Acórdão nº 944/18.3T8CLD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelPAULA MARIA ROBERTO
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam[1] na Secção Social (6ª secção) do Tribunal da Relação de Coimbra: I - Relatório E...

, carteiro, residente na ..., intentou a presente ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, contra C..., S.A.

, com sede em ...

Para tanto, apresentou o formulário de fls. 2, opondo-se ao despedimento de que foi alvo e requerendo que seja declarada a ilicitude ou a irregularidade do mesmo, com as legais consequências.

Procedeu-se à realização de audiência de partes e a empregadora, notificada para apresentar articulado motivador do despedimento veio fazê-lo alegando, em síntese, que: O trabalhador invocou, desde há alguns anos, incapacidades físicas que não lhe permitiam executar tarefas inerentes ao exercício das suas funções de carteiro e, avaliado pela medicina do trabalho foram feitas recomendações à empregadora quanto ao modo de prestação do trabalho daquele, no entanto, no mesmo período o trabalhador foi jogador de futebol, tendo participado semanalmente em jogos de futebol de onze, de sete e de praia, o que não se enquadra com as invocadas limitações físicas, dores, impossibilidade de conduzir e de andar a pé; o trabalhador agiu de forma intencional e enganosa com o objetivo de conseguir, através das informações transmitidas aquando das avaliações da medicina do trabalho, exercer o mínimo de funções exigíveis a um trabalhador carteiro; o trabalhador recusava-se a realizar tarefas internas que não envolviam qualquer esforço físico; o trabalhador prestou informações falsas aos médicos da medicina do trabalho; o comportamento ilícito e doloso do trabalhador é grave, violando o dever de prestar de forma plena a sua actividade de carteiro, bem como o dever de boa fé na vigência do contrato e o dever de lealdade para com o empregador e tornou imediata e impossível a subsistência da relação de trabalho, constituindo justa causa de despedimento. Termina, dizendo que deve ser declarada a regularidade e licitude do despedimento e, em consequência, improceder a oposição ao despedimento apresentada pelo trabalhador, com as demais consequências legais.

* O trabalhador apresentou contestação e reconvenção e negando os factos que lhe são imputados.

Termina dizendo que: “Nestes termos e melhores de Direito deve a presente acção ser julgada procedente e, em consequência, ser a Ré condenada, cumulativamente, no seguinte: I) Que o uso de imagens e/ou fotografias seja declarado ilícito, já que as mesmas foram retiradas pela Ré (através de funcionários dos seus quadros como é mencionado no próprio processo disciplinar), quer dos eventos onde o Autor participou, quer a utilização de fotografias retiradas do facebook de outras pessoas e/ou das mais diversas entidades, seja declarado como ilegal conforme disposto no n.º 2 do artigo 199º do Código Penal, e o uso de imagens e/ou fotografias ser declarado ilícito para instruir o presente processo disciplinar, pois tratam-se de fotografias de carácter privado e/ou pessoal, e o uso das mesmas não foi autorizado nem por parte das pessoas e/ou entidades onde as mesmas foram publicadas, nem o uso das mesmas foi autorizado, nem existiu autorização para ser fotografado por parte do ora Autor, tratando-se assim o uso ilícito de tais imagens e/ou fotografias pela Ré de uma clara violação da vida privada do Autor, pelo que o uso de tais imagens e/ou fotografias não poderia ser considerado pela Ré para instruir o processo disciplinar que ora se impugna, atendendo que o uso de tais imagens e/ou fotografias deverá ser declarado ilícito, tratando-se inclusivamente de um crime tipificado de gravações e fotografias ilícitas.

II) A sanção disciplinar aplicada em 10/04/2018 ao Autor, pena de despedimento sem indemnização ou compensação, deverá ser declarada nula, por o processo disciplinar instaurado pela Ré contra o Autor ser ilícito por o mesmo ter por fundamento além do uso de imagens e/ou fotografias obtidas de forma ilícita, tem também factos que não correspondem à verdade e que foram deturpados pela Ré com o claro propósito de instruir um processo disciplinar com o intuito de pressionar o Autor a cessar o contrato de trabalho que o Autor tinha com a Ré.

III) Que a sanção disciplinar que foi aplicada pela Ré ao Autor seja anulada e em consequência, que seja retirada toda e qualquer referência à mesma do seu cadastro disciplinar.

Da Reconvenção IV) Ser a Ré condenada no pagamento ao Autor de uma indemnização no montante de €: 22.756,18 euros, atendendo a que o Autor opta em substituição da sua reintegração pelo pagamento de uma indemnização, tendo como referência 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao elevado grau de ilicitude do despedimento decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381º.

V) Que a Ré seja condenada a pagar ao Autor todas as retribuições (atendendo a que vencimento base do Autor é de €: 816,60 euros e que as diuturnidades são no montante global de €: 104,82 euros), que este deixou de auferir desde a data do seu despedimento até à data do trânsito em julgado da presente sentença, assim como solícita da Ré o pagamento da retribuição do mês de Abril de 2018, a qual lhe deveria ter sido paga pela Ré até à data do seu despedimento, e não ocorreu, assim como solícita da Ré o pagamento dos proporcionais de férias, de subsídio de férias e de subsídio de Natal, e as férias que se venceram em 01/01/2018, relativamente ao trabalho prestador pelo autor para a Ré no ano 2017 VI) A pagar ao Autor uma compensação não inferior a €: 1.200,00 euros, pelos danos morais sofridos pelo Autor, resultantes de lhe ter sido instaurado o processo disciplinar que conduziu ao seu despedimento.

A tudo acrescerá juros de mora à taxa legal, a contar da sentença até efetivo e integral pagamento.” A empregadora apresentou resposta concluindo como no articulado motivador e pela improcedência das exceções e da reconvenção.

Foi proferido o despacho saneador de fls. 652 e segs..

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento.

Posteriormente foi proferida a sentença de fls. 725 e segs., cujo dispositivo tem o seguinte teor: “Pelo exposto, julgo procedente, por parcialmente provada, a presente acção, bem como parcialmente procedente reconvenção e, em consequência: - declaro ilícito o despedimento do A., E..., operado pela R., “C..., S.A.”, através da decisão proferida no procedimento apensado aos presentes autos; - condeno a R. a pagar ao A., a título de retribuições intercalares, a quantia mensal de € 921,42 (novecentos e vinte e um Euros e quarenta e dois cêntimos), desde 1/5/2018 e até trânsito em julgado desta sentença, acrescidas de juros de mora, à taxa anual de 4%, desde, quanto à retribuições vencidas anteriormente, a data da sentença e, quanto às retribuições vencidas posteriormente, a data do seu vencimento, deduzidas do montante de subsídio de desemprego eventualmente atribuído ao A., devendo a R. entregar essa quantia à Segurança Social; - condeno a R. a pagar ao A., a título de indemnização substitutiva, a quantia de €14.740,80 (catorze mil, setecentos e quarenta Euros e oitenta cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa anual de 4% desde a data desta sentença e até efectivo e integral pagamento; - absolvo a R. do mais peticionado pelo A.” A empregadora, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte: “...

” * O trabalhador apresentou resposta, concluindo que: ...” * O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 921 e segs., no sentido de que a sentença recorrida deve manter-se.

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

II – Fundamentação a)- Factos Provados constantes da sentença recorrida: 1) O A. foi admitido nos quadros da R. com efeitos a 20 de novembro de 2002, tendo permanecido ao seu serviço até ao dia 16/1/2018, data em que foi suspenso de funções; 2) Em 10 de abril de 2018 o A. foi notificado da deliberação da R. que lhe aplicou a sanção disciplinar de despedimento sem indemnização ou compensação; 3) À data de 10 de abril de 2018 o A. auferia as seguintes remunerações mensais: - vencimento base: € 816,60; - diuturnidades: € 91,71; - diuturnidade especial: € 13,11; - subsídio de refeição por cada dia de trabalho: € 9,01; 4) No âmbito da sua categoria de carteiro, o A. desenvolvia a sua atividade no Centro de Distribuição Postal de ...); 5) No dia 30 de novembro de 2017 o Diretor de Operações ... da R., ..., enviou mensagem de correio eletrónico à Inspeção da Direção de Auditoria e Qualidade da R. a solicitar ajuda no caso do A., atendendo à discrepância entre os condicionalismos para exercer as funções de carteiro e os comentários sobre a sua atividade desportiva, nomeadamente de que o A. jogava futebol de onze na equipa de veteranos do “...”; 6) No dia 30 de novembro de 2017, para desenvolver ação de investigação com vista a esclarecer os factos que estiveram na origem da situação reportada, foi designado ...; 7) No dia 2 de dezembro de 2017, no âmbito das diligências realizadas na ação de investigação, o inspetor ... deslocou-se ao Estádio Municipal de ..., onde iria haver um jogo com intervenção da equipa de Veteranos do ... e que deu origem ao auto de notícia de fls. 10-11 do processo disciplinar; 8) No dia 7 de dezembro de 2017, a diretora dos Serviços Jurídico-Laborais da Ré determinou a abertura de procedimento disciplinar com vista ao apuramento de todas as circunstâncias que rodearam a prática dos factos participados e/ou outros que viessem a ser apurados e foi nomeada instrutora a Dra...; 9) O A., nos últimos anos, alegou junto da gestão do Centro de Distribuição Postal de ..., que: - não conseguia realizar integralmente os giros, mesmo os mini giros, no tempo previsto, pois, devidos aos seus problemas de saúde, não tem o mesmo ritmo de trabalho dos outros colegas carteiros; - não conseguia efetuar as tarefas internas de divisão e sequenciamento durante...

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