Acórdão nº 287/17.0T8VIS-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelLUÍS CRAVO
Data da Resolução08 de Maio de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO M (…), residente em (…), (...) , veio por apenso aos autos de execução nº 287/17.0T8VIS deduzir embargos de executado contra o Exequente, “N (…)S.A.

”, com sede na (...) , (...) , pedindo que os presentes embargos sejam julgados procedentes por provados e, em consequência seja decretada a extinção da execução.

Para tanto, alega que, a livrança que serve de base à execução foi entregue à exequente em branco, sendo que, a mutuária “A. (…)” não efetuou o pagamento da prestação vencida em 14 de Fevereiro de 2007, nem qualquer outra prestação, sendo nessa data o valor do capital em divida de € 14.855,12. Ora, o preenchimento da livrança com data de vencimento em 09/12/2016, ou seja, nove anos depois do efetivo incumprimento não cabe no pacto de preenchimento assinado pela executada, o que determina a nulidade do titulo, tudo se passando como se o titulo não existisse.

* Os embargos foram recebidos, ordenando-se a notificação do exequente para contestar.

O exequente apresentou contestação, pedindo que os embargos sejam julgados improcedentes, por não provados.

* Elaborou-se despacho despacho saneador, onde foram aferidos pela positiva todos os pressupostos processuais relevantes, enunciado o objecto do litígio e os temas de prova, despacho esse que não foi objeto de reclamação.

Procedeu-se a audiência de julgamento, com observância do formalismo legal, conforme se alcança da respectiva ata.

* Na sentença, considerou-se, em suma, que se verificava, no vertente caso, um abuso no preenchimento da livrança (por violação do pacto de preenchimento), no que respeita à data do vencimento que nela foi aposta, pois que importava concluir, em face dos factos provados, que o banco embargado, no uso dos poderes que lhe foram concedidos, a deveria ter preenchido com uma data de vencimento reportada a 14 de Fevereiro de 2007, mas na medida em que estava igualmente provado que os juros calculados até 7 de Novembro de 2012 haviam sido liquidados com o produto da venda do imóvel da obrigada principal, os juros devidos (4%, de acordo com a Portaria nº 291/2003) só podiam ser contabilizados a partir dessa data, mais se concluindo que a execução podia prosseguir na parte não afetada, isto é, que a livrança era passível de ser aproveitada no tocante ao capital em divida aí englobado (€ 14.855,14), imposto de selo e selagem da livrança, calculados sobre o valor do capital (sendo que os juros devidos só podiam ser calculados a partir de 7 de Novembro de 2012), acrescendo que a igual conclusão importava chegar à luz do enquadramento através do abuso do direito (por a exequente haver injustificadamente demorado nove anos a proceder ao preenchimento da livrança que tinha na sua posse para ser preenchida aquando do incumprimento), donde também por esta vertente teria tal pedido que ser reduzido ao montante do capital na data do incumprimento (pois a executada vinculou-se ao seu pagamento), bem como aos juros de mora à taxa legal de 4% desde 7 de Novembro de 2012 (uma vez que os juros até essa data estão liquidados), termos em que se concluiu com o seguinte concreto “dispositivo”: «V- Decisão: Por tudo o exposto, e ao abrigo das disposições legais citadas, julgo parcialmente procedente por provados os presentes embargos de executado e, em consequência determino o prosseguimento da execução no tocante ao valor de € 14.855,12 (catorze mil, oitocentos e cinquenta e cinco euros e doze cêntimos), correspondente ao capital em divida, acrescido de juros desde 7 de novembro de 2012, à taxa legal de 4%, até integral pagamento, acrescida dos valores relativos a imposto de selo e selagem da livrança (calculados sobre o capital).

Custas dos embargos a cargo da executada e da exequente na proporção do decaimento, cuja responsabilidade se fixa em 70% para a executada/embargante e 30% para a exequente.

Notifique e registe.» * Inconformada, apresentou a Embargante recurso de apelação, que finalizou com as seguintes conclusões: (…) Apresentou a Exequente/Embargada contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: (…) * Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso[2] cumpre apreciar e decidir.

* 2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objeto do recurso delimitado pela Recorrente nas conclusões das suas alegações (arts. 635º, nº4 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608º, nº2, “in fine” do mesmo n.C.P.Civil), face ao que é possível detetar o seguinte: - nulidade da sentença [als. c) e d) do nº1 do art. 615º do n.C.P.Civil]; - impugnação da decisão sobre a matéria de facto, que levou ao incorreto julgamento de factos como “provados”, a saber, os factos constantes dos pontos “1)”, “10)” e “12)” [para os quais reclama uma redacção diversa, que enuncia]; - desacerto da decisão que julgou improcedentes os embargos, porquanto do preenchimento abusivo da livrança devia ter-se retirado necessariamente a invalidade do título, a qual igualmente decorria de não ser o mesmo determinável face ao respetivo pacto de preenchimento, acrescendo que da aplicação do abuso do direito se retirariam as mesmas conclusões? * 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 3.1 – Como ponto de partida, e tendo em vista o conhecimento dos factos, cumpre começar desde logo por enunciar o elenco factual que foi considerado fixado/provado pelo tribunal a quo, ao que se seguirá o elenco dos factos que o mesmo tribunal considerou/decidiu que “não se provou”, sem olvidar que tal enunciação terá um carácter “provisório”, na medida em que o recurso tem em vista a alteração parcial dessa factualidade. Tendo presente esta circunstância, consignou-se o seguinte na 1ª instância em termos de “factos provados”: «1-O exequente/embargado N (…), S.A, é portador de uma livrança, na qual consta como data de emissão o dia, como data de vencimento o dia, com o montante de € 21.690,56 (vinte e um mil, seiscentos e noventa euros e cinquenta e seis cêntimos), figurando como avalista a executada/embargante M (…) dando-se aqui por integralmente reproduzida a livrança constante de fls. 13 da execução a que os presentes autos se encontram apensos, a qual foi subscrita em branco pela executada/embargante e foi inteiramente preenchida pela exequente.

2- No dia 14 de fevereiro de 2001, foi celebrada escritura pública intitulada “Mútuo com Hipoteca”, no 1º Cartório Notarial de (...) , na qual intervieram como primeiro outorgante a sociedade comercial AA (…) e como segundo outorgante o Banco (…), S.A., pelo qual foi “ajustado (entre os outorgantes) um contrato de empréstimo de onze milhões de escudos (…) do qual se confessa devedora a partir de hoje”, conforme documento de fls. 25 a 31 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

3 – No âmbito da escritura aludida em 2) foi ainda declarado que “Para caução e garantia de todas as responsabilidades assumidas nos termos do presente contrato, juros e todas as demais despesas inerentes a mutuária constitui hipoteca sobre o seguinte imóvel: Fração autónoma designada pela letra E, correspondente a cave, destinada a armazém composto por um compartimento amplo do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na (...) , concelho de (...) , inscrito na matriz sob o artigo 1 (...) º e descrito na Conservatória do registo predial sob o n º 846”.

4 – A executada/embargante assinou pelo seu punho o documento datado de 14 de fevereiro de 2001, cuja cópia consta de fls. 32 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido intitulado “Autorização”, do qual consta que “Para garantia e segurança do cumprimento das obrigações decorrentes da operação de obras de beneficiação de espaço comercial que o Banco (…), S.A., nos concedeu no montante de PTE 11.000.000$ (onze milhões de escudos), à data do seu vencimento ou das suas eventuais prorrogações, compreendendo o saldo que for devido à data do reembolso, acrescido de comissões e juros contratuais e de mora, nós abaixo assinados, A.J. (…), L.da (…) junto remetemos uma livrança por nós subscrita e avalizada por J (…) e cônjuge M (…) (…) a favor do Banco (…), S.A., ficando este, desde já, pela presente, em caso de incumprimento das obrigações assumidas, autorizado a completar o preenchimento do titulo, quando o considerar oportuno, fixando o seu vencimento para a data que entender, e a prócer ao seu desconto, se nisso tiver interesse (…) ”.

5 - As obrigações emergentes do contrato aludido em 3) foram consideradas pela exequente/embargada definitivamente incumpridas em 14/02/2007.

6 – O bem imóvel aludido em 4) foi penhorado no âmbito do processo de execução fiscal n º 37005010299599 que correu termos no Serviço de Finanças de (...) .

7 – Tendo o embargado sido citado no âmbito do processo aludido em 6) reclamou em 28/03/2007 créditos no montante de € 16.228,11 (sendo € 16.014,37 referente a capital e € 213,74 relativo a juros vencidos calculados à taxa de 10,5% desde 14/02/2007), conforme documento de fls. 32 verso a 48 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

8 – Após a data aludida em 7) foram realizados pagamentos por conta da dívida: a) o montante de € 398,31 em 16/04/2007; b) o montante de € 392,24 em...

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