Acórdão nº 21/11.8TBCLB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução23 de Junho de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 08.02.2011, S (…), S. A., instaurou contra L (…) e G (…) acção executiva para pagamento da quantia de € 13 976,23 (capital e juros), baseada numa livrança cujo valor não foi pago na data de vencimento.

Por despacho de 17.10.2019, a Mm.ª Juíza a quo, nos termos do art.º 721º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC), julgou improcedente a reclamação da decisão proferida pela Sr.ª Agente de Execução (AE) no sentido de julgar extinta a execução.

Inconformada, a exequente apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - Na sequência da decisão de extinção elaborada pela AE em 04.7.2019, com fundamento da falta de pagamento de provisão devida, o Exequente apresentou reclamação daquele acto.

  1. - O Mm.º Juiz de Direito, na sentença de que se recorre julgou a impugnação improcedente, mantendo a decisão proferida pela AE, entendendo que “a notificação foi efetuada, a exequente tomou conhecimento da mesma, dela não apresentou qualquer reclamação e, portanto, eram as quantias devidas, não tendo sido as mesmas pagas no prazo legalmente concedido para o efeito. Prazo esse que é peremptório e em relação ao decurso do qual a lei estabelece uma cominação específica: a extinção da execução.” 3ª - Em 25.01.2019, a AE requereu ao Mm.º Juiz de Direito do Tribunal autorização para levantamento do sigilo fiscal, para aferir junto do serviço de finanças, o domicílio fiscal dos co-herdeiros identificados na participação de imposto de selo.

  2. - Os autos aguardavam naquela data por autorização para proceder ao levantamento do sigilo fiscal com vista à concretização da penhora do quinhão hereditário da executada nomeado à penhora pelo Exequente oportunamente, que poderia não ser autorizado.

  3. - Na mesma data, a AE elaborou a sua nota de despesas e honorários e notificou o Exequente para proceder à sua liquidação, não se tratando de um mero pedido de provisão cujo pagamento fosse essencial para prosseguir com as diligências de penhora.

  4. - Nos termos do art.º 50º da portaria n.º 282/2013, de 29.8, “os honorários referidos no artigo anterior são pagos ao agente de execução no termo do processo ou procedimento, ou quando seja celebrado entre as partes acordo de pagamento em prestações.” 7ª - Nenhuma das situações supra referidas se verificava, pelo que não era oportuna a elaboração da nota de despesas e honorários pela AE, pelo que deveria a AE ter emitido um pedido de provisão no montante que entendesse necessário para acautelar os seus honorários ou as despesas futuras com as diligências requeridas pelo Exequente, e não elaborar a nota de despesas da AE.

  5. - Acresce que o teor do n.º 3 do art.º 721º do CPC, tem na sua origem o art.º 4º do DL n.º 4/2013, de 11.01, sob a epígrafe “Extinção da instância por não pagamento da remuneração devida a agente de execução”, donde se extrai que quando esteja em falta o pagamento de quantias devidas ao AE, a título de honorários e despesas, o AE notifica o exequente de que, se no prazo de 30 dias não efectuar o respectivo pagamento, a instância se extingue.

  6. - Os montantes que a AE notificou o exequente para liquidar, correspondem à nota de despesas e honorários do AE, que não se inclui no conceito de despesa devida a AE tipificada no n.º 1 do art.º 4º do DL n.º 4/2013, de 11/01, o qual também era interpretado em harmonia com o disposto na Portaria n.º 331-B/2009, de 30.3, diploma que regulamentava vários aspectos das acções executivas cíveis, entre os quais a qualificação das despesas devidas a agente de execução.

  7. - Dispunham os art.ºs 11º, n.º 1 e 21º, n.º 1 da aludida portaria que o AE tinha direito a ser reembolsado das despesas necessárias que realizasse no exercício das suas funções e que comprovasse devidamente.

  8. - As despesas a que se refere, portanto, o art.º 4º n.º 1 do DL n.º 4/2013, de 11/01 dizem respeito às despesas que já tenha efectuado, a expensas suas, e a cujo reembolso teria direito, não se incluem, assim, no conceito de despesas, as que efectivamente ainda não foram suportadas pelo AE, ou a nota de despesas e honorários deste, como era o caso dos autos.

  9. - A falta de pagamento pelo exequente do montante requerido pela AE a título de nota de despesas não consubstancia falta de pagamento de despesas devidas ao AE como configuradas, pelo que não nos deparamos com uma situação de incumprimento de um dever por parte do exequente correspectivo de um direito do AE de exigir o pagamento de quantia em dívida.

  10. - O pagamento solicitado corresponde ao cumprimento de um ónus, sendo certo que na data em que a AE elaborou a nota de despesas e honorários, a mesma não era admissível, pois não se verifica nenhuma das situações indicadas no art.º 50º da Portaria n.º 282/2013, de 29.8.

  11. - A falta de pagamento do montante indicado pela AE não se mostrava à data necessário para impulsionar o processo, os autos aguardavam pela autorização para levantamento do sigilo fiscal requerida pela AE.

  12. - Acresce que, em 14.6.2019, a AE notificou o Exequente para proceder ao pagamento do pedido de provisão emitido em 25.01.2019.

  13. - O art.º 721º, n.º 3 do CPC refere o pagamento de honorários e despesas, e não o pagamento da nota de despesas e honorários conforme solicitava a AE, pelo que não poderia enquadrar-se a situação dos autos nesta norma.

  14. - Após tal notificação o Exequente, em 21.6.2019, procedeu à liquidação do montante solicitado pela AE, que emitiu o respectivo recibo/factura em 26.6.2019, liquidação efectuada muito antes do prazo de 30 dias concedido para o efeito, pelo que inexiste fundamento para extinguir a acção executiva nos termos em que o fez a AE., e confirmou o Mm.º Juiz de Direito a quo.

  15. - Em 01.7.2019, a AE enviou ao Exequente outro pedido de provisão para obtenção de informações no Serviço de Finanças, que o Exequente também liquidou.

  16. - Em 04.7.2019, a AE elaborou decisão de extinção por falta de pagamento da nota de despesas e honorários elaborada em 25.01.2019.

  17. - Se a AE tivesse intenção de extinguir os presentes por falta de pagamento da nota de despesas e honorários elaborada em 25.01.2019, não deveria ter notificado o Exequente para fazer o pagamento da mesma em 14.6.2019, nem emitido outro pedido de provisão em 01.7.2019, ou emitindo os respectivos recibos.

  18. - A actuação da AE fez o Exequente crer que não havia considerado existir fundamento para extinguir os autos pela falta de pagamento da nota de despesas e honorários elaborada em 25.01.2019, pois se assim fosse teria desde logo extinto os autos, e não teria emitido novos pedidos de provisão em 14.6.2019 e 01.7.2019.

  19. - Assim, se em 14.6.2019, a AE enviou nova notificação ao Exequente, não pode aceitar-se que os autos sejam extintos com fundamento na notificação remetida em 25.01.2019, pois se posteriormente remeteu nova notificação, não poderá valer-se da primeira notificação, quando concedeu novo prazo ao Exequente para liquidar o montante, o qual foi cumprido.

  20. - Tratar-se-á de uma decisão surpresa que o Exequente não poderia antever, e que mais a mais se mostra contrária à actuação anterior da AE.

  21. - A sentença de que se recorre é nula por violação do art.º 721º, n.º 3 do CPC, pelo que deve ser revogada, ordenando-se o prosseguimento dos autos, revogando a decisão de extinção por falta de pagamento de provisão devida à AE.

Não houve resposta.

Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso[1], importa reapreciar e decidir, apenas, se a execução ficou extinta ou se assim não sucedeu e nada obsta ao seu prosseguimento.

* II. 1. Para a decisão do recurso releva o relatório que antecede e os seguintes actos e tramitação:[2]

  1. Em 23.3.2012 realizou-se a penhora de “1/3 da pensão que o executado aufere através da C(…), até perfazer o montante de € 17 154,71”.

  2. Por despacho de 19.10.2015 foi autorizada a consulta de elementos protegidos pelo sigilo fiscal visando apurar a “entidade processadora dos rendimentos” auferidos pela executada G(…) e os elementos relativos à herança em que a mesma executada “consta como herdeira”.

  3. Em 11.12.2018, a Mm.ª Juíza a quo determinou a notificação da AE para, “em cinco dias, sob pena de condenação em multa processual e comunicação ao caaj[3], vir dar imediato cumprimento ao disposto no art.º 750º, n.ºs 1 e 2 do CPC, comprovando-o nos autos, informando o Tribunal do estado das diligências”, e bem assim que caso não fossem “indicados bens penhoráveis no prazo legal de dez dias” deveria a AE “proceder à formalização da extinção da instância, respectivas notificações e informação aos autos”[4].

    Determinou-se, ainda, a notificação da exequente “para vir requerer o que tiver por conveniente, no prazo legal de dez dias, sob pena do decurso do prazo previsto no art.º 281º, n.º 5 do CPC”.

  4. A 20.12.2018, a exequente comprovou haver dirigido à AE requerimento pedindo a penhora do quinhão hereditário da executada G (…) relativamente à herança aí identificada, para o que se devia indagar previamente as moradas dos demais herdeiros, atento o disposto no art.º 781º, n.º 1 do CPC.

  5. Na mesma data, a exequente esclareceu o Tribunal daquele impulso dos autos de execução, dito em d).

  6. Por despacho de 17.01.2019, a Mm.ª Juíza a quo ordenou a notificação da AE “para responder, no prazo máximo de dez dias, no cumprimento das suas funções, ao que lhe foi solicitado, pela exequente, no dia 20.12.2018, sob pena de condenação em multa processual e comunicação ao caaj”.

  7. Veio então a AE requerer ao Tribunal, em 25.01.2019, o levantamento do sigilo fiscal para “a identificação e domicílio fiscal do participante e demais herdeiros identificados na participação de imposto de selo da herança da qual a executada consta como herdeira, porquanto tal informação não se encontra abrangida no despacho anteriormente deferido” (sic).

    [5] h) O que foi atendido por despacho de 05.02.2019, autorizando-se “a consulta das bases de dados e outos elementos protegidos pelo sigilo fiscal e...

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