Acórdão nº 88/21.0T8CTB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Maio de 2022
Magistrado Responsável | ANTÓNIO DOMINGOS PIRES ROBALO |
Data da Resolução | 10 de Maio de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na Secção Cível (3.ª Secção), do Tribunal da Relação de Coimbra Proc.º n.º 88/21.0T8CTB-A.C1 1. Relatório 1.1.-O exequente - N..., S.A, intentou a presente execução, contra AA e BB, referindo que os mesmos se encontram em dívida perante si, na quantia de € 35.645,89€ acrescido de juros desde o vencimento da letra até integral pagamento, bem como ainda o Imposto de Selo previsto na Tabela Geral do Imposto de selo.
** 1.2. - Notificados da mesma vieram os executados, através dos presentes embargos de executado, invocar que: - há incompetência territorial, uma vez que têm domicílio em C1C1, na Rua ..., ..., ..., ... C1C1; - os embargantes requereram um Processo Especial de Revitalização (PER), no âmbito do qual foi aprovado e judicialmente homologado Plano de Recuperação que reestruturou integralmente o seu passivo, por sentença transitada em julgado em 6.12.2016; - no PER dos embargantes foi reconhecido ao B... um crédito de natureza comum, no montante global de € 36.420,27, que correspondente à quantia de € 35.645,89 de capital, inscrito na livrança ora dada à execução, acrescida de juros de mora, à data vencidos, no valor de € 744,60 euros e ainda de Imposto do Selo sobre os juros, no valor de € 29,78 euros; - ou seja, o passivo reclamado na execução está abrangido pelo Plano aprovado e judicialmente homologado, por sentença transitada em julgado; - estando vedado aos embargantes o pagamento dos créditos abrangidos pelo Plano de Recuperação aprovado no âmbito do PER – nos quais se inclui o crédito exequendo – em moldes distintos dos supra elencados; - do mesmo modo que estão os credores inibidos de receber o pagamento dos seus créditos em violação do mesmo Plano de Recuperação aprovado e judicialmente homologado; - a exequente, no artigo 12.º do requerimento executivo, menciona o incumprimento do Plano pelos aqui embargantes, invocando resultar o mesmo provado pelo documento que junta como Doc. 7; - mas não tem o condão de fazer prova do incumprimento do plano, por banda dos embargantes; - mais refere a exequente ter interpelado os executados «para proceder ao pagamento do montante em dívida, no transato dia 14 de Outubro de 2019, nos termos do artigo 218.º n.º 1 al. a) do CIRE», o que é falso, como aliás o próprio documento junto pela exequente, como Doc. 9 do requerimento executivo, comprova; - missiva essa que foi, a julgar pelo teor do documento (vide carta e respetivo talão de registo) junto pelo exequente, remetida por correio registado, sem aviso de receção (ao invés do que é textualmente mencionado na carta), em 18.10.2019, para a seguinte morada: Rua ..., ... C2C2; - e essa morada não coincide com a morada, em C1C1, na qual foram os executados citados para os presentes autos, que é, aliás, a mesma que consta da livrança que constitui o título executivo; - por outro lado, nunca foi missiva de semelhante teor (para efeitos do artigo 218.º, n.º 1, al a) do CIRE) remetida à embargante mulher, nem o exequente o invoca ou tão-pouco comprova; - a carta junta como Doc. 9 do requerimento executivo, remetida pelo exequente para os efeitos previstos no artigo 218.º, n.º 1, al a) do CIRE, nunca foi recebida pelo seu destinatário, o embargante marido, antes tendo sido devolvida ao remetente, em 5.11.2019; - ainda que o Plano de Recuperação aprovado e judicialmente homologado no PER dos embargantes não estivesse a ser cumprido, a exequente limita-se a aludir, de forma tabelar, ligeira e meramente conclusiva, no seu requerimento executivo, sem concretizar ou comprovar minimamente, nunca foram os mesmos regularmente interpelados, nos termos e para os efeitos do disposto na al. a) do n.º 1 do artigo 218.º do CIRE; - mais, a embargante mulher não foi destinatária de qualquer missiva, com tal intuito ou propósito, por banda da exequente, pelo que é o crédito exequendo inexigível; - mais alega a prescrição dos juros de mora, nos termos do artigo 310.º, alínea d) do CC, segundo a qual os juros legais prescrevem no prazo de cinco anos.
Conclui, a final, que a exequente não pode lançar mão do título dado à execução para obter coercivamente contra os embargantes a satisfação de um crédito que está reestruturado num Plano ao qual a exequente continua vinculada.
** 1.3. - Notificada a exequente, a mesma juntou o seu articulado de defesa, contrariando totalmente toda a matéria aduzida pelos embargantes, alegando que, estando em causa o incumprimento do plano, e tendo vindo os executados/embargantes referir morada sita em C2C2 como sua residência habitual no requerimento que deu início ao PER, a exequente/embargada realizou as comunicações necessárias relativas ao incumprimento do Plano para tal morada, concluindo pela improcedência total dos embargos.
Pede ainda a condenação dos executados como litigantes de má fé.
** 1.4. - No âmbito da ação executiva, foi proferido despacho em 15 de junho de 2021, que declarou a incompetência do juízo local cível de Castelo Branco para a tramitação da execução e remeteu para o Juízo de Execução de Soure.
** 1.5. - Foi proferido despacho a considerar que o processo já dispunha de todos os elementos necessários à prolação de decisão final e para as partes, querendo e em 10 (dez) dias, se pronunciarem.
Nenhuma das partes se opôs a esse desiderato.
** 1.6.- Foi saneado o processo onde se referiu, ser o Tribunal o competente para conhecer a causa, em razão da nacionalidade, da matéria, da hierarquia e do território, não enfermar o processo de nulidade total, terem as partes personalidade e capacidade judiciárias, serem legítimas e estarem devidamente representadas, não existem outras questões prévias, exceções, dilatórias ou perentórias, de que cumpra, neste momento, conhecer.
Foram referidas as questões a decidir, como tendo os presentes embargos, por objeto apreciar da questão da interpelação dos embargantes nos termos do disposto no art.º 218, n.º 1, al. a) do CIRE e sua influência no prosseguimento da execução; da prescrição dos juros; da litigância de má fé dos executados.
Após foi proferida sentença, onde se decidiu: a) - julgar totalmente procedentes os embargos à execução, determinando-se a extinção da execução quanto aos dois executados/embargantes e o levantamento da penhora sobre eventuais bens dos mesmos; b) - julgar improcedente o pedido de condenação dos executados como litigantes de má fé.
c)- custas legais a cargo da embargada/exequente, que ficou vencida – cfr. art.º 527, nºs. 1 e 2, do Código de Processo Civil.
** 1.7. – Inconformado com tal decisão dela recorreu o exequente - B... – terminando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem: “1.Vem o presente Recurso interposto da douta sentença proferida pelo Mma Juiz “ a quo “, que julgou procedente os Embargos do Executado , a favor dos Executados , por apenso aos autos de execução, com vista a que fosse tido como não realizada corretamente a interpelação nos termos do artigo 218 nº1 alínea a) do CIRE, e em consequência a inexistência do título executivo válido para a ação executiva; 2. Entendeu a sentença recorrida que após uma análise da globalidade, os meios de prova, com não tendo sido nenhum dos Executados , aqui Embargantes, regularmente interpelados, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 218º do CIRE , já que a única carta remetida pela Exequente foi registada sim, mas sem aviso de receção ( contrariamente ao que ficou textualmente mencionado na carta ), e foi devolvida ao remetente em 5.11.2019, sendo que a exequente, porém , não enviou qualquer carta à executada, o que levou a concluir pela inexistência do titulo executivo válido para a ação executiva, já que não se podem ter os dois executados como devidamente interpelados de acordo com a alínea a ) do nº 1 do artigo 218º nº 1 a ) do CIRE , e eventualmente a lista definitiva de créditos admitidos , constitui título executivo complexo para demandar os devedores nos termos que ali constem, sendo que na falta de um deles, não existe título executivo válido”; 3. Decidido como decidiu, salvo o devido respeito , o Tribunal “ a quo “ não fez correta interpretação dos fatos , nem adequada aplicação do direito; 4. Da conjugação da prova produzida terá resultado para o Tribunal “ a quo”, recorrido pela inexistência do título executivo, dado a interpelação nos termos do artigo 218º nº1 alínea a ) do CIRE não ter sido realizada corretamente; 5. Com tal decisão não se conforma o Recorrente, nem com as suas premissas nem com a sua conclusão ; II- RECURSO DA MATÉRIA DE FATO 6. - Impõem-se a modificação da decisão do Tribunal “ a quo “ sobre a matéria de facto , que foi incorretamente julgada, a qual se impugna, bem como a sua fundamentação; 7-Assim, e sem salvo devido respeito serem desconsideradas as cartas de interpelação enviadas aos Recorridos, foi dada demasiada importância à forma e aos termos em que foi aludida missiva enviada, nomeadamente se a mesma foi remetida através de correio registado sem aviso de receção, quando tal situação não é imperativa para a resolução do problema em questão, e nem sequer se encontra devidamente fundamentado pelo qual tal forma deverá ser aceite; 8- Naturalmente entende o aqui Recorrente, que deveria ter sido como provado o fato de que o B..., SA, ao ter efetuado a interpelação nos termos do artigo 218º nº 1 alínea a ) do CIRE, a mesma foi efetuada de forma correta, ou seja, os Recorridos oram devidamente interpelados nos termos do artigo 218º nº 1 alínea a) do CIRE para a morada indicada sita em C2C2, morada essa constante do Requerimento que iniciou o PER; 9- Não decorre expressamente do artigo 218º nº 1 alínea a) do CIRE, que a carta de interpelação enviada para os Devedores que se encontram em incumprimento necessite de formalidades especiais, nomeadamente ser enviada com aviso de receção , tal como consta da douta sentença que se recorre; 10- Verificando-se a interpelação para pagamento, a moratória ou o perdão previstos no plano ficam sem efeito decorridos que sejam 15...
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