Acórdão nº 3573/17.5T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelALBERTO RUÇO
Data da Resolução05 de Maio de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

* Tribunal da Relação de Coimbra – 2.ª Secção Recurso de Apelação – Processo n.º 3573/17.5T8LRA .C1 * Juiz relator…………....Alberto Augusto Vicente Ruço 1.º Juiz adjunto………José Vítor dos Santos Amaral 2.º Juiz adjunto……….Luís Filipe Dias Cravo * Sumário: I- O dano biológico ou dano na saúde é sempre indemnizável independentemente das suas consequências patrimoniais ou não patrimoniais, influindo estas apenas no seu quantitativo.

II - Tendo o autor 47 anos à data do acidente; tendo permanecido 221 dias em estado de doença, suportado sofrimentos (quantum doloris) situados no grau 4 de uma escala de 7 graus de gravidade crescente; sendo portando de um dano estético permanente enquadrável no grau 1 da mesma escala, é ajustado fixar a indemnização por estes danos em 7.500,00 euros.

Tendo ficado com um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 5 pontos numa escala ascendente de 100, que se reflete numa diminuição da capacidade do autor para praticar atividades desportivas e de lazer, de grau 3 na mesma escala, afigura-se adequada a indemnização de 17.500,00 euros.

* Recorrente ………………Z (…) – Sucursal Portugal, (…) Recorrido…………………J (…) * I. Relatório

  1. O presente recurso insere-se numa ação declarativa de condenação através da qual o Autor pretende obter da Ré seguradora uma indemnização por danos que sofreu num acidente de viação, porquanto a Ré assumiu, por contrato de seguro, a responsabilidade civil resultante de danos causados pela circulação do veículo automóvel matrícula HG (...) , a cujo condutor o Autor atribui a responsabilidade pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu.

    Concretizando, pediu a condenação da Ré no seguinte: A – A reconhecer que o condutor do veículo HG (...) é o único culpado do acidente descrito neste articulado de petição inicial e como tal incumbe à Ré, enquanto entidade para a qual se encontra transferida a responsabilidade civil por acidentes de viação, a obrigação de indemnizar o Autor.

    B – A pagar ao Autor a quantia de 70.000,00 € (setenta mil euros), por danos patrimoniais futuros/lucros cessantes, causados pelo acidente de que o Autor foi vítima, já apurados e contabilizados até à data de entrada desta petição em juízo (de acordo com o disposto no artigo 565º do C.C), nomeadamente por danos patrimoniais futuros resultantes da incapacidade permanente, determinante para a diminuição da capacidade geral de ganho, com a consequente diminuição dos proventos do trabalho para o Autor, tudo sem prejuízo da indemnização por danos não patrimoniais; C- A pagar ao Autor as quantias emergentes dos tratamentos e cirurgias que o mesmo vier a ser sujeito; D – A pagar ao Autor a quantia que se vier a apurar em execução de sentença relativa a todas as componentes indemnizatórias integrantes do dano não patrimonial sofrido pelo acidente de que o A. foi vítima, e que não pode de momento peticionar-se por se desconhecer com precisão o “quantum doloris” e o grau de incapacidade geral/ Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de que o Autor irá padecer para o resto da vida.

    E – A pagar à Autor juros à taxa legal a contar da citação até integral pagamento dos montantes em débito.

    A ré contestou aceitando a culpa do condutor do veículo segurado; que acidente é, ao mesmo tempo, também de acidente de trabalho, impugnando também a extensão dos danos alegados pelo autor.

    ● A seu tempo procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento e depois foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a ação e A- condeno a ré a pagar ao autor: i- a quantia de € 25 000 (vinte e cinco mil euros) a título de danos morais, a que acrescem juros vincendos até integral pagamento; e ii- a suportar as quantias necessárias aos tratamentos e cirurgias que o autor vier a ser sujeito e que sejam consequência do acidente.

    B- absolvo a ré dos restantes pedidos contra si formulados.

    Custas pelo autor e ré nas proporções dos respetivos decaimentos».

  2. E desta decisão que vem interposto recurso por parte da Ré seguradora, cujas conclusões são as seguintes: (…) c) Não há contra-alegações.

    II. Objeto do recurso.

    De acordo com a sequência lógica das matérias, cumpre começar pelas questões processuais, se as houver, prosseguindo depois com as questões relativas à matéria de facto e eventual repercussão destas na análise de exceções processuais e, por fim, com as atinentes ao mérito da causa.

    Tendo em consideração que o âmbito objetivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (artigos 639.º, n.º 1, e 635.º, n.º 4, ambos do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as questões que este recurso coloca são as seguintes: 1- A primeira questão colocada pelo recurso respeita à impugnação da matéria de facto.

  3. A recorrente pretende que sejam declarados «não provados» os seguintes factos declarados «provados»: «1.11 - as sequelas são compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares»; «1.20 - O Autor sempre exerceu a sua atividade profissional bem como a sua vida diária com normalidade sem quaisquer limitações físicas, antes do acidente ora em causa nos presentes autos»; e «1.25 - O trabalho realizado pelo Autor implica esforço físico, por o mesmo consistir na abertura de roços para reparação de canalizações».

  4. E pretende que seja ainda declarado provado o seguinte facto, considerando o depoimento prestado em audiência pela esposa e pelo filho do Autor: «Atualmente o Autor continua a trabalhar na Câmara Municipal de P (...) , exercendo agora funções como vigilante na rodoviária».

    2 – Em segundo lugar, em sede de mérito da causa, a Recorrente pretende a alteração da decisão, no sentido de se relegar para liquidação posterior a indemnização devida ao autor por danos não patrimoniais, por não ser ainda possível definir tais danos, devendo-se eliminar da decisão o pagamento da quantia de 25.000,00 euros, a título de indemnização relativa a danos de natureza não patrimoniais.

    Ou, subsidiariamente, fixar-se uma indemnização em montante inferior porquanto o Autor já padecia de limitações físicas que se repercutiam negativamente na sua atividade profissional.

    III. Fundamentação a) Impugnação da matéria de facto.

    1- Como se disse, a Recorrente pretende ver declarado «não provado» o seguinte facto «provado»: «1.11 - as sequelas são compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares».

    A Ré argumenta que o Autor continua a trabalhar para a Câmara Municipal de P (...) , mas deixou de exercer funções na divisão de águas e saneamento da Câmara Municipal de P (...) , tendo passado a exercer funções de vigilante na Rodoviária de P (...) .

    Sendo assim, as lesões sofridas pelo Autor poderão não implicar para si a realização de esforços acrescidos no exercício das novas funções laborais de vigilante na rodoviária.

    Para alcançar este resultado, a Ré também pretende que este novo facto relativo ao exercício de novas funções seja declarado provado, como se verá mais abaixo, para poder ser levado em consideração nos autos.

    Por conseguinte, sem necessidade de produzir mais considerações, este facto impugnado poderá ser redigido de um modo mais concreto, que seja compatível com a pretensão da Ré quanto ao novo facto, sem que com isso se descaraterize a correspondência entre a matéria de facto e a realidade.

    Por conseguinte reformula-se o facto que passará a ter a seguinte redação.

    «1.11 - As sequelas são compatíveis com o exercício da atividade habitual de assistente operacional da divisão de águas da C.M. de P (...) , no exercício da qual abre e escava manualmente sulcos para saneamento básico, mas implicam esforços suplementares».

    Deste modo, se se vier a considerar provado que o Autor já não exerce estas funções, então este facto poderá ser articulado com o novo facto sem que haja contradições.

    2- A Autora pretende também ver declarado «não provado» o seguinte facto «provado»: «1.20 - O Autor sempre exerceu a sua atividade profissional bem como a sua vida diária com normalidade sem quaisquer limitações físicas, antes do acidente ora em causa nos presentes autos».

    A Recorrente argumenta que consta do relatório médico-legal que o Autor já padecia anteriormente ao acidente de várias patologias.

    Assiste razão à Recorrente.

    Com efeito consta do relatório que o Autor padecia anteriormente de espondilose lombar nas vértebras L4, L5 e L5-S1 e que o mesmo numa consulta realizada em 28 de agosto de 2014, no Hospital de Santo André, em Leiria, se queixou de dores incapacitantes e persistentes tendo sido seguido no hospital com vista ao tratamento destas patologias.

    Consta também do relatório (fls. 12 e 13) que «Em virtude das lesões sofridas no presente acidente (fractura de L1), o Autor não necessita de ser submetido a tratamento cirúrgico. O tratamento cirúrgico entretanto realizado – “fixação transpedicular L4 L5 S1. Fenestração L4-L5 esquerda e discectomia. Fenestração e foraminectomia L5-S1 esquerda” – teve por objectivo o tratamento de patologia que não guarda relação com o presente acidente”. (…) Adicionalmente às queixas/sequelas acima referidas, o Autor padece ainda de lombociatalgia esquerda, para a qual foi submetido a tratamento cirúrgico, sequelas estas que resultam de patologia prévia ao acidente, conforme se pode verificar nos dados documentais acima...

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