Acórdão nº 1925/21.5T8VIS-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Março de 2022
Magistrado Responsável | VÍTOR AMARAL |
Data da Resolução | 17 de Março de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório Por apenso aos autos de execução sumária para pagamento de quantia certa, fundada em título de injunção, que lhe move AA, com os sinais dos autos, veio a executada “F..., Ld.ª”, também com os sinais dos autos, deduzir oposição mediante embargos de executado, peticionando a sua absolvição da execução, com cancelamento da penhora efetuada sobre o crédito que detém junto da sociedade “S..., S. A.”.
Para tanto, excecionou a inexequibilidade do título executivo, alegando, em resumo, assim: - o Exequente é filho de um dos sócios da sociedade Executada, BB; - o representante da sociedade executada não foi citado de qualquer ação declarativa, fosse de que género fosse; - tendo sido enviada alguma carta de citação ou de notificação, a mesma foi retirada da caixa de correio pelo sócio BB ou pelo seu filho – ora Exequente – dado que quem residia na morada sede da sociedade era o sócio BB e quem tinha acesso à mesma era ele próprio e o Exequente; - aquele sócio BB esconde as notificações ao outro sócio, prejudicando, assim, a sociedade, pelo que o sócio CC, faltando-lhe o conhecimento de ações em tribunal contra a sociedade, especificamente esta, não teve a hipótese de representar a sociedade para que ela pudesse exercer o contraditório; - a sociedade executada impugna todos os factos contra si alegados, sendo que não existe, nem nunca existiu, qualquer dívida desta para com o Exequente; - ninguém da Executada, incluindo o sócio em conflito com a sociedade, assinou qualquer contrato ou quaisquer faturas com o Exequente; - ocorreu que o sócio BB, a fim de fazer baixar os lucros da sociedade, solicitava faturas a vários fornecedores, que nunca tinham fornecido nada, pagando apenas o respetivo IVA; - assim aconteceu também com o Exequente, na qualidade de filho do sócio BB; - perante a dita inexequibilidade do título, é nula a penhora efetuada sobre bens propriedade da executada, nomeadamente o referido crédito penhorado.
Foi determinada a notificação da Embargante para se pronunciar sobre a eventual inadmissibilidade da oposição e o respetivo indeferimento liminar, nos termos do disposto no art.º 732.º, n.º 1, al.ª b), do NCPCiv., tendo a mesma tomado posição no sentido de não se verificar fundamento para tal indeferimento.
Em despacho liminar, datado de 23/10/2021, foi decidido assim na 1.ª instância: «Pelo exposto, ao abrigo do disposto no art.º 732.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil, indefiro liminarmente os embargos de executado (…).».
Inconformada, a Embargante recorre do assim decidido, apresentando alegação, onde formula as seguintes Conclusões ([1]): «1ª O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, salvo o devido respeito, não andou bem na interpretação e aplicação das normas jurídicas fazendo uma errada interpretação e aplicação do direito, nomeadamente no que concerne à interpretação e aplicação do que dispõem os seguintes artigos: 729º, 732º e 857º todos do CPC e artº 14º - A do DL nº 269/98 de 1 de setembro tendo, tal circunstância, levado a uma decisão errónea.
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Com o presente recurso, pretende a executada/recorrente a revogação ou reformulação da decisão proferida pela Sra. Juiz do Tribunal a quo por verificação de erro na interpretação e aplicação do direito.
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A ação executiva para pagamento de quantia certa de que estes autos de embargo são oposição, tem por base um requerimento de Injunção ao qual foi aposta força executória.
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O que está verdadeiramente em causa é saber se um simples requerimento de Injunção ao qual foi aposta uma fórmula executória por um Sr. Secretário Judicial é ou não título exequível e sendo-o, o que parece pacífico, se deve levar a que os embargos sejam liminarmente indeferidos.
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A questão em concreto que importa decidir é a da admissibilidade dos fundamentos de oposição à execução, nos termos previstos no artº 732º nº 1 do CPC.
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A executada tem dois sócios que são também seus gerentes: BB e CC. O primeiro é pai do exequente e o segundo é tio.
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Exequente e o seu pai, mancomunados os dois, acordaram que o exequente intentasse requerimento injuntivo contra a sociedade, dado que tinham a certeza que o outro sócio – CC, não saberia da citação da sociedade, pelo facto de o outro sócio a ter escondido e assim não haveria dedução de Oposição e obteriam facilmente um título executivo.
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As faturas que foram referidas no requerimento de Injunção são simuladas, dado que o exequente nunca vendeu rigorosamente nada à executada.
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O enquadramento jurídico deste caso passa por analisar o título executivo que dá fundamento à execução para, de seguida apreciar os fundamentos que lhe podem ser oponíveis por parte da executada.
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Da contextualização feita, não restam dúvidas que a executada não teve a oportunidade de deduzir Oposição, dada a estratégia montada entre o exequente e o seu pai.
Os embargos de executado seriam a única forma de a executada, depois de conhecidos os fundamentos da execução, poder deduzir a sua oposição.
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O indeferimento dos embargos faz com que a executada fique sem possibilidades de se defender assim se violando o princípio da confiança e do contraditório.
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O título dado à presente execução não é uma decisão, é um requerimento injuntivo ao qual foi aposta a fórmula executória e há, efetivamente, uma grande diferença entre o requerimento de injunção com fórmula executória, que é o caso dos autos de execução e a decisão judicial a conferir força executiva à petição.
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O Tribunal Constitucional concluiu que a restrição dos fundamentos de Oposição à execução baseada em requerimento de injunção com fórmula executória não pondera devidamente o direito de defesa que assiste ao executado e afeta de forma desproporcional a garantia de acesso ao direito e aos tribunais.
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O mesmo Tribunal alerta para o facto de que o Secretário Judicial, que apõe a fórmula executória não ser um Juiz, pois enquanto que a sentença implica o exercício de uma função jurisdicional, o mesmo já não acontece com a aposição de fórmula executória.
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Tendo por base estes argumentos o citado tribunal declarou inconstitucional, com força obrigatória geral, o artº 814º nº 2 do CPC (atual 729º) na parte em que limita os fundamentos de oposição à execução com base em requerimento de injunção ao qual foi aposta fórmula executória, vide Acórdão do Tribunal Constitucional nº 388/2013 de 9 de junho, disponível em www.tribunalconstitucional.pt 16ª A decisão do Meritíssimo Juiz do tribunal “a quo” ao não permitir que a executada deduza a sua oposição por embargos, além de ser a apologia da indefesa, e a consequente inversão do princípio do contraditório é também lesivo do princípio da economia processual.
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Na ação executiva e suas condições, existem a exequibilidade do título e a exequibilidade da pretensão exequenda ou, o que vale o mesmo, entre exequibilidade da pretensão incorporada no título (exequibilidade extrínseca) e validade ou eficácia do ato ou negócio nele titulado (exequibilidade intrínseca). No caso sub judice entendemos que não se verifica a exequibilidade da pretensão nem a validade ou eficácia do ato ou negócio nele titulado.
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A douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo” deverá ser revogada, dado que fez uma errada interpretação e aplicação do direito, nomeadamente no que concerne à interpretação e aplicação do que dispõem os seguintes artigos: 729º, 732º e 857º todos do CPC e artº 14º - A do DL nº 269/98 de 1 de setembro. Efetivamente, em nosso entender deveria ter considerado que os fundamentos da oposição, no que tange à inexequibilidade do título e à inexequibilidade da pretensão do exequente, deveriam ter sido aceites, na esteira do que dispõe o artº 729º al. a) do CPC. Nesta sequência também, não deveria o Meritíssimo Juiz do tribunal “a quo”, ter considerado haver motivo para indeferimento liminar com base no artº 732º al. b) e 857º do CPC.
Nestes termos, devem V...
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