Acórdão nº 3620/21.6T8LRA-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução28 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

3620/21.6T8LRA-C.C1 Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Coimbra: I - Relatório P... Unipessoal, Lda.

foi declarada insolvente por sentença transitada em julgado, tendo sido aberto concurso de credores, pelo prazo de 30 dias.

Findo o prazo para as reclamações, a Srª Administradora da Insolvência juntou aos autos a lista de credores reconhecidos. Mostram-se apreendidos para a massa insolvente os seguintes bens: - móveis; - 660 ações nominativas representativas do capital social da ...; - 1050 ações nominativas representativas do capital social da ...; - saldo bancário no valor de €381,30; A M..., SA veio impugnar a lista de credores, alegando que o seu crédito ascendia a e € 3.238,84.

O Município da ... veio impugnar a lista de credores, alegando que o seu crédito ascendia ao valor de € 465,92, acrescido de juros moratórios de € 4,48.

Notificada, a Srº Fiduciária veio reconhecer ambos os créditos.

Foi proferida sentença, cujo dispositivo é o seguinte: “1) Reconhecer os créditos constantes da lista de créditos reconhecidos elaborada pelo Srº Administrador de insolvência.

2) – Julgar procedente as impugnações e, consequentemente, reconhecer à M..., SA no valor de € 3.238,84 e ao Município da ... um crédito no valor de € 465,92, acrescido de juros moratórios de € 4,48.

3) - Graduar os créditos pela seguinte forma: 1) – Pelo produto dos bens móveis e depósito bancário: A) - As dívidas da massa insolvente saem precípuas do produto da venda do bem (art. 172º, nº 1 e 2).

  1. Do remanescente do produto da venda, dar-se-á pagamento: 1º- Crédito reclamado pela trabalhadora constante da lista referido aí com o nº 4) que beneficia de privilégio mobiliário geral; 2º- Crédito reclamado pelo Ministério Público, em representação da Autoridade Tributária e Aduaneira, relativamente a créditos IRS, IRC e IVA no montante de no montante de €11.700,68 e crédito da Segurança Social no montante de €17.875,43 que beneficiam de privilégio mobiliário geral; 3º- Os restantes créditos reconhecidos, que têm natureza comum, a pagar rateadamente, se necessário; 4º- Os créditos subordinados.

    * 1) – Pelo produto da venda das ações: A) - As dívidas da massa insolvente saem precípuas do produto da venda do bem (art. 172º, nº 1 e 2).

  2. Do remanescente do produto da venda, dar-se-á pagamento: 1º- Crédito reclamado pela Segurança Social no montante de €17. 875,43 que beneficia de privilégio mobiliário geral; 2º- Crédito reclamado pela G..., SA que beneficia de penhor; 3º- Crédito reclamado pela trabalhadora constante da lista referido aí com o nº 4) que beneficia de privilégio mobiliário geral; 4º- Crédito reclamado pelo Ministério Público, em representação da Autoridade Tributária, relativo a IRS,IRC e IVA que beneficia de privilégio mobiliário geral; 5º- Os restantes créditos reconhecidos, que têm natureza comum, a pagar rateadamente, se necessário; 6º- Os créditos subordinados. “ A credora G..., S.A.

    , não se conformou com a graduação efetuada, relativamente ao produto da venda das ações e interpôs o presente recurso de apelação, tendo concluído as suas alegações da seguinte forma: A. O crédito da ora Recorrente beneficia e foi reconhecido como crédito garantido por penhor sobre 1710 ações representativas do respetivo capital.

  3. O penhor é uma garantia real que confere ao credor o direito à satisfação do seu crédito, bem como dos juros, se os houver, com preferência sobre os demais credores, pelo valor de certa coisa móvel, ou pelo valor de créditos ou outros direitos não suscetíveis de hipoteca, pertencentes ao devedor ou a terceiro (art. 666.º, n.º 1 do CC).

  4. Constituindo-se o penhor de valores mobiliários pelo registo na conta do titular dos valores mobiliários, com indicação da quantidade de valores mobiliários dados em penhor, da obrigação garantida e da identificação do beneficiário (art. 81.º, n.º 1 do Código dos Valores Mobiliários).

  5. No que à graduação de créditos concerne, o penhor, se constituído validamente, como in casu, e enquanto garantia real, é oponível erga omnes, preferindo aos privilégios mobiliários gerais – artigo 749.º do Código Civil.

  6. Por conseguinte, os créditos com aqueles privilégios não podem ser, quanto aos bens empenhados, graduados antes do crédito pignoratício, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 666.º, 749.º e 822.º, todos do Código Civil.

  7. Os privilégios gerais, não constituindo verdadeiros direitos reais de garantia (de gozo, de aquisição ou de preferência) sobre coisa certa e determinada, devem ceder perante os direitos reais de garantia de terceiros, individualizados sobre bens concretos.

  8. Esta conclusão infere-se da norma estabelecida no n.º 1, do artigo 749.º do Código Civil, segundo a qual o privilégio geral não vale contra terceiros sempre que estes terceiros sejam titulares de direitos que sejam oponíveis ao exequente.

  9. Ora, são oponíveis ao exequente, nos termos do já referido artigo 822.º do Código Civil, os direitos de garantia real anteriores à penhora, como é o caso do penhor ou da hipoteca.

    I. No caso, o crédito garantido por penhor sobre direitos confere ao credor o direito à satisfação do seu crédito e juros com preferência sobre os demais credores – arts. 666º, nº 1, e 679.º do CCivil - que não gozam de privilégio especial ou de prioridade de registo, nos termos do art. 686.º, n.º 1, do C.Civil, como sucede com os créditos laborais que, não gozando de privilégio mobiliário especial, mas tão só de privilégio mobiliário geral, devem ser graduados depois daquele (arts. 666º, nº 1, 749º, nº 1 do CC e 333º, nº 1, al. a) do CT).

  10. No concurso entre o direito de crédito garantido pelo direito de penhor e o direito de crédito da titularidade de instituições da Segurança Social garantido por privilégio mobiliário geral, atualmente, e após bastante discussão na doutrina e jurisprudência, tem-se vindo a entender que deve graduar-se em primeiro o direito de crédito garantido pelo direito de penhor.

  11. Para tal foi relevante o acórdão do Tribunal Constitucional nº 363/02, de 17.9.2002, onde se decidiu, com força obrigatória geral, serem, por violação do princípio da confiança ínsito no princípio do Estado de Direito democrático consagrado no art. 2º da Constituição, inconstitucionais as normas contidas nos art. 2º do Decreto-lei nº 512/76, de 3 de Julho, e 11º do Decreto-lei nº 103/80, de 9 de Maio, na interpretação segundo a qual o privilégio imobiliário geral neles conferido prefere à hipoteca, nos termos do art.º 751º do Código Civil. (disponível em www.dgsi.pt) L. E indo de encontro à análise efetuada no recentíssimo Acórdão da 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa de 6 de Setembro de 2021, proferido no processo 638/20.0T8SNTA.L1, entendemos que tal interpretação deve ser feita também relativamente ao penhor, acolhendo-se a posição que assim o gradua em primeiro lugar uma vez que tais fundamentos “(…)têm suporte legal e melhor se conjugam com o sistema de prioridades de pagamento que o Código Civil consagra. A verdade é que, não se menosprezando a importância fundamental das contribuições para a sustentabilidade da Segurança Social, e sem minimizar o interesse público por ela prosseguido, o certo é que o...

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