Acórdão nº 1097/12.6TBCTB-I.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução22 de Outubro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra Por apenso aos autos de insolvência em que foi declarada insolvente a sociedade “C (…), Unipessoal, L.da”, veio a Massa Insolvente de C (…)Unipessoal, L.da, requerer execução para pagamento de quantia certa, com processo comum, contra “CA (…), L.da”, já ambas identificadas nos autos.

Apresentou como título executivo, a sentença proferida pelo Tribunal recorrido, em 14 de Julho de 2015 (aqui junta, por cópia, de fl.s 90 a 117), já transitada em julgado, que condenou a aqui executada, a pagar à aqui exequente, a quantia de 172.916,00 €, acrescida de juros de mora.

A executada (CA (…), L.da), veio deduzir os presentes embargos à execução, visando seja declarada a compensação de créditos, que alega deter sobre a exequente, com a consequente procedência dos embargos e a extinção da execução.

Alega para tal que no âmbito dos autos que correram termos na Comarca de Castelo Branco, Instância Central, Secção Cível, com o n.º 1588/11.6TBCTB, em que figurava como autor D (…) e como réu S (…), em 03 de Junho de 2016, foi celebrada transacção, pondo fim a tais autos, a qual foi judicialmente homologada nos termos que se passam a reproduzir: “

  1. Autor e réu aceitam que o negócio em discussão nos autos foi celebrado pelo autor como representante da D (…), Lda e da sociedade A (…)Lda – e não em nome próprio – com a CA (…) Unipessoal, Lda.

  2. Ficou acordado que € 300.000,00 (trezentos mil euros) seriam para pagar dívidas da D (…)Lda a credores, incluindo à sociedade A (…), Lda.

  1. Do mesmo modo também o autor em nome da A (…), Lda – e não em nome próprio – celebrou um contrato de empreitada com a C (…)Unipessoal, Lda para a construção de uma moradia, sita à Rua do (...) em (...) pelo preço de € 167.000,00 (cento e sessenta e sete mil euros) a que vieram a acrescer trabalhos a mais no valor de € 20.916,50 (vinte mil novecentos e dezasseis euros e cinquenta cêntimos), tudo num total de €187.916,50 (cento e oitenta e sete mil novecentos e dezasseis euros e cinquenta cêntimos), a qual veio a ser edificada durante os anos de 2008 a 2011, tendo sido facturada àquela – A (…), Lda.

  2. Autor e réu aceitam que em consequência do contrato celebrado entre o autor em representação da D (…)Lda e da A (…) Unipessoal, Lda, representada pelo seu sócio A (…) e datado de 17/10/2007 tenham ficado por pagar €175.000,00 (cento e setenta e cinco mil euros) à A (…) Lda, e não ao autor, pela A (…), Unipessoal, Lda.

  3. O autor reconhece o crédito referido na cláusula anterior não é da responsabilidade do réu mas da sociedade para quem trabalhou, C (…)Unipessoal, Lda, sendo que faz parte do pedido global deduzido pelo autor na Insolvência nº 1097/12.6TBCTB - Fundão – Inst. Central - Sec. Comércio - J1 da Comarca de Castelo Branco.

  4. O autor reconhece que o réu nada lhe deve nem a qualquer empresa que representa ou da qual tenha sido ou seja gerente ou administrador.

  5. O réu reconhece que também o autor nada lhe deve a qualquer título.

  6. As custas em dívida a juízo serão suportadas pelo autor, prescindindo ambos das de parte já pagas.

    * O autor presenciou esta transacção e deu a sua anuência para tal.

    * Neste momento, pela Meritíssima Juiz foi proferida a seguinte: SENTENÇA I – Na presente acção declarativa, sob a pretérita forma de processo comum, que D (…) moveu contra S (…), todos com sinais nos autos, pretendem as partes pôr termo àquela mediante a transacção que antecede.

    II – Apreciando.

    As partes podem, em qualquer estado da instância, transigir sobre o objecto da causa, desde que tal não importe a afirmação da vontade das mesmas relativamente a direitos indisponíveis – artigos 283º, nº 2, e 289º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho.

    A forma que deve assumir a referida transacção encontra-se definida no artigo 290º do mesmo diploma.

    III – Decidindo.

    Atendendo a que o objecto transaccionado está na livre disponibilidade das partes e vista a qualidade dos sujeitos intervenientes: - julgo válida e eficaz a transacção que antecede, homologo-a por sentença e, em consequência, condeno as partes a cumpri-la nos seus precisos termos, dando aqui por reproduzido o respectivo clausulado – artigos 283º, nº 2, 284º, 289º a contrario, 290º nº 1 e 3, todos do Código de Processo Civil, e artigos 1248º e 1249º, ambos do Código Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho; e - declaro extinta a presente instância – artigos 277º, alínea d), do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho; e - como acordado, condeno o Autor no pagamento das custas processuais, prescindindo ambas de custas de parte – artigo 537º, nº 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho.

    Registe e notifique.”.

    Com base nesta transacção, refere a aqui embargante-executada deter sobre a exequente-embargada, o crédito na mesma referido, que pretende ver compensado com o crédito exequendo.

    Conforme despacho de fl.s 15, proferido em 18 de Novembro de 2018, a M.ma Juiz a quo, invocando que a questão da compensação alegada pelo executado-embargante já havia sido apreciada no apenso de Reclamação de Créditos, por decisão transitada em julgado, o que configura uma situação de “autoridade de caso julgado”, ordenou a notificação da embargante para, quanto a tal, se pronunciar.

    O que esta fez – cf. requerimento de fl.s 17 e 18 – defendendo a admissibilidade dos embargos, com o fundamento em que “as partes podem por termo ao conflito por acordo e até pelo abuso de direito que seria receber duas vezes”, porque nada deve e “então deixe-se provar que nada deve”.

    Conclusos os autos à M.ma Juiz, foi proferida a decisão de fl.s 19 a 21 v.º, na qual se indeferiu liminarmente os embargos deduzidos, nos termos que se passam, parcialmente, a reproduzir: “Cumpre, então, apreciar e decidir.

    Conforme resulta do requerimento inicial de embargos, a executada quer ver reconhecido e compensado o crédito exequendo com o crédito reconhecido no âmbito do processo nº 1588/11.6 TBCTB, cuja sentença data de 03.06.2016 e que junta.

    Alega para o efeito, em suma, que ali foi definitivamente posto fim a vários litígios nos termos da sentença que junta e que dela decorre que a A (…) tem um crédito sobre a Massa Insolvente de 175.000,00€.

    Conforme referimos e resulta comprovado do processado no apenso B (reclamação de créditos do processo de insolvência), foi aí proferida decisão (já transitada em julgado) que conheceu, para além de outras, desta mesmíssima questão e que, depois de ouvido o Sr. Administrador de Insolvência e a comissão de credores, indeferiu a possibilidade de qualquer compensação destes mesmos créditos.

    Ora, é evidente que este quadro processual nos remete para um cenário não de caso julgado, atenta a inexistência da tríplice identidade característica daquele instituto, mas antes a autoridade de caso julgado.

    Veja-se que a questão ali apreciada foi incidental, no âmbito do apenso de reclamação de créditos, onde têm intervenção, para além da devedora e do Sr. Administrador de Insolvência, todo o universo de credores da insolvente, e que nestes embargos apensos à execução o núcleo dos sujeitos é mais restrito, uma vez que são partes apenas a Massa insolvente (representada pelo Sr. Administrador) e a ora executada, ali interveniente acidental.

    Como ensina a este respeito Miguel Teixeira de Sousa, “ Estudos sobre o Novo Código de Processo Civil ”, Lex, 2ª edição, 1997, pág. 572, também citado do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22.11.2016, referente ao processo nº 1677/15.8T8VNG.P1, disponível in www.dgsi.pt, e que acompanharemos a partir deste momento, o caso julgado realiza dois efeitos: - um efeito negativo (que decorre da exceção de caso julgado, antes caracterizada), que se traduz na insusceptibilidade de qualquer tribunal (mesmo, portanto, aquele que decidiu) se voltar a pronunciar sobre a decisão proferida, seja proferindo decisão oposta, seja repetindo a anterior; - um efeito positivo, que resulta da vinculação do tribunal que proferiu a decisão e, eventualmente, de outros tribunais ao que nela foi definido ou estabelecido.

    Em suma, o mesmo instituto do caso julgado produz dois efeitos distintos: um efeito negativo exercido através da exceção dilatória do caso julgado, a qual tem por fim evitar a repetição de causas idênticas, segundo o critério da identidade de partes; identidade de causa de pedir; identidade do pedido; um efeito positivo, através da autoridade de caso julgado, impondo a força vinculativa da decisão proferida ao próprio tribunal decisor ou a outro tribunal a quem se apresente a dita decisão anterior como questão prejudicial ou prévia face ao “thema decidendum” no processo posterior.

    Neste mesmo sentido, refere J. LEBRE de FREITAS, que “… pela excepção [de caso julgado] visa-se o efeito negativo da inadmissibilidade da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT