Acórdão nº 6985/18.3T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Setembro de 2019
Magistrado Responsável | FONTE RAMOS |
Data da Resolução | 17 de Setembro de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.
Em 20.9.2018, P (…) instaurou a presente acção especial de interdição por anomalia psíquica de A (…), seu pai, nascido a 12.10.1945, viúvo, institucionalizado na D (…), sita em (...) .
Solicitou a sua nomeação como tutor e indicou as pessoas para composição do Conselho de Família.
Por decisão de 04.10.2018, foi decretada a interdição provisória do requerido e nomeado o requerente para exercer as funções de tutor provisório.
Anunciou-se a propositura da acção nos termos do art.º 892º do Código de Processo Civil (CPC) e citou-se o requerido, conforme os art.ºs 21º, n.º 1 e 893º, do mesmo diploma.
O M.º Público, em representação do requerido, contestou a acção pedindo que seja julgada conforme for de direito e requereu o prosseguimento dos autos com a produção da prova preliminar nos termos do disposto no art.º 896º do CPC, para além da realização de perícia médico-legal e da diligência de interrogatório previstas nos art.º 897º e 898º do CPC.
Em consequência da entrada em vigor da Lei n.º 49/2018, de 14.8, no dia 13.02.2019 procedeu-se à audição pessoal e directa do beneficiário e à realização do respectivo exame pericial.
O requerente e o M.º Público pugnaram pela aplicação ao beneficiário da medida de acompanhamento de representação geral, tendo o M.º Público promovido ainda que «(…) face à entrada em vigor do Regime Jurídico do Maior Acompanhado, aplicável aos processo pendentes, (…) o Requerente seja notificado para aperfeiçoar o requerimento inicial apresentado, de acordo com os novos requisitos legais previstos no artigo 892º do CPC, bem como para juntar aos autos documento comprovativo da autorização do beneficiário para requerer o acompanhamento ou requerer o seu suprimento (cf. artigo 141º do CC)» (sic).
[1] Por decisão de 10.4.2019, o Tribunal a quo indeferiu aquele requerimento[2] e, ao abrigo do disposto no art.º 901º do CPC, - Decretou o regime de acompanhamento de A (…) com a aplicação da medida de representação geral - art.º 145º, n.º 2, alínea b) do CC (Código Civil) (1); - Nomeou como acompanhante do beneficiário o seu filho, P (…)ao qual fixou uma periodicidade de visitas quinzenal - art.º 146º, n.º 2 do mesmo Código (2); - Nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 145º, n.º 4, dispensou a constituição do conselho de família (3); - Fixado o início da patologia em 13.9.2018, considerou a medida conveniente desde essa data - art.º 900º, n.º 1 do CPC (4), a rever no prazo de 5 (cinco) anos - art.º 155º do CC (5).
Inconformado, o M.º Público apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - A presente acção especial de interdição por anomalia psíquica de A (…)foi instaurada, no dia 20.9.2018, pelo seu filho, P (…).
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- No decurso da mesma, entrou em vigor a Lei n.º 49/2018, de 14.8, a qual nos termos do disposto no art.º 26º, n.º 1 é aplicável aos processos pendentes.
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- Face ao novo Regime Jurídico (do Maior Acompanhado), a legitimidade para requerer o acompanhamento passou a ser do maior impossibilitado ou mediante a sua autorização, do cônjuge, do unido de facto, de qualquer parente sucessível ou, independentemente de autorização, do M.º Público (cf. art.º 141º do CC).
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- Quando o maior impossibilitado não possa requerer o seu acompanhamento, a sua autorização pode, no entanto, ser suprida, devendo o pedido de suprimento da autorização do beneficiário ser cumulado com o pedido de acompanhamento, tal como dispõe o citado preceito nos n.ºs 2 e 3. O que, in casu, não se verificou.
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- Pese embora a promoção do M.º Público, no sentido do Requerente ser convidado a aperfeiçoar o requerimento inicial apresentado, de acordo com os novos requisitos legais, visando-se, além do mais, a questão da falta de legitimidade do Requerente, a Mm.ª Juiz a quo, em despacho prévio à prolação da sentença, explanou que “a referida lei não tem efeito retroactivo, sendo aplicável apenas a actos futuros em processos pendentes, de harmonia com a regra da adequação formal”.
“Concretamente, em relação ao consentimento do beneficiário para o processo de acompanhamento, ou ao respectivo suprimento, entendo que o mesmo não é exigível, porquanto não o era, à data da instauração da presente acção”.
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- Alicerçada neste entendimento, sustentou a Mm.ª Juiz na decisão ora em crise que “as partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas”.
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- Todavia, constituindo, actualmente, a autorização do acompanhando um dos requisitos da legitimidade do Requerente (art.º 141º, n.º 1 do CC), a sua falta, desacompanhada do pedido de suprimento da autorização do beneficiário, leva à ilegitimidade do Requerente, configurando a excepção dilatória a que alude o art.º 577º, al. e) do CPC, pelo que, não tendo havido um aperfeiçoamento do requerimento inicial, a sentença proferida viola o disposto nos citados preceitos, ao considerar o Requerente parte legítima.
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- Por outro lado, atenta a actual redacção do art.º 900º, n.º 3 do CPC, “a sentença que decretar as medidas de acompanhamento deverá referir expressamente a existência de testamento vital ou de procuração para cuidados de saúde e de acautelar o respeito pela vontade antecipadamente expressa pelo acompanhado”.
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- Contudo, relativamente a tal aspecto, nada é referido na decisão proferida, não se vislumbrado qualquer menção quanto à existência ou inexistência testamento vital ou de procuração para cuidados de saúde.
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- Tal referência assume, hodiernamente, especial relevância, porquanto se trata de uma manifestação da vontade do Acompanhado, acolhendo o referido na Proposta de Lei do Governo n.º 110/XIII (que se converteu na citada Lei n.º 49/2018, de 14.8) que visa, além do mais, “a primazia da autonomia da pessoa, cuja vontade deve ser respeitada e aproveitada até ao limite do possível”.
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- Pelo que a sentença proferida é nula, nos termos do disposto no art.º 615º, n.º 1, alínea d), do CPC, porque omissa, quanto à existência de tais instrumentos, não obstante o disposto no art.º 900º, n.º 3 do CPC.
Remata dizendo que deve revogar-se a sentença recorrida, a fim de, primeiramente, se diligenciar, além do mais, pelo suprimento da autorização do acompanhado e após proferir sentença que se pronuncie, também, pela existência de testamento vital e de procuração para cuidados de saúde, nos termos ´supra` expostos! O requerente não respondeu.
Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa reapreciar, principalmente, se, face à entrada em vigor da Lei n.º 49/2018, de 14.8 (em 10.02.2019), era ainda exigido o suprimento da autorização do acompanhado e se a sentença devia pronunciar-se expressamente pela existência de testamento vital e de procuração para cuidados de saúde.
* II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:[3] 1) O Requerente é filho do Beneficiário.
[4] 2) O Beneficiário nasceu em 12.10.1945 e é viúvo.
3) O Beneficiário...
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