Acórdão nº 1158/21.0T8GRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelTERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução22 de Novembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I - AA, intentou, em 31/8/2021, acção de processo comum, para deduzir pedido cível contra BB, pedindo a condenação deste a pagar-lhe: a) € 3640,00 a título de danos patrimoniais ou subsidiariamente, a título de enriquecimento sem causa; b) € 956,86 referente a tratamentos médicos, consultas médicas e deslocações a esses tratamentos; c) valor nunca inferior a € 3.000,00, a título de danos não patrimoniais; d) valor nunca inferior a € 5000,00, por lucros cessantes; e) juros vencidos desde 05/06/2019, data da apresentação da queixa crime, e vincendos, até efectivo e integral pagamento do presente pedido civil.

No essencial, fundamentou a sua pretensão na prática de um crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelo art.º 199º, nº 2 al. a), do Código Penal e de crime de extorsão, p. e p. pelo art.º 223º/1 do Código Penal, cometido pelo aqui R. e pelos quais foi condenado por sentença, transitada em julgado, proferida no âmbito do processo 147/19...., que correu termos no Juízo Central Criminal ...- J... , crimes dos quais resultaram para a A. danos, patrimoniais e não patrimoniais de que pretende aqui ser ressarcida/restituída e que a mesma quantificou em € 12.596,86. O R. contestou, além do mais, por excepção, invocando a excepção de caso julgado, uma vez que a A. alega factos que já foram apreciados em sede de julgamento no âmbito do referido processo crime. Mais invoca a excepção dilatória de incompetência do tribunal, em razão da matéria, por preterição do princípio da adesão obrigatória do pedido cível à acção penal, porquanto a A. não deduziu, oportunamente, pedido de indemnização civil, em sede de acção penal.

Exercendo o devido contraditório quanto às excepções invocadas, para o que aqui interessa, a A. sustentou a admissibilidade do pedido, com base nas al c) e d) do artigo 72º do CPP.

Fixado valor à causa - € 12.596,86 – entendeu o Exmo Juiz a quo dispensar a realização da audiência prévia, uma vez que as excepções invocadas pelo R. já haviam sido debatidas pelas partes nos articulados, bem como entendeu ser possível o conhecimento imediato do pedido, vindo a julgar procedente a excepção dilatória de incompetência do tribunal, em razão da matéria, por preterição do princípio da adesão obrigatória do pedido cível à acção penal, tendo, em consequência, absolvido o R. da presente instância.

II – Do assim decidido, apelou a A., que concluiu as respectivas alegações nos seguintes termos : 1º A autora propôs a presente acção pedindo que o Réu fosse condenado a pagar-lhe : a)-O valor de € 3.640,00 a título de danos patrimoniais ou subsidiariamente a título de enriquecimento sem causa b) O valor de € 956,86 referente a tratamentos médicos, consultas médicas e deslocações a esses tratamentos c)- Valor nunca inferior a € 3000,00 a título de danos não patrimoniais d)-Valor nunca inferior a € 5000,00 por lucros cessantes 2º Para tanto a autora alegou em síntese que: a)-Previamente à presente acção cível, correu termos contra o Réu, o comum colectivo nº 147/19...., em que a Autora se queixou ter entregue ao réu no inicio de 2019,em 22.03.2019, em 05.04.2019, em 18.04.2019, em 20.05.2019 os valores de € 2.000,00, €200,00,€70,00, €130,00, €200,00, num total de € 2600,00, para que este não divulgasse um vídeo e outros registos fotográficos do relacionamento sexual que Autor e Réu tinham mantido, vídeo e registo que este tinha captado sem autorização ou conhecimento daquela.

b)- Tinha ficado demonstrado no acórdão proferido no comum colectivo nº 147/19.... que -Em data não concretamente apurada, mas que se situou entre junho de 2018 e final de 2018/início de 2019, o arguido manteve relacionamento extraconjugal de natureza sexual com AA, a qual é casada com CC, desde há cerca de 15 anos, tendo consumado tais relações em locais como o escritório da AA, a residência do arguido, ou o veículo automóvel deste. - No âmbito desse relacionamento, em data não concretamente apurada, mas situada entre junho e outubro de 2018, o arguido convidou a AA a dirigir-se à respetiva residência, sita em Praça ..., ..., ..., a fim de manterem relacionamento de natureza sexual, o que aconteceu por vontade de ambos. - Nessas circunstâncias, sem conhecimento da AA, o arguido montou um aparelho gravador de vídeo num quarto dessa residência, possivelmente um telemóvel, ligando-o em modo de gravação e apontando-o para a cama de casal que ali se encontrava e, alguns momentos depois, após ter desligado a luz do quarto e dali se ter ausentado, regressou ao quarto na companhia daquela e levou para essa cama a AA, aí tendo aquela praticado coito oral, sendo certo que o arguido procedeu à gravação audiovisual de tal prática, à revelia, contra a vontade e com desconhecimento da AA. -Posteriormente, desde o início do ano de 2019 e até junho do mesmo ano, o arguido, via as mensagens enviadas por telemóveis com os ns.º ...81 e ...64 e, por vezes, fazendo-se passar pela sua companheira DD a fim de melhor ludibriar AA, passou a exigir à AA quantias de dinheiro, sob pena de, não as entregando, contra a mesma instaurar processo por falsificação de documentos e divulgar o referido vídeo e outros registos fotográficos de idêntico teor, até então desconhecidos por parte da AA, ao marido desta e à comunidade de ... em geral (cfr. fls. 57 a 73, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido). -Efetivamente, por essa via, em data não concretamente apurada mas situada no início do ano 2019, o arguido exigiu à AA a quantia de €2.000,00 (dois mil euros), para que não divulgasse, como prometera, o referido vídeo e os outros registos. -Nessa sequência, a AA, no intuito de evitar a divulgação do referido vídeo e demais registos, em data não concretamente apurada mas situada no início do ano de 2019, depositou a quantia de €2.000,00 (dois mil euros) na caixa de correio da residência do arguido, seguindo instruções do mesmo que se fazia fazer passar pela respetiva companheira DD, dinheiro que o arguido dali retirou, fazendo-o seu. -Posteriormente, em março de 2019, pela mesma via e com os mesmos argumentos, o arguido voltou a exigir à AA que lhe entregasse a quantia de €600,00 (seiscentos euros), igualmente para que não divulgasse o referido vídeo e outros registos da mesma índole que dizia dispor em seu poder, comprometendo-se, o arguido, a destruir tais registos quando a AA procedesse a tal pagamento. -O arguido e AA combinaram que esses €600,00 fossem pagos em três prestações de €200,00 cada uma, sendo certo que a primeira dessas tranches foi entregue pela AA ao arguido no dia 22.3.2019 e as seguintes seriam entregues em abril e maio de 2019. Nessa sequência, no dia 5.4.2019, entregou ainda a AA ao arguido a quantia de €70,00; no dia 18.4.2019 entregou a quantia de €130,00; bem como no dia 20.5.2019 entregou ao arguido a quantia de €200,00, quantias que o arguido fez suas, contudo não destruiu os mencionados vídeo e demais registos. - Ainda seguindo aquela mesma resolução, no dia 28 de maio de 2019, pelo mesmo meio e com idênticos argumentos, voltou o arguido a exigir à AA o pagamento de €1.200,00 (mil e duzentos euros), sob pena de, não o fazendo, divulgar o referido vídeo e fotografias da queixosa de teor pornográfico junto do respetivo marido, bem como de, contra aquela, instaurar um processo em Tribunal por falsificação de documentos. - A AA nunca chegou a entregar tal quantia de €1.200,00 ao arguido, tendo, ao invés, posto o seu marido ao corrente da situação a que se encontrava sujeita e feito a denúncia que deu origem aos presentes autos. - O arguido agiu consciente e livremente, com intenção concretizada de captar registos vídeo-fotográficos de AA enquanto a mesma consigo praticava atos sexuais, sem que para tal tivesse sido autorizado e contra a vontade daquela, bem sabendo ser a conduta que assumiu proibida e punível por lei penal. -O arguido agiu sempre consciente e livremente, arquitetando um plano com intenção de conseguir para si enriquecimento ilegítimo, tendo, para o efeito, constrangido AA, por meio das referidas ameaças, a efetuar disposições patrimoniais a favor do próprio arguido, com o consequente prejuízo para a queixosa.

c) Para além dos valores enumerados na alínea a) deste artigo a autora alegou que também tinha entregue ao Reu, a 10 e 23 de Julho de 2018, as quantias de € 100,00 e € 940,00, num total de € 1040,00 que este lhe exigiu alegando que tinha sofrido prejuízo, que não sofreu, por aquela ter remetido à companheiro deste uma fotocopia do seu Cartão de Cidadão , com o seu nome ai aposto, acusando-a de ter falsificado o documento, o que não corresponde a verdade, sabido que tais acusações sempre causariam a Autora prejuízo a nível pessoal e profissional, caso viessem a ser publicadas; esclareceu que esta materialidade não tinha sido objecto de qualquer queixa crime, nem mesmo no processo nº 147/19...., nem aí foi objecto de acusação.

d)- Nada dever ao Réu apesar de ter entregue todos as valores enumerados nas alíneas que antecedem.

e)- Ter sofrido ao longo dos anos de 2018 a inicio de 2020, como consequência directa e necessária do comportamento do Réu, desmaios e crises de pânico, situação de stress, e angustia que a conduziram a ser assistida por diversas vezes em termos médicos na ..., Centro de saúde, Hospital ..., em consultas particulares e a obrigaram a compra e toma de medicação.

f)-A perda de clientes em Dezembro de 2019, por no ano de 2018 e 2019 ter cometido erros de contabilidade, decorrentes da sua especial falta de concentração e fatiga acentuada provocadas de forma directa e necessária pelo comportamento do réu g)- Ter sido notificada da acusação deduzida no comum colectivo nº 147/19.... e para querendo ai deduzir acusação em 17 -09-2019 ( e não 17-08-2019 como por lapso ficou a constar da PI mas rectificado na resposta ) 3º Com a sua resposta à contestação, a autora juntou a acusação pública deduzida no processo nº 147/19.... (...

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