Acórdão nº 647/18.9T8ACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelALBERTO RUÇO
Data da Resolução04 de Junho de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório a) O presente recurso insere-se numa ação com processo especial, prevista nos artigos 891.º e seguintes do Código de Processo Civil, relativa a «acompanhamento de maiores», na redação introduzida pela Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto.

    Prende-se com o despacho que decidiu não ouvir o beneficiário R(…) com fundamento em desnecessidade e inutilidade dessa audição.

    1. O Ministério Público recorre deste despacho argumentando que essa audição tem de ser sempre feita e que a sua omissão resulta numa nulidade processual.

      Concluiu as alegações do seguinte modo: «1. O recurso incide sobre o despacho proferido sob ref. CITIUS n.º 90764802, que decidiu não proceder à audição pessoal e directa do visado prevista no artigo 897.º/2 do CPC, entendendo que, como resulta dos autos que «o Beneficiário não fixa o olhar, não colabora, não comunica verbalmente ou por gestos», seria manifestamente inútil realizar uma diligência que não permitirá, de facto, a audição do beneficiário (e com isso a imediação), porquanto o mesmo não comunica nem verbalmente, nem por gestos» e que «a deslocação do Tribunal à residência do Beneficiário ou a deslocação deste ao Tribunal redundaria num novo incómodo para este, sem qualquer utilidade que não fosse a de o Tribunal concluir que o mesmo não tem capacidade de comunicação, sendo os sorrisos a que alude a promoção do Ministério Público, apenas destinados pontualmente à sua mãe e à sua irmã (já que com o Sr. Perito, não fixou sequer o olhar».

      1. O despacho recorrido interpretou (implicitamente) as normas previstas nos artigos 139.º do Código Civil e 897.º/2 do Código de Processo Civil como apenas impondo a audição pessoal e directa do beneficiário nos casos em que tal audição seja útil, estribando-se no princípio da adequação formal para justificar a não audição do visado, mas sem razão, pois este princípio, consagrado no artigo 547.º do CPC, aplicável ao processo comum declarativo, só é aplicável ao processo especial de acompanhamento de maior para adaptação dos processos de interdição/inabilitação pendentes às novas regras (cf. artigo 26.º/2 da Lei n.º 49/2018).

      2. Nos anteriores processos de interdição/inabilitação, o interrogatório do requerido apenas era realizado quando houvesse contestação (cf. artigo 896.º do CPC); no actual processo especial de acompanhamento de maior, o artigo 897.º/2 do CPC estabelece que em qualquer caso, o juiz deve proceder, sempre, à audição pessoal e directa do beneficiário, deslocando-se, se necessário, ao local onde o mesmo se encontre», norma esta que, na perspectiva do Ministério Público, deve ser interpretada no sentido da audição pessoal e directa do beneficiário constituir uma excepção ao critério da conveniência previsto no n.º 1 do mesmo preceito, e uma formalidade obrigatória, um dever processual que o juiz deve observar «sempre», «em qualquer caso», ainda que o grau de incapacidade comunicacional do visado seja de tal modo profundo e notório que não permita comunicação alguma entre este e o juiz, para que seja dado pleno cumprimento aos princípios da imediação, do contraditório e do processo equitativo.

      3. A intenção declarada do legislador foi a de impor a «obrigatoriedade de o juiz contactar pessoalmente com o beneficiário antes de decretar o...

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