Acórdão nº 3605/10.8T2AGD-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2011
Magistrado Responsável | TELES PEREIRA |
Data da Resolução | 25 de Outubro de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.
No quadro de uma execução para prestação de facto [artigos 933º e seguintes do Código de Processo Civil (CPC)], fundada em sentença condenatória, execução esta que se iniciou em 04/10/2010[1] com o requerimento executivo certificado a fls. 48/51[2], foi deduzida oposição pelos Executados, A… e mulher, M… (Executados, RR. condenados na acção que gerou o título executivo e aqui Apelantes)[3], sendo Exequente B… (A. cuja pretensão procedeu na acção que gerou o referido título executivo e ora Apelada).
1.1.
Esta – a Exequente – respondeu à oposição pugnando pelo prosseguimento da execução nos exactos termos resultantes do título nela apresentado, indicando como antagónica do caso julgado subjacente à Sentença/título executivo a pretensão dos Executados reportada ao nº 2 do artigo 941º do CPC.
1.1.1.
Para integral compreensão do que está em causa no recurso tenha-se presente o pronunciamento decisório com o qual culminou essa Sentença, na parte (abaixo destacada) cuja realização corresponde à prestação de facto aqui pretendida executar: “[…] - reconhece-se que a A., B…, é dona e legitima proprietária do prédio identificado no ponto 1. da matéria de facto; - reconhece-se que o prédio identificado no ponto 1. da matéria de facto tem direito a manter abertas para Sul, à custa do prédio dos RR., as duas janelas e uma porta, que já existiam à data da aquisição do prédio identificado no ponto 3. da matéria de facto; - reconhece-se que a A. tem direito a entrar e sair pela dita porta, utilizando para tanto o caminho existente a Sul; - condenam-se os RR., A… e M… a demolir todas as obras por si erigidas a Sul das ditas janelas e porta; - condenam-se os RR. a absterem-se de levantar qualquer tipo de construção em frente às ditas janelas e porta enquanto se mantiver qualquer dos edifícios (construções urbanas) existentes em ambos os prédios (de A. e RR.).
- condenam-se os RR. a repararem todo o alçado Sul da casa da autora e respectivo beiral, colocando-o no estado em que se encontrava antes das obras que os RR. iniciaram em Janeiro do ano de 2007; […]”[4] [transcrição de fls. 63/64, sublinhado aqui acrescentado] 1.2.
Surge então, decidindo esta oposição, o despacho (a Sentença) de fls. 27/29 – constitui este(a) a decisão objecto do presente recurso –, julgando improcedente a pretensão dos Executados e determinando o prosseguimento da execução[5].
1.3.
Inconformados, interpuseram os Executados a presente apelação, motivando-a a fls. 37/40, formulando a rematar tal peça as conclusões que aqui se transcrevem: “[…] 1.
Os recorrentes fundaram a sua oposição no disposto na parte final do nº 2 do artigo 941º do CPC.
-
Tal disposição legal, salvo melhor opinião, encontra-se em vigor, não sendo anulada pelo disposto no artigo 814º do mesmo CPC.
-
A douta decisão recorrida não apreciou o fundamento da oposição.
-
A douta decisão recorrida padece, por isso, do vício enumerado na alínea d) do artigo 668º do CPC, pelo que deve ser declarada nula e substituída por outra que, apreciando a oposição deduzida, ordene os posteriores termos […].
[…]” [transcrição de fls. 40] II – Fundamentação 2.
Neste recurso, como em qualquer outro, as conclusões formuladas pelos Apelantes, que transcrevemos no item anterior, operaram a delimitação temática do respectivo objecto, nos termos dos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do CPC.
Os elementos relevantes a considerar correspondem a todo o acervo de incidências (fundamentalmente de índole processual) relatadas ao longo do item 1. deste Acórdão. São esses, pois, se preferirmos designar as coisas nesses termos, os factos que interessam à subsequente exposição.
2.1.
Constitui tema único do recurso – e assim o enunciamos – a questão da aplicabilidade do artigo 941º, nº 2 do CPC (trecho final)[6], enquanto enunciação de um fundamento autónomo de oposição a uma execução para prestação de facto cujo título executivo é constituído por uma sentença – uma sentença que condena, precisamente, nessa prestação de facto.
É esta questão, pois, que nos cumpre apreciar, substituindo – haverá que o conceder – algum défice argumentativo da decisão apelada.
2.1.1.
Com efeito, a decisão recorrida julgou improcedente a oposição deduzida pelos Executados aqui Apelantes com fundamento na não verificação de qualquer das situações elencadas no artigo 814º do CPC[7], podendo extrapolar-se – e é necessária a extrapolação porque a decisão recorrida é omissa, na sua argumentação, na apreciação de tal incidência – pode extrapolar-se, dizíamos, que subjaz ao pronunciamento do Tribunal o entendimento da não aplicabilidade do artigo 941º, nº 2 do CPC à execução baseada em sentença, mesmo que esta (a condenação) corresponda a uma prestação de facto (negativo e fungível)[8] que se traduza numa demolição. Esta é – realizar uma demolição –, com efeito, a situação que aqui se nos depara tendo presente a estrutura do pronunciamento decisório da Sentença apresentada pela Exequente como título executivo.
Interessa-nos reter, assim, como ponto de partida e na sequência do que acabámos de dizer, a seguinte incidência geral (mesmo fora do quadro da obrigação imposta por sentença) associada à realização coactiva da prestação de um facto negativo fungível (incidência que aqui caracterizamos citando Fernando Amâncio Ferreira): “[…] Se o facto fungível respeitar a uma obrigação que tenha por objecto um facto negativo, tem o credor o direito de exigir que a obra, se obra feita houver, seja demolida à custa do que se obrigou a não a fazer, a menos que o prejuízo da demolição para o devedor seja consideravelmente superior ao prejuízo sofrido pelo credor (artigo 829º do CC).
[…]”[9] Note-se que o tal entendimento que subjaz à decisão recorrida, quanto à inaplicabilidade do artigo 941º, nº 2 in fine à prestação de facto negativo resultante de sentença, vale, desde logo, como projecção da indiscutibilidade própria do caso julgado (v. artigo 671º, nº 1 e trecho inicial do artigo 673º do CPC)[10]. Com efeito, foi através deste (do caso julgado), depois de alcandorado à categoria de título executivo, que se demonstrou aqui o acertamento da obrigação, que constitui pressuposto da acção executiva[11], sendo que uma indagação adicional em sede de acção executiva sobre a proporcionalidade da obrigação de demolir nos termos em que foi imposta aos RR. na acção declarativa (note-se que é um juízo de proporcionalidade o que subjaz ao segundo trecho do nº 2 do artigo 941º do CPC), relativizaria esse mesmo caso julgado, pois implicaria um novo julgamento no qual poderíamos concluir – e tratar-se-ia sempre de uma conclusão contra o sentido desse caso julgado – que a obrigação imposta na sentença, até poderia ser desproporcional: poderia, parafraseando o trecho final do nº 2 do referido artigo 941º, representar para o executado...
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