Acórdão nº 2047/18.1T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelEMÍDIO SANTOS
Data da Resolução25 de Janeiro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Sumário: I - O n.º 3 do artigo 410.º do Código das Sociedades Comerciais não exclui a hipótese de serem os próprios administradores a preverem a reunião em datas prefixadas ou uma forma de convocação não escrita.

II – Não é condição de validade das deliberações tomadas na assembleia sobre o relatório de gestão e as contas do exercício que, aquando da publicação da convocatória da assembleia anual para apreciação dessas matérias, tais documentos estejam na posse do presidente da mesa da assembleia geral.

III - É anulável a deliberação que aprova a nomeação de membros de órgãos sociais, na hipótese de, nos 15 dias anteriores à data da assembleia geral em que teve lugar a sua nomeação, não ter sido facultada à consulta dos accionistas os nomes das pessoas propostas, as suas qualificações profissionais, a indicação das actividades profissionais exercidas nos últimos anos, designadamente no que respeita a funções exercidas noutras empresas ou na própria sociedade, e do número de acções da sociedade de que são titulares.

IV- No caso de a sociedade ter sítio na Internet, os documentos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 289.º do CSC devem também aí estar disponíveis durante os 15 dias anteriores à data da assembleia geral.

V- A não divulgação deles no respectivo sítio na Internet não configura violação do direito à informação preparatória da assembleia geral, pois o que a lei prevê, em tal hipótese, é a faculdade de qualquer accionista requerer o seu envio, através de correio electrónico, o que a sociedade deverá cumprir no prazo de oito dias.

VI- E assim o que, na realidade, é susceptível de configurar a violação do direito à informação preparatória da assembleia geral é a recusa de envio dos documentos através de correio electrónico, no prazo estabelecido na lei.

VII- O vogal suplente de um conselho de administração, que nunca exerceu efectivamente funções de administração, não tem nem o dever nem o direito de estar presente nas assembleias gerais de accionistas, ainda que um dos assuntos da assembleia seja a destituição dele do conselho de administração.

VIII – A deliberação, tomada na assembleia geral reunida para deliberar sobre o relatório de gestão e as contas do exercício e sobre a apreciação geral da sociedade, que não autoriza a presença nela de um administrador que tinha o direito de aí estar presente, é anulável se puser em causa a participação livre e informada dos accionistas na deliberação sobre as matérias a debater.

IX- A inexistência de justa causa não é motivo de invalidade da deliberação da assembleia geral que destitui qualquer membro do conselho de administração.

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra M (…), residente (…), e C (…) Lda, com sede na rua(…), propuseram a presente acção declarativa com processo comum contra Casa de Saúde (…) S.A, com sede (…), pedindo se anulassem as deliberações adoptadas na Assembleia Geral da sociedade ré, realizada em 26.03.2018, isto é, a deliberação de renovação, com eficácia retroactiva, das deliberações adoptadas na AG de 9.02.2018 (destituição de todos os membros que integravam o anterior Conselho de Administração, nomeado para o triénio 2016-2018, e eleição de um novo Conselho de Administração, para completar o triénio em causa), deliberação adoptada ao abrigo do ponto 1 da respectiva ordem de trabalhos e, ainda, as deliberações adoptadas ao abrigo dos pontos 2, 2A e 3 da mesma ordem de trabalhos, reconhecendo-se a invalidade de todas essas deliberações, tudo com as legais consequências.

Para o efeito alegaram: 1. Que são accionistas da ré; 2. Que no dia 9 de Fevereiro de 2018 teve lugar uma assembleia geral extraordinária da ré na qual foi aprovada, com os votos a favor da accionista P (…) SA e os votos contra dos autores, a destituição de todos os membros que integravam o actual conselho de administração da ré e a eleição de um novo conselho de administração para completar o triénio de 2016 a 2018, 3. Que as deliberações eram inválidas; 4. Que eles, autores, requereram a suspensão de tais deliberações, correndo o respectivo procedimento no TJ da Comarca de Viseu com o 87/18.0T8VIS; 5. Que, no dia 26 de Março de 2018, teve lugar a assembleia geral anual da sociedade com a seguinte ordem de trabalhos: 1) Renovação, com eficácia retroactiva, das deliberações tomadas na assembleia geral extraordinária realizada em 9 de Fevereiro de 2018; 2) Deliberar sobre o relatório de gestão contas do exercício de 2017; 3) Deliberar sobre a proposta e aplicação dos resultados; 4) Proceder à apreciação da administração e fiscalização da sociedade; 5) Proceder à eleição do único da sociedade; 6. Que nessa assembleia foi aprovada por maioria a renovação com eficácia retroactiva das deliberações tomadas na AG. Extraordinária de 9 de Fevereiro de 2018 com os votos contra dos autores; 7. Que nessa mesma assembleia foram aprovados por maioria o relatório e gestão e as contas do exercício 2017, com os votos contra dos autores 8. Que foi ainda aprovada por maioria a proposta de aplicação dos resultados com abstenção dos autores; 9. Que por iniciativa de A (…), na qualidade de presidente do conselho de administração a ré e legal representante a accionista P (…) – SGPS foi aditado à ordem de trabalhos da assembleia o seguinte ponto: “apreciação da invalidade e eventual ratificação o contrato de empreitada para a ampliação e remodelação da Casa de Saúde (…) celebrado em de Maio de 201 entre a E (…) SA e a Casa de Saúde (…) SA, o qual foi aprovado no sentido da validação ou ratificação do contrato de empreitada, com os votos a favor da accionista P (…)– SGPSSA e com a abstenção dos autores; 10. Que a deliberação sobre o relatório de gestão e as contas do exercício de 2017, a deliberação sobre a proposta de aplicação dos resultados, a deliberação sobre a validação e ratificação do contrato de empreitada e a deliberação de renovação com eficácia retroactiva das deliberações tomadas na assembleia de 9 de Fevereiro de 2018 são ilegais; 11. Que a assembleia geral anual foi convocada por iniciativa exclusiva do presidente da mesa da assembleia geral, sem precedência de intervenção do conselho de administração; 12. Que, aquando da convocação da assembleia geral anual, o CA não disponibilizou ao presidente da mesa da assembleia geral os elementos documentais de suporte às matérias a submeter à apreciação dos assuntos, designadamente as contas da sociedade; 13. Que a convocatória da assembleia para deliberar sobre a renovação das deliberações tomadas em 9 de Fevereiro de 2018 é ambígua; 14. Que não foi disponibilizada aos autores informação sobre o currículo das novas administradoras nos 15 dias anteriores à assembleia; 15. Que o administrador suplente (…) foi impedido de participar na assembleia geral e depois de votada a renovação das deliberações tomadas em 9 de Fevereiro de 2018 o administrador J (…) foi impedido de permanecer na assembleia; 16. Que as deliberações eram abusivas.

A ré contestou, pedindo a improcedência da acção. Para o efeito impugnou os factos articulados pelos autores.

No decurso da audiência – sessão de 10 de Dezembro de 2019 – o Meritíssimo juiz do tribunal a quo notificou a ré para juntar aos autos o pedido de convocatória do conselho de administração relativo à sua assembleia geral de 26-03-2018 e os documentos que compunham o dossiê/pasta relativos à convocatória da assembleia, com excepção dos documentos contabilísticos relativos às contas do exercício.

Dando cumprimento ao que fora determinado, a ré juntou aos autos cópia do pedido de convocatória da Assembleia Geral; cópia da convocatória, cópia dos comprovativos de pagamento da publicação da convocatória no Portal do Ministério da Justiça, cópia dos nomes a propor para o Conselho de Administração e cópia do Quadro-Resumo dos Órgãos Sociais.

Notificados da junção dos documentos, os autores arguiram a falsidade do documento relativo ao pedido de convocação da assembleia geral e do documento intitulado “Nomes a propor para integrarem o conselho de administração e demais informações a que alude a alínea d) do artigo 289.º do Código das Sociedades Comerciais”.

Pediram ainda a condenação da ré como litigante de má-fé. Após a realização da audiência foi proferida sentença que julgou improcedentes o incidente de falsidade e a acção e, em consequência, absolveu a ré Casa de Saúde (…), S.A. dos pedidos e, bem assim, do pedido de condenação como litigante de má-fé formulado pelos autores. Os autores não se conformaram com a sentença e interpuseram o presente recurso de apelação, pedindo se revogasse e se substituísse a sentença recorrida por decisão que julgasse verificada a anulabilidade das deliberações adoptadas pela AG de 26.03.2018.

Os fundamentos do recurso expostos nas conclusões consistiram, em resumo, na seguinte alegação: 1. Que o tribunal a quo errou na decisão de julgar provados os factos enunciados sob os pontos número 18, 21, 22, 28, 29, 36, 37, 38, 44, 45 e 59 dos fundamentos da sentença e na decisão de julgar não provadas as alegações enunciadas sob as alíneas a), b), c), d) e), f), g), h), i), j), q), r), s), t), u), v) e w); 2. Que o tribunal a quo entendeu não se mostrar verificado o vício na iniciativa da convocação da assembleia geral, incluindo quanto à renovação das deliberações adotadas na AG de 9.02.2018, mas que – e já com as pertinentes alterações e explicações formuladas em sede de impugnação do julgamento de facto ut supra, - a matéria de facto dada como provada não permite confirmar a conclusão explanada pelo tribunal a quo na decisão ora posta em crise; 3. Que o que emergia da prova carreada aos autos era que, aquando da publicação da convocatória para a realização da AG de 26.03.2018, não tinha o CA reunido para promover a sua convocação, como nunca veio a reunir para esse facto e, por conseguinte, aquela AG foi convocada pelo presidente da mesa, sem a precedência da intervenção do conselho de administração; 4. Que compulsado o livro de actas do CA...

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