Acórdão nº 2546/20.5T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelJOÃO MOREIRA DO CARMO
Data da Resolução25 de Outubro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. AA, residente em Porto ..., intentou contra Zurich Insurance Plc – Sucursal em Portugal, com sede em ..., acção declarativa de condenação, pedindo a condenação da ré no pagamento da indemnização de 75.000 €, acrescida de juros à taxa de 8% ano a calcular sobre a diferença entre o quantum atribuído em sede judicial e o valor de 10.000 € oferecido pela ré, calculados desde 1.10.2019, data da apresentação da proposta razoável ou, caso assim se não entenda, acrescida de juros calculados desde a citação.

    Invocou, para tanto, os prejuízos sofridos em resultado de acidente de viação ocorrido, a nível de dano biológico (a indemnizar em 40.000 €) e dano não patrimonial (a indemnizar em 35.000 €).

    Contestou a ré, reconhecendo a sua responsabilidade civil pelo pagamento de uma indemnização à ora autora, impugnando somente os danos invocados e respectivos valores peticionados por os considerar excessivos. * A final foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção, e, em consequência, condenou a R. a pagar à A. a quantia global de 75.000 €, sendo 40.000 € a título de danos patrimoniais e 35.000 € a título de danos morais. Mais condenou a R. a pagar à A. juros de mora à taxa de 8% ano a calcular sobre a diferença entre o quantum atribuído em sede judicial e o valor de 10.000 € oferecido pela R., calculados desde 1.10.2019 até integral pagamento da quantia ora fixada.

    * 2. A R. recorreu, concluindo que: 1ª. – Pelo presente Recurso de Apelação pretende a ora Recorrente impugnar a decisão relativa à matéria de facto nos termos do disposto no Artº. 640º. do Código de Processo Civil, sendo também o recurso extensivo à aplicação da matéria de direito; 2ª. – Salvo o devido respeito, entende a ora Recorrente que, na Sentença proferida, o Tribunal “a quo” não procedeu a uma correta apreciação da prova produzida, visto que determinados factos deveriam ter sido considerados não como provados e o cálculo indemnizatório não deveria ter considerado determinados fatores, os quais, no entendimento da ora Recorrente, não se verificaram; 3ª. – Em cumprimento do disposto no Artº. 640º. do Código de Processo Civil, a ora Recorrente efetuou a transcrição dos depoimentos das Testemunhas em sede de fundamentação do presente Recurso, sendo que não efetua a transcrição dos mesmos em sede das presentes Conclusões de Recurso, atenta a extensão daqueles; 4ª. – Nos presentes Autos discute-se a extensão dos danos resultantes de um sinistro rodoviário ocorrido no dia 23 de Abril de 2015, pelas 07h00m, na Rua ..., em Porto ..., e no qual esteve envolvido um veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula ..-..-LO, encontrando-se o mesmo, à data do acidente “sub judice”, segurado na ora Recorrente “Zurich – PLC”, através de contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, titulado pela Apólice nº. ...67; 5ª. – O condutor do veículo segurado na Zurich perdeu o controlo da viatura que tripulava, entrou em despiste, e embateu no corpo da Autora, AA, a qual se encontrava a aguardar a chegada do autocarro escolar, pelo que, em sede pré-contenciosa, a Zurich aceitou a culpa do condutor do veículo seu segurado na ocorrência do sinistro, tendo comunicado tal posição à Autora e à Mãe da mesma, e face a tal, a Autora foi seguida e tratada pelos serviços clínicos da Zurich, até à data em que lhe foi atribuída “alta clínica”; 6ª. – (… narrativa) 7ª. – A ora Recorrente não se conforma com a Sentença proferida pelo Tribunal “à quo”, na parte em que condenou a Zurich no pagamento das quantias de: a) 40.000,00 Euros a título de indemnização relativa a dano biológico na vertente patrimonial e dano futuro; b) 35.000,00 Euros a título de indemnização relativa a danos não patrimoniais.

    8ª. – Relativamente aos danos não patrimoniais, foram dados como provados, entre outros, os seguintes factos constantes da Sentença proferida pelo Tribunal “a quo”: “28. ….” 29. … (…) 44. …” 9ª. – Salvo o devido respeito, a Recorrente entende que a prova produzida deveria ter sido objeto de outra análise, tratamento e conclusão final, e, consequentemente não deveriam ter sido considerados como provados os supra transcritos factos.

    10ª. – No ponto 44 da matéria considerada como provada consta que, “em resultado do acidente”, a Autora sente-se desinteressada e incapaz de voltar a praticar as atividades extracurriculares que praticava antes do acidente (dança “hip-hop” e aulas de “violeta”, tal como fixado nos pontos 30 e 31 da matéria considerada como provada na Sentença proferida); 11ª. – O Tribunal “a quo” entendeu que os ferimentos sofridos pela Autora no acidente aqui discutido foram a única causa para a mesma ter deixado de praticar as atividades extracurriculares, sendo referido … no 44º. facto considerado como provado; 12ª. – A ora Recorrente entende que foi produzida prova Testemunhal na Audiência de Julgamento de que o facto de a Autora ter deixado de praticar tais atividades se deve a várias causas, a saber: - ferimentos ocorridos no acidente de viação aqui discutido; - localização da residência da Autora; - localização da escola onde eram ministradas as aulas de “hip-hop”; - localização do conservatório onde a Autora frequentava as aulas de “violeta”; - localização das escolas frequentadas pela Autora desde o oitavo ano, até ao ingresso na faculdade.

    13ª. – O acidente de viação “sub judice” ocorreu quando a Autora se encontrava a frequentar o oitavo ano de escolaridade, sendo que, na Audiência de Julgamento relativa aos presentes Autos foi inquirida a Testemunha BB (Mãe da Autora), e foi referido pela mesma que as aulas de dança “hip-hop” eram ministradas em ..., perto da escola que a Autora frequentou no oitavo e nono ano de escolaridade, e também que, quando a Autora ingressou no décimo ano de escolaridade, passou a frequentar uma escola sita em Porto ..., cidade onde residiam; 14ª. – Foi inquirido o irmão da Autora – CC – na Audiência de Julgamento, sendo que o mesmo referiu que as aulas de “violeta” eram também ministradas na cidade ...; 15ª. – Consta o seguinte do relatório pericial elaborado pelo Instituto de Medicina Legal e constante dos presentes Autos: “Não voltou a praticar hip-hop porque tal como não podia praticar educação física, não podia dançar “e depois saí da escola (o grupo de dança pertencia à escola) e nunca mais dancei” (Cfr. pág. 6 do relatório pericial, notificado às Partes em 01/09/2021 e ao qual foi atribuída a referência nº. 976 904 85 pelo sistema “Citius”) 16ª. – Foi a própria Autora que referiu ao Perito do INML que o grupo onde dançava pertencia à escola, e, posteriormente, saiu dessa escola, sendo que tal matéria consta do 46º. facto considerado como provado na Sentença proferida pelo Tribunal.

    17ª. – Verifica-se assim que o critério geográfico, quer relativo localização da residência da Autora (Porto ...), quer relativo à localização da escola onde a Autora frequentou o décimo ano de escolaridade (Porto ...) condicionou a frequência das aulas de “hip-hop” e de “violeta” (ministradas em ...).

    18ª. – Entende a ora Recorrente que os factos numerados com 28 e 44 da matéria considerada como provada, não o poderiam ter sido, uma vez que nestes consta a ocorrência do acidente “sub judice” como causa única para a Autora ter deixado de frequentar as aulas de dança e de “violeta”, quando, na verdade, e atenta a prova produzida, se verifica que para tal concorreram outros fatores e causas, tal como a localização do local de ensino escolar e a residência da Autora; 19ª. – Entendeu também o Tribunal “a quo” considerar como provado o facto numerado como 29, o qual se transcreve: “29. …” 20ª. – A ora Recorrente entende que não foi feita prova da última parte do mesmo, ou seja, de que a Autora, à data do acidente era uma pessoa “sociável”; 21ª. – Na Audiência de Julgamento, o irmão da Autora – CC – descreveu a mesma como sendo, uma pessoa tímida e envergonhada anteriormente à ocorrência do acidente de viação “sub judice”, pelo que, desta forma, não poderá ser considerado como provado que anteriormente ao acidente “sub judice”, a Autora era uma pessoa sociável, visto que tal é a antítese de uma pessoa “tímida” e “envergonhada”; 22ª. – Entende a ora Recorrente que não poderá ser considerada como provada a matéria constante do facto numerado como 17, ou seja, o teor de um documento de cariz clínico junto pela Autora com a Petição Inicial; 23ª. – Tratando-se de um documento particular, a Ré Zurich impugnou o mesmo em sede de Contestação, sendo que, posteriormente, o Autor de tal documento não foi inquirido em sede de Audiência de Julgamento, pelo que não foi não foi produzida qualquer prova que permitisse confirmar o teor do mesmo; 24ª. – Ocorreu um lapso de escrita na redação do 2ª. facto considerado como provado na Sentença proferida, constando do mesmo que a matrícula do veículo segurado na Zurich é “84-46-20”; 25ª. – A matrícula do veículo é “..-..-LO”, tal como consta da Apólice de Seguro, junta à Contestação como Doc. nº. 1, pelo que se requer a correção da redação de tal facto considerado como provado; 26ª. – Na fundamentação da Sentença é referido que a Autora foi atropelada por um veículo pesado de passageiros, sendo que nos factos considerados com provados não consta a categoria do veículo.

    27ª. – Em termos de danos não patrimoniais, verifica-se que a Autora alega que ficou traumatizada com a ocorrência do sinistro, tendo sido considerado como provado que: “45. …” 28ª. – A tipologia e categoria do veículo atropelante é um fator a considerar quando tais danos são alegados (“medo e terror psicológico”), e, pela leitura da fundamentação da Sentença, verifica-se que o Tribunal entendeu que a categoria do veículo constituiu um facto que agravou os contornos do acidente “sub judice” neste domínio; 29ª. – Em termos memórias traumatizantes relacionadas com a ocorrência de um sinistro, será menos grave aquela em que se visualiza um veículo ligeiro – e consequentemente, de menores dimensões – em rota de colisão, do que a mesma...

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