Acórdão nº 216/19.6T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelFALCÃO DE MAGALHÃES
Data da Resolução25 de Outubro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra1:*I - A) - 1) – AA, instaurou, em 18/1/2019 (tendo a petição aperfeiçoada entrado em juízo em 29/1/2019), a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra a ré, BB, pedindo a condenação desta na demolição das inovações por si introduzidas no imóvel e na reposição deste no estado em que se encontrava, custeando tais trabalhos, para o que, em síntese, alegou: -Que o imóvel se destina à habitação e é pertença dos dois, em compropriedade, já que, tendo vivido em união de facto, foi adquirido por ambos que aí viveram, só lhe tendo sido possível, recentemente - pois que depois de ter de lá saído nunca teve acesso ao imóvel -, constatar as obras e as alterações que nele foram feitas sem o seu consentimento ou conhecimento, quando, recentemente, a ele teve acesso, por força do decidido numa providência cautelar que intentou contra a ora Ré; - Que tais obras, que não revestem o carácter de urgentes, nem se podem ter como benfeitorias, foram feitas sem sua necessária autorização, enquanto comproprietário do imóvel em causa, sendo que também não foram licenciadas nem o podem ser, face à disposições legais em vigor.

2) - A ré contestou, impugnando parcialmente os factos descritos na petição inicial e alegando, em síntese, que: - O Autor não teve o acesso vedado ao imóvel, porque, por sentença já transitada em julgado a 13/11/2013, proferida no âmbito do Processo Comum Singular Nº. 496/12.8GCLRA, foi condenado, entre o mais: a) «pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artº. 152, nº. 1, al. b), e nº. 2 do Código Penal, na pena de dois anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com sujeição a regime de prova, nos termos supra descritos, ao abrigo do disposto nos artigos 50º, 53º e 54º todos do Cód. Penal»; b) «na pena acessória de proibição de contactos com a ofendida BB durante o período de dois anos, incluindo o afastamento da residência onde esta habita, actualmente sita na Rua ..., ..., ..., ..., nos termos do artº. 152, nºs. 4 e 5, do Cód. Penal»; - Por outro lado, a Ré e o seu agregado familiar, composto pelos seus três filhos CC (nascido a .../.../2004), DD (nascido a .../.../1999) e EE (nascido a .../.../2002), habitam, de forma contínua e ininterrupta, a fracção autónoma identificada no artigo 2º da p.i. desde, pelo menos, 23/04/2004; - Sendo que, as obras que efetuou, para além de aumentarem o valor do imóvel, tiveram por fim evitar a deterioração deste, e satisfazer as necessidades da ré e do seu agregado familiar, sendo facilmente removíveis; - No andar existente acima da cave, a colocação de uma parede em «pladur», designadamente, destinou- a criar dois quartos para os seus filhos DD e EE, actualmente com 19 e 16 anos de idade, respectivamente, que, anteriormente, partilhavam um quarto; - Em algumas nalgumas zonas da cave, mandou erigir paredes de «pladur», que, para além de serem facilmente removíveis, foram levadas a efeito pela Ré para obter melhor aproveitamento do espaço existente para arrumações e para fazer face às efectivas necessidades do seu agregado familiar; - Acresce que, corre termos, pelo Juiz 2 do Juízo de Família e Menores ..., Acção de Atribuição de Casa de Morada de Família Nº. 2326/18...., em que é Autora a aqui Ré e Réu o aqui Autor.

Pugnou pela improcedência da acção.

3) – No âmbito da audiência prévia de 26/4/2021, foi definido o objecto do processo e elencados os temas de prova, tendo sido junta pela Ré cópia da sentença já proferida nos autos de atribuição de casa de morada de família referidos na contestação.

À acção foi fixado o valor de 15.000,01 €.

4) – Por requerimento da Ré, de 5/5/2021, foi junta certidão da sentença proferida em 13-10-2020 nos referidos autos de Atribuição da Casa de Morada da Família nºs 2326/18...., em que é Requerente BB, sendo Requerido AA, sentença essa transitada em julgado em 18/11/2020.

5) – Nas diligências de prova que precederam a audiência final, procedeu-se à peritagem do imóvel em causa, respeitando, essencialmente, as obras que nele foram efectuadas pela Ré;*B) – Tendo a audiência final ocorrido em 10/2/2022, veio a ser proferida sentença, em 19/2/2022, consignando-se, na respectiva parte dispositiva, o seguinte: «[…] julga-se a ação parcialmente procedente e, em consequência:

  1. Condena-se a ré a retirar as paredes de gesso cartonado (pladur) que construiu no interior da fração autónoma do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., ..., descrita sob o n.º ...20..., da freguesia ..., repondo os respetivos compartimentos no estado em que se encontravam (sem a colocação dessas paredes).

  2. Absolve-se a ré do restante pedido.

    Custas processuais pelo autor e pela ré, na proporção dos respetivos decaimentos, que se fixam em metade para cada uma das partes, sem prejuízo da proteção jurídica de que beneficiam. […]».

    *II - Inconformada com o decidido, na parte que lhe foi desfavorável, apelou a Ré para este Tribunal da Relação, terminando a sua alegação recursiva com as seguintes conclusões: «1) Em conformidade com a prova testemunhal produzida, deveriam constar dos Factos Provados a matéria de facto alegada pela Ré nos artigos 11º, 15º e 18º da Contestação.

    2) A Ré, em tais artigos da sua Contestação, alega factos (essenciais), os quais apresentam natureza impeditiva e/ou extintiva do direito do Autor e são, por isso, conducentes à improcedência da acção.

    3) No que respeita à matéria de facto constante no artigo 11º da Contestação, foi referido quer pela testemunha DD (depoimento prestado no dia 10/02/2022 e gravado no sistema Habilus Media Studio das 10:18:36 até às 10:51:37 horas), quer pela testemunha FF (depoimento prestado no dia 10/02/2022 e gravado no sistema Habilus Media Studio das 11:05:48 até às 11:19:33 horas), que desde que Autor e Ré adquiriram a fracção autónoma melhor identificada na Alínea A) dos Factos Provados, em 2004, que esta, juntamente com os seus três filhos, habitam tal imóvel, situação que se mantém até aos dias de hoje.

    4) Os depoimentos destas testemunhas nesta parte encontram-se, também, corroborados pelo teor do documento 1 junto com a p. i., assim como pelo teor da certidão judicial junta aos autos pela Ré a 05/05/2021.

    5) Deve ser ADITADA aos FACTOS PROVADOS a seguinte matéria: - “a Ré e o seu agregado familiar, composto pelos seus três filhos CC (nascido a .../.../2004), DD (nascido a .../.../1999) e EE (nascido a .../.../2002), habitam, de forma contínua e ininterrupta, a fracção autónoma identificada na Alínea A) dos Factos Provados desde, pelo menos, 2004.” 6) No que respeita à matéria de facto do artigo 15º da Contestação, as testemunhas DD (depoimento prestado no dia 10/02/2022 e gravado no sistema Habilus Media Studio das 10:18:36 até às 10:51:37 horas) e FF (depoimento prestado no dia 10/02/2022 e gravado no sistema Habilus Media Studio das 11:05:48 até às 11:19:33 horas), ouvidas em julgamento, declararam ambas que, com as duas divisórias feitas na garagem, a Ré pretendeu criar um espaço de arrumação autónomo para o cilindro e para as máquinas de lavar e de secar roupa (lavandaria) e um outro espaço onde pudesse colocar/arrumar os bens que, anteriormente, estavam dispersos na garagem, junto ao veículo automóvel.

    7) Mais referiram que a Ré teve necessidade de subdividir em dois o espaço que, até então, consistia no quarto dos seus dois filhos mais velhos, para que os mesmos tivessem mais privacidade e pudessem estudar.

    8) Deve ser ADITADA aos FACTOS PROVADOS a seguinte matéria: - “As obras referidas em C) e H) dos Factos Provados foram levadas a efeito pela Ré para obter melhor aproveitamento do espaço existente para arrumações e para fazer face às efectivas necessidades do seu agregado familiar, designadamente ao nível de banhos, lavagem e secagem de roupa, privacidade dos membros da sua família e criação de zonas de descanso e estudo para estes.” 9) Relativamente à matéria de facto constante do artigo 18º da Contestação, o mesmo devia ter sido dado como provado, em face da resposta dada pelo Sr. Perito ao Quesito 4.

    10) Tendo em conta o resultado da perícia nesta parte e, bem assim, as regras de experiência comum, deveria o Tribunal a quo ter dado como PROVADO que: - “As alterações efectuadas pela Ré e descritas na alínea C) e H) dos Factos Provados são facilmente levantadas/removíveis, sem prejuízo para a coisa.”; razão pela qual deve tal matéria ser também ADITADA aos Factos Provados.

    11) As paredes mencionadas nas Alíneas C) e H) dos Factos Provados (tal como sucede com a instalação de máquinas de lavagem/secagem de roupa, de um termoacumulador, de um lavatório e de cadeiras de cabeleireiro e assim foi considerado pelo Tribunal de Primeira Instância) estão ligadas ao imóvel de forma precária e podem facilmente ser removidas, pelo que integram o conceito de bens móveis – Cfr. Relatório Pericial - resposta do Perito ao Quesito 4 (Artigos 203º, 204º, nº. 3 e 205º, nº. 1 todos do Código Civil).

    12) As paredes de «pladur» mencionadas nas Alíneas C) e H) dos Factos Provados, não integram o conceito de edificação previsto no DL 555/99 de 16/12.

    13) Não constituindo a aplicação de paredes de pladur “obra” ou “edificação”, na medida em que as mesmas são facilmente removíveis, estando afixadas ao imóvel de forma precária/sem carácter de permanência, não deve a Ré ser condenada a remover as mesmas, pelo menos enquanto estiver a habitar o imóvel em causa.

    14) Atenta a prova produzida em julgamento, a colocação de tais paredes de gesso cartonado não serviu apenas para recreio da Ré, destinando-se, antes, a fazer face às necessidades do seu agregado familiar.

    15) Constitui acto de administração ordinária aquele destinado a atender às necessidades quer do titular, quer da sua família.

    16) Como resulta da alínea B) dos Factos Provados, à Ré foi, posteriormente à instauração da presente acção, conferido o direito de uso e habitação da fracção ...) dos Factos Provados (casa de morada de...

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