Acórdão nº 3886/18.9T8CBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelVÍTOR AMARAL
Data da Resolução12 de Janeiro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO Por apenso aos autos de execução que o “B (…), S. A.

”, com os sinais dos autos, intentou contra I (…) e marido, A (…) também com os sinais dos autos, veio a Executada I (…) deduzir oposição a tal execução (mediante embargos de executado), concluindo pela procedência da oposição e consequente extinção da execução.

Alegou, para tanto, em síntese: - a falta de personalidade e capacidade judiciária do Executado marido, por ter falecido em 13/10/2014 – anteriormente à instauração da execução –, não podendo, por isso, os autos prosseguir contra aquele; - ter a Executada/Embargante e marido convencionado com o Exequente, no âmbito do documento complementar anexo ao título – contrato de mútuo com hipoteca –, no sentido de se obrigarem a contratar um seguro de vida, enquanto mutuários, sendo beneficiário o banco mutuante, com cobertura de eventos de falecimento ou invalidez absoluta e definitiva das pessoas seguras (os mutuários), pelo valor do empréstimo e a vigorar até à data do pagamento deste; - tendo ainda ficado convencionado poder o banco credor (aqui Exequente) alterar ou anular os respetivos seguros, pagar por conta dos mutuários os respetivos prémios, debitando-os na conta de depósitos à ordem daqueles, e, em seu nome, receber as indemnizações em caso de sinistro; - por isso, o falecido subscreveu, em vida, junto da “R (…) S. A.”, um seguro de vida, em que o Exequente figura como tomador do seguro e beneficiário irrevogável e o falecido como pessoa segura, com obrigação de pagamento de prémio, com transferência para tal segurador da responsabilidade de amortização do capital mutuado de € 32.470,00 ao Exequente, em caso de morte ou invalidez absoluta e definitiva; - o ocorrido falecimento foi logo participado ao segurador, o qual solicitou que fossem enviados diversos documentos, o que lhe foi satisfeito, salvo quanto ao relatório do médico assistente por os CHUC se recusarem a emiti-lo, do que tudo foi dado conhecimento também ao Exequente; - todavia, o segurador nunca indemnizou o passivo bancário dos Executados ao Exequente e este último deduziu a execução que corre no processo principal; - cabe, assim, ao Exequente reclamar do segurador o pagamento do capital mutuado ainda em dívida, ante a existência de seguro de grupo contributivo, devendo o banco mutuante/credor, como parte no contrato de seguro, solicitar ao segurador o cumprimento das obrigações derivadas desse contrato; - encontrando-se, pois, a Embargante desvinculada da obrigação exequenda.

Recebidos os embargos, contestou o Exequente/Embargado: - impugnando diversa factualidade alegada pela contraparte; - defendendo a improcedência da deduzida exceção de falta de personalidade e capacidade judiciária do Executado marido, por ter já sido julgado procedente o incidente de habilitação dos respetivos herdeiros (a Executada/Embargante e o filho do falecido, de nome A (…)), razão pela qual foi ordenado o prosseguimento da execução; - esgrimindo que, constituída hipoteca para garantia das obrigações dos mutuários, estes não cumpriram quanto à prestação vencida em 14/08/2014, pelo que, goradas as diligências extrajudiciais, o banco credor resolveu o contrato de mútuo em 30/11/2017, para o que enviou cartas à Embargante; - não tendo sido regularizado o incumprimento, restava ao credor instaurar ação executiva, como foi feito; - não foi entregue ao segurador toda a documentação por este solicitada para efeitos de acionamento do seguro e subsequente resgate do prémio para liquidação do montante em dívida, designadamente, certificado de óbito, relatório do médico assistente, relatório da autópsia, cópia do cartão de cidadão da pessoa segura e dos herdeiros e certidão de habilitação de herdeiros, sendo que incumbe aos herdeiros proceder à entrega de tais documentos, nos termos contratados; - o pagamento pelo segurador está sempre condicionado à não verificação de qualquer das causas de exclusão da responsabilidade, não tendo de ser o Embargado, que desconhece se o segurador pagará a quantia segura, a levar a cabo as diligências necessárias à respetiva liquidação; - o contrato de seguro não consubstancia um contrato a favor de terceiro, que fosse enquadrável no regime previsto nos art.ºs 443.º e seg. do CCiv., não podendo o banco credor ser prejudicado pela falta de documentação referida, no que não tem responsabilidade, mas encontrando-se impedido de reclamar o pagamento ao segurador, pelo que pugnou pela total improcedência dos embargos.

Dispensada a audiência prévia – as partes declararam prescindir da sua realização –, foi proferido saneador-sentença, com conhecimento de meritis e o seguinte dispositivo (na parte relevante): «Pelo exposto, o Tribunal decide: 1) Declarar extinta a Acção Executiva de que os presentes autos constituem incidente declarativo processado por apenso por inexigibilidade da dívida exequenda.

2) Ordenar o levantamento/cancelamento/restituição de toda e qualquer penhora efectuada na Acção Executiva de que os presentes autos constituem incidente declarativo processado por apenso.

3) Fixar o valor dos Embargos de Executado em € 34.415,48.» (destaques retirados).

Inconformado, o Exequente/Embargado apelou do assim decidido, apresentando alegação recursiva, onde formula as seguintes Conclusões ([1]): (…) A Recorrida contra-alegou, pronunciando-se pela total improcedência do recurso.

Este foi admitido como de apelação, com o regime e efeito fixados no processo ([2]), tendo então sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foi mantido tal regime e efeito fixados. Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito da apelação, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objeto dos recursos delimitado pelas respetivas conclusões, pressuposto o objeto do processo fixado nos articulados das partes – como é consabido, são as conclusões da parte recorrente que definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([3]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil em vigor (doravante, NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 ([4]) –, está em causa na presente apelação saber: a) Se foi deduzida eficaz impugnação da decisão da matéria de facto e, em caso afirmativo, se deve proceder; b) Em matéria de direito, se ocorre, ou não, inexigibilidade da dívida exequenda, com exercício abusivo do direito do credor, mediante excesso manifesto face aos limites impostos pelo princípio da boa-fé.

III – FUNDAMENTAÇÃO A) Matéria de facto Na 1.ª instância foi considerada – apenas – a seguinte factualidade como provada: «1.

A Exequente/Embargada “B (…) S. A.” intentou, a 15-05-2018, a Acção Executiva n.º 3886/18.9T8CBR de que os presentes autos constituem incidente declarativo processado por apenso, contra os Executados: I (…) e cônjuge, A (…) [Ref.4180921⊂15-05-2018⊂Execução].

  1. Com o requerimento executivo (RE), a Exequente/Embargada apresentou à execução, como título executivo, um documento do qual resultam os seguintes factos: As Partes celebraram um contrato, a 14-07-2011, que denominaram de mútuo com hipoteca; Por esse contrato, a Exequente/Embargada emprestou onerosamente aos mutuários, pelo prazo de 275 meses, a quantia de € 32.470,00; Em garantia de pagamento, a Executada hipotecou a favor da Exequente/Embargada o seu direito de propriedade sobre dois imóveis; Mais acordaram os sujeitos [Cláusula Décima Oitava (SEGUROS)] que: 2. Os mutuários obrigam-se a contratar um seguro de vida de que a mutuante seja beneficiária, em caso de falecimento ou invalidez absoluta e definitiva das pessoas seguras, pelo valor total do empréstimo e que vigorará até à data do pagamento deste.

  2. A mutuante poderá alterar ou anular os referidos seguros...

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