Acórdão nº 172/20.8T8VLF-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Junho de 2022
Magistrado Responsável | CRISTINA NEVES |
Data da Resolução | 14 de Junho de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação de COIMBRA: RELATÓRIO Intentada execução pela C...
contra AA, para pagamento da quantia de € 9751,16, constituindo o título executivo, livrança por si subscrita e avalizada pela executada BB e contrato de subscrição de cartão de crédito, veio o executado AA deduzir embargos, invocando: - o preenchimento abusivo da livrança exequenda, por parte da exequente; -a não junção do título que subjaz à livrança e respectivos documentos comprovativos da dívida; -a violação dos deveres de informação no que se reporta à conta cartão; * Notificada para contestar veio a embargada contestar impugnando o preenchimento abusivo, mas alegando que a livrança constitui título executivo, com independência da relação causal e que ao executado foram prestadas todas as informações referentes aos contratos celebrados com o banco.
* Mediante articulado autónomo veio o embargante invocar a inobservância do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) no que toca à conta cartão.
* Admitida a invocação desta exceção, por se tratar de questão de conhecimento oficioso, o embargado veio alegar que “O título executivo consubstanciado na livrança junta aos autos não se enquadra no contexto dos contratos subjagados ao regime do Dec. Lei 227/2012 porque o mutuário não se qualifica como consumidor.” e que “Por fim e sem prescindir, Sempre se dirá que o mutuário (o executado AA) foi integrado em PERSI, nomeadamente quanto ao cartão de crédito nº ...12, objecto também de execução nos autos principais”.
* Após, realizou-se audiência de discussão e julgamento, finda a qual foi proferida sentença que decidiu julgar a “presente oposição à execução mediante embargos de executado deduzida pelo Embargante AA parcialmente procedente e, em consequência: - Determina-se a prossecução da execução de que estes autos constituem um apenso, no que toca à livrança subscrita pelo executado AA, emitida em 2014/12/16 e com data de vencimento de 2020/02/21, no valor de 4.365,04€ (quatro mil trezentos e sessenta e cinco euros e quatro cêntimos) - Absolve-se AA da instância e determina-se a extinção da execução movida contra o mesmo, no que toca à conta cartão n.º ...12.” * Não se conformando com essa decisão, veio a embargada dela interpor recurso, concluindo da seguinte forma: “1ª- O artigo 3º, alínea h), do DL nº 227/2012, define o suporte duradouro como qualquer instrumento que permita armazenar informações durante um período de tempo adequado aos fins a que as informações se destinam e que possibilite a reprodução integral e inalterada das informações armazenadas.
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- Se a intenção do legislador fosse a de sujeitar as partes do procedimento extrajudicial de regularização das situações de incumprimento a comunicar através de carta registada com aviso de receção, tê-la-ia consagrado expressamente.
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- Não definindo a lei a necessidade da comunicação ser por carta registada com aviso de recepção, não compete à instituição de crédito o ónus de provar a recepção.
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- No âmbito do PERSI é admissível o envio da comunicação por correio simples e por meios electrónicos através de endereço de e-mail ou por via da adesão ao sistema on line a que o cliente bancário adere.
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- Não tendo sido impugnadas a carta datada de 14/04/2018 a mesma tem o condão de provar a sua existência e envio ao embargante, tanto mais que a embargada estava impossibilitada de sobre a mesma produzir prova testemunhal, por esta já ter sido produzida quando a mesma foi junta aos autos.
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- Deverá, assim, alterar-se a matéria de facto não provada constante da alínea e) dos factos para outra em que se dê como provado que “ Ponto 12 dos Factos Provados: “Pela missiva datada de 14.04.2018, a embargada comunicou ao embargante que havia procedido naquela data à integração no PERSI, nomeadamente quanto ao cartão de ...12 e que, para beneficiar dos direitos consignados no Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, deveria dirigir-se a uma agência da Embargada até ao dia 24.04.20118, foi expedida pelo Banco Embargado para a morada « Rua ...»”.
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- Deste quadro factual resulta inequívoco que se deu cumprimento ao disposto nos artºs 14º a 20º do Dec. Lei 227/12 de 25 de Outubro, devendo ser revogada a douta Sentença e deliberado que a execução deve prosseguir por inexistência de excepção de inexigibilidade da cobrança coerciva.
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- Entre outros, foram violados os artigos 14º, nº 4 e 18º, nº 1, alínea b) do DL 227/2012.
Nestes termos e mais de direito e com o sempre mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso de Apelação ser julgado procedente e, destarte, alterar-se a douta Sentença por outra que julgue não verificada a excepção de ausência de PERSI e determine seja proferida decisão de mérito sobre a causa de pedir e pedido dos embargos de executado.
Assim se fazendo inteira e sã JUSTIÇA.” * Por sua vez o embargante veio interpor contra-alegações, delas constando o seguinte: “A. Salvo melhor e douto entendimento, carece de razão a Recorrente, C....
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Pois, tal como é referido pelo Tribunal a quo, a Recorrente (Embargada) competia-lhe fazer prova, primeiro, da existência da declaração e, segundo, do envio desta e da sua recepção pelo embargante . Cfr. Ac. Trib. Rel. Évora de 16.12.2021 ( “A simples junção aos autos das cartas de comunicação e a alegação de que foram enviadas à executada, não constituem, por si só, prova do envio e recepção das mesmas pelo cliente bancário) e Ac. do Trib. Da Rel. Coimbra de 07.11.2017 ( “cabe ao credor dar conhecimento à contraparte da abertura e do encerramento do PERSI, impendendo sobre si o ónus da alegação e prova da respetiva notificação.
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Como muito bem sabe a Embargante (Instituição Bancária), com obrigação de saber, a prova da existência das missivas (forma da declaração) é uma coisa e, a prova do seu envio e da sua recepção pelos destinatários, é uma outra coisa. Cfr. Ac. Rel. Lisboa de 05.01.2021 e Ac. Rel. Évora de 11.02.2021.
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E, tal como refere o Tribunal a quo a Recorrente não deu cumprimento a esse ónus de alegação e prova, isto é, não fez prova, seja do envio da carta, seja, da sua recepção pelo Embargante.
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Esquece ainda a Embargada que foi produzida prova testemunhal nas duas audiências de discussão e julgamento, tendo as mesmas referido, em particular a testemunha CC, que tal notificação não ocorreu.
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Também não corresponde à verdade que o Embargado não tenha impugnado o documento, pois, o Embargante, no seu requerimento datado de 27.10.2021 com a referência ...03, impugna tal documento, quando declara que “ a exequente, para além de não o ter interpelado para cumprir (pagar), também não lhe deu conhecimento, e estava obrigada a fazê-lo (Cfr. artigo 21º, n.º 3 do DL 227/2012), de que, também nessa qualidade (de fiador) podia solicitar a sua integração no PERSI, bem como sobre as condições para o seu exercício. Logo, a exequente (C...), violou normas de caracter imperativo, que configuram, também, execpções dilatórias atípicas ou inominadas, por falta de pressuposto (antecedente) da instauração da acção. Cf. neste sentido, o citado Acórdão Tribunal da Relação...
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