Acórdão nº 2212/19.4T8CBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução02 de Junho de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 20.9.2019, M (…), D (…) e I (…) deduziram oposição, por embargos, à execução para pagamento de quantia certa, no valor de € 90 744,69, que lhes é movida por Banco (…), S. A. - embargos opostos a esta e a S (…) Seguros, Companhia de Seguros Vida, S. A. -, pedindo a condenação da Seguradora no “pagamento do valor em dívida exequenda extinguindo-se o processo executivo”.

Alegam, em síntese: a dívida exequenda resulta do empréstimo que foi contraído para a aquisição de habitação própria permanente da executada M (…) e de seu falecido marido J (…); foi condição para que a entidade bancária concedesse tal empréstimo a celebração de seguro de vida de ambos os mutuários; foi celebrado seguro de vida entre estes e S (…) Seguros, figurando o Banco exequente como Tomador do Seguro e a embargante e seu falecido marido como 2ª e 1ª Pessoa Segura, respectivamente; tal contrato cobre os riscos de morte e invalidez absoluta e definitiva das Pessoas Seguras, garantindo o pagamento do empréstimo; no dia 29.7.2016, por infortúnio, o marido da executada M (…) foi mortalmente atropelado; foi accionado o supra referido seguro por carta dirigida à 2ª demandada, a 28.8.2016, não tendo, até hoje, a Seguradora assumido o pagamento da indemnização a que têm direito os sucessores e o Tomador do Seguro (exequente); até à data do óbito do mutuário não existia incumprimento; o circunstancialismo que envolveu o decesso do marido da executada não se encontra excluído da cobertura da referida apólice; estava ciente a executada M (…) que não se encontrava a incumprir qualquer das suas obrigações, pois a Seguradora tinha a obrigação de assumir o pagamento integral da dívida à data do óbito de seu marido/segurado; devem, assim, ser admitidos os presentes embargos, deduzidos também contra a Seguradora, ainda que não exequente.

Por despacho de 07.10.2019, o Mm.º Juiz a quo, nos termos e para os efeitos do art.º 732º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC), indeferiu liminarmente os Embargos de Executado, por manifesta improcedência, considerando, por um lado, que não servem para demandar terceiros nem para obter a condenação desses terceiros no que quer que seja e, por outro lado, que a Exequente/Embargada é terceira em relação ao contrato de seguro (apenas devendo ser beneficiária do mesmo), e não configura a alegada existência de um contrato de seguro válido fundamento de Oposição à Execução por Embargos de Executado.

Inconformados, pugnando pela revogação daquele despacho, os embargantes apelaram formulando as seguintes conclusões: 1ª - Foram violados os art.ºs 54º n.º 1, 731º e 732º n.ºs 2, 4 e 5 do CPC.

  1. - Os Embargos de Executado são na sua verdadeira acepção processual a enxertia de uma nova acção judicial noutra pré-existente esta de cariz executivo, não sendo possível a utilização do expediente de chamamento à Demanda, pelo Embargante/Executado naquele articulado, pelo que é admissível a sua dedução contra terceiro não executado.

  2. - Foram invocados factos relacionados com a negociação do crédito dado à execução, mormente, a obrigação de contratação de seguro de vida imposto pela Exequente.

  3. - Assim, e tendo sido já accionado tal contrato de seguro, é lícito nos termos das disposições processuais civis proceder à inclusão da seguradora na acção que se intenta, pois na esfera jurídica da mesma serão produzidos efeitos que obstam ao ganho de causa e pretensão da Exequente.

  4. - Caso assim se não entenda, com a conjunção das disposições legais ínsitas nos art.ºs 54º n.º 1 e 731º do CPC sempre se terá obrigatoriamente que admitir que a fundamentação da mesma constante se subsume do art.º 731º do CPC.

  5. - Se a oposição à execução se fundar noutro título que não seja a sentença ou injunção com fórmula executória, o executado pode deduzir embargos com base em qualquer dos fundamentos de oposição à execução daqueles títulos e bem assim, quaisquer outros que este possa usar como defesa na acção declarativa, na medida em que os embargos seguem esta forma processual. Pode, assim, o executado defender-se por excepção e por impugnação, alegando circunstâncias de facto que não resultam do título executivo, assim como pode deduzir pedido reconvencional, nomeadamente com vista à compensação com crédito de que seja titular contra o exequente.

  6. - Nos casos em o mutuante impõe ao mutuário a celebração de contrato de seguro que assegure a obrigação de restituição do capital mutuado e a remuneração acordada, deve entender-se que a vontade usual das partes será a de que o mutuante se pague primeiro à custa do segurador, pelo que se o mutuante executa o mutuário, este pode, com sucesso, deduzir oposição à execução, desde que alegue e prove que o segurador está efectivamente vinculado ao dever de prestar ao mutuante.

Notificada nos termos e para os efeitos dos art.ºs 638º, n.º 5 e 641º, n.º 7 do CPC, a exequente nada disse.

Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar e/ou decidir se existe fundamento para o recebimento dos embargos (em razão da possibilidade de intervenção de terceiros na acção executiva e do direito aplicável por força do seguro de vida associado ao contrato de crédito por dívida provida de garantia real sobre imóvel).

* II. 1. Para a decisão do recurso releva o que consta do relatório que antecede e o seguinte:

  1. Consta do requerimento executivo (de 21.3.2019): 1º - Por título particular de mútuo com hipoteca e fiança (Lei de 16.4.1874, Decreto de 07.01.1876 e DL 272/90, de 07/9), considerado, para todos os efeitos legais, como escritura pública - (…) - outorgado em 18.01.2007[1] (doc. n.º 1)[2], o Banco exequente concedeu a J (…) e M (…)um empréstimo no valor de € 90 000, pelo prazo de 492 meses, vencendo juros à taxa Euribor a 3 meses, acrescida de spread de 2,5 % e demais condições constantes do aludido título.

    1. - Para garantia do indicado mútuo, juros e despesas, os referidos mutuários constituíram, a favor do Banco exequente, hipoteca sobre o prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra, na ficha 1322/19910621, da freguesia de x...., a qual se encontra registada em definitivo.

    2. - J (…) faleceu em 30.7.2016 (doc. n.º 2).

    3. - São seus únicos e universais herdeiros, contra eles devendo correr a presente execução (cf. art.º 54º do CPC) a viúva M (…) (cf. doc. n.º 3) e os filhos do casal D (…) e I (…)(cf. docs. 4 e 5).

    4. - Não foi paga a prestação do empréstimo vencida em 02.8.2016, nem as subsequentes.

    5. - De acordo com o contratualmente previsto o Banco considerou o contrato resolvido e a dívida integralmente vencida.

    6. - Os executados, nesta data, quanto a tal empréstimo, são devedores ao Banco exequente da quantia global de € 90 744,69 (€ 79 865,59 de capital em dívida + € 7 279,10 de juros à taxa de 0,451 %, contados de 02/7 a 02/8/2016 e à mesma taxa, acrescida da sobretaxa de 3 %, contados desde 03/8/2016 e até esta data + € 3 600 das despesas judiciais e extrajudiciais).

    7. - Os executados C.... e A....

    [3] constituíram-se fiadores e principais pagadores, com renúncia ao benefício da excussão prévia, quanto às obrigações assumidas pelos mutuários no identificado contrato.

  2. Relativamente ao contrato de seguro conexo com o contrato de mútuo que é título executivo no Processo Executivo de que os presentes autos constituem incidente declarativo, em 11.02.2007, S (…) Seguros Vida, S. A., emitiu a apólice n.° 15.000001/certificado n.º 271176, com data de efeito de 18.01.2017 e duração de um ano e seguintes, tendo como prazo máximo o do empréstimo associado ou no ano em que a 1ª pessoa segura complete 75 anos de idade.

  3. A referida apólice de seguro, subscrita pelos aludidos mutuários (segurados), com as condições gerais e especiais descritas nos documentos de fls. 5 verso a 8, passou a garantir/cobrir os riscos de morte e invalidez total e permanente dos mutuários; o valor seguro é o capital em dívida do empréstimo contraído pelas pessoas seguras, à data da ocorrência; o Tomador de Seguro do seguro, a exequente.

  4. O mutuário/segurado J (…) foi vítima do atropelamento objecto da participação de acidente de viação reproduzida a fls. 8 verso a 10, desconhecendo-se algumas das circunstâncias desse embate.

  5. Por carta datada de 26.8.2016, a embargante M (…) accionou o seguro identificado em II. 1...

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