Acórdão nº 1724/20.1T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelTERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução01 de Fevereiro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A. e B., instauraram a presente ação declarativa com processo comum contra C. e D., Lda., pedindo que a ação seja julgada procedente e, em consequência: a) Seja o 1º R. condenado a liquidar aos AA. a quantia de €100.000,00 (cem mil euros), correspondente ao dobro do sinal por estes entregue; b) Acrescido do valor de € 5.315,07 (cinco mil trezentos e quinze euros e sete cêntimos), correspondente aos juros de mora, calculados à taxa legal em vigor, desde a data em que terminou o prazo no qual o 1º R. deveria ter procedido à devolução do dobro do sinal aos AA., na sequência da interpelação por estes efetuada, até à presente data; c) Bem como de todos quantos venham a vencer-se até efetivo e integral pagamento (…); d) Seja a 2ª R. condenada a devolver aos AA. a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros) relativa à cobrança ilegítima de comissão de intermediação do negócio, e) Acrescida de juros calculados à taxa legal em vigor, desde a data em que a 2ª R seja citada para a presente ação e até efetivo e integral pagamento (…) f) Seja a 2ª R. condenada, solidariamente com o 1º R., a restituir aos AA., a quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros), entregue pelos AA. a um representante da 2ª R. em 05 de novembro de 2017, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 18º, nº.1 da Lei nº.15/2013, de 08/02.» Para fundamentar a sua pretensão, alegaram, em síntese, que celebraram com o 1º R. um contrato-promessa de compra e venda de imóvel, que este incumpriu de forma definitiva, e entregaram à 2ª R., empresa de mediação imobiliária, escolhida pelo 1º R., € 50.000, a título de sinal e princípio de pagamento, e ainda € 5.000, a título de adiantamento da remuneração da mesma, que esta, instada, recusa devolver.

Os RR., citados, não contestaram, nem constituíram mandatário.

Notificados os AA., nos termos do artigo 567º/2 do CPC, para apresentaram alegações, vieram os mesmos fazê-lo, reiterando o alegado na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador, assinalando-se a regularidade da instância e, atento o disposto no artigo 567º/1do CPC, consideraram-se provados os factos articulados pelos AA., em função dos quais foi proferida sentença que, tendo fixado à causa o valor de € 110.315,07, julgou a ação totalmente procedente, por provada e, em consequência: A. Condenou o réu C., entregar aos autores a quantia de € 100.000 (cem mil euros), correspondente ao dobro do sinal e princípio de pagamento entregues pelos autores, dos quais € 10.000 (dez mil euros), solidariamente com a ré D., Lda.; B. Condenou a ré D.,, Lda., solidariamente com o réu C., restituir aos autores a quantia de € 10.000 (dez mil euros), correspondente ao montante por estes entregue em depósito; C. Condenou a ré D., Lda., a restituir aos autores a quantia de € 5.000 (cinco mil euros), correspondente ao valor do adiantamento por conta da remuneração que estes lhe entregaram; D. Condenou os réus a pagarem aos autores juros de mora sobre as quantias referidas em A), B) e C), à taxa legal em vigor para as obrigações civis, devidos desde a citação até integral pagamento; E. Absolveu os réus do mais peticionado.

II - Do assim decidido, apelou o R. C., que concluiu as respectivas alegações nos seguintes termos: 1-O ora recorrente apenas tomou conhecimento efetivo da existência dos presentes autos, aquando da notificação da sentença proferida, de que agora recorre.

2- Certo é que, o ano transato, constituiu um período conturbado e atípico que acabou por lhe gerar alterações e desequilíbrios no seu dia a dia que deixaram o ora recorrente incapaz de gerir adequadamente a sua vida, o que, desde logo, é reflexo a não contestação dos presentes autos, pois estamos em crer que nem consciência terá tido das consequências negativas resultantes dessa omissão.

3 - Sendo uma pessoa que, atualmente, tem mais de 70 anos, cuja capacidade cognitiva se tem vindo a degenerar substancialmente nos últimos tempos.

4 - Isto para dizer que, o 1º R. não se encontra minimamente em condições físicas, psíquicas e mentais para perceber o constante e consequências daquela citação e até mesmo de lhe atribuir a importância devida, o que é compreensível em face do seu débil estado de saúde.

5-Assim, e em face de todo o aduzido, é por demais evidente que o ora recorrente não reunia, à data da citação, as condições físicas e o discernimento mental necessário para assimilar a importância do teor da citação recebida.

6-A verdade é que, o ora recorrente, em resultado da vida descontrolada que levou acabou por ser vítima de uma doença grave (AVC), ficando, assim, impedido, em absoluto, por si ou através de outra pessoa, de praticar qualquer ato processual, dispor do exercício pleno da sua capacidade judiciária.

7-Ora, “in casu”, o que deverá relevar decisivamente para a verificação de justo impedimento – mais do que a cabal demonstração da ocorrência de um evento totalmente imprevisível e absolutamente impeditivo da prática atempada do ato - é a inexistência de culpa por parte do ora recorrente na ultrapassagem do prazo perentório, a qual deverá, naturalmente, ser também valorada no caso vertente.

8-O ora recorrente não teve qualquer consciência do que representava aquela citação, porque desconhecia tal negócio nos termos apresentados pelos autores, pois só agora percebeu todo o procedimento adotado, à sua revelia.

9-A verdade é que, tendo a citação, dos presentes autos, sido efetuada na pessoa do Réu, e estando este incapacitado de a receber devido ao seu estado débil a nível psíquico, verifica-se a falta de citação nos termos do art.º 188, n.º 1, al. e) do CPC pois, “…o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do ato, por facto que não lhe seja imputável.”, verificando-se a nulidade prevista no artigo 187, a) do CPC.

10-Em consequência do seu comportamento, que teve como consequência direta o Acidente Vascular Cerebral por si sofrido, o ora recorrente, viu a sua capacidade mental fortemente diminuída, manifestando confusão e desorientação no tempo e no espaço, bem como falta de consciência na sua vivência diária com terceiros.

11-Sem capacidade de exercício não pode, pois, o aqui recorrente, exercer os seus direitos e cumprir os seus deveres, isto é, não pode estar, por si só, em juízo, e entender os atos processuais praticados de forma a tomar decisões que decorram da tramitação do processo.

12-Ora, carecendo o incapaz de representante geral requer-se a nomeação deste, sem prejuízo da imediata designação de um curador provisório.

13-Consta da douta sentença que o tribunal não pode conhecer oficiosamente da validade formal do CPCV, pois, tais factos não foram suscitados nem questionado pelos réus em contestação.

14-Assim, duvidas não existem de que o CPCV, constante dos presentes autos, tratando-se de um simples documento particular, não reúne os requisitos formais essenciais e necessários para a sua validade jurídica, sendo, em consequência, inapto a produzir quaisquer efeitos jurídicos; nulidade formal que, desde já, se deixa invocada para todos os devidos e legais efeitos.

15-Acresce que, o ora recorrente, não subscreveu, nem assinou o CPCV junto aos autos pois, a verdade é que, nem tampouco conheceu os promitentes compradores previamente à outorga do contrato.

16-Ainda que, a assinatura constante do CPCV possa ser a assinatura do Réu, a mesma terá sido aposta numa folha em branco e posteriormente aproveitada para aquele fim.

17- Pelo que, desde já, se impugna a genuinidade do documento nos termos do art.º 444º do CPC, no seu n.º1.

18-Arguindo-se a falsidade do documento, pois só agora se teve conhecimento do seu conteúdo e da sua existência, cfr. art.º 444º, n.2 do CPC.

19-Com efeito, a falta de reconhecimento presencial das assinaturas dos outorgantes em contrato-promessa a que alude o art.º 410º, n.º 3 do CC, acarreta a invalidade do negócio jurídico, sujeita embora a um regime especial que permite qualificá-la como uma nulidade atípica ou mista, invocável a todo o tempo.

20-Para além de que, verifica-se que não é legalmente admissível considerar-se como factos provados o contante dos pontos 1, 2 e 3 do probatório porquanto, se tratam de factos para cuja prova a lei exige documento escrito, que é o caso dos autos.

21-Pelo que, atento o disposto no normativo 568º, al. d) do CPC, não é admissível considerar como provados os factos referidos, tanto mais que, o referido documento não reúne os requisitos de validade formal, legalmente exigidos.

22-Compulsados que foram os presentes autos, verifica-se que, por despacho datado de 28/04/2020, foi notificada a Autora B. para que procedesse à junção aos autos de procuração forense, uma vez que, na petição inicial não procedeu à sua junção.

23-Com efeito, em 29/04/2020, veio então a Autora, juntar a procuração em falta sem, contudo, ratificar todo o anteriormente processado.

24-Ora, a este respeito, cumpre, desde logo, fazer referência ao artigo 40º do Código de Processo Civil, que tem pro epígrafe “Falta, insuficiência e irregularidade do mandato.” 25-Ora, a falta, insuficiência ou irregularidade do mandato têm consequências tanto para a parte como para o advogado que subscreveu a peça processual.

26-Sendo certo que, é à parte, enquanto mandante, que cumprirá suprir a falta de procuração e ratificar o processado.

27-Ora, prescrutados os autos, verifica-se que a Autora, apesar de ter junto procuração, a mesma é omissa relativamente à ratificação do processado, nulidade essa que, desde já, se deixa invocada para todos os devidos e legais efeitos.

28-Com efeito, a decisão de que ora se recorre foi proferida na sequência de uma nulidade cometida, com influência no exame e decisão da causa, incorporando-a; a saber, a omissão de pronúncia por parte do douto tribunal a quo, relativamente ao facto de a parte não ter junto procuração a ratificar todo o processado.

29-Pois, o que realmente importa, em situações análogas à dos presentes autos é que a parte, ou...

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