Acórdão nº 157/07.0TAMMV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução26 de Outubro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - RELATÓRIO No processo comum singular supra identificado, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que CONDENOU O ARGUIDO A..., casado, residente em …, VV...

pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de falsificação de documento p. e p. nos arts. 256°, n° 1, al. b) do Código Penal, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa à taxa diária de € 10,00 (dez euros), o que perfaz a quantia global de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros).

Inconformado o arguido interpôs da sentença, sendo do seguinte teor as conclusões, formuladas na motivação do recurso: 1ª O tribunal, ao condenar o arguido, fundou a sua convicção tendo por base, além da prova documental junta aos Autos, parte das declarações do Arguido e em toda a prova testemunhal prestada em audiência de discussão e julgamento.

2a O n.º 6 do art. 328 do C.P.P. estabelece que "O adiamento não pode exceder trinta dias. Se não for possível retomar a audiência nesse prazo, perde eficácia a produção de prova já realizada".

3ª - Este dispositivo legal consagra o princípio da continuidade da audiência, visando defender os fins pretendidos pelos princípios da imediação e da concentração (manutenção das impressões e recordações colhidas e unidade, decorrente da continuidade da audiência e decisão).

4ª Destarte, esta disposição é justificada pela oralidade e imediação da prova, que necessariamente tem de estar presente na memória dos julgadores.

5ª - Acontece que, conforme aduzimos supra, entre 15 de Outubro de 2010 (data em que foram prestados os depoimentos das testemunhas B..., C... D..., E..., F..., G... e H...) e 16 de Novembro de 2010, (data em que, na sequência de comunicação em audiência de leitura de sentença, de alteração não substancial dos factos, o arguido apresentou por escrito a sua defesa, cuja junção foi admitida aos presentes autos), não foi produzida qualquer prova, o que, tendo sido ultrapassado o período de 30 dias fixado por lei, acarreta a ineficácia da prova produzida nas sessões de julgamento ocorridas em 21 de Setembro e 15 de Outubro de 2010.

6- Não se venha dizer que neste intermédio ocorreram duas sessões de julgamento que terão interrompido o aludido prazo, uma vez que em 29 de Outubro de 2010 apenas foram produzidas alegações de facto e de direito pelo Ministério Público e pela Mandatária do Arguido, e em 11 de Novembro de 2010, em audiência de leitura de sentença, apenas foi comunicada uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação e concedido prazo ao arguido para apresentar a sua defesa, não tendo por isso sido produzida qualquer prova.

7ª A perda de eficácia da prova está ligada a uma presunção legal implícita, segundo a qual o decurso de tal prazo apagará da memória do julgador os pormenores do julgamento, prejudicando desse modo a base da decisão factual, de tal modo que será possível o entendimento de que o único remédio para um tal esquecimento presumido passará pela repetição da audiência.

8ª Assim sendo, tendo decorrido mais de 30 dias entre audiências de julgamento onde de facto foi produzida prova, esta perdeu eficácia, impondo-se por isso a anulação e a repetição do julgamento.

9ª Com efeito, o art. 328º, nº 6 do CPP ao determinar que perde eficácia a prova produzida, em caso de adiamento superior a 30 dias, consagra o princípio da concentração processual ou da continuidade, cuja aplicação adequada não pode deixar de ter em conta os princípios da oralidade, da imediação e da verdade material.

10ª Princípios estes que não foram respeitados ao não se ter produzido qualquer prova num hiato de tempo que decorreu entre 15 de Outubro e 16 de Novembro de 2010.

11a A perda da eficácia probatória da prova só tem consequências quando esta prova é incluída na fundamentação da sentença.

12ª Ora, quer as declarações do Arguido, quer o depoimento de todas as testemunhas que foram ouvidas em julgamento e que serviram de fundamento à sentença sub iudicio foram prestados nas sessões de 21 de Setembro e 15 de Outubro de 2010 e serviram de pedra angular à sentença sub iudicio.

13a Como se refere no Acórdão do STJ de fixação de jurisprudência, de 29-10-2008, «(...) a perda de eficácia tem por consequência a necessidade da sua repetição. A mesma prova produzida deixa de ter qualquer virtualidade para fundamentar a convicção do julgador, ou para produzir qualquer efeito processual.-».

14ª - Por conseguinte, tendo a prova perdido eficácia, há proibição quanto à sua valoração e consequentemente lugar à anulação da sentença ora recorrida, bem como, tendo em conta o procedimento descrito em 29 a 159 deste articulado, à anulação de todo o julgamento, nos termos do disposto no art. 1222 do CPP.

15ª em audiência de discussão e julgamento ocorrida em 29 de Outubro de 2010 foram produzidas alegações quer pelo Ministério Público, quer pela Mandatária do Réu, findas as quais foi perguntada ao arguido se tinha mais alguma coisa a alegar em sua defesa e em seguida foi declarada encerrada a discussão, tendo-se designado data para a leitura de sentença, nos termos do disposto no art. 361º do CPP.

16ª Posteriormente, em 11 de Novembro de 2010, na data designada para a leitura de sentença foi comunicado pelo tribunal ao Arguido nos termos do disposto no art. 358º do CPP a alteração não substancial dos factos elencados na acusação tendo-lhe sido concedido prazo para apresentar a sua defesa, em escrupuloso cumprimento do princípio do contraditório.

17ª Ora, o art. 361º n.º 2 in fine estipula que finda as alegações e perguntado ao arguido se tem mais alguma coisa a alegar em sua defesa, a audiência de discussão e julgamento considera-se para sempre encerrada, só sendo permitida a sua reabertura nos termos e para os efeitos previstos no art. 371º do CPP.

18ª Refira-se outrossim que o art. 361º do CPP está inserido no Título II daquele código designado por "Da Audiência".

19ª - Diga-se também que o art. 358º que estipula o instituto da alteração não substancial dos factos descritos na acusação também está inscrito no capítulo designado por "Da Audiência", o que significa que tal alteração só pode ser comunicada ao arguido no decurso da audiência de discussão e julgamento e não já depois desta encerrada, isto é, não depois de já terem sido proferidas alegações, dada oportunidade ao arguido para se pronunciar a final sobre a sua defesa e encerrada a discussão com designação de dia para a leitura da sentença.

20ª Mais se argumente que, nos termos do disposto no art. 361º n.º 2 in fine conjugado com o art. 371º n.º 1 do CPP só é permitida a reabertura da audiência de discussão depois desta encerrada, quando se torne necessária a produção de prova suplementar, nos termos do n.º 2 do art. 369º.

21ª Ora, o n.º 2 do art. 369º refere-se a prova suplementar para determinação da espécie e da medida da sanção a aplicar.

22ª Diga-se que este artigo 371º do CPP já está inserido no capítulo III designado por "Da sentença", o que significa que a sua aplicação ocorre num momento em que já está encerrada a audiência de discussão.

23º Ora, da aplicação conjugada dos artigos 361º n.º 2 in fine e do art. 371º do CPP não decorre que após encerrada a audiência de discussão, possa o tribunal vir reabri-la com fundamento e para os efeitos no disposto no art. 358º do CPP.

24a se assim fosse, o legislador teria mencionado no art. 361 n.º 2 do CPP "Em seguida o presidente declara encerrada a discussão, sem prejuízo do disposto no art. 358º e no art. 371e, e o tribunal retira-se para deliberar". E o art. 371º n.º 2 do CPP referiria expressamente, tornando-se necessária a produção de prova suplementar, nos termos do disposto no art. 358º do CPP e nos termos do disposto no n.º 2 do art. 369º, o tribunal volta à sala de audiência e declara esta reaberta.

25- Neste conspecto, só se poderá concluir que a comunicação ao Arguido da alteração não substancial de factos não previstos na acusação só poderá ser feita até ao encerramento da discussão, nos termos do disposto no art. 361º do CPP e não, como ocorreu nos presentes autos, depois desta encerrada e em audiência marcada para a leitura da sentença.

26- Considerar que a comunicação da alteração não substancial dos factos plasmada no art. 358º n.º 1 poderá ser feita depois de encerrada a discussão, ao abrigo do disposto no art. 361º n.º 2 in fine e do disposto no art. 371º é fazer uma interpretação sem que esta tenha, na letra da lei, um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

27ª Em suma, o intérprete deverá presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados - art. 92 nº. 3 do Código Civil.

28- Pelo que o tribunal a quo ao comunicar ao arguido em audiência de leitura de sentença marcada para o dia 11 de Novembro de 2010 uma alteração não substancial dos factos, quando essa possibilidade já lhe estava legalmente vedada e ao condenar o arguido com fundamento em factos que não constavam da acusação pública, mas sim de uma alteração não substancial que processualmente lhe estava vedado realizar está a violar o disposto nos artigos 358º conjugados com os artigos 361º e 371º todos do CPP, o que deverá determinar a anulação da sentença recorrida.

29º Na sentença objecto do presente recurso consta no ponto 7. dos factos provados que a construção de seis churrasqueiras e das duas chaminés no telhado e a colocação da porta de entrada do alçado/fachada sul à face da parede exterior, alteraram a fachada do edifício.

Em ponto alguns dos factos dados como provados consta que a construção de duas chaminés no telhado altera a forma do telhado.

30- Ora, da leitura do Capítulo IV da sentença ora posta em causa, denominado "Fundamentação de Direito. Enquadramento jurídico-subsunção", podemos concluir que o tribunal a quo considerou que as alterações em obra, que deu como provadas, alteram a forma do telhado, quando tal nunca foi referido nos factos dados como provados, nem foram...

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