Acórdão nº 2/20.0T8MMV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelALBERTO RUÇO
Data da Resolução18 de Janeiro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório

  1. O presente recurso vem interposto da seguinte decisão: « (…) III- Do Saneamento: 3.1- Da competência do Tribunal: Em sede de contestação, veio a Ré invocar a exceção dilatória de incompetência absoluta dos tribunais portugueses para dirimirem o presente litígio, por infração das regras de competência internacional, atento o disposto no artigo 96.º, al. a) do Código de Processo Civil.

    Para o efeito, a Ré alegou que os tribunais espanhóis são os competentes para a presente ação, tendo em conta que foi em Espanha que ocorreu a deslocação alegadamente ilícita dos menores, com carater duradouro, e a fixação da sua residência, sem autorização do Autor, bem como foi em Espanha que ocorreu o primeiro dano sofrido pelo Autor, traduzido na impossibilidade e visitar os seus filhos e ter qualquer contacto físico com eles. Tais factos, segundo alegou a Ré, permitem preencher o critério estabelecido pelo citado art. 7.º, n.º 2 do Regulamento (CE) n.º 44/2001, de 16 de janeiro.

    Por seu turno, o Autor peticionou a improcedência da exceção, alegando que o facto ilícito em causa constitui o impedimento de o Autor exercer as suas responsabilidades parentais, nos termos do acordo fixado, nomeadamente, de ir levar e buscar os filhos nos dias determinados. Desta forma, alegou o Autor que o aludido impedimento, decorrente da deslocação dos menores, ocorreu em Portugal, sendo que os demais danos sofridos desencadearam-se, de igual modo, em território Português; razão pela qual, nos termos do art. 7.º, n.º 2 do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro, a competência internacional cabe aos tribunais portugueses.

    Cumpre decidir.

    O Autor intentou a presente ação declarativa de condenação contra a Ré, residente na ..., Espanha.

    Neste sentido, considerando a residência da Ré, indicada na ação intentada pelo Autor (que se encontra num Estado-Membro distinto), bem como a matéria a discutir nestes autos (responsabilidade civil extracontratual) e a data em que a presente ação foi intentada (03-01-2020), importará chamar à colação as regras instituídas pelo Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro, que, por seu turno, estabelece as regras de competência judiciária, reconhecimento e execução de decisões em matéria civil e comercial, e que veio substituir o Regulamento (CE) n.º 44/2001, de 16 de janeiro, anteriormente em vigor a este propósito e a título meramente exemplar, leia-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 01-10-2019, processo n.º 2300/18.4T8PRT.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt.

    Assim sendo, o art. 4.º do aludido Regulamento estabelece a regra geral a aplicar, quando o objeto da ação intentada não se integrar em qualquer uma das disposições especiais, também previstas no mencionado Regulamento. Por conseguinte, o art. 4.º, n.º 1 em apreço, Sem prejuízo do disposto no presente regulamento, as pessoas domiciliadas num Estado-Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais desse Estado-Membro Todavia, o objeto da presente ação insere-se no âmbito da responsabilidade civil extracontratual; razão pela qual o art. 7.º, n.º 2 do Regulamento em apreciação consagra uma regra especial, que deverá ser tida em consideração para a tomada de decisão sobre a exceção suscitada pela Ré, no seu articulado de contestação. O art. 7.º, n.º 2 mencionado dispõe, então, As pessoas domiciliadas num Estado-Membro podem ser demandadas noutro Estado-ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso.

    Ora, para este efeito, considero que o lugar onde ocorreu o facto danoso é o local onde se verificou o facto ilícito gerador da responsabilidade civil extracontratual, bem como o local onde se verificou o dano, podendo o Autor optar por intentar a ação em qualquer dos tribunais, desde que os mesmos sejam distintos, pela aplicação dos critérios em apreço neste sentido, vejam-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 03-03-2005, processo n.º 04A4283 e o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 18-06-2013, processo n.º 3398/11.1TVLSB.L1-7, disponíveis em www.dgsi.pt.

    Assim sendo, tendo em consideração os factos alegados em sede de petição inicial e o objeto da ação, impõe-se, então, conhecer o local onde ocorreu o facto danoso.

    Tal como resultou admitido por acordo, antes de alterar a sua residência para Espanha, a Ré residia, com os dois filhos menores, na ..., Montemor-o-Velho. Desta forma, os factos que, alegadamente, estiveram na origem dos danos invocados pelo Autor, terão ocorrido em território português. Vejamos: tendo presente o que foi alegado pelo Autor, em sede de petição inicial, os danos alegados, que estão na origem da ação de responsabilidade civil, desencadearam-se, por um lado, pelo facto de a Ré se ter deslocado com os menores para local distinto ao que previamente havia sido estabelecido no acordo de regulação das responsabilidades parentais, com vista a possibilitar o cumprimento dos direitos instituídos no referido acordo e, por outro lado, pelo facto de a Ré ter ficado impedido de exercer os direitos de visita e os demais direitos estabelecidos no referido acordo de regulação das responsabilidades parentais.

    Na verdade, contrariamente ao alegado pela Ré, no art. 42.º da sua contestação, a alegada deslocação dos menores não terá ocorrido em Espanha. A alegada deslocação dos menores terá ocorrido em Portugal, pois tal como resulta da matéria assente por acordo, era em Portugal que os menores residiam com a Ré.

    Do mesmo modo, contrariamente ao alegado pela Ré no art. 43.º da sua contestação, a alegada impossibilidade de o Autor visitar os seus filhos e de exercer os demais direitos fixados por acordo terá ocorrido em Portugal, pois, tal como já se explanou, era em Portugal e, mais concretamente, em Montemor-o-Velho, que os menores residiam com a Ré [cfr. art. a regulação das responsabilidades parentais das crianças, em Portugal, apenas fixou a sua residência junto da mãe Por outra via, atentos os danos invocados pelo Autor cujo valor indemnizatório pedido assenta, maioritariamente, em danos de natureza não patrimonial dúvidas, também, não subsistem de que os mesmos ocorreram em território português. O Autor invoca que a deslocação dos seus dois filhos para Espanha provocou-lhe tristeza, abalo psicológico, depressão (entre outros). Ora, a terem ocorrido os aludidos danos (o que o Tribunal, de momento, desconhece), os mesmos desencadearam-se, naturalmente, em Portugal, onde o Autor reside habitualmente.

    Assim, independentemente do critério adotado pelo Autor, as regras de competência internacional aplicáveis (mais concretamente, as que resultam do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro) sempre atribuiriam a competência aos tribunais portugueses para a presente ação.

    Face ao exposto, improcede a exceção dilatória de incompetência absoluta dos tribunais portugueses para dirimirem o presente litígio.» b) É desta decisão que vem interposto recurso por parte da recorrente A. , cujas conclusões são as seguintes: «1ª - Com o presente recurso visa a ora Recorrente impugnar o despacho saneador, de 21.09.2021, com a Ref.ª Citius 86298173, (notificado à Ré em 27.09.2021) na parte em que o mesmo julgou improcedente a exceção dilatória de incompetência absoluta dos tribunais portugueses para dirimirem o presente litígio.

    1. - Do despacho saneador sub iudicio consta que o Autor intentou a presente ação declarativa de condenação contra a Ré, residente na ..., Espanha, pelo que, considerando a residência da Ré, indicada na ação intentada pelo Autor (que se encontra num Estado-Membro distinto), bem como a matéria a discutir nestes autos (responsabilidade civil extracontratual) e a data em que a presente ação foi intentada (03-01-2020), importará chamar à colação as regras instituídas pelo Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro, que, por seu turno, estabelece as regras de competência judiciária, reconhecimento e execução de decisões em matéria civil e comercial, e que veio substituir o Regulamento (CE) n.º 44/2001, de 16 de janeiro, anteriormente em vigor.

    2. – O Tribunal a quo determinou que, atendendo a que o objeto da presente ação se insere no âmbito da responsabilidade civil extracontratual deverá ser tida em consideração, para a tomada de decisão sobre a exceção dilatória de incompetência absoluta dos tribunais portugueses, suscitada pela Ré, no seu articulado de contestação, o artigo 7.º, n.º 2 do mencionado Regulamento.

    3. - Para este efeito, o Tribunal a quo estipulou que o lugar onde ocorreu o facto danoso é o local onde se verificou o facto ilícito gerador da responsabilidade civil extracontratual, bem como o local onde se verificou o dano, podendo o Autor optar por intentar a ação em qualquer dos tribunais, desde que os mesmos sejam distintos, pela aplicação dos critérios em apreço.

    4. - Mais estabeleceu o Tribunal ora Demandado que, tendo presente o que foi alegado pelo Autor, em sede de petição inicial, os danos alegados, que estão na origem da ação de responsabilidade civil, desencadearam-se, por um lado, pelo facto de a Ré se ter deslocado com os menores para local distinto ao que previamente havia sido estabelecido no acordo de regulação das responsabilidades parentais, com vista a possibilitar o cumprimento dos direitos instituídos no referido acordo e, por outro lado, pelo facto de o Autor ter ficado impedido de exercer os direitos de visita e os demais direitos estabelecidos no referido acordo de regulação das responsabilidades parentais.

    5. - Considerou igualmente o Tribunal a quo que, a alegada deslocação dos menores terá ocorrido em Portugal, pois tal como resulta da matéria assente por acordo, era em Portugal que os menores residiam com a Ré.

    6. - Acresce que, também determinou que a alegada impossibilidade de o Autor visitar os seus filhos e de exercer os demais direitos fixados por acordo terá ocorrido em Portugal, pois, era em Portugal e, mais concretamente, em Montemor-o-Velho, que os menores residiam com a Ré.

    7. - Por outra via...

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