Acórdão nº 1896/18.5T8ACB-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO AREIAS
Data da Resolução22 de Outubro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I - RELATÓRIO Por apenso à execução que contra si é movida por 321 – I (…) S.A., vem o executado P (…) deduzir oposição à execução mediante - embargos de executado e, em simultâneo, - Incidente de Intervenção Principal Provocada de R (…), S.A., invocando, entre outros fundamentos, o seguinte: para outorga do contrato de crédito que deu origem à livrança exequenda foi exigida ao embargante a adesão a um seguro de crédito designado “Plano de Proteção B(…) Crédito”, que foi celebrado entre o embargante, a embargada, na qualidade de beneficiária ou tomadora do seguro e a seguradora R (…), S.A.; o embargante sofreu doença do foro oncológico que lhe determinou uma incapacidade temporária absoluta para a sua atividade profissional entre 06.06.2017 e 03.04.2018, sendo que a partir desta data ficou reformado por invalidez; sendo a Incapacidade Absoluta para o Trabalho (AIT) do embargante um risco coberto pelo contrato de seguro de crédito o montante de 2.799,61 € deve ser deduzido à quantia exequenda, bem como os respetivos juros moratórios, e exigido pela exequente à Seguradora; caso o executado/embargante venha a ser executado na totalidade da divida exequenda terá de intentar ação declarativa contra a chamada, a fim de exercer o seu direito de regresso contra aquela, na medida do que se obrigou a pagar nos termos do contrato de seguro.

Conclui que, na procedência da oposição, o valor aposto na livrança deve ser reduzido na quantia de 2.799,61 €, correspondente às prestações que se venceram quando o embargante sofria de AIT, e respetivos juros, devendo ser admitida a intervenção principal provocada da seguradora.

A exequente deduz oposição aos embargos alegando, relativamente a tal fundamento, que o tipo de contratação segurada abrangia tão só a morte ou invalidez permanente, não se pronunciando sobre o requerido incidente de intervenção principal da seguradora.

O juiz a quo proferiu despacho a indeferir o incidente de intervenção principal provocada.

* Não se conformando com tal decisão, o executado embargante, dela interpõe recurso de apelação, concluindo a respetiva motivação, com as seguintes conclusões: 1 – É legalmente admissível a requerida intervenção do terceiro companhia de seguros.

2 - Os embargos de executado seguem os trâmites do processo declarativo, atendendo ao prescrito no n.º 1 do artigo 551.º do C.P.C., que manda aplicar ao processo de execução, com as necessárias adaptações, as disposições reguladoras do processo de declaração que se mostrem compatíveis com a natureza da ação executiva.

3 - Inexiste justificação legal ou mesmo de ordem prática que possa fundamentar uma conclusão, em termos gerais e absolutos, no sentido da inadmissibilidade do incidente de intervenção principal provocada no processo comum de execução.

4 - “a admissibilidade dos incidentes de intervenção de terceiro no âmbito da ação executiva e respetiva oposição tem que ser analisada em face das circunstâncias do caso concreto, com vista a apurar se, nessas circunstâncias, estão ou não verificados os respetivos pressupostos legais e se a intervenção tem ou não a virtualidade de satisfazer um qualquer interesse legítimo e relevante e se a intervenção implica ou não com a estrutura e a finalidade da acção executiva.” – vide Ac. do T.R.P., de 19/11/2009.

5 – Há que aferir se, in casu, estão verificados os pressupostos legais da intervenção principal de terceiros, plasmados nos artigos 311.° e 316.º do C.P.C.

6 – A Companhia de Seguros é responsável pelo pagamento de parte da dívida exequenda, conforme decorre do contrato de seguro de crédito validamente celebrado entre a seguradora e o embargante, no âmbito do qual aquela se obrigou a pagar à Exequente, em caso de ITA por Acidente e/ou Doença da Pessoa Segura, ocorrida durante a vigência da adesão que se prolongue por um período superior a 30 dias consecutivos, o valor correspondente à Prestação Pecuniária devida por conta do Contrato de Financiamento, até que a Pessoa Segura volte a trabalhar ou até que seja atingido o limite máximo de 12 meses em dívida, pelo que dúvidas não podem restar de que tem a seguradora interesse em intervir equivalente ao lado do ora Recorrente.

7 – O indeferimento da intervenção principal da seguradora prejudica gravemente a defesa deduzida pelo Recorrente nos embargos de executado deduzidos, na medida em que a eficácia dessa defesa depende, forçosamente, daquela intervenção, pelo que estamos perante uma situação em que a intervenção de um terceiro no processo executivo, no âmbito dos embargos de executado, se justifica, porquanto esta se apresenta como “indispensável e necessária à defesa do executado” – vide Acórdão da Relação do Porto de 28/04/2008.

8 – Apesar de a regra ser a da não admissibilidade da intervenção de terceiros no processo executivo, nas circunstâncias como as dos autos, deve ser permitido às partes, num processo, executivo recorrer ao incidente da intervenção principal de terceiros.

9 – O título executivo é uma livrança, que faz parte integrante do Contrato de Crédito e do Contrato de Seguro de Proteção de Crédito celebrados, que foi assinada e entregue ao exequente por preencher e que, por essa razão, a respetiva literalidade e abstração não podem ser deixadas de ser tidas em consideração à luz do que consta do Contrato de Crédito, e mormente, da Convenção de Preenchimento da Livrança.

10 – É em face do teor dos embargos de executado deduzidos, bem como dos fundamentos do incidente de intervenção provocada formulado, que se deve atender à admissibilidade ou rejeição do pedido de intervenção de terceiros e não, simplesmente, em face do que consta do título dado à execução.

11 – A regularidade do preenchimento do título tem que ser sindicada em face do contrato de Crédito e do Pacto de Preenchimento da Livrança, sendo que, nos termos do contrato de crédito e do contrato de seguro de crédito a que a livrança assinada em branco estava anexa, é à seguradora que cabe garantir a obrigação do mutuário, no caso de incapacidade temporária absoluta para o trabalho por doença do tomador do seguro.

12 – Se “… o credor opta voluntariamente por não acionar a companhia seguradora com quem mantém relacionamento negocial privilegiado, preterição essa que à luz da boa-fé e do equilíbrio contratual causa um impacto negativo aos executados de valor superior ao benefício que advém para o credor por intermédio dessa inação, é possível a intervenção do terceiro segurador co-responsável pelo pagamento da dívida titulada por esta ser uma providência adequada à realização coactiva da obrigação devida e estar integrada na esfera de protecção do título executivo habilitante.” – vide Acórdão do T.R.E., de 15-11-2016, Proc. 802/05.1TBPSR-C.E1 13 – A obrigação da companhia de seguros encontra-se integrada no âmbito da “esfera de proteção do título executivo habilitante”, pelo que a intervenção principal provocada deve ser admitida.

14 – A intervenção nos autos do terceiro companhia de seguros visa suprir a conduta da Exequente, violadora dos princípios da boa-fé e tutela de legítimas expectativas, traduzida na imposição ao executado, enquanto entidade bancária mutuante, da realização de um Seguro de Proteção de Crédito, constituindo-se como beneficiária do mesmo, para depois, dispensar o seu acionamento e executar, a seu bel-prazer e sem critério de preferência, o património do tomador do seguro e livrar a seguradora.

15 – Perante o teor, quer dos embargos de executado, quer do incidente de intervenção principal provocada, ao ser determinada a intervenção da Companhia de Seguros em nada se subvertem as regras que enformam o processo executivo, dado que, além do mais, a responsabilidade da seguradora é apenas parcial.

16 – Se ao invés do Incidente de Intervenção Principal Provocada, se entender que está em causa a Intervenção Acessória Provocada, como se sustenta no despacho sob recurso, sempre o Tribunal a quo deveria ter aceite e convolado a referida intervenção nesses mesmos termos, uma vez que não está sujeito à qualificação feita pelas partes.

17 – O despacho em recurso ao decidir como decidiu, violou entre outros, o disposto nos artigos 311.º, 316.º, n.º 3, 317.º, 318.º, 551.º, n.º 1 º do Código de Processo Civil.

Termos em que e nos melhores de direito, dever-se-á dar provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogar-se o despacho recorrido, substituindo-se o mesmo por outro que julgue procedente o requerimento de...

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