Acórdão nº 12/14.7TBMGL.1.C1. de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelEMÍDIO SANTOS
Data da Resolução17 de Setembro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra M (…), Lda, instaurou execução para pagamento de quantia certa contra A (…), Lda, com base na decisão que homologou o plano de recuperação tendente à revitalização da executada.

A execução foi instaurada por apenso ao processo especial de revitalização que correu termos no juízo de comércio (juiz 1) do tribunal judicial da comarca de Viseu.

O Meritíssimo juiz do tribunal a quo indeferiu liminarmente o requerimento executivo.

A exequente não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação contra a decisão de indeferimento liminar do requerimento executivo, pedindo a revogação e a substituição da decisão recorrida por outra que admitisse a sentença homologatória do plano de revitalização como título executivo.

Os fundamentos do recurso foram, em resumo, na imputação à sentença recorrida da violação dos artigos 130.º, 703.º, n.º 1, alínea a) e 621.º, todos do CPC, bem como os artigos 17.º-A, n.º 1, e 215.º, ex vi 17.º-F, n.º 3, ambos do CIRE, os artigos 233.º, n.º 1, alínea c) e 218.º, n.º 1, alínea a), ambos do CIRE e artigos 9.º e 10.º, n.º 2, do Código Civil.

Não houve resposta ao recurso.

* Questões suscitadas pelo recurso Saber se a decisão recorrida, ao indeferir liminarmente o requerimento executivo por falta de título executivo, violou as normas indicadas pela recorrente.

* Os factos relevantes para a resposta ao recurso são os seguintes: 1. No âmbito do processo especial de revitalização instaurado pela sociedade A (…), Lda, que correu ternos sob o n.º 12/14.7TBMGL no tribunal judicial de Mangualde foi proferida decisão a homologar o plano de recuperação aprovado pelos credores.

  1. A decisão transitou em julgado em 17 de Junho de 2014.

  2. No referido processo, o administrador judicial provisório reconheceu à ora exequente um crédito comum de fornecedor no montante de € 17 472,14, 4. O plano de recuperação previa em relação aos credores comuns o perdão de 40% da dívida, o período de carência de um ano (após o trânsito em julgado da sentença de homologação do plano) e a amortização da dívida (capital) em 8 anos (12,50% ao ano) em pagamentos semestrais (após o trânsito em julgado da sentença de homologação do plano) e o perdão de juros vencidos e outros encargos.

  3. Sob a alegação de que que, até à data da instauração da execução, a devedora pagou apenas € 655,12, a ora exequente instaurou execução contra a devedora para pagamento do capital ainda em dívida, no montante de € 16 816,93, e juros de mora no montante de € 3 129,33.

    * Passemos à resolução da questão suscitada pelo recurso.

    Antes de mais deve dizer-se que a questão de saber se a sentença homologatória do plano de recuperação em processo especial de revitalização constitui título executivo tem obtido respostas negativas por parte dos tribunais.

    Assim: os dois acórdãos citados pela recorrente - acórdão do tribunal da Relação de Guimarães proferido em 21-01-2016, no processo n.º 1963/14.4TBCL.1.G1. bem como o acórdão do tribunal da Relação do Porto proferido em 19-03-2018, no processo n.º 121/14.2TBAMT.P1 - decidiram que a decisão homologatória do plano de recuperação proferido em processo especial de revitalização constituía título executivo.

    Decidiram em sentido contrário o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido em 9 de Abril de 2019, no processo n.º 154/17.7T8ALD.C1.S2. publicado em www.dgsi.pt. e acórdão do tribunal da Relação de Coimbra proferido em 12-07-2017, no processo n.º 3528/15.4T8CBR, publicado em www.dgsi.pt.

    De seguida, cabe dizer que não tem sentido imputar à decisão recorrida a violação de seguintes normas indicadas pela recorrente: artigos 130.º, 621.º e 703.º, n.º 1, alínea d), do CPC, e os artigos 17.º-A, n.º 1 e 215.º, 233.º, n.º 1, alínea c) e 218.º, n.º 1, alínea a), e os artigos 9.º e 10.º, n.º 2, do Código Civil. Com efeito resulta da cominação das alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 639.º do CPC que só tem sentido imputar à decisão recorrida a violação das normas que tenham constituído fundamento jurídico do que foi decidido e, no caso, as normas atrás indicadas não constituíam fundamento da decisão de indeferir liminarmente o requerimento executivo. As normas citadas pela decisão sob recurso para justificar o decidido foram a da alínea a) do n.º 1 do artigo 703.º do CPC e da alínea a) do n.º 2 do artigo 726.º do mesmo diploma. A norma da alínea a) do n.º 1 do artigo 703.º do CPC foi invocada para dizer que a decisão homologatória do plano de recuperação não constituía sentença condenatória para efeitos de tal norma. A alínea a) do n.º 2 do artigo 726.º do mesmo diploma – segundo a qual o juiz indefere liminarmente o requerimento executivo quando seja manifesta a falta ou insuficiência do título executivo – foi invocada para justificar o indeferimento liminar.

    Mesmo que se entenda que o que a recorrente quis significar, ao alegar que a decisão violou as citadas normas, foi que resultava delas que a decisão que homologa o plano de recuperação está em condições de servir de base à execução contra a devedora para pagamento de um crédito reconhecido no processo especial de revitalização – e parece que é nestas águas que navega a recorrente – ainda assim o recurso é de julgar improcedente.

    Pelas razões a seguir expostas, entendemos que a decisão que homologa um plano de recuperação em processo especial de revitalização não cabe em nenhuma das espécies de títulos executivos previstas no artigo 703.º do CPC. Vejamos.

    Visto que toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam os fins e os limites da acção executiva (n.º 5.º do artigo 10.º do CPC) e que à execução apenas podem servir de base as espécies de títulos executivos previstas no artigo 703.º do CPC, a resposta à questão de saber se a decisão sob recurso errou ao indeferir liminarmente o requerimento executivo com o fundamento de que a sentença que servia de base à execução não era título executivo passa necessariamente por responder à questão de saber se tal decisão homologatória cabe nalguma das espécies de títulos executivos previstos no n.º 1 do artigo 703.º do CPC.

    A recorrente sustenta que a sentença que homologa o plano de recuperação em processo especial de revitalização cabe na espécie prevista na alínea a) “sentenças condenatórias” e que se assim se não entender, cabe na espécie prevista na alínea d), ou seja, nos documentos a que, por disposição especial - alínea c) do n.º 1 do artigo 233.º do CIRE - for atribuída força executiva.

    A recorrente sustenta que a decisão que homologa um plano de recuperação em processo especial de revitalização cabe na “sentenças condenatórias” [alínea a) do n.º 1 do artigo 703.º com base na seguinte linha argumentativa: 1. Que não obstante a sentença homologatória do plano de revitalização apenas fiscalizar a validade do acordo que se firmou entre as partes em contenda, no caso entre a devedora e a credora, a força vinculativa que tipicamente se atribui à decisão judicial mantém-se intocada, porquanto ainda que de tais sentenças homologatórias não brote uma condenação tout court, delas resulta pelo menos uma condenação implícita, sendo quanto basta para revestir a natureza de título executivo, assim tendo sido decidido no acórdão do tribunal da Relação de Lisboa de 15-10-2013, proferido no âmbito do processo n.º 3462/11.7TCLRS-A-L1-7; no acórdão do tribunal da Relação do Porto proferido em 19-03-2018, no processo n.º 121/14.2TBAMT.P1 e no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 21-01-2016, no processo n.º 1963/14.4TBCL.1.G1.

  4. Que o artigo 215.º do CIRE aplicável ao plano de revitalização ex vi artigo 17.º-F, n.º 3 do mesmo diploma, vem reforçar o carácter transaccional que se pretende atribuir ao acordo de revitalização firmado...

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