Acórdão nº 3276/20.3T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelTERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução12 de Julho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I - Banco 1..., S.A., intentou contra AA e BB, a presente providência cautelar, sem audiência prévia dos Requeridos e com pedido de antecipação do juízo sobre a causa principal.

Pede que seja ordenada a entrega judicial a seu favor de dois imóveis locados, ao abrigo do art 21º do Decreto-Lei nº 149/95, de 24 de Junho, com as alterações introduzidas pelos Decreto-Lei nº 265/97, de 2 de Outubro, Decreto-Lei nº 285/2001, de 3 de Novembro e Decreto-Lei nº 30/2008, de 25 de Fevereiro, que aprovou o Regime Jurídico do Contrato de Locação Financeira, alegando que os Requeridos deixaram de pagar rendas vencidas, e que, em consequência desse incumprimento, procedeu à resolução do contrato mediante carta registada com aviso de recepção, ao abrigo da clausula 14ª, tendo-os interpelado a procederem à restituição imediata dos imóveis em causa, o que não veio a suceder.

Inquirida a testemunha arrolada pela Requerente foi proferida decisão, na qual foi julgado procedente o procedimento cautelar e se decretou a providência requerida, ordenando-se, em consequência, a imediata entrega dos imóveis identificados à Requerente, livres e devolutos de pessoas e bens.

II – Inconformados, apelaram os Requeridos, tendo concluído as respectivas alegações, nos seguintes termos: 1 – A Requerente intentou o procedimento cautelar de entrega judicial está previsto no art° 21° do Decreto-Lei n.° 149/95, de 24/06, cujo n.º 1, prescreve: “Se, findo o contrato por resolução ou pelo decurso do prazo sem ter sido exercido o direito de compra, o locatário não proceder à restituição do bem ao locador, pode este, após o pedido de cancelamento do registo da locação financeira, a efectuar por via electrónica sempre que as condições técnicas o permitam, requerer ao tribunal providência cautelar consistente na sua entrega imediata ao requerente”.

2 – O n.º 4 do preceito, prescreve, que “o Tribunal ordenará a providência requerida se a prova produzida revelar probabilidade séria da verificação dos requisitos referidos no nº 1, podendo, no entanto, exigir que o locador preste caução adequada”.

3 – São seus elementos constituintes: a) a cedência temporária de um bem adquirido ou construído por indicação do locatário; b) a opção de compra, findo o período do contrato, mediante o pagamento de um valor previamente definido ou, ao menos, determinável de acordo com critérios pré-fixados (Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, IV Vol., pág. 302).

4 - Operada validamente a resolução, produzem-se os seus efeitos, o contrato tem-se por resolvido por incumprimento das obrigações assumidas pelo locatário e se este não restituir o bem, reunidos estão os pressupostos legais estabelecidos na lei para o decretamento da providência cautelar, nos termos do art. 21°, n.º 1, do D.L. n.º 149/95, de 24/06.

5 - A partir do momento em que seja ordenada e executada a providência, o bem passa para a esfera de actuação prático-jurídica do locador, o qual pode dispor dele livremente.

6 - Temos que são então, requisitos deste procedimento cautelar: a) que o contrato de locação financeira se tenha extinguido por resolução ou decurso do prazo (caducidade) sem que tenha sido exercido pelo locatário o direito de compra; b) que o locatário não tenha procedido à restituição do bem ao locador (Vide, entre outros, Ac. S.T.J. de 01/07/1999, in www.dgsi.pt).

7 - O contrato de locação financeira, pode ser resolvido de acordo com o regime geral, com exclusão das normas especiais relativas ao contrato de locação, cfr. artº 17º do D.L. n.º 149/95, revogados que foi o regime especial pelo D.L, n.º 285/2001 de 13 /11.

8 - E no regime geral das obrigações, fora dos casos acima referidos, a mora só se converte em incumprimento, quando ocorre perda do interesse do credor na prestação, ou não realização da prestação dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor ao devedor através da interpelação admonitória, conforme resulta do art. 808º do Código Civil.

9 - Verificado o incumprimento definitivo, se a obrigação tiver por fonte um contrato bilateral, o credor, independentemente do direito à indemnização, pode resolver o contrato e, se já tiver realizado a sua prestação, exigir a restituição por inteiro, conforme resulta do artº 801º, n.º 2 do Código Civil.

10 - Mas a Requerente, apenas alega genericamente, sem, portanto, concretizar os seus termos “(...) e não obstante as interpelações realizadas, pela requerente, os requeridos deixaram de proceder ao pagamento (...)” 11 - Tal como ensina João Baptista Machado In “Obra Dispersa”, Vol. I, Scientia Iuridica, Braga, 1991, pág. 164. “A interpelação admonitória com fixação de prazo peremptório para o cumprimento a que se refere a segunda parte do n.º 1 do art.º 808º é, pois, uma intimação formal dirigida ao devedor moroso para que cumpra a sua obrigação dentro de certo prazo determinado, sob pena de se considerar o seu não cumprimento como definitivo”.

12 - Pelo que na expressão de Antunes Varela, In R.L.J, 128º, 138, constiuti “uma ponte obrigatória de passagem para o não cumprimento (definitivo) da obrigação.

13 - E “deve conter três elementos: a) a intimação para o cumprimento; b) a fixação de um termo peremptório para o cumprimento, c) admonição ou a cominação (declaração admonitória) de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida se não se verificar o cumprimento dentro daquele prazo.

14 - Também o Ac. do STJ de 13-12-2007, decidiu: “a declaração da ré constante da interpelação admonitória escrita enviada ao autor no sentido de que se este não cumprisse o contrato (promessa) se consideraria este definitivamente incumprido com as legais consequências, designadamente, de a ré fazer sua a quantia entregue, não pode, sem mais, ser considerada como manifestação de vontade de resolver o contrato em causa.”.

15 - Por outro lado, a interpelação admonitória como declaração receptícia que é torna-se eficaz – e, portanto, definitiva e irrevogável – a partir do momento em que chega ao poder do devedor ou é dele conhecida, nos termos do art.º 224º, do Código Civil.

16 - Como resulta dos Autos, não resulta, (passa-se a redundância), provado ou mesmo alegado concretamente a realização da interpelação admonitória – apenas aa declaração de resolução.

17 - Pelo que falece o fundamento normativo à emitida declaração resolutiva, que aquando da sua emissão, resulta ilícita.

18 - E, consequentemente, não operou a extinção da relação contratual, nessa invocada via de resolução, porque inexistiu peremptória...

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