Acórdão nº 1312/18.2T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução28 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM OS JUIZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

AA, instaurou contra BB, CC, DD, e EE, ação declarativa, de condenação, com processo comum.

Pediu que: i. o R. BB seja condenado a indemniza-la no montante de 41.600,00€ correspondente ao valor de rendas vencidas entre 20/06/2012 e 28/10/2016, acrescido de juros de mora vincendos desde a data da citação até efetivo e integral pagamento; ii. Os R.BB e DD sejam condenados, solidariamente, a indemniza-la no montante de 13.600,00 €, correspondente ao valor de rendas desde 28/10/2016 até à presente data, quantia esta acrescida de juros de mora vincendos desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.

Para tanto, alegou: . a . Ser proprietária do prédio urbano n.º ...56 da matriz da freguesia ... registado com o n.º ...36 na conservatória do registo predial ; . b . Ter sido casada com o 1.º Réu e, na constância do casamento, ter sido construída naquele prédio a casa de morada do casal; . c . Que desde 2012, na sequência da separação do casal, o 1.º Réu passou a viver na casa de morada do casal, esta que que lhe foi provisoriamente atribuída a 20 de junho de 2012 e, com o divórcio de 16 de janeiro de 2014, foi-lhe definitivamente atribuída; . d . Que o acordo firmado (e homologado) no processo de divórcio relativamente à casa de morada do casal foi anulado no processo 3783/15.....

. e . O primeiro Réu doou a sua parte da casa aos demais RR. e estes consentiram que aquele usasse a casa, o que impede a utilização pela A.

. f . Que a casa tem um valor locativo de 1.100,00€ o que, tendo em conta a respetiva quota no prédio, lhe permitiria auferir mensalmente a quantia de oitocentos euros, e que não recebe, sendo o Réus BB e DD que a vêm usando, este último desde que atingiu a maioridade; . g . O que, tendo em conta o número de meses decorrido desde que BB habita a casa e a data da maioridade do R. DD lhe confere direito às peticionadas quantias.

Contestaram os RR. BB e DD, pugnando pela improcedência da ação, alegando para o efeito: . a . A ocorrência de caso julgado porque no processo 3175/16.... Comarca ... – ... – Instância Local – Secção Cível – J..., a A. que julgou improcedente igual pretensão contra o R. BB pediu que o Réu BB fosse condenado a pagar-lhe a quantia mensal de 600 euros desde o dia 20/06/2012 até à propositura da acção, bem com a quantia de 600 euros por cada mês subsequente de utilização da casa morada de família, terrenos adjacentes e anexos que o aí réu - (aqui réu BB) continuasse a usufruir até efectivação da partilha dos bens comuns do extinto casal, nos quais se incluíam essa a casa morada de família, terreno adjacente e anexos; . b . A ocorrência de litispendência, porque na sequência da improcedência daquela ação, 3175/16.... e da decisão que anulou o acordo, foi instaurada, por apenso à ação de divórcio, ação para atribuição da casa de morada de família, essa que está a decorrer sob o número 84/12...., que corre termos no Juízo e Família e Menores – Juiz – Tribunal Judicial da Comarca ..., ação esta onde a A. pretendeu apenas que fosse fixada uma renda, que aí se irá decidir.

. c . A ilegitimidade da autora para, por si só, exercer os direitos relativos ao prédio, porquanto atento o regime de bens do casamento e a circunstância de o bem ser do casal, terão se der ambos a fazê-lo, nomeadamente em relação ao pedido feito contra DD.

No decurso do processo, veio a ser proferida decisão no processo nº 84/12...., já transitada em julgado.

  1. Prosseguiu o processo os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido: «1. Julgo procedente a arguida exceção do caso julgado e, em consequência, absolvo o Réu BB da instância; 2. Julgo verificada a exceção da nulidade do processo, decorrente da ineptidão da petição inicial, na parte remanescente e relativa ao Réu DD e em consequência, absolvo-o da instância.

  2. Condeno a Autora como litigante de má fé na multa de sete unidades de conta.» 3.

    Inconformada recorreu a autora.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1ª – A decisão pela qual o Tribunal a quo decidiu absolver os RR. dos pedidos, ao considerar verificadas as excepções de caso julgado e nulidade do processo (por ineptidão da petição inicial), e, consequentemente, condenar a A. como litigante de má fé, decorre duma incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 186º, 542º, 580º e 581º do Código de Processo Civil, e é, portanto, injusta e ilegal.

    1. – A recorrente formulou os pedidos de condenação do BB a indemnizá-la no montante de 41.600,00 €, correspondentes a rendas de 20.06.2012 a 28.10.2016, acrescidas de juros vincendos, e bem assim dos RR. BB e DD a indemnizá-la no montante de 13.600,00 €, correspondentes a rendas de 28.10.2016 até à propositura da acção, acrescidas de juros vincendos.

    2. – Fundou tais pedidos no facto de ser proprietária do prédio urbano inscrito sob a matriz predial urbana 1556 da freguesia ..., registada sob a ficha nº ...36 da referida freguesia na Conservatória do Registo Predial ..., no qual veio a ser edificada uma casa na constância do seu casamento com o BB, e de, tendo-se separado do BB em 2012, estar desde então privada da utilização de tal prédio urbano.

    3. – Alegou igualmente que, mostrando-se impedida de utilizar a referida casa, estava também impedida de utilizar o terreno adjacente e o anexo nele construído, atribuindo ao prédio na sua globalidade o valor locativo de 1.100,00 € mensais, sendo 600,00 € correspondentes à casa de habitação, 250,00 € ao anexo e 250,00 € ao logradouro, cabendo-lhe o direito a 800,00 € mensais, por ser proprietária exclusiva do logradouro e anexo.

    4. – Pelo Acórdão do Tribunal da Relação ... prolatado em 07 de Outubro de 2020 no âmbito do processo nº 84/12...., foi confirmada a decisão do Tribunal Judicial ... no sentido de declarar constituída uma relação contratual de arrendamento da casa de morada de família (passando o aqui R. BB a deter ali a qualidade de arrendatário) e atribuir-lhe o valor locativo de 225,00 €, e, consequentemente, à contrapartida devida à aqui recorrente o valor de 112,50 € mensais.

    5. – Do relatório de avaliação em que, no âmbito do processo nº 84/12...., se fundou a decisão de atribuir à casa de habitação o valor locativo de 225,00 €, resulta claro que apenas a casa de habitação foi considerada na avaliação, nunca se referido o logradouro e o armazém nele construído, dos quais, conforme alegado pela ora recorrente, é passível de ser extraído valor autónomo relativamente à casa.

    6. – O processo nº 84/12...., tramitado por apenso ao processo de divórcio da ora recorrente e do R. BB, apreciou e decidiu questões inerentes ao destino da casa de morada de família, mas a pretensão da recorrente nestes autos não se circunscreve à sua compensação pela utilização da casa de morada de família.

    7. – “A autoridade de caso julgado de uma sentença só existe na exacta correspondência com o seu conteúdo e daí que ela não possa impedir que em novo processo se discuta e dirima aquilo que ela mesmo não definiu.” (Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 12 de Dezembro de 2017, processo nº 3435/16.3T8VIS-A.C1, in www.dgsi.pt, destaque do subscritor) 9ª – Nos presentes autos inexiste tal correspondência, o que decorre, essencialmente, de não estar nestes autos em causa uma pretensão indemnizatória que possa subsumir-se apenas na renda que foi fixada no âmbito do processo nº 84/12.....

    8. – A configuração da causa de pedir nestes autos não é a que decorre da decisão proferida pelo Tribunal a quo, mas assenta, por outro lado, nas alegações da ora recorrente de que apenas a casa de morada de família pertence à comunhão conjugal e de que o logradouro existente e o anexo construídos no mesmo prédio urbano são propriedade da ora recorrente e têm valores locativos autónomos; 11ª – Estando a causa de pedir perfeitamente delimitada na petição inicial, não andou bem o Tribunal a quo ao restringi-la injustificadamente (de forma implícita), não se pronunciando quanto aos factos suprarreferidos.

    9. – “…a causa de pedir é “o acto ou facto jurídico (simples ou complexo, mas sempre concreto) donde emerge o direito que o Autor invoca e pretende fazer valer (art. 498.º, n.º 4)”; ou, com Antunes Varela, “(…) é o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido”, competindo ao Autor, ao invocar determinado direito, especificar a respectiva causa de pedir, ou seja, a fonte desse direito, os factos donde, no seu entendimento, procede tal direito, neles alicerçando, numa relação lógico-jurídica, o pedido deduzido.

      Por isso, exercendo a causa de pedir uma função individualizadora do objecto do processo, conformando-o, o tribunal tem de a considerar ao apreciar o pedido e não pode basear a sentença de mérito em causa de pedir não invocada pelo autor, sob pena de nulidade da sentença – artigos 660.º, n.º 2 e 668.º, n.º 1, alínea d), do CPC.” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07 de Maio de 2008, processo 07S4005, in www.dgsi.pt, destaque do subscritor) 13ª – Não podia o Tribunal a quo ter deixado de apreciar tais alegações (nos termos do artigo 608º do Código de Processo Civil), sob pena de nulidade da sentença, que assim se verifica, nos termos da alínea d) do nº1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, e aqui expressamente se argui (tornando indispensável a ampliação da matéria de facto, com a consequência prevista na alínea c) do nº2 do artigo 662º do Código de Processo Civil).

    10. – O Tribunal deve pronunciar-se sobre o mérito da quaestio petendi configurada pela ora recorrente, com a redução inerente a autoridade do caso julgado existente sobre o valor locativo da casa de morada de família: tem a recorrente direito a receber do R. a quantia mensal de 500,00 € pela utilização, pelos RR., do logradouro e do armazém? 15ª – Só através da resposta a tal questão se mostrará cumprida a norma violada pelo Tribunal a quo, o artigo 608º do Código de Processo Civil.

    11. – A petição inicial não é inepta.

    12. – A...

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