Acórdão nº 262/19.0T8FVN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução21 de Janeiro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

L (…), instaurou contra R (…), S.A., ambos com os sinais dos autos, a presente acção declarativa, de condenação, com processo comum.

Pediu: A condenação da Requerida a emitir, gratuitamente, e no mesmo programa seguinte à decisão, o texto de Resposta do Requerente, que indica, e acompanhado da menção de que é efectuado por decisão judicial.

Para tanto alegou, em síntese: No âmbito da emissão do programa “ X (....) ”, no dia 05.07.2019, designadamente, na peça jornalística intitulada “ Y (....) ” e relacionado com os escândalos políticos em torno dos K (....) , a Requerida omitiu por completo os contactos estabelecidos entre a jornalista F (…) e o requerente, antes da emissão da mesma, na qual negou qualquer envolvimento na entrega dos donativos, nos termos que explicita, factos estes omitidos na peça.

No programa em causa são levantadas suspeições e veiculadas falsidades que colocam em causa o bom nome do Requerente e reputação enquanto Presidente da Direcção da H (....) de Z (....) .

Remeteu, tempestivamente, duas comunicações dirigidas à Requerida com o fito do exercício do seu direito de resposta, sendo que as mesmas foram indeferidas com o argumento de que não cumpriam as disposições legais da Lei da Televisão.

Estava vedado à Requerida a recusa da transmissão da resposta, pois que precludido tal direito de recusa por esta não ter cumprido o prazo de 24 horas; por outro lado, o indeferimento para a sua transmissão encontra-se desprovido de legalidade.

A Requerida contestou.

Alegando, em suma: O facto de ter excedido o período de 24 horas para recusar a transmissão da resposta apresentada pelo Requerente é irrelevante, pois que não tem como consequência a transmissão da dita resposta.

No mais, a pretensão do A. carece manifestamente de fundamento, não tem relação directa e útil com a reportagem e excede largamente o número de palavras do texto que alegadamente faz referência ao Requerente e, consequentemente, é legítima a recusa da transmissão de resposta pretendida por este.

Pediu: a improcedência da acção.

  1. Prosseguiu o processo os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido: «julga-se procedente a presente acção e, consequentemente, decide-se: 1 - Condenar a Requerida no pedido; 2 - Determinar à Requerida a transmissão gratuita, no programa « X (....) », do texto de resposta do Requerente, referente à emissão do dia 05 de julho, e à reportagem “ Y (....) ” na primeira emissão do programa referido a contar do trânsito em julgado da presente decisão, acompanhado da menção de que aquela é efectuada por decisão judicial, com seguinte teor: “No programa “ X (....) ”, titulado “ W (....) . Donativos distribuídos em várias autarquias nas vésperas das eleições”, emitido em 05.07.2019, são levantadas suspeições e veiculadas falsidades que colocam em causa o meu bom nome – L (…) - e reputação enquanto Presidente da Direção da H (....) de Z (....) .

  2. Ao contrário do que foi reportado no programa " X (....) ", não tive qualquer intervenção ou participação no processo de entrega de donativos mostrado na reportagem e desconhecia a sua realização.

  3. Foi o então comandante dos H (....) de Z (....) , que conduziu este processo tendo previamente solicitado à Câmara Municipal de Z (....) a lista dos beneficiários desses donativos.

  4. Foi a associação doadora representada pelo Sr. J (....) que entregou a referida listagem.

  5. A listagem apresentada pelo " X (....) " está disponível no sítio da Câmara Municipal de Z (....) .

  6. A jornalista da Q (...) que me interpelou conhecia estes factos, omitiu-os na reportagem e apesar de lhe ter transmitido que nada tive a ver com a distribuição dos donativos, também omitiu este meu esclarecimento.

  7. Lamento que a Q (...) tenha veiculado uma notícia que coloca em causa o meu bom nome e reputação, mesmo sendo conhecedora de factos que omitiu.” » 3.

    Inconformada recorreu a requerida.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. A Recorrente vem interpor recurso da sentença proferida no dia 26.09.2019 pelo Tribunal a quo, que julgou totalmente procedente a presente ação, por discordar, em absoluto, da aplicação do direito aos factos dados como provados.

  8. Embora os factos dados como provados sejam suficientes para que, ao abrigo da lei, a ação fosse julgada totalmente improcedente, da própria reportagem de 05.07.2019, que se encontra junta aos autos por requerimento da Recorrente de 26.08.2019, resultam outros factos, alegados na contestação da Recorrente, que deveriam ter sido dados como provados.

  9. Resulta dos minutos 30:52 a 31:08 da reportagem de 05.07.2019, conforme alegado no artigo 47.º da contestação, que “O Comandante dos H (....) de Z (....) foi identificado na reportagem”, razão pela qual tal facto deve ser dado como provado.

  10. Resulta dos minutos 30:52 a 31:08 da reportagem de 05.07.2019, conforme alegado no artigo 50.º da contestação, que “Na reportagem foi ouvido o Comandante dos H (....) de Z (....) ”, razão pela qual tal facto deve ser dado como provado.

  11. Resulta dos minutos 30:47 a 30:51 da reportagem de 05.07.2019, conforme alegado no artigo 57.º da contestação, que “Na reportagem é expressamente afirmado que no caso de Z (....) , ao contrário do que sucedeu nos demais concelhos, a lista de beneficiários dos donativos era conhecida”, razão pela qual tal facto deve ser dado como provado.

  12. O Recorrido limitou-se a alegar que a reportagem é ofensiva do seu bom nome e reputação, não tendo alegado e, consequentemente, provado qualquer facto que conduzisse à conclusão da verificação de tais ofensas, o que sempre seria necessário para que a sua pretensão fosse julgada procedente.

  13. Ao julgar a ação procedente sem terem sido alegados ou provados factos essenciais que demonstrem que a reportagem é ofensiva do bom nome e reputação do Recorrido, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 5.º do Código de Processo Civil.

  14. Não existe ao longo da reportagem, não tendo, como tal, sido dado como provado qualquer facto a esse respeito, qualquer relação entre o Recorrido e o processo de entrega de donativos ou com o conhecimento da respetiva lista de beneficiários.

    9. A reportagem já assegura aquilo que o Recorrido pretende repetir em sede de resposta (facto provado 29), isto é, de que não esteve envolvido com a distribuição de donativos no dia de reflexão para as eleições autárquicas.

  15. A curta referência feita ao Recorrido na reportagem não contém, conforme o próprio não contesta, qualquer inverdade, o que por si só determina que inexista, também por este motivo, fundamento para a transmissão da resposta.

  16. Por manifesta ausência de fundamento da resposta elaborada pelo Recorrido, a sentença proferida pelo Tribunal a quo, ao julgar a presente ação procedente, violou o disposto no artigo 68.º, n.º 1, da Lei da Televisão.

  17. A resposta do Recorrido é absolutamente irrelevante para alterar a impressão causada no telespectador, porque em nada muda o teor da própria reportagem.

  18. Além do mais, não existem referências na reportagem ao Recorrido relacionadas com a resposta que pretende apresentar, o que afasta o requerido da relação útil entre a resposta e a reportagem.

  19. A sentença proferida pelo Tribunal a quo violou, portanto, o disposto no artigo 68.º, n.º 2, da Lei da Televisão, que exige uma relação útil entre o direito de resposta e o ato que lhe deu causa.

  20. A resposta que o Recorrido pretende que seja transmitida não respeita à referência (única, cf. facto provado 17) que lhe é feita, aproveitando para expressar-se sobre outros pontos da reportagem com o qual não é, em momento algum, relacionado.

  21. Assim, também por falta de legitimidade do Recorrido para a resposta que apresenta, o Tribunal a quo, ao julgar a presente ação procedente, violou o disposto no artigo 67.º, n.º 1 e 4, da Lei da Televisão.

  22. O Recorrido apenas pode exercer o seu direito de resposta naquilo em que foi visado, pelo que a sua resposta, caso fosse admissível, não poderia exceder 65 palavras (facto provado 31).

    18. Considerando que a resposta do Recorrido contém 204 palavras (facto provado 32), a sentença proferida pelo Tribunal a quo violou o disposto no artigo 68.º, n.º 2, da Lei da Televisão, ao julgar que a resposta do Recorrido não era demasiado extensa.

  23. Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo e substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente e, consequentemente, seja a Recorrente absolvida do pedido contra si formulado.

    Contra alegou o requerente pugnando pela manutenção do decidido.

  24. Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª - Alteração da decisão sobre a matéria de facto.

    1. - Improcedência do pedido.

  25. Apreciando.

    5.1.

    Primeira questão.

    5.1.1.

    Devem ser considerados e atendidos todos os factos que, provados, tenham interesse para a decisão da causa.

    Mas, como é consabido, não a decisão que, liminar, aparente e aprioristicamente, pode advir, mas antes aquela que possa ser possível, considerando as várias soluções plausíveis da questão de direito, máxime se ela não é total e uniformemente perspectivada e sedimentada pela doutrina e jurisprudência.

    No caso vertente, e tal como alega a julgadora, a boa decisão da causa impõe uma análise e dilucidação concatenada do «enquadramento global da reportagem emitida, a qual tem uma sequência lógica, e não apenas (atender-se) a passagem espartilhada…».

    Aliás, esta perspectiva é aceite pelo próprio requerente, pois que, não obstante desde logo se opor a esta pretensão da recorrente, aceita que « teremos de analisar a “noticia” como um todo, para se perceber a razão de ser e fundamento do direito de resposta do Requerente.» (sublinhado nosso).

    E assim é.

    Devendo, pois, os factos...

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