Acórdão nº 3307/16.1T8LRA.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução12 de Março de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

A (…) instaurou contra BANCO B (…), S.A. [anterior B (…), S.A.], acção declarativa, de condenação, com processo comum.

Pediu.

A condenação do réu a pagar-lhe a quantia de cento e cinquenta mil euros, acrescida dos juros vencidos e vincendos e, ainda, sete mil e quinhentos euros a título de danos não patrimoniais.

Subsidiáriamente impetrou: Ser declarado nulo o contrato de adesão que o réu invoque para ter aplicado os 150 mil euros que o autor lhe entregou em obrigações subordinadas S (…) 2006 por violação do dever de informação.

Alegou, em apertada síntese: Que subscreveu, a pedido do B (…), sem que tivesse sido informado da natureza e possíveis riscos, obrigações subordinadas S (…) 2006.

O réu contestou.

Disse, nuclearmente: O autor, desde logo pela sua qualidade de empregado bancário, conhecia a natureza do produto financeiro subscrito, o qual, à data da subscrição, era seguro, tendo sido esclarecido sobre o mesmo, bem sabendo que não era um depósito a prazo.

  1. Prosseguiu a acção os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido: Absolver o réu do pedido.

  2. Inconformado recorreu o autor.

    Rematando as suas alegações com as seguintes (aliás, prolixas) conclusões: A) Quanto à impugnação da douta decisão de facto: (…) Contra alegou o recorrido pugnando pela manutenção do decidido.

  3. Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª - Alteração da decisão sobre a matéria de facto.

    1. - Procedência da acção.

  4. Apreciando.

    5.1.

    5.1.1.

    No nosso ordenamento vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, e fixa a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido -artº607 nº5 do CPC.

    Perante o estatuído neste artigo, exige-se ao juiz que julgue conforme a convicção que a prova determinou e cujo carácter racional se deve exprimir na correspondente motivação – cfr. J. Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 3º, 3ªed. 2001, p.175.

    O princípio da prova livre significa a prova apreciada em inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada externamente; mas apreciada em conformidade racional com tal prova e com as regras da lógica e as máximas da experiência – cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 3ª ed. III, p.245.

    Acresce que há que ter em conta que as decisões judiciais não pretendem constituir verdades ou certezas absolutas.

    Pois que às mesmas não subjazem dogmas e, por via de regra, provas de todo irrefutáveis, não se regendo a produção e análise da prova por critérios e meras operações lógico-matemáticas.

    Assim: «a verdade judicial é uma verdade relativa, não só porque resultante de um juízo em si mesmo passível de erro, mas também porque assenta em prova, como a testemunhal, cuja falibilidade constitui um conhecido dado psico-sociológico» - Cfr. Ac. do STJ de 11.12.2003, p.03B3893 dgsi.pt.

    Acresce que a convicção do juiz é uma convicção pessoal, sendo construída, dialeticamente, para além dos dados objetivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, nela desempenhando uma função de relevo não só a atividade puramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis e mesmo puramente emocionais – AC. do STJ de 20.09.2004 dgsi.pt.

    Nesta conformidade - e como em qualquer atividade humana - existirá sempre na atuação jurisdicional uma margem de incerteza, aleatoriedade e erro.

    Mas tal é inelutável. O que importa é que se minimize o mais possível tal margem de erro.

    O que passa, como se viu, pela integração da decisão de facto dentro de parâmetros admissíveis em face da prova produzida, objetiva e sindicável, e pela interpretação e apreciação desta prova de acordo com as regras da lógica e da experiência comum.

    E tendo-se presente que a imediação e a oralidade dão um crédito de fiabilidade acrescido, já que por virtude delas entram, na formação da convicção do julgador, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova, e fatores que não são racionalmente demonstráveis.

    Sendo que estes princípios permitem ainda uma apreciação ética dos depoimentos - saber se quem depõe tem a consciência de que está a dizer a verdade– a qual não está ao alcance do tribunal ad quem - Acs. do STJ de 19.05.2005 e de 23-04-2009 dgsi.pt., p.

    09P0114.

    Nesta conformidade constitui jurisprudência sedimentada, que: «Quando o pedido de reapreciação da prova se baseie em elementos de características subjectivas, a respectiva sindicação tem de ser exercida com o máximo cuidado e só deve o tribunal de 2.ª instância alterar os factos incorporados em registos fonográficos quando efectivamente se convença, com base em elementos lógicos ou objectivos e com uma margem de segurança muito elevada, que houve errada decisão na 1.ª instância, por ser ilógica a resposta dada em face dos depoimentos prestados ou por ser formal ou materialmente impossível, por não ter qualquer suporte para ela.

    – Ac. do STJ de.20.05.2010, dgsi.pt p. 73/2002.S1.

    5.1.2.

    Finalmente, e como dimana do já supra referido, e como constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, o recorrente não pode limitar-se a invocar mais ou menos abstrata e genericamente, a prova que aduz em abono da alteração dos factos.

    A lei exige que os meios probatórios invocados imponham decisão (não basta que sugiram) diversa da recorrida.

    Ora tal imposição não pode advir, em termos mais ou menos apriorísticos, da sua, subjetiva, convicção sobre a prova.

    Porque, afinal, quem tem o poder/dever de apreciar/julgar é o juiz.

    Por conseguinte, para obter ganho de causa neste particular, deve ele efetivar uma análise concreta, discriminada, objetiva, crítica, logica e racional, do acervo probatório produzido, de sorte a convencer o tribunal ad quem da bondade da sua pretensão.

    A qual, como é outrossim comummente aceite, apenas pode proceder se se concluir que o julgador apreciou o acervo probatório com extrapolação manifesta dos cânones e das regras hermenêuticas, e para além da margem de álea em direito probatório permitida e que lhe é concedida.

    E só quando se concluir que a natureza e a força da prova produzida é de tal ordem e magnitude que inequivocamente contraria ou infirma tal convicção, se podem censurar as respostas dadas.

    – cfr. neste sentido, os Acs. da RC de 29-02-2012, p. nº1324/09.7TBMGR.C1, de 10-02-2015, p. 2466/11.4TBFIG.C1, de 03-03-2015, p. 1381/12.9TBGRD.C1 e de 17.05.2016, p.

    339/13.1TBSRT.C1; e do STJ de 15.09.2011, p. 1079/07.0TVPRT.P1.S1., todos in dgsi.pt; 5.1.3.

    No caso vertente pretende o autor que se dê como provado o teor das als. L) e d) dos factos não provados e como não provados os factos 25, 26 , 28 e 34 dos provados.

    Têm eles o seguinte teor: l – Os funcionários da rede de balcões do B (…) repetiam junto dos seus clientes, como a funcionária (…) o fez com o aqui Autor, que se tratava de um produto que representava um investimento seguro e, por isso, o próprio Banco B (…) assegurava o pagamento do reembolso do capital investido e o pagamento dos juros.” d) Não foi dito ao Autor que a referida aplicação se tratava de obrigações nem as suas características e que o Autor as desconhecia em absoluto.

  5. Nesta sequência, porque a S (…), S.A., detinha o Banco B (…), qualquer obrigação por si emitida é tendencialmente um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente, sendo este necessariamente, um garante da solvabilidade daquela, por ser o principal activo do seu património.

  6. O risco de um Depósito a Prazo seria semelhante a uma tal subscrição por o risco da S(…) ser indexado ao risco do próprio Banco.

  7. Acabando o seu incumprimento por ser determinado por circunstâncias completamente imprevisíveis e anormais, como uma nacionalização e a forma como essa nacionalização foi determinada, separando o Banco do restante grupo de empresas.

    34.

    A subscrição de Obrigações S (…) não foi sujeita a qualquer tipo de contrato de adesão, ou qualquer tipo de formulário de cláusulas contratuais gerais.

    Perscrutemos.

    Liminarmente há que dizer que a decisão sobre a matéria de facto não é um modelo – antes pelo contrário – no que concerne à sua fundamentação e à coerência e linearidade do acervo factual dado como provado e não provado.

    No atinente à fundamentação ela queda-se nos limites do admissível pois que, nomeadamente, não é efectivada por reporte a cada facto ou núcleo factual homogénio, como, no rigor dos princípios, é exigível -, mas antes, e inversamente, algo genericamente.

    Não obstante, e porque, com algum esforço e condescendência, a decisão factual ainda pode ser sindicada – quid essencial para aceitação de qualquer fundamentação – releva-se a imperfeição.

    No atinente à incoerência dos factos provados e não provados verifica-se que ela existe, assumindo, quiçá, inclusive, foros de contradição relativamente a alguns pontos dados como provados –em certos pontos - e não provados –em certas alíneas.

    Assim: «5. A referida funcionária do B (…) transmitiu ao Autor que o produto em causa era com capital 100% garantido, ou seja sem qualquer risco de perda deste» l) – Os funcionários da rede de balcões do B (…) repetiam junto dos seus clientes, como a funcionária A (...) o fez com o aqui Autor, que se tratava de um produto que representava um investimento seguro…» 7. Nesse momento não foi explicado ao Autor o que eram “obrigações” nem o que eram “obrigações subordinadas”.

    1. Que à altura da aquisição da referida aplicação ao Autor não foi explicada a natureza e características da aplicação, nomeadamente o que eram “Obrigações” e, concretamente “Obrigações S (…) 2006”.

    2. Que não foi dito ao Autor que a referida aplicação se tratava de obrigações nem as suas...

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