Acórdão nº 4158/17.1T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

L... instaurou contra J... ação declarativa, de condenação, com processo comum.

Pediu: 1) A condenação do réu a reconhecer que o prédio identificado no artigo 42º da petição é propriedade do dissolvido casal de Autora e Réu, ou que é propriedade de Autora e Réu na proporção de metade; 2) Em consequência ordenada a atualização e retificação da descrição matricial e da descrição predial do mesmo prédio, nos termos alegados nos artigos 78, 79º, 81º e 82º da petição.

A título subsidiário, caso improceda o primeiro pedido: 3) A reconhecer que foram realizadas obras que constituem benfeitorias necessárias, pois tiveram como finalidade evitar a perda, destruição ou deterioração do imóvel; 4) A reconhecer que foram realizadas benfeitorias úteis que lhe aumentaram e aumentam o valor; 5) A reconhecer que tais benfeitorias necessárias e úteis foram realizadas por Autora e Réu de boa fé, de comum acordo, tendo cada um suportado metade do seu custo; 6) A reconhecer que tais benfeitorias não podem ser retiradas do citado prédio sob pena da sua destruição ou perecimento; 7) A pagar à Autora a quantia de 100.000,00€ (cem mil euros), a título de indemnização correspondente a metade do valor das benfeitorias, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação.

Alegou em síntese: A autora e réu, na constância do casamento, ergueram em conjunto a casa de morada de família, com o dinheiro proveniente dos ambos os progenitores do casal, tendo realizado obras de melhoramento pagas com dinheiro ganho pela força de trabalho de ambos.

O réu contestou.

Impugnou a factualidade alegada na PI, alegando que a casa foi totalmente construída no terreno herdado da família do pai, que posteriormente lhe foi adjudicado em partilhas, tendo as obras sido custeadas exclusivamente com dinheiro dos seus pais.

E que as obras de melhoramento foram custeadas exclusivamente com recurso aos seus rendimentos de trabalho e ainda a produto da venda de bens próprios.

Pediu: A improcedência da ação e, em consequência, a absolvição do pedido.

  1. Prosseguiu o processo os seus termos, tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido: «Pelo exposto, ao abrigo das disposições legais supra citadas, decide este Tribunal julgar a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência: I – Condenar o réu a pagar à autora quantia no valor de €48.302,94 (quarenta e oito mil trezentos e dois euros e noventa e quatro cêntimos), correspondentes à sua parte, por benfeitorias úteis não passíveis de levantamento implantadas no prédio melhor descrito em 5), acrescido de juros civis, à taxa legal de 4% desde a prolacção da presente sentença até integral pagamento; II – Absolver o réu do demais pedido; III – Condenar autora e o réu nas custas da ação, na proporção respectiva de 51,70% e 48,30%;» 3.

    Inconformado recorreu o réu.

    Rematando a s suas alegações com as seguintes conclusões: ...

    w).Assim sendo, o valor do benefício ao tempo da entrega da coisa não poderá ser superior a €20.000,00 e nunca nos valores fixados pela Douta Sentença, que conseguiu arbitrar ao valor da metade, valor superior ao valor de mercado do prédio no seu todo.

    a.a). A douta sentença recorrida violou, assim, o disposto no no nº 5 do artigo 607º, 608º, do Código de Processo Civil e artigos 479º e 1273º do Código Civil.

    Contra alegou a autora pugnando pela manutenção do decidido.

  2. Sendo que, por via de regra: artºs 635º, nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª - Alteração da decisão sobre a matéria de facto.

    1. – Improcedência da ação.

  3. Apreciando.

    5.1.

    Primeira questão.

    5.1.1.

    No nosso ordenamento vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção, segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, e fixa a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido -artº 607º, nº 5 do CPC.

    Perante o estatuído neste artigo exige-se ao juiz que julgue conforme a convicção que a prova determinou e cujo carácter racional se deve exprimir na correspondente motivação – cfr. J. Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 3º, 3ªed. 2001, p.175.

    O princípio da prova livre significa a prova apreciada em inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada externamente; mas apreciada em conformidade racional com tal prova e com as regras da lógica e as máximas da experiência – cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 3ª ed. III, p.245.

    Acresce que há que ter em conta que as decisões judiciais não pretendem constituir verdades ou certezas absolutas.

    Pois que às mesmas não subjazem dogmas e, por via de regra, provas de todo irrefutáveis, não se regendo a produção e análise da prova por critérios e meras operações lógico-matemáticas.

    Assim: «a verdade judicial é uma verdade relativa, não só porque resultante de um juízo em si mesmo passível de erro, mas também porque assenta em prova, como a testemunhal, cuja falibilidade constitui um conhecido dado psico-sociológico» - Cfr. Ac. do STJ de 11.12.2003, p.03B3893 dgsi.pt.

    Nesta conformidade - e como em qualquer atividade humana - existirá sempre na atuação jurisdicional uma margem de incerteza, aleatoriedade e erro.

    Mas tal é inelutável. O que importa é que se minimize o mais possível tal margem de erro.

    O que passa, como se viu, pela integração da decisão de facto dentro de parâmetros admissíveis em face da prova produzida, objetiva e sindicável, e pela interpretação e apreciação desta prova de acordo com as regras da lógica e da experiência comum.

    Finalmente, e como dimana do já supra referido, e como constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, o recorrente não pode limitar-se a invocar mais ou menos abstrata e genericamente, a prova que...

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