Acórdão nº 127/10.0TBLSA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelSÍLVIA PIRES
Data da Resolução25 de Outubro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra A Autora intentou a presente acção com processo ordinário, pedindo que seja reconhecida como titular das prestações da pensão de sobrevivência, no âmbito do regime de segurança social, e respectivo pagamento decorrentes do falecimento de F...

Para fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese: Ø A Autora e F…, ambos com o estado civil de divorciados, viveram como se marido e mulher fossem um do outro durante vários anos, com início em 1996, e até à morte deste, ocorrida em 12.11.2008.

Ø Presentemente a Autora, desempregada desde o ano de 2007, encontra-se em situação de não possuir bens ou rendimentos que lhe permitam fazer face às despesas correntes do seu quotidiano e do seu agregado familiar, composto por si e por um filho menor, de nome J…, o qual é filho também do referido F...

Ø A Autora, dentre os seus diversos familiares, não tem ninguém com possibilidade de lhe prestar alimentos.

Ø Da herança deixada pelo falecido não constam bens ou rendimentos que permitam suportar o pagamento da pensão de alimentos de que carece.

O Réu contestou, impugnando diversa factualidade alegada pela Autora, concluindo que a acção seja julgada de acordo com a prova a produzir em audiência de julgamento.

Veio a ser proferida sentença que julgou a acção improcedente por não provada.

Inconformada com a decisão a Autora recorreu, formulando as seguintes conclusões: ...

Conclui pela procedência do recurso.

O Réu apresentou resposta, defendendo a confirmação da decisão recorrida.

  1. Do objecto do recurso Encontrando-se o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente cumpre apreciar a seguinte questão: A Autora demonstrou que se verificam os requisitos necessários ao reconhecimento do direito invocado? 2. Os Factos Os factos provados são os seguintes: ...

  2. O Direito Aplicável A Autora na presente acção pretende que lhe seja reconhecida a titularidade das prestações por morte no âmbito dos regimes de Segurança Social previstos no Decreto-Lei nº 322/90, de 18 de Outubro, no Decreto-Regulamentar nº 1/94, de 18 de Janeiro e na alínea e) do nº 3, ex vi artigo 6º, da Lei nº 7/2001, de 11 de Maio, em resultado da morte de F…, com quem vivia em união de facto.

A decisão recorrida recusou-lhe esta pretensão com fundamento em que a Autora não demonstrou que não pudesse obter alimentos do ex-cônjuge.

Como expressão de um Estado-Providência este assegura, desde há muito, no nosso sistema, a protecção por morte dos beneficiários abrangidos pelo regime geral de segurança social, mediante a concessão aos familiares próximos do falecido de prestações continuadas, embora não necessariamente vitalícias - as pensões de sobrevivência e os subsídios de assistência - e de uma prestação única - o subsídio por morte.

Contudo, as relações de comunhão de vida não formalizadas não foram sempre reconhecidas para este efeito.

Em Portugal, até à profunda reforma do Direito de Família operada pelo Decreto-Lei n.º 496/77, de 25 de Novembro, aprovada na sequência da Revolução de 25 de Abril de 1974, essas situações apenas eram consideradas, excepcionalmente, para a consagração de efeitos completamente alheios ao reconhecimento de qualquer estatuto jurídico a essa realidade (v.g. os artigos 1860.º, c), e 1862.º, do C.C. que incluíam como uma das situações em que se admitia a acção de investigação de paternidade, a existência duma comunhão duradoura de vida em condições análogas às dos cônjuges).

Contudo, a crise do casamento que se manifestou nas últimas décadas do século passado, acompanhada duma crescente opção pelo estabelecimento de relações de união de facto, deu força a uma realidade social cuja importância não podia mais deixar de suscitar a intervenção do Direito.

E foi esse reconhecimento jurídico, normalmente obtido através da extensão aos membros destas uniões dos mais diversos direitos atribuídos pela ordem jurídica aos cônjuges, que começou a ser reclamado, em nome de uma visão alargada do direito à protecção da família.

O referido Decreto-lei n.º 496/77, de 25 de Novembro, iniciou um movimento legislativo de atribuição de efeitos jurídicos às relações de união de facto, com a consagração no artigo 2020º do C.C., de um direito a alimentos por morte de um dos seus membros ao companheiro sobrevivo, a satisfazer pela herança daquele.

Na sequência desta inovação legislativa e após o pagamento de pensões de sobrevivência às pessoas que vivam com o falecido, em condições análogas às dos cônjuges, mas não eram casadas, ter sido introduzido pelo Decreto-Lei n.º 191-B/79, de 25 de Junho, que alterou a redacção dos art.º 40º e 41º do Decreto-Lei n.º 142/73, de 31 de Março, no âmbito do funcionalismo público, o Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, que uniformizou as regras relativas às mencionadas prestações por morte no âmbito do regime geral da segurança social, veio reconhecer aos unidos de facto, que reunissem determinadas condições, o direito de também beneficiarem dessas prestações.

Na verdade, o art.º 8º, n.º 1 deste diploma estendeu o direito às prestações por morte de beneficiário do regime geral da segurança social às pessoas que se encontrassem na situação prevista no art.º 2020º do C. Civil, remetendo o n.º 2 do mesmo artigo para regulamento posterior, o processo de prova dessas situações e a definição das condições de atribuição das prestações.

A situação prevista no art.º 2020º do C. Civil é a daqueles que, no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, viviam com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges, e necessitando de alimentos, não os podiam obter dos familiares referidos nas alíneas a) a d) do art.º 2009º do C. Civil, sendo-lhes reconhecido o direito a exigi-los da herança do falecido.

A regulamentação do direito reconhecido no art.º 8º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, foi efectuada pelo Decreto Regulamentar nº 1/94, de 18 de Janeiro, que no seu art.º 3º estabeleceu que o direito às referidas prestações ficava dependente do reconhecimento judicial da qualidade de titular daquelas, obtido mediante acção declarativa interposta, com essa finalidade, contra a instituição de segurança social competente para a sua atribuição.

A Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto, posteriormente revogada e substituída pela Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, veio a enunciar num só diploma os diversos direitos atribuídos por lei às pessoas que vivam em união de facto, tendo previsto este último diploma, no art.º 3º, al. e), o direito à protecção na eventualidade de morte do beneficiário, pela aplicação do regime geral da segurança social, estabelecendo o artigo 6º que beneficiava desse direito quem reunisse as condições constantes no art.º 2020º do C. Civil, devendo o mesmo efectivar-se mediante acção proposta contra a instituição competente para a...

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