Acórdão nº 1313/18.0T8FIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Dezembro de 2019
Magistrado Responsável | JORGE MANUEL LOUREIRO |
Data da Resolução | 06 de Dezembro de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 6.ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório O autor propôs contra a ré a presente acção com a forma de processo comum e emergente de contrato de trabalho, tendo deduzido o pedido seguidamente transcrito: “Nestes termos e nos melhores de direito, deve a presente acção ser julgada procedente, por provada declarando-se a rescisão do contrato efectuada com justa causa e a R. condenada a pagar ao A. a quantia de 26.412,39€, acrescida dos juros moratórios à taxa legal a contar de 30.04.2018 e até integral pagamento.
”.
Como fundamento da sua pretensão alegou, em resumo, que tendo sido trabalhador subordinado da ré, resolveu, com justa causa subjectiva para o efeito, o contrato de trabalho, sendo que do contrato e da sua cessação emergiram para si os créditos melhor identificados e quantificados ao longo da petição inicial, os quais não foram satisfeitos pela ré.
Citada, a ré contestou, pugnando pela improcedência da acção, “… à exceção: - Do valor de €145,90 referente à diferença salarial na retribuição de férias, resultantes da inclusão na mesma dos valores médios recebidos pelo autor, a título de trabalho suplementar prestado em dias de descanso, respeitante ao ano de 2017.
”.
Alegou, em resumo, que o autor não é titular de qualquer dos créditos a que se arroga na petição, com excepção da diferença salarial na retribuição de férias de 2017 no valor de €145,90 que admite estar em dívida.
A acção prosseguiu os seus regulares termos, acabando por ser proferida sentença de cujo dispositivo consta, designadamente, o seguinte: “Pelos fundamentos expostos, julgo a presente ação parcialmente procedente e, em consequência: a) Condeno a R. “T..., S.A.” a pagar ao A. N... quantia a liquidar posteriormente e nunca podendo exceder os montantes peticionados a estes títulos pelo A., relativa aos dias de férias não gozadas pelo A. e à retribuição do trabalho prestado pelo A. ao serviço da R. de acordo com o instrumento de regulamentação coletiva do trabalho aplicável, excluindo o pagamento de descansos compensatórios e depois de descontados os montantes já pagos pela R., acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos desde 30/4/2018 e até efetivo e integral pagamento; b) Absolvo a R. “T..., S.A.” do demais peticionado pelo A. N...
”.
Inconformado com o assim decidido, apelou o autor, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas: “a) - O A. realizava, no estrangeiro, ao serviço da Ré e por determinação desta, como motorista TIR para que foi contratado, viagens entre a Bélgica onde a Ré tinha a sua base na cidade de Leuze e vários países europeus com excepção de Portugal, pelo que todo o tempo dos contratos, o primeiro de 04.08.2015 a 03.08.2016 e o segundo de 02.11.2016 a 31.12.2017, excluindo os dias que o A. passou em Portugal nos termos do disposto na Clª 4º nº4 de ambos os contratos se têm que considerar como dias passados no estrangeiro ao serviço da Ré.
b)- Se não se decidir assim, o A. que trabalhou sempre destacado no estrangeiro, acabava por ter menos direitos que os motoristas TIR, pois estes são considerados como passados ao serviço da Ré todos os dias, desde o dia da partida até ao da chegada a Portugal e ao chegarem a Portugal não podem legalmente sair para nova viagem sem descansarem tantos dias úteis quanto os domingos e feriados que passaram nessas viagens, no estrangeiro, acrescido de mais um dia ( 24 horas) antes da partida para a nova viagem.
c)- Ora como atento o regime de trabalho do A. no estrangeiro, não era possível determinar os descansos correspondentes aos fixados na Clª 20 nº3 do CCTV as partes ao fixarem na Clª 4 nº4 dos contratos o direito do A. vir a Portugal descansar 2 semanas, após 60 dias de trabalho, estavam a fixar aleatoriamente que naquelas 2 semanas estavam incluídos todos os descansos compensatórios a gozar pelo A. correspondentes aos 60 dias de trabalho, tanto mais que só se referiram a descansos e caso quisessem fixar férias teriam expressamente que o dizer, com a restrição que o A. ao chegar a Portugal não poderia começar a gozar férias sem primeiro gozar todos os descansos compensatórios a que tinha direito.
d)- Por tudo o já dito a este propósito, não tem qualquer fundamento a restrição do MMª Juiz de impedir o A. de reclamar o pagamento, em liquidação, das verbas relativas aos descansos compensatórios a que tinha direito, pelo que, neste sentido, deve eliminar-se da decisão, expressão “excluindo o pagamento de descansos compensatórios” por violar os direitos do A. plasmados na Clª 20 nº3 e 41 nº6 do C.C.T.V.
e)- O MMº Juiz não definiu se, juridicamente, os dias de descanso que o A. vinha gozar a Portugal de 60 em 60 dias eram descansos compensatórios ou eram férias, sendo que só com tal definição será possível liquidar, quer os descansos compensatórios quer as férias não gozadas.
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– O MMº Juiz não se pronunciou sobre o peticionado pelo A. a título de subsídio de férias nos arts. 26 e 38º da petição inicial onde pedia a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de 285,30, da qual deverá ser reconhecida.
g)- Uma vez que as partes acordaram nos contratos que o A. viria a Portugal gozar 2 semanas (ou 14 dias consecutivos) de descanso após cada período de 6 semanas de trabalho e tal só se poderá entender no sentido da Ré pretender dar a gozar ao A. os descansos compensatórios a que este tinha direito nos termos das Clªs 20, nº 3 e 41, nº 6 do CCTV, então sobre a Ré recaia a obrigação de suportar todas as despesas com essas deslocações desde a saída do A. da cidade belga de Leuze onde a Ré tinha a sua base até à povoação de Mira onde o A. tinha a sua residência em Portugal e regresso, e pagar todos os dias gastos nessas viagens como dias de trabalho, isto é, passados ao serviço da Ré no estrangeiro, incluindo as diárias e os acréscimos legais sempre que esses dias fossem de descanso.
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– O A. nas viagens realizadas em França tinha direito a que a remuneração horária mínima ilíquida fosse a vigente em França de 9,88€, quer por aplicação do disposto na Lei Macron dirigido à empresa Ré, quer emergente dum direito próprio do A. que lhe é conferido pelo disposto no art. 7º nº1 al. e) e nº2 al. a) , “ ex vi” do art.8º do C. do T., dado o A. se encontrar em França como trabalhador destacado.
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– A Ré deve ser condenada a pagar ao A. o total a liquidar previamente à execução relativo aos dias de descanso, (sábados, domingos e feriados) passados no estrangeiro ao serviço e por determinação da Ré e que são todos os respeitantes à duração dos contratos, dele excluindo apenas os dias que o A. descansou em Portugal em cumprimento do acordado na Clª 4 nº4 dos contratos individuais celebrados entre as partes.
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– Todos os fundamentos invocados como justa causa para a rescisão do contrato se verificaram pelo que dada a ilicitude da conduta da Ré, devia esta ter sido condenada a pagar ao A. a indemnização pedida a este título. ORA l) – Ao não condenar a Ré pela forma e no montante peticionado pelo A. na p.i. e atentos os fundamentos “supra” referidos, violou o MMº Juiz “a quo” o disposto na Clª 41 nº6 e 20 nº3 do C.C.T.V. no art. 7º nº1 al. e) e nº2 al. a), 127 nº3 e 194 nº4 do C. do T., Clª 47 nº6.
”.
A ré contra-alegou, pugnando pela improcedência da apelação.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido de que o recurso deve ser julgado improcedente.
Cumpre decidir.
II – Questões a resolver Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – NCPC – aplicável “ex-vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho – CPT), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: 1ª) se os factos dados como provados permitem reconhecer o autor como titular de um crédito pecuniário sobre a ré decorrente de descansos compensatórios que não foram concedidos ao autor pela ré e que lhe deveriam ter sido concedidos por trabalho prestado à ré, no estrangeiro, em sábados, domingos ou feriados; 2ª) se a sentença recorrida incorreu em qualquer vício ao decidir como decidiu em matéria de créditos por férias não gozadas; 3ª) se a sentença recorrida incorreu em qualquer vício ao decidir como decidiu em matéria de créditos por subsídio de férias; 4ª) se o autor tinha direito a que a ré lhe custeasse, por ocasião das suas deslocações entre a sua residência em Portugal e a sua base de trabalho em Leuze, para gozo de férias e descansos compensatórios, todas as despesas necessárias à concretização dessas deslocações, mesmo para lá das despesas com as viagens de avião entre Bruxelas e Porto que a ré suportou; 5ª) se o autor logrou provar os factos constitutivos do direito de crédito a que se arrogou na petição inicial e referente à retribuição correspondente a sábados, domingos e feriados em que o autor se terá deslocado entre a Bélgica e Portugal e vice-versa com a finalidade de gozar em Portugal descansos compensatórios; 6ª) se a ré deveria ter sido condenada a pagar ao autor as quantias a cujo direito se arrogou na petição inicial e referente às “diárias” relativas aos dias das viagens “Portugal/Bélgica”; 7ª) se a ré deveria ter sido condenada a pagar ao autor as quantias a cujo direito se arrogou na petição inicial com fundamento em aplicação da denominada “Lei Macron”; 8ª) se deve ser introduzido qualquer esclarecimento no dispositivo da sentença recorrida referente ao crédito do autor por trabalho prestado no estrangeiro aos sábados, domingos e feriados; 9ª) se assistia ao autor o direito a resolver, com justa causa subjectiva para o efeito, o contrato de trabalho entre ele e a ré.
III – Fundamentação A) De facto Factos provados O tribunal recorrido descreveu como provados os factos seguidamente transcritos: “1º A R. dedica-se ao Transportes Público Rodoviário de Mercadorias. (Artigo 1º...
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