Acórdão nº 46310/18.1YIPR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelLUÍS CRAVO
Data da Resolução28 de Maio de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO JJ (…) apresentou requerimento de injunção contra P (…) solicitando o pagamento da quantia global de €7.172,47 por conta de dívida emergente de um contrato, acrescida de €389,97 a título de juros de mora, €100,00 por outras quantias e €102,00 de taxa de justiça.

* O réu opôs-se à injunção invocando que se desvinculou unilateralmente do contrato de mediação, que não se verificou integralmente a relação mediada, pois que o réu não beneficiou da atividade e o negócio visado pelo contrato não se realizou. Mais invocou que a cláusula 5.ª do contrato não foi objeto de prévia negociação, nem informado ao réu do seu teor, sendo que ela é igualmente abusiva e violadora da lei.

* Em virtude dessa oposição, os autos foram remetidos à distribuição como ação declarativa especial para cumprimento de obrigações de valor superior à alçada de 1.ª Instância.

* Em sede de audiência foi proferido despacho de aperfeiçoamento, convidando a autora a aperfeiçoar a sua petição inicial, tendo esta respondido ao convite, o que se traduziu na explicitação de que a pretensão do autor à remuneração deriva da violação do regime de exclusividade com que fora celebrado entre as partes o contrato de mediação imobiliária, sem prejuízo de que o réu, na imediata sequência da celebração do contrato de mediação, por intermédio da sociedade mediadora, subscreveu igualmente um contrato-promessa tendo por objeto, entre outros, o prédio identificado na cláusula 1.ª do contrato de mediação e pelo valor fixado na respectiva cláusula 2ª, donde, tendo a mediadora cumprido com a obrigação de meios a que se vinculou, consequentemente, teria direito à sua remuneração.

* Foi conferido o contraditório relativamente ao aperfeiçoamento efetivado.

* E, tendo sido apresentada no mesmo ato a prova pelas partes, oportunamente admitida para o efeito, prosseguiu-se com a audiência de julgamento, a qual foi realizada com observância das formalidades legais.

* Na sentença, considerou-se, em suma, que face à factualidade apurada, importava concluir no sentido de que a própria celebração do contrato promessa era facto gerador da remuneração da mediadora, dele decorrendo que a mesma cumpriu com a obrigação de meios a que se vinculou e, consequentemente, atribui a ela mediadora o direito à sua remuneração, sendo certo que se o réu poderia desistir do negócio, tal não obstava a que o direito da mediadora à remuneração se mantivesse intacto, posto que o negócio prometido, de compra e venda, apenas não se realizou porque o réu acordou em pôr fim ao negócio e pagar o final em dobro, isto é, o negócio visado no contrato não se concretizou por causa imputável ao cliente; em todo o caso, também à luz da cláusula de exclusividade importava concluir que o réu não cumpriu integralmente com os seus deveres contratuais, mais concretamente, porque o réu não poderia pôr fim ao contrato de mediação antes do seu aprazado termo, por declaração unilateral e imotivada como intentou fazer, pelo que, porque o contrato de mediação imobiliária em discussão nestes autos não havia cessado os seus efeitos quando o réu vendeu a fração, antes o réu se encontrava vinculado pelo mesmo, consequentemente, deve proceder ao pagamento da comissão acordada, correspondente à contraprestação contratualizada para o caso de celebração do contrato visado ou violação do princípio da exclusividade, de acordo com o disposto no art. 795º, nº2 do C. Civil, comissão essa acrescida de juros moratórios à taxa comercial, direitos esses que se transferiram validamente para o ora A., em consequência da cessão de créditos que foi operada, o que tudo se traduziu no seguinte concreto “dispositivo”: «VII. Decisão Nestes termos e nos demais de direito, decide-se julgar parcialmente procedente a ação e, consequentemente: A. Condenamos o Réu no pagamento ao Autor da quantia de €6.580,5 [seis mil quinhentos e oitenta euros e cinquenta cêntimos], acrescida dos juros de mora vencidos desde 13/6/2017 e vincendos até integral pagamento, à taxa legal para os juros comerciais sucessivamente em vigor.

  1. Absolver o réu do demais peticionado.

* Custas por autor e réu, em função do respetivo decaimento, que se fixa em 1,4% para o autor e 98,6% para o réu – n.ºs 1 e 2 do art. 527.º do Código de Processo Civil.

* Registe e notifique.

» * Inconformado com essa sentença, apresentou o Réu recurso de apelação contra a mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) * Não foram apresentadas quaisquer contra-alegações.

* A Exma. Juíza a quo sustentou a fls. 83-86 a não verificação das arguidas nulidades da sentença.

* Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

* 2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelo R. nas conclusões das suas alegações (arts. 635º, nº4, 636º, nº2 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608º, nº2, “in fine” do mesmo n.C.P.Civil), face ao que é possível detetar o seguinte: - nulidades da sentença [als. c) e d) do nº1 do art. 615º do n.C.P.Civil]; - erro na decisão da matéria de facto, a saber, quanto ao facto que foi dado como “provado” sob “6)”, mas que deve ser dado agora como “não provado”, pugnando ainda por que ambos os pontos dados por “não provados” [sob “a)” e “b)”], sejam dados por “provados”; - erro na determinação, interpretação e aplicação das normas de direito aplicáveis [designadamente, que há inconstitucionalidade (por violação do direito à livre disposição dos bens e propriedade privada) do entendimento segundo o qual é inadmissível a cessação de contrato de mediação imobiliária celebrado com cláusula de exclusividade mediante declaração unilateral e imotivada; que a entender-se diversamente, a mediadora apenas teria direito a ser indemnizada pela cessação do contrato, mas não teria direito à remuneração, por não ter desenvolvido quaisquer atos de promoção do imóvel após a revogação unilateral do contrato de mediação, que ela mediadora aceitou implicitamente, não havendo aplicação automática do valor da remuneração (violação da confiança e abuso do direito); que em último termo, devia ter havido redução equitativa e proporcional da comissão contratada, em virtude de o objecto negocial do contrato promessa de compra e venda ser mais vasto (para além do enriquecimento sem causa e da ausência de prova do enquadramento do IVA)] .

* 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 3.1 – Como ponto de partida, e tendo em vista o conhecimento dos factos, cumpre começar desde logo por enunciar o elenco factual que foi considerado fixado/provado pelo tribunal a quo, ao que se seguirá o elenco dos factos que o mesmo tribunal considerou/decidiu que “não se provou”, sem olvidar que tal enunciação terá um carácter “provisório”, na medida em que o recurso tem em vista a alteração parcial dessa factualidade. Tendo presente esta circunstância, consignou-se o seguinte na 1ª instância em termos de “Factos provados”: 1) A “H (…)Lda.” e J (…) subscreveram os documentos de fls. 35 a 38, cujo teor damos por integralmente reproduzido, intitulados “CESSÃO DE CRÉDITOS” e “TERMO DE AUTENTICAÇÃO”.

2) No documento de fls. 35 e sg., a “H (…)Lda.” surge na qualidade de cedente e designada por “Primeira Outorgante” e J (…) na qualidade de cessionário e designado de “Segundo Outorgante” e declararam, entre o mais, que: “[…] Em virtude de o Segundo Outorgante ser avalista do empréstimo bancário sob o n.º […] concedido pela C (…), S.A. à Primeira Outorgante […] e a título de compensação, este cede àquele, o qual declara aceitá-lo, o crédito do montante global de €6.580,50 [seis mil quinhentos e oitenta euros e cinquenta cêntimos], que tem sobre P (…) […], resultante da fatura n.º 69, emitida no dia 13/6/2017 e com vencimento no mesmo dia, no valor supra referenciado.

Segunda O crédito é cedido com os juros à taxa comercial, calculados ao abrigo do artigo 102.º, n.º 3 do Código Comercial que, desde a data do vencimento da fatura até à presente data, se cifram em €10,10 […]” 3) A “H (…), Lda.”, designada como “Mediadora” e o réu, designado como Segundo Contratante, na qualidade de proprietário, subscreveram documento, intitulado “contrato de mediação imobiliária”, cuja cópia consta de fls. 7 verso e 8, 16 e 17 e cujo teor damos por integralmente reproduzido, datado de 18/1/2017, no qual consta o seguinte: “Cláusula 1.ª (Identificação do Imóvel) O Segundo Contratante é proprietário e legítimo possuidor da fração autónoma/prédio (rústico/urbano)/ estabelecimento comercial, destinado(a) a habitação, sendo constituído por T-4 divisões assoalhadas, com uma área total de 209 m2, sito (…) (...) , descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) , sob a ficha n.º 3120, com a licença de construção/utilização n.º 4212008, emitida pela Câmara Municipal de (...) , em 27/5/2008 e inscrito na matriz predial (urbana/rústica) com o artigo n.º 2777 da Freguesia de (...) .

Cláusula 2.ª (Identificação do Negócio) 1 – A mediadora obriga-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra, pelo preço de 107.000,00 Euros (cento e sete mil euros), desenvolvendo para o efeito, ações de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e caraterísticas dos respetivos imóveis […] Cláusula 4.ª (Regime de Contratação) 1 – O Segundo Contratante contra a Mediadora em regime de Exclusividade.

2 – Nos termos da legislação aplicável, quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a Mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação durante o respetivo período de vigência, ficando o Segundo Contratante obrigado a pagar a comissão acordada caso viole a obrigação de exclusividade.

Cláusula 5.ª (Remuneração) 1 – A remuneração será devida se a Mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato e...

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