Acórdão nº 30628/18.6YIPRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução13 de Novembro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório 1. T (…) LDA., com sede na (...) , apresentou requerimento de injunção contra P (…) e A (…), ambos residentes na (...) , pedindo a notificação dos réus no sentido de lhe ser pago o montante de 9.508,50 €, acrescido de juros de mora vencidos, desde a data da factura, no montante de 483 €, mais juros de mora vincendos, à taxa comercial de 7% ao ano.

Para tanto, alegou ter celebrado com os mesmos um contrato para fornecimento do banquete do seu casamento, pelo valor global de 17.008,50 €. Os serviços foram prestados, mas os réus só pagaram o montante de 7.500 €.

Os réus deduziram oposição, na qual invocaram que o preço acordado para a realização do serviço de casamento foi de 7.500 €, pelo que já se encontra pago. Mais alegaram que a referida prestação de serviços foi realizada com a existência de graves defeitos e inúmeras irregularidades, uma vez que ocorreram várias quebras de electricidade no recinto, o que afectou a qualidade da comida e provocou a debandada dos convidados, o calor que nesse dia se fazia sentir e a falta de ar condicionado. Assim, foi acordado entre as partes reduzir o preço para metade, que já pagaram.

Os autos passaram a seguir termos como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato. Foi, depois, proferido despacho judicial que ordenou que a autora respondesse às excepções arguidas pelos réus.

A autora respondeu, dizendo não ter sido acordada qualquer redução de preço e as duas quebras de energia registadas no decurso do serviço deveram-se à ocorrência de diversos incêndios no distrito de Leiria, ou seja, a problemas da rede pública de fornecimento de energia e não a circunstâncias próprias ou deficiências do seu estabelecimento. Que procurou obviar a tais condicionalismos, a que era alheia, com recurso a gerador e através de serviços de terceiros. Que executou o serviço com a qualidade e quantidade convencionadas, tanto assim que a festa só terminou às 5.30h (e não às 4 h, como estava acordado, por forma a compensar as duas quebras de energia) e os réus e os seus convidados levaram consigo a comida não consumida durante a boda, como de resto era seu direito. * A final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, e, em consequência, absolveu os RR do pedido contra si formulado pela A. * 2. A A. recorreu, concluindo que: (…) 3. Os RR contra-alegaram, pugnando pela manutenção do decidido.

II - Factos Provados 1 – A A. é uma sociedade comercial que tem como objeto a hotelaria e a prestação desses serviços na área, designadamente o fornecimento de banquetes.

2 – Por escrito datado de 22 de janeiro de 2017 e subscrito por A. e RR., aquela acordou fornecer a estes o banquete do seu casamento, pelo valor global de € 17.008,50 (dezassete mil oito euros e cinquenta cêntimos), mais constando de tal acordo, nomeadamente, o seguinte (cfr. o documento intitulado “contrato de prestação de serviços”, junto com o requerimento de 26/11/2018, que aqui se dá por integralmente reproduzido): “SEXTA (…) 2. O acto da assinatura do presente contrato constitui uma reserva, com o valor de 2000,00 € (dois mil euros).

  1. Restante valor acordado pago a data de 30 (trinta) dias antes do dia do evento. (…) DÉCIMA PRIMEIRA 1. A T(…) não será, em qualquer circunstância, responsável por danos causados em incidentes como roubos ou incêndios que sucedam durante a realização do evento. (…) a) Número previsível de utilizadores do serviço: 200 b) Programa: Em anexo c) Preço previsível por pessoa: 87.00 €.

    d) Número previsível de pessoas a participar no evento: 200 e) Custo previsível global do serviço: 17.400,00 € f) Valor a que se refere a cláusula 6ª nº2: 2000.00 € g) Data do evento: 17-06-2017 (…) Hora de término 4.00 Horas”.

    3 – Na data referido em 2), os RR. entregaram à A. a quantia de € 2.000 (dois mil euros).

    4 – No dia 17 de junho de 2017 teve lugar o fornecimento do banquete, no complexo da A. denominado (…).

    5 – Nesse dia ocorreram os incêndios que assolaram a localidade de Pedrogão Grande e localidades contíguas e fazia-se sentir calor.

    6 – No decurso da celebração do casamento, os cerca de 190 convidados dos RR. encontravam-se na sala de refeições da A. de forma a iniciarem o respetivo almoço, quando, por volta das 14 horas, o recinto fica totalmente sem luz, o que veio a originar que o ar condicionado do espaço e qualquer outro tipo de refrigeração (como frigoríficos e montras) tenham ficado sem funcionar.

    7 – Neste seguimento, os convidados, num espaço com um ar irrespirável, tiveram de se deslocar para o ar livre.

    8 – Dando logo lugar a queixas por parte dos convidados, porque era um local onde se encontravam crianças e pessoas idosas.

    9 – Os empregados de mesa encontravam-se nervosos e ansiosos com a situação.

    10 – Apenas por volta das 16 horas regressou a eletricidade através do gerador pertencente à A..

    11 – A A., julgando que o problema da falta de eletricidade se encontrava sanado, dispensa o gerador que havia alugado por volta das 22 horas.

    12 – O copo de água encontrava-se agendado para as 21 horas e apenas começou cerca das 22h30.

    13 – Cerca das 23h30 falha novamente a eletricidade e os convidados, que nem tinham acabado de jantar, começam a abandonar o local.

    14 – O corte do bolo de noiva teve de ser efetuado à luz dos automóveis e já com poucos convidados.

    15 – O serviço prestado pela A. foi concluído apenas às 5h30, por força da festa e para compensar as duas quebras de energia registadas no decurso do serviço.

    16 – Os RR. e os seus convidados levaram comida não consumida durante a boda.

    17 – A pernoita dos noivos na quinta, como havia sido acordado, acabou por não suceder.

    18 – No dia seguinte, os RR. deslocaram-se à quinta de modo a efetuarem as contas.

    19 – Lá chegados, encontrava-se presente uma das sócias da A., (…), e o seu filho, (…) 20 – No dia 22 de junho de 2017, a A. emitiu a fatura n.º 1391, no valor de € 15.008,50 (quinze mil oito euros e cinquenta cêntimos).

    21 – Os RR. apenas entregaram à A. o montante de € 5.500 (cinco mil e quinhentos euros), por conta da fatura referida em 20), liquidado na ocasião descrita em 18).

    22 – A falta de energia deveu-se a problemas da rede pública de fornecimento de energia.

    * Factos não provados: ...

    h) O descrito em 17) deveu-se ao facto de o quarto não ter luz.

    (…) j) Os RR. e as pessoas referidas em 19) acordaram que aqueles apenas liquidariam cerca de metade do valor que haviam acordado para a prestação do serviço, ou seja, € 7.500, tomando-se em conta o valor já referido em 3).

    (…) * III - De Direito 1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 635º, nº 4, e 639º, do NCPC), apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas.

    Nesta conformidade, as questões a resolver são as seguintes.

    - Nulidade da sentença.

    - Alteração da matéria de facto.

    - Condenação dos RR no valor peticionado.

  2. A A. entende que a sentença é nula, nos termos do art. 615º, nº 1, e), do NCPC, porque a sentença conheceu para além do pedido e em objecto diverso (cfr. conclusão de recurso 8º).

    Em tal normativo estabelece-se que a sentença é nula se o juiz condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. Ora, no nosso caso não houve nenhuma condenação, antes os RR foram absolvidos, pelo que a arguida nulidade, obviamente, não se verifica. 3. A A. impugna a decisão da matéria de facto, relativamente aos factos provados 7., 8., 13. e 17., pretendendo que os factos 8. e 13. passem a não provados e o 7. e 17. tenham outra redacção (cfr. conclusão de recurso 1.). Fá-lo com base nas declarações de parte do representante legal da A. e da R., e depoimento das testemunhas (…) e teor do contrato celebrado.

    3.1. Em relação aos factos provados 7., 8. e 13., a julgadora de facto exarou na sua motivação que eles emergiam de: “Os pontos 1) a 14), …..dos fundamentos de facto resultou do acordo das partes, designadamente por RR. e A. terem aceite tais factos, os quais foram articulados, respetivamente, pela A. no requerimento de injunção e pelos RR. na oposição – artigos 574.º, n.º 2, e 587.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.”.

    Efectivamente verifica-se tal admissão de factos pela A. Expliquemos.

    A presente acção só consente 2 articulados – petição e contestação, mas não réplica -, como é a regra, aliás, no processo declarativo. Por conseguinte, como este tipo de acção especial não prevê a audiência prévia, a A. podia responder, querendo, às excepções invocadas pelos RR, na sua oposição, no início da audiência final (art. 3º, nº 4, do NCPC).

    Acontece que na 1ª instância, no uso dos seus poderes de gestão processual (arts. 6º, nº 1, e 547º do NCPC), a Sra. Juíza adoptou mecanismo de adequação formal, ordenando que a A. respondesse desde logo às referidas excepções, a que a A. correspondeu respondendo e exercendo o contraditório.

    Só que a partir do momento em que a A. respondeu a mesma fica sujeita ao ónus de impugnação, previsto no art. 587º, nº 1, do NCPC, que dispõe que a falta de impugnação dos novos factos alegados pelo réu tem o efeito previsto no art. 574º do mesmo código, designadamente a admissão dos mesmos (nº 1 e 2, inicio da 1ª parte do mesmo preceito) – vide neste sentido L. Freitas, CPC Anotado, Vol. 2º, 3ª Ed., nota 6. ao artigo 584º, pág. 608, e Paulo Pimenta, Proc. Civil Declarativo, 2ª Ed., pág. 223, o que merece a nossa concordância (estes autores, inclusive, até defendem que no caso em que haja lugar a réplica o A. deve na mesma peça responder às excepções invocadas pelo R. na contestação, ficando, igualmente aí, sujeito ao ónus da impugnação, sob pena de, também, haver admissão de factos, por razão de economia processual: aquele autor na ob. cit., respectivamente nota 3. ao artigo 584º, pág. 605, e nota 2. ao artigo 587º, pág. 610, e o segundo autor na mesma página). Ora, como a A. na sua resposta não impugnou aqueles factos alegados pelos RR, como integrantes da excepção de cumprimento defeituoso do contrato...

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