Acórdão nº 178/10.5GFPRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Junho de 2011

Data21 Junho 2011
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. No processo comum singular n.º 178/10.5GFPRT do Tribunal Judicial da Mealhada, o arguido VN...

    , devidamente identificado nos autos, por sentença datada de 7 de Outubro de 2010, foi decidido: · a) Condenar o arguido VN...

    , como autor material, pela prática de um crime de desobediência p. e p. pelo artº. 248º, 1, a) e 69º, n.º1, al. c), do C.P., por referência ao art. 152º, n.º 1, al. a), n.º 3, e 153º, do Código da Estrada, na pena de 5 (cinco) meses de prisão; · b) Substituir a pena de prisão aplicada em a), pela pena de 150 (cento e cinquenta) horas de prestação de trabalho a favor da comunidade; · c) Condenar o arguido na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, pelo período de 12 (doze) meses (artº 69º, nº 1, al. a), do C.P, na redacção actual), devendo o arguido entregar a respectiva carta/licença de condução, na secretaria deste Tribunal, no prazo de dez dias a contar do trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de, não o fazendo, ser determinada a apreensão daquela carta/licença (cf. artº. 500º, nºs. 2 e 3, do C.P.P.), e de incorrer na prática de um crime de violação de proibições, a que também ficará sujeito se conduzir durante o período acima fixado.

    · d) Mais, vai o arguido condenado no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC.

    2.

    Inconformado, o arguido recorreu da sentença.

    Finalizou a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): «1. A factualidade dada como provada nas alíneas c), d), e), f) e 1), m) e n) não traduz, a nosso ver, e salvo o devido respeito, com exactidão, tudo aquilo que se passou em audiência de discussão e julgamento e não está conforme com a prova ali produzida.

  2. O tribunal alicerçou a sua convicção no depoimento prestado pela testemunha AF..., que no era de todo desconforme com as declarações do próprio arguido, como resulta da gravação da prova - cfr. gravação em suporte magnético com o n.° 981, da volta 126 (inicio da gravação) à volta 194 (fim da gravação) - esclarece que no se recusou a expirar o ar para o aparelho solicitado, no estrito cumprimento das ordens dadas pela autoridade; todavia, de seguida, perante a solicitação de repetição do procedimento para outro aparelho que pediu para realizar a contra-prova com análise ao sangue, explicando que em data anterior, no âmbito de uma fiscalização pelas autoridades, que após ter expirado ar para um aparelho, realizou uma contraprova com análise ao sangue e que os níveis de álcool detectados no sangue foram mais reduzidos; esclareceu que desconhecia qual o valor acusado, pois no lhe foi sequer comunicado pelas autoridades e deixou bem claro que a única razão por que no quis soprar novamente foi a diferença de procedimento relativamente à referida fiscalização anterior de que foi alvo e que estava nervoso e no percebeu que era proibida a sua recusa em expirar o ar pela segunda vez, para um aparelho diferente, estando convencido que a sua prontidão para prestar a contra-prova ao sangue demonstrava a sua prontidão em colaborar.

  3. A testemunha AF... confirma que o arguido estava nervoso, com questões da sua vida e que este solicitou a contra-prova, com análise ao sangue, e ainda, que no foi dito ao arguido quais os valores registados.

    4[1]. A factualidade dada como provada não traduz, a nosso ver, e salvo o devido respeito, com exactidão, tudo aquilo que se passou em audiência de discussão e julgamento e não está conforme com a prova ali produzida, uma vez que o tribunal alicerçou a sua convicção nos depoimentos prestados pelas testemunhas indicadas na acusação – mãe e irmãs da ofendida BX..., em detrimento dos depoimentos das testemunhas indicadas pela defesa, no sentido de não ter atribuído igual importância a estes, por ter considerado que estas tinham um “conhecimento da vida do casal de forma superficial, dado o relacionamento casual com os mesmos”. Todavia, o contacto com as testemunhas de acusação no era diário, nem próximo, sendo certo que uns viviam na Suíça e outros em Portugal, e grande parte dos relatos que fizeram foi a reprodução de conversas com a ofendida e de telefonemas feitos por esta.

  4. O arguido quando não expirou o ar pela segunda vez, não teve consciência da ilicitude da sua conduta porque afinal até solicitou a contraprova ao sangue e acreditava que era um procedimento correcto.

  5. Nas alíneas l), m) e n) dos factos provados constam três condenações do arguido, resultantes do certificado de registo criminal junto aos autos, de fls, onde consta que o arguido foi condenado pela prática de dois crimes de condução em estado de embriaguez, praticados em 29/11/2004 e 06712/2003, e ainda, por um crime de desobediência, praticado em 01/08/2002.

  6. Da douta sentença resulta que na escolha e determinação da medida da pena o arguido já foi condenado, por três vezes, pela prática de crimes relacionados com a circulação estradal, sendo um deles pela prática do crime de desobediência, contudo, do certificado de registo criminal no se pode extrair que o arguido tenha sido condenado três vezes pela prática de crimes relacionados com a circulação estradal.

  7. As únicas condenações do arguido relacionadas com a circulação estradal só as de condução em estado embriaguez, não resultando do certificado de registo criminal que o crime de desobediência tenha qualquer relação com a circulação estradal.

  8. A condenação do arguido pela prática do crime de desobediência foi no âmbito de uma decisão sobre a edificação de um muro.

  9. Assim, e salvo melhor opinião, a conclusão vertida na douta sentença sobre as referidas condenações anteriores do arguido são um erro notório na apreciação da prova, o que obviamente, influencia também na medida da pena.

  10. Se os referidos factos não fossem considerados provados, no restam dúvidas que da restante matéria de facto considerado provada, o arguido não seria condenado em cinco meses de prisão e na pena acessória de inibição de conduzir veículos motorizados durante o período de 12 meses.

  11. Deste modo, tendo a douta sentença condenado o arguido nos termos em que o fez, em desrespeito pelos princípios supra enunciados, poderá mesmo consubstanciar, a nosso ver, tanto uma violação do art° 127° do Cód. Proc. Penal, como uma insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova, por incorrectamente julgada e apreciada a matéria de facto constante das alíneas c), d), e), f) e l), m) e n) com o sentido que lhe atribuiu, vícios que aqui expressamente se invocam e a que se refere a al. a) do n°. 2, do art° 410º do Cód. Processo Penal, pois, como é jurisprudência pacífica, tal vício ocorre, além do mais, quando da factualidade vertida na decisão em recurso se colhe faltarem elementos que, podendo e devendo ser julgados, são necessários para se formular um juízo seguro (neste caso) de condenação (cfr. Acs. Do S.T.J. de 98.03.19, Proc. N.° 1467, de 98.12.09, Proc. 1165/98, e 99.01.07, Proc. N.° 1055/98, citados por Simas Santos e Leal Henriques, in «Recursos em Processo Penal», 4ªa edição - 2001, pp. 72 e 73).

  12. Do que poderia resultar provado, da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, e ainda, do certificado de registo criminal, deveria o arguido ser absolvido da prática do crime de desobediência, mas mesmo que assim no se entenda, e no caso de entender que deve ser condenado, ser aplicada uma pena inferior, sendo certo que ao ter sido condenado nos termos em que o foi, verificou-se uma violação do art° 71° do C.

    Penal 14. Não constam dos autos elementos que permitam a condenação do arguido na pena de cinco meses de prisão e na pena acessória de inibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 12 meses.

    Termos em que deve a sentença em apreço ser revogada e substituída por outra que absolva o arguido do crime pelo qual foi acusado, e caso assim no se entenda, seja alterada a pena aplicada ao arguido, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!» 3.

    O Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso, opinando que o acórdão recorrido deve ser mantida na íntegra, assente que a mesma fez uma criteriosa fundamentação e aplicação da lei ao caso concreto.

    Conclui assim: «1. A prova dos factos indicados nas alíneas a) a f) da sentença recorrida decorre do depoimento de AF... (gravado em suporte magnético com o n°981, da volta 126 à volta 194), militar da GNR que procedeu à acção de fiscalização e que confirmou o teor do auto de notícia por si lavrado.

  13. Esclareceu esta testemunha que, após a abordagem ao arguido, foi solicitada a realização de teste de pesquisa de álcool no sangue por ar expirado através de aparelho qualitativo, ao que o arguido acedeu. No entanto, após ter sido informado de que tinha acusado uma taxa positiva de álcool no sangue e de que, por esse motivo, teria de efectuar o teste de pesquisa de álcool por ar expirado através de aparelho quantitativo que se encontrava no Posto da GNR, o arguido recusou-se a efectuar esse teste.

  14. Esclareceu ainda esta testemunha que o arguido foi informado de que poderia efectuar o teste de pesquisa de álcool através de colheita sanguínea em sede de contraprova, após a realização do teste quantitativo pelo ar expirado e de que, não o fazendo, incorreria na prática do crime de desobediência, ao que o arguido, esclarecido do procedimento a adoptar e ciente das consequências da sua conduta, recusou efectuar o aludido teste.

  15. Trata-se de depoimento de testemunha imparcial, agente de autoridade no exercício das suas funções, que não conhecia o arguido e, por esse motivo, totalmente desinteressado na causa. Para além disso, respondeu sempre de forma segura e coerente, sem hesitações ou contradições, esclarecendo a todos os pormenores que lhe foram solicitados, pelo que não merecem credibilidade as declarações do arguido e a alegação de que não se teria recusado à elaboração do teste por ter solicitado a realização de colheita sanguínea.

  16. Para além disso, conhecia o arguido os concretos moldes deste procedimento, uma...

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