Acórdão nº 178/19.0T8MBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelISAÍAS PÁDUA
Data da Resolução18 de Maio de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório 1. A autora, E..., casada no regime de separação de bens com J..., instaurou (em 21/03/2019) contra os réus, Herança aberta por óbito de J... (aqui representada pelos seus herdeiros: (

  1. M..., viúva e cabeça de casal; b) M... e marido J..., casados no regime de comunhão geral de bens, e c) S...

    casado, no regime comunhão de adquiridos, com sua mulher M..., casado – adiante também designados por 1ª. Ré ou 1ºs. Réus - e J...

    e sua mulher M... - casados no regime de comunhão de adquiridos – (adiante também designados por 2ºs. Réus), todos com os demais sinais dos autos, a presente ação declarativa, sob forma de processo comum, pedindo no final que os réus sejam condenados a: a)- Reconhecer-se à A. o direito de preferir na compra do prédio rústico identificado no artº. 5º da p.i., e substituir-se aos 2ºs. RR na escritura de compra e venda desse prédio e a que se reporta a escritura pública junta como doc. 7.

    b)- Que os mesmos 2ºs. RR sejam condenados a entregarem o referido prédio à A. no estado em que se encontra.

    c)- Que se ordene o cancelamento de qualquer eventual registo desse prédio a favor dos 2ºs. RR., que os próprios ou quaisquer terceiros hajam feito ou venham a fazer lavrar a seu favor, antes ou depois da data de entrada da presente ação em juízo.

    Para o efeito, em síntese, alegou o seguinte: Ser por proprietária dos prédios rústicos inscritos na respetiva matriz sob os artigos ..., cuja natureza e características ali melhora ali descreve, com uma área global de 1.500 m2, que atualmente se encontram juntos e que fornam uma unidade agrícola.

    Por seu turno a 1ª. ré (herança) é proprietária do prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo ..., com a área real de 762 m2 - e não de 3.000 m2, como erradamente consta da matriz - que confronta com os prédios da autora.

    Apesar dessa confrontação, a autora veio, porém, a saber que os representantes da 1ª. R. venderam (por escritura pública realizada em 24/08/2018) aquele seu prédio aos 2ºs. RR. sem que lhe tenham dado, todavia, conhecimento dessa venda e muito menos dos elementos básicos da mesma.

    Após ter tomado conhecimento dessa venda e dos seus elementos essenciais, instaurou a presente ação.

    1.2 Na sequência dessa alegação, por requerimento (referencia nº...) remetido eletronicamente ao tribunal em 31/03/2019, a autora veio a juntar aos autos documento comprovativo de ter efetuado (em 25/03/2019) o depósito do respetivo preço declarado na escritura (€12.000,00).

    1. Apenas os 2ºs. RR. contestaram a ação, defenderam-se por impugnação.

      E nessa sua defesa alegaram, em síntese, serem proprietários do prédio urbano, que melhor identificam no artº. 6º do seu articulado.

      Dada a pequena área (1.200 m2) desse seu prédio, apenas decidiram comprar o aludido prédio pertença da 1ª. R. com a única intenção de alargar aquele seu, de forma a construírem neste um anexo de apoio àquela sua casa, nomeadamente construindo nele uma cozinha, uma zona de lazer, um canil e um compartimento para instalarem uma máquina de aquecimento central (como os representantes da 1ª. R. bem sabiam).

      E daí que, verificando-se a exceção prevista na 2ª. parte da al. a) do artº. 1381º do Cód. Civil, não assiste à autora o direito de preferir na sobredita venda.

      Todavia, por mera cautela, e para o caso de assim não se vir a entender, deduziram reconvenção, pedindo, por via dela, que a A. seja condenada a pagar-lhes (para além do preço, depositado pela A., que despenderam na compra do prédio) as quantias de €462,93 (respeitante à quantia que despenderam com a outorga da escritura e o respetivo registo), de €600,00 (respeitante ao montante que pagaram de IMT) e €96,00 (respeitante ao imposto de selo que também pagaram), no total de € 1.158,93.

      Pelo que terminaram por pedir a improcedência da ação com a sua absolvição do pedido, e, apenas no caso de a ação proceder, a procedência da reconvenção com a condenação da autora a pagar-lhes a quantia total de €1.158,93 (respeitante ao somatório daquelas quantias parcelares supra referidas que despenderam).

    2. Replicou a autora, impugnando e contraditando a versão factual aduzida pelos RR. contestantes, pedindo a improcedência da reconvenção.

    3. No despacho saneador, proferido em audiência prévia, afirmou-se a validade e a regularidade da instância, fixando-se o objeto do litígio e enunciando-se os temas de prova, sem que tivesse sido apresentado qualquer reclamação.

    4. Mais tarde realizou-se (ao longo de 2 sessões, tendo no decurso da última o tribunal realizado uma inspeção ao local) a audiência de discussão e julgamento (com a gravação da mesma).

    5. Seguiu-se a prolação da sentença que, no final, julgando a ação procedente, decidiu nos seguintes termos: « a) reconhecer a Autora, E..., o direito de preferência na compra do prédio rústico identificado no ponto 5. dos factos provados e, como consequência, condena-se os segundos Réus, ..., a abrir mão do mesmo prédio em favor da Autora, substituindo-se esta àqueles no título de compra e venda, enquanto compradores, na inscrição matricial e no registo predial, cancelando-se as inscrições a favor dos Réus adquirentes.

  2. Julgar a reconvenção totalmente improcedente por não provada.» 7. Inconformados com tal sentença, dela apelaram os 2ºs. RR.

    tendo concluído as suas alegações de recurso nos seguintes termos: ...

    1. Contra-alegou a autora, pugnando pela improcedência total do recurso e pela manutenção integral do julgado.

    2. Corridos que foram os vistos legais, cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.

      II- Fundamentação 1.

      Do objeto do recurso.

    3. Como é sabido, e é pacífico, é pelas conclusões das alegações dos recorrentes que se fixa e delimita o objeto dos recursos, pelo que o tribunal de recurso não poderá conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs. 635º, nº. 4, e 639º, nº. 1, e 608º, nº. 2, do CPC).

      Ora, da leitura das conclusões das alegações dos 2ºs. RR./recorrentes, verifica-se que as questões que nos cumpre aqui apreciar são as seguintes:

  3. Da nulidade da sentença; b) Da impugnação/alteração da decisão da matéria de facto; c) Do direito, ou não, da A. preferir na compra da venda que foi feita do prédio rústico a que se reporta a presente ação; d) Em caso de procedência da ação, do direito de os 2ºs. RR./apelantes receberem da autora as quantias dela peticionadas no pedido reconvencional.

    1. Pelo tribunal da 1ª. instância foram dados como provados os seguintes factos (respeitando-se a ordem de descrição, a sua numeração e a sua ortografia que constam da sentença): ...

    2. Quanto à 1ª. questão.

    3. - Na nulidade da sentença.

      Invocam os RR./apelantes a nulidade da sentença, por violação do artº. 615º, nº. 1 als. c) e d) do CPC.

      Para sustentar a nulidade da sentença, por violação do disposto na al. c) do mesmo normativo legal, aduzem (de forma que não concretizam) os apelantes a existência de oposição entre os fundamentos de facto e a decisão.

      Para sustentar essa nulidade, por violação do disposto na al. d) do citado normativo legal, aduzem (de forma singela) os apelantes não ter o tribunal a quo se pronunciado “relativamente o facto de os recorrentes já terem iniciado a construção da sua cozinha no prédio objeto de preferência, nomeadamente para efeitos de constituição de acessão industrial imobiliária, artº. 1339º do CC.” Contra a verificação de tal nulidade se pronunciou a A. /apelante.

      1.2 Apreciemos.

      Como é sabido, as causas de nulidades da sentença encontram-se taxativamente previstas no artº. 615º CPC – e entre elas aquelas decorrentes das situações previstas nas als. c) e d) do seu nº. 1 -, e que têm a ver com vícios estruturais ou intrínsecos da própria sentença, também conhecidos por erros de atividade ou de construção da própria sentença, mas que não se confundem com eventual erro de julgamento de facto e/ou de direito.

      1.2.1 Quanto à alegada violação da al. c) do nº. 1 do artº. 615º do CPC.

      Naquilo que para aquilo importa, e tendo em conta o fundamento invocado, estatui-se na al. c) do nº. 1 desse mesmo normativo legal que “a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão (…).

      ” Decorre desse normativo legal, que o vício de nulidade da sentença previsto aí previsto - fundamentos em oposição com a decisão - verifica-se/ocorre quando os fundamentos de facto e/ou de direito invocados pelo julgador deveriam conduzir logicamente a um resultado oposto ao expresso na decisão. Trata-se, pois, de um vício estrutural da sentença, por contradição entre as suas premissas, de facto e/ou de direito, e a conclusão, de tal modo que esta deveria seguir um resultado diverso.

      Porém, esta nulidade não abrange, como atrás já se referiu, o erro de julgamento, seja de facto ou de direito, e designadamente a não conformidade da sentença com o direito substantivo.

      Assim, e por outras palavras, só ocorrerá essa causa de nulidade quando a construção da sentença é viciosa, isto é, quando «os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão mas a um resultado oposto» (cfr.

      o prof. Alb. dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 141”). Ou, melhor ainda, quando das premissas de facto e de direito que o julgador teve por apuradas, ele haja extraído uma conclusão oposta à que logicamente deveria ter extraído.

      Constitui entendimento também prevalecente que só existe contradição entre factos quando eles se mostrem absolutamente incompatíveis entre si, apresentando-se com um conteúdo logicamente incompatível de tal modo que ambos não possam coexistir ou subsistir entre si.

      Vício esse que poderá ainda ocorrer quando a decisão se mostre ininteligível, por ser ambígua ou obscura.

      O vício da ambiguidade ou obscuridade pressupõe inteligibilidade de uma decisão, não podendo com segurança, determinar-se o sentido exato dessa decisão, quer porque não se mostra claramente expresso, quer porque contém em si mais do que um sentido...

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