Acórdão nº 674/19.9T8LRA.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelVÍTOR AMARAL
Data da Resolução26 de Janeiro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: *** I – Relatório W (…) e marido, P (…), com os sinais dos autos, intentaram ação declarativa que prossegue os seus termos sob a forma de processo comum ([1]) contra 1.º - Município de Ó(…) e 2.º - “Banco (…) S. A.

”, estes também com os sinais dos autos, alegando por modo a concluir pela procedência da ação e, assim, peticionando que seja declarada a prescrição de três hipotecas – que melhor identificaram, incidentes sobre um imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Ó(…) – e o respetivo cancelamento, as quais oneram um prédio adquirido pelos AA. em 24/07/2012, sendo as duas primeiras a favor do Banco R. e a terceira a favor do R. Município, designadamente, por estarem consolidadas, há mais de dez anos, as obrigações que visavam garantir e por decurso do prazo de 20 anos, contado a partir do registo da primeira aquisição do imóvel a favor de um terceiro ([2]).

Citados os RR., veio o Município de Ó(…):

  1. Formular contestação, impugnando diversa factualidade alegada pela contraparte e pugnando pela contagem do prazo de prescrição de vinte anos apenas a partir da data de aquisição pelo terceiro adquirente que invoque a respetiva exceção ([3]), no caso, os AA., que adquiriram em 24/07/2012, assim concluindo pela improcedência do pedido destes; b) Deduzir reconvenção, pretendendo manifestar, junto dos AA., a sua intenção de exercer o direito garantido pela hipoteca a seu favor, devendo, por isso, considerar-se interrompido o prazo de prescrição daquela hipoteca, termos em que pediu, na via reconvencional, que seja declarada, relativamente aos AA., a interrupção do prazo prescricional respetivo.

    Em réplica, os AA. vieram pugnar pela improcedência do pedido reconvencional e pela procedência da ação, reiterando a argumentação expendida na petição inicial.

    Os AA. vieram desistir do pedido quanto ao R. “Banco (…) S. A.”, desistência essa que foi homologada por sentença.

    Dispensada, sem oposição das partes, a audiência prévia, na perspetiva do conhecimento de meritis, e admitida a reconvenção, foi proferido saneador-sentença, com o seguinte dispositivo: «I. Julga-se a presente ação procedente quanto ao pedido dirigido contra o réu Município de Ó(…) e declara-se a extinção, por prescrição, da hipoteca voluntária, a favor dele, que incide sobre o prédio urbano sito no (…) freguesia de (…), concelho de Ó(…), descrito na Conservatória do Registo Predial de Ó(…) sob o nº 8(…)/19911118 e inscrito na matriz sob o artigo 1(…), registada pela inscrição resultante da AP. 23 de 1987/04/29, mais se determinando o respetivo cancelamento.

    1. Julga-se improcedente o pedido reconvencional do identificado réu, dele absolvendo os autores.» (cfr. fls. 155 e v.º do processo físico).

    Inconformado com o assim decidido, vem o R. Município interpor o presente recurso, apresentando alegação respetiva e as seguintes Conclusões ([4]) (…) Contra-alegou a parte recorrida, pugnando pela improcedência da impugnação e decorrente manutenção da decisão sob recurso.

    * O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo então sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foi mantido tal regime e efeito fixados. Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir, à luz do Código de Processo Civil em vigor (doravante, NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 ([5]).

    * II – Âmbito do Recurso Sendo o objeto dos recursos delimitado pelas respetivas conclusões, pressuposto o objeto do processo delimitado nos articulados das partes, está em causa na presente apelação saber ([6]):

  2. Se ocorre insuficiência da matéria de facto dada como provada, implicando aditamento fáctico com base em prova documental (conclusões 21 e 28); b) Se o Tribunal a quo errou na interpretação da norma jurídica do art.º 730.º, al.ª b), do CCiv. (conclusões 8 a 20); c) Se deve ter-se por verificada causa interruptiva da prescrição – assunção/reconhecimento (conclusão 39); d) Se os AA./Apelados incorreram em exercício abusivo do direito (conclusões 32 e 40).

    * III – Fundamentação

    1. Da necessidade de aditamento fáctico, com alteração da decisão da matéria de facto Como visto, invoca o Apelante ocorrer insuficiência da materialidade fáctica dada como provada, pugnando, por isso, por um aditamento fáctico, fundando-se em prova documental junta aos autos (conclusões 21 e 28), matéria que cabe começar por apreciar.

    É o seguinte o facto considerado em falta: «Através da escritura pública de compra e venda outorgada em 24/07/2012, os autores declararam conhecer a hipoteca a favor do R. Município, declararam comprar com tal hipoteca em vigor e convencionaram o seu cancelamento ulterior a realizar nos termos clausulados nessa escritura.».

    Sustenta-se o Recorrente, no plano probatório, no «DOC. Nº 3 junto com a Petição Inicial», tratando-se, assim, do documento de fls. 21 a 25 do processo físico, referente a escritura pública de “COMPRA E VENDA”, datada de 24/07/2012, a que também alude o ponto 4 dos factos dados como provados.

    Ali os AA. declararam, como segundos outorgantes (compradores), que “aceitam a presente venda nos termos exarados”, o que fizeram após a primeira outorgante (declarante vendedora) ter declarado vender-lhes, através de tal escritura, «livre de ónus ou encargos, o prédio urbano (…)», sobre o qual «incidem três hipotecas, duas a favor da U (…), E.P., registadas pelas inscrições resultantes das Ap. 3 de 1986/09/24 (de 3443/3550 avos) e Ap. 4 de 1987/05/07, e uma a favor do MUNICÍPIO DE Ó(…), registada pela inscrição resultante da Ap. 23 de 1987/04/29 (doravante também designadas abreviadamente e em conjunto por “HIPOTECAS”), cujo cancelamento declara encontrar-se assegurado», tendo ainda declarado que «se obriga a diligenciar pelo cancelamento das HIPOTECAS até ao dia trinta e um de Dezembro de dois mil e doze, sem prejuízo de, sendo necessário recorrer à via judicial, o referido prazo poder ser alargado pelo prazo necessário para a conclusão do respectivo procedimento judicial (…)» e, bem assim, que, «caso o cancelamento das HIPOTECAS não ocorra até ao dia trinta e um de Dezembro de dois mil e doze ou, no caso de a PRIMEIRA OUTORGANTE recorrer à via judicial para o cancelamento das HIPOTECAS, as mesmas não estejam canceladas no prazo máximo de cinco anos após a propositura da respectiva acção judicial, os SEGUNDOS OUTORGANTES têm direito a fazer sua a totalidade da quantia que se encontre depositada, nessa data, na Conta 1, ficando os SEGUNDOS OUTORGANTES, desde já, pela presente escritura, autorizados a solicitar ao Banco indicado a transferência daquele montante para uma conta titulada por qualquer um dos SEGUNDOS OUTORGANTES, sem que o banco ou a PRIMEIRA OUTORGANTE se possam opor a essa transferência», tal como que «será responsável por quaisquer custos, seja de que natureza forem, que seja necessário incorrer com o cancelamento das HIPOTECAS e respectivo registo, bem como manterá os SEGUNDOS OUTORGANTES indemnes de quaisquer danos e/ou prejuízos que possam decorrer da existência das HIPOTECAS, incluindo, mas não se limitando a, à sua execução pelos respectivos beneficiários» e ainda que «se obriga a informar os SEGUNDOS OUTORGANTES, mensalmente, das diligências efectuadas, a cada momento, tendo em vista o cancelamento das HIPOTECAS».

    Ora, nada obstando a que esta factualidade, provada documentalmente (por via de...

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