos os bens a partilhar lhe fossem adjudicados, nada tendo ficado consignado quanto às tornas a que teria direito.

Neste conspecto, e por maioria de razão, o acordo de partilha em questão, tendo subtraído da esfera patrimonial do executado todos os bens comuns, não poderá conduzir ao levantamento da penhora, tendo também em mente o que dispõe o artigo 819º do CC.

(...)» Inconformada, a referida BB apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - O acordo de partilha celebrado no âmbito do processo de inventário, pelo qual a recorrente ficou com os dois bens que constituíam o património conjugal, incluindo o imóvel aqui em causa, e assumiu todo o passivo que consistia nos empréstimos concedidos pelo credor reclamante e o valor das prestações dos empréstimos pagas desde a data do divórcio até à data da partilha, é apenas a formalização de um acordo verbal celebrado aquando do divórcio e que traduz a realidade desde essa data.

2ª - Os valores dos bens não foram impugnados pela exequente que tinha legitimidade para o fazer no âmbito do processo de inventário, dado que é interessada e tinha conhecimento de tal processo de inventário.

3ª - Tendo assumido o passivo, a recorrente assumiu dívidas de valor muito superior ao valor dos bens que lhe foram adjudicados, razão pela qual o citado executado, seu ex-cônjuge, não tinha direito a receber qualquer valor a título de tornas, pelo que, nada ficou consignado quanto a isso.

4ª - Quem tinha direito a tornas seria a recorrente, tendo delas prescindido.

5ª - É certo que o art.º 740º, n.º 2 do Código Processo Civil (CPC) que se, na partilha os bens penhorados não couberem ao executado, podem ser penhorados outros que lhe tenham cabido, permanecendo a anterior penhora até à nova apreensão. Sucede que já existe um bem do executado penhorado no âmbito dos presentes autos, mais concretamente o seu salário, pelo que não existe razão para se manter a penhora sobre o imóvel adjudicado à recorrente.

6ª - Acresce que a falta de apreensão de outros bens, a ocorrer, será por razões não imputáveis à ex-cônjuge do executado (recorrente), nem ao executado, na medida em que foi adjudicado àquela o imóvel penhorado, que também assumiu todo o passivo que é superior ao valor aos bens adjudicados e, como tal, o executado não tem direito a qualquer valor a título de tornas.

7ª - Não pode prosseguir a execução quanto ao imóvel em causa pois o que estabelece o art.º 740º, n.º 2 é que a penhora permanece até nova apreensão de outros bens, não determinando o prosseguimento da execução quanto ao imóvel já partilhado e adjudicado à ex-cônjuge do executado, pois o prédio já não pertence ao executado.

8ª - Se assim não fosse, a citação do ex-cônjuge do executado para requerer o inventário para partilha dos bens comuns de forma a salvaguardar a sua meação e o próprio processo de inventário não teriam razão de ser.

9ª - Como decidiu o Ac. da RP de 19/09/2002, “se os bens penhorados deixaram de ser bens comuns do casal e passaram a pertencer, em exclusivo, à mulher não podem responder por um crédito que a autora tem sobre o marido, uma vez que só este é executado no processo” (Proc.º 0231033, dgsi).

10ª - Pelo exposto, não terá sido feita a melhor e mais correta interpretação e aplicação ao caso das pertinentes disposições legais, nomeadamente dos art.ºs 740º, n.º 2 do CPC e 818º e 819º do Código Civil (CC).

Remata pedindo a revogação da decisão recorrida e o levantamento da penhora que incide sobre a fração autónoma, identificada pela letra ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... com o n.º ...72 e inscrita na matriz predial sob o art.º ...90.

Não houve resposta.

Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa conhecer e/ou reapreciar, apenas, se a penhora do imóvel deverá permanecer conforme prevê o n.º 2 do art.º 740º do CPC.

* II. 1. Para a decisão do recurso releva o que consta do relatório e o seguinte:[1] a) Em 10.01.2020/17.01.2020[2] foi penhorada nos autos a fração autónoma destinada a habitação, identificada pela letra ... ( ...), do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, sito na Urbanização ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... com o n.º ...28... e inscrita na matriz predial sob o art.º ...90....

b) Por carta registada de 20.12.2019, a AE notificou M... Unipessoal, Lda., na qualidade de entidade patronal do executado AA, para iniciar “os descontos sobre o vencimento daquele dentro dos limites legalmente previstos, no próximo processamento de salários”.

c) Em auto de penhora com data de 06.02.2020, e para pagamento da quantia exequenda de € 33 789,71 e despesas prováveis, fez-se constar a penhora do «vencimento auferido pelo executado (AA) na qualidade de funcionário da sociedade “M... Unipessoal, Lda.”, dentro dos limites legalmente previstos para pagamento da quantia exequenda, juros e demais encargos com o processo.» d) Desconhece-se a existência de “descontos sobre o vencimento do executado, à ordem dos presentes autos”.

[3] e) A recorrente foi citada na execução, por carta da AE de 11.02.2020, nos termos do art.º 740º do CPC, «tendo o prazo de...

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