Acórdão nº 459/20.0T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelLUÍS CRAVO
Data da Resolução11 de Maio de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] 1 – RELATÓRIO R...

, com residência na Rua ..., propôs a presente ação especial de prestação de contas, contra J...

, com residência na Rua ..., pedindo que o Réu preste contas da sua administração sobre os bens do seu falecido pai, com todas as consequências legais.

Para tanto alegou, em síntese, que: - Autor e Réu são irmãos.

- São filhos e únicos descendentes de M..., falecida no estado civil de casada, em 13 de outubro de 2004, e de J..., falecido no estado civil de viúvo, em 17 de agosto de 2016.

- por ocasião do óbito de M..., correu termos no então Cartório Notarial de ..., o processo de inventário aberto por óbito da mãe do Autor e do Réu, sob o n.º ...

- Nesse processo de inventário, no dia 3 de junho de 2016 teve lugar a conferência de interessados, na qual estiveram presentes autor e réu, este último intervindo por si e como procurador do pai, J..., - No referido dia 3 de junho de 2016, Autor e Réu lograram obter acordo quanto à partilha por óbito da sua mãe, pelo que, determinados os quinhões de cada um dos interessados, o Autor pagou tornas ao Réu, por si e na qualidade de procurador de seu pai, no valor de, respetivamente, €7.500,00 e €30.000,00; - Nesse mesmo dia e na referida diligência, Autor e Réu decidiram excluir da partilha por óbito de sua mãe, algumas verbas dos bens relacionados, designadamente, as verbas nos um, dois e três que, sumariamente, se referiam a depósitos bancários existentes à data do óbito da falecida mãe destes.

- Por ocasião dessa mesma exclusão, que refletia um valor de cerca de €23.000,00, firmaram um acordo, titulado, “Acordo de Vontades”, através do qual o Réu admitia receber, por conta do processo de inventário n.º 1472/15, a quantia de € 23.000,00 (vinte e três mil euros), a qual se destinava a “fazer face às despesas tidas com o seu progenitor”, ficando o A. desobrigado, a partir da data da outorga do referido acordo, de contribuir, a que título fosse, de prestar alimentos ao pai até se esgotar a referida quantia da qual o Réu ficou, a par dos já aludidos €30.000,00, fiel depositário.

- entre a data da conferência de interessados realizada a 3 de junho de 2016 e o falecimento do pai do Autor e Réu decorreram 75 dias.

- está pendente processo de inventário por óbito de J..., atualmente a correr termos no Cartório Notarial de ..., sob o processo n.º ....

- O Réu, notificado para prestar as declarações de Cabeça de Casal e Compromisso de Honra, o que teve lugar em 19 de dezembro de 2016, disse, expressamente que, por morte do seu pai, inexistiam quaisquer bens a partilhar.

- J... esteve, nesse período, aos cuidados do Réu que terá dado ao dinheiro destino que se desconhece, - em sede do processo de inventário n.º ... o Réu afirmou que fez seu dinheiro que recebeu por conta e no interesse de seu pai.

- o falecido pai do Autor e Réu auferia uma pensão de reforma por velhice cujo valor se desconhece por ora.

- Pretende, assim, o Autor que o Réu discrimine nos presentes autos, através de conta corrente, as contas referentes aos bens pertença da herança aberta por óbito de J..., desde o dia 3 de junho de 2016, data em que recebeu a quantia de € 53.000,00, por conta e no interesse de seu pai J....

- Uma vez que o Réu, administrando bens alheios – do dia 3 de julho de 2016 até ao dia da morte de seu pai, em 17 de agosto de 2016, e depois disso, como cabeça de casal em Cabeça de Casal é obrigado a prestar contas, quer como administrador de bens alheios, quer como cabeça de casal, tudo conforme o disposto no artigo 2093.º, n.º 1 do Código Civil, pretendendo o Requerente que aquele preste contas da sua administração.

* Regularmente citado, o R. contestou, invocando, além do mais, a exceção de erro na forma de processo, considerando a pendência de inventário notarial, que impõe que o interessado que pretenda a prestação de contas pelo cabeça de casal terá de o requerer como incidente no processo de inventário notarial.

Respondeu o A., pugnando pela inexistência de erro na forma do processo e pela obrigação do R. prestar contas.

Quanto ao erro na forma do processo, invocou que: encontra-se suspenso no Cartório Notarial a cargo da Sr.ª Dr.ª ... o processo de inventário n.º ..., em que o aqui autor assume a posição de requerente/interessado e o réu a de cabeça de casal; por decisão de 23 de março de 2019 proferida no âmbito do processo de inventário n.º ..., a Sr.ª Notária absteve-se de decidir o incidente da reclamação apresentada pelo autor, remetendo as partes para os meios judiciais comuns, e determinado a suspensão do processo de inventário até que ocorra decisão judicial sobre a existência ou não de bens a partilhar; o aqui autor propôs, por apenso ao referido processo de inventário, a devida ação de prestação de contas; por decisão de 14 de junho de 2019, a Sr.ª Notária indeferiu liminarmente a ação de prestação de contas, com fundamento na incompetência absoluta do Cartório Notarial para tramitar a ação de prestação de contas – artigos 576.º, n.º 1, artigo 577.º, alínea a) e artigo 96.º, n.º 1 do Código de Processo Civil e artigos 3.º e 45.º do RJPI; o art. 947.º do Cód. do Proc. Civil dispõe que “As contas a prestar por representantes legais de incapazes, pelo cabeça de casal e por administrador ou depositário judicialmente nomeados são prestadas por dependência do processo em que a nomeação haja sido feita”; a norma acabada de citar deve ser entendida apenas relativamente à dependência dos processos de inventário que ainda corressem em Tribunal à data da entrada em vigor do novo Cód. do Proc. Civil, pois que nos inventários a correr nos Cartórios, ao notário não foi atribuída essa competência para a tramitação da ação de prestação de contas, pois, os Cartórios Notariais apenas têm competência para tramitar o incidente do artigo 45.º e não a ação judicial de prestação de contas prevista e regulamentada nos artigos 941.º e seguintes do Código de Processo Civil.

Quanto à contestação da obrigação de prestar contas, invocou o A. que o próprio Réu não enjeita ter recebido, por conta e no interesse de seu pai, as tornas que o Autor lhe pagou no âmbito do processo de inventário n.º ..., no dia 3 de junho de 2016, por si e na qualidade de procurador do seu pai, no valor de, respetivamente, €7.500,00 e €30.000,00; tal pagamento foi efetuado por meio de cheque com o n.º ... sacado sobre o Banco B..., no valor de €37.500,00, entregue em mão ao R.; o próprio Réu confessa que o pai esteve acamado um largo período antes de falecer (cfr. art. 20.º da contestação); é por demais evidente que o dinheiro que o A. lhe entregou e que pertencia ao pai de ambos, no valor de €30.000,00, não podia ter sido por este gasto; se o pai do autor e réu não tinha conta bancária à data do falecimento, o réu terá de esclarecer em que conta bancária depositou o cheque n.º ... sacado sobre o Banco B..., no valor de €37.500,00 que lhe foi entregue, comprovar o destino que deu à quantia de €30.000,00 que pertencia ao seu pai e ainda, informar como é que procedia ao levantamento/depósito/movimento da pensão de aposentação do seu falecido pai; quanto à verba de €23.000,00, o Réu diz que nunca a recebeu, sem prejuízo de, por documento particular de 3 de junho de 2016, cujas assinaturas do Autor e do Réu foram notarialmente...

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