Acórdão nº 30/17.3T8FCR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. J (…) e marido D (…) instauraram a presente acção declarativa comum contra H (…) e mulher M (…) (1ºs Réus), L (…) e mulher A (…) (2ºs Réus) e E (…) (3ª Ré), pedindo que estes sejam condenados a reconhecer que é nula e de nenhum efeito a transacção efectuada no Processo de Inventário n.º 96/98, no qual: (1) Descrevem sob a verba n.º 4, um «Prédio urbano, correspondente à fracção A, rés-do-chão, com várias saídas para a via pública, destinando-se a fim industrial e comercial e composto de oficina, lavagem, pintura, chapeiro, bar, lavabos, vestiário, arrecadação, casa de máquinas e escritório, inscrito na respectiva matriz sob o artigo n.º 01 ( ...) e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 02 ( ...) , pertence à fracção com todo o logradouro do prédio, com a área de 812 m2.», adjudicado à A.; e (2) acordaram em subdividir esta fracção retirando-lhe a parte destinada a café e bar, parte que atribuíram aos 1ºs Réus.

Alegaram, em síntese: uma das verbas que lhes foi atribuída (denominada fracção “A”) e aos 1ºs Réus, na partilha, não pode ser alvo de subdivisão por já constituir uma fracção decorrente da constituição do imóvel em propriedade horizontal, nos termos do disposto no art.º 1422º-A, n.º 3, do Código Civil (CC); embora estivessem representados por mandatário, não tomaram conhecimento de que não foi respeitado e cumprido o formalismo legal, e só agora ficaram a saber da gravidade de omissões cometidas no processo de inventário, designadamente, que ninguém se pronunciou sobre a forma a dar à partilha, não foram definidos os valores das quotas disponível e indisponível, não foi proferido despacho determinando o modo como devia ser organizada a partilha, a secretaria não organizou o mapa da partilha, o qual, por isso mesmo, não foi rubricado pelo Juiz e não foi posto em reclamação, não foi proferida sentença a homologar a partilha constante do mapa; a interessada E ( ...) esteve afastada da referida transacção e dos seus direitos à herança, cujo valor se desconhece.

Os 1ºs Réus contestaram[1], por excepção e impugnação, referindo, além do mais, por um lado, que é possível com o acordo de todos os condóminos (AA. e Réus neste processo) alterar a constituição horizontal da dita “fracção A” e que o tribunal já se pronunciou definitivamente quanto à pretensão dos AA. por despacho de 04.10.2011 dos autos apensos de inventário, sendo que, por outro lado, não é verdade que os AA. só tenham tido conhecimento da tramitação processual do processo de inventário à data da propositura da presente acção, tendo os mesmos ali apresentado um requerimento com o mesmo teor da petição inicial (p. i.), sendo certo, ainda, que sempre teriam tido pessoal conhecimento da sentença homologatória da partilha em Outubro/2007, quando citados no âmbito de Acção Ordinária n.º 160/07.TBFCR contra eles instaurada. Concluíram pela improcedência da acção.

Os AA. responderam à matéria de excepção, concluindo como na p. i..

Por saneador-sentença de 12.9.2018 a acção foi julgada totalmente improcedente, absolvendo-se os Réus do pedido, por se considerar que não existe fundamento para julgar nula a transacção efectuada no Processo de Inventário n.º 96/1998.

Inconformados, os AA. apelaram formulando as seguintes conclusões: 1ª - O Tribunal julgou a acção totalmente improcedente, por entender que “não existe fundamento para julgar nula a transacção efectuada no processo de Inventário n.º 96/1998” - o Tribunal confunde, por um lado, a questão da nulidade da transacção efectuada entre as partes com a questão da nulidade da sentença que homologou essa mesma transacção e, por outro lado, a questão da tempestividade ou caducidade da dedução da presente acção com a falta de fundamento para julgar nula a transacção efectuada no Processo de Inventário n.º 96/1998.

2ª - Os AA. deduziram a presente de acção de declaração de nulidade da transacção, ao abrigo do disposto no art.º 291º, n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), por via da qual se pretende obter a declaração de nulidade ou a anulação da transacção - destina-se a atacar os efeitos negociais da transacção, enquanto contrato, pelo que a sentença que declare tal nulidade ou anulabilidade pode decretar os efeitos substantivos daí emergentes, destruindo os efeitos negociais dela emergentes, sendo certo que, por força de disposição legal expressa, o caso julgado anteriormente formado com a sentença que homologou a transacção não constitui obstáculo à produção desses efeitos.

3ª - A presente acção é tempestiva, ao abrigo do disposto no art.º 286º do CC.

4ª - A transacção efectuada que altera a constituição da propriedade horizontal traduz-se na divisão de uma fracção já existente em outras duas, pelo que era necessário “a aprovação de tal divisão pela entidade pública”, que é a Câmara Municipal, para que fosse certificada a autonomização e independências das novas fracções, atribuída a respectiva (nova) designação, estabelecidos os respectivos acessos, as respectivas áreas e o valor relativo a cada fracção, expresso em percentagem ou permilagem, do valor do prédio, resultantes da pretendida divisão, por forma a poderem ser, posteriormente, averbadas, tais alterações, no respectivo título, o que, não sucedeu, pois que, não podem os particulares substituir-se à Camara Municipal que é a entidade com competência para a verificação dos pressupostos da urbanização e da edificação e, com base num acordo de vontades e à sua revelia, criar imóveis, sujeitos a operações urbanísticas e, da mesma forma, substituir-se à Administração Fiscal que atesta a existência jurídica e física do prédio e a sua autonomização em relação ao prédio mãe.

5ª - A preterição de formalidades administrativas prévias sempre acarretaria a nulidade do referido acordo de alteração.

6ª - Deve a sentença recorrida ser revogada e declarada a nulidade da transacção efectuada, nos termos da qual, recorrentes e recorridos dividiram “ad hoc” a fracção autónoma designada pela “letra A”, com preterição de formalidades legais essenciais; a referida transacção é, ainda, nula por violação do procedimento legalmente previsto no art.º 1422-A, n.º 3 do CC, para a divisão de fracções, pois não constando qualquer autorização do título constitutivo da propriedade horizontal, para a divisão de fracções, a modificação do mesmo título só poderia ter sido efectuada mediante assembleia de condóminos, aprovada sem qualquer oposição e, no caso do autos, não foi.

7ª - A sentença recorrida violou o disposto nos art.ºs 291º do CPC e 286º, 289º, 1248º, 1415º, 1416º, 1418º, n.º 1, 1419º, n.º 1 e 1422-A, n.ºs 3, 4 e 5, do CC e as normas do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação e do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis.

Os Réus não responderam.

Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa conhecer e/ou reapreciar se a transacção efectuada nos autos de inventário padece de algum vício e as consequências daí decorrentes.

* II. 1. A 1ª instância deu como provados os...

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