Acórdão nº 2221/10.9PBAVR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Janeiro de 2011

Data19 Janeiro 2011
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

A - Relatório: 1. Nos autos de Inquérito n.º 2221/10.9PBAVR, que correm termos no Tribunal de Instrução Criminal de Coimbra, Secção Única, foi, em 16/9/2010 (fls. 99 e 106 a 111), decidido pela Meritíssima Juiz de Instrução, após 1º interrogatório judicial, que o arguido A...

ficasse sujeito à medida de coacção de prisão preventiva, nos termos dos artigos 191.º, 193.º, 195.º, 196.º, 202.º, n.º 1, al. a) e 204.º, als. a), b) e c), do C.P.P., por existir forte indiciação da prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217.º e 218.º, n.º 2, al. a), do Código Penal, correspondendo ao mesmo pena de prisão de 2 a 8 anos, por se encontrarem verificados os pressupostos da respectiva aplicação, mormente o perigo de continuação da actividade criminosa, o perigo de fuga e o perigo de perturbação do inquérito, sem prejuízo de, posteriormente, esta poder vir a ser substituída por permanência na habitação sob vigilância electrónica, desde que verificados todos os pressupostos materiais e consentimentos indispensáveis e feita prognose favorável pela D.G.R.S.

**** 2.

Inconformado com tal decisão, dela recorreu o arguido, em 6/10/2010, pedindo a revogação da mesma e consequente substituição por outra que determine o fim da prisão preventiva e a sujeição do recorrente a uma medida de coacção não privativa da liberdade, em concreto, a obrigação de apresentação periódica, nos termos do artigo 198.º, do C.P.P.

O arguido apresentou as seguintes conclusões: 1 – No caso concreto, inexistem os fundamentos que justifiquem, por parte do Meritíssimo Juiz, a aplicação de prisão preventiva e/ou de obrigação de permanência na habitação; 2 – O recorrente não prestou declarações; 3 – Os autos não se encontram dotados de indícios – pelo menos fortes – que permitam cominar o recorrente com a prática do crime de que vem acusado; 4 – Encontra-se por determinar a participação do arguido/recorrente no cometimento do ilícito que se lhe encontra assacado; 5 – O despacho que sujeitou o arguido/recorrente à medida de coacção de prisão preventiva não menciona os factos susceptíveis de permitir a aplicação de medida tão gravosa; 6 – O risco de fuga é nulo, assim como o risco de prossecução de eventual actividade criminosa e, ainda, o risco de poder prejudicar ou condicionar a actividade processual dos autos; 7 – Nos termos do artigo 202.º, n.º 1, al. a), do CPP, a prisão preventiva só é aplicável se existirem FORTES indícios de prática de actividade ilícita; 8 – A medida de coacção imposta ao recorrente e traduzida, nos termos dos artigos 201.º e 202.º, do CPP, na prisão preventiva e/ou obrigação de permanência na habitação, viola o disposto nos artigos 201.º, 202.º e 204.º, todos do CPP, assim como é violadora do princípio da proporcionalidade a que se encontra obrigado o julgador na sua ponderação, devendo optar-se pela imediata revogação da medida de coacção imposta; 9 – Cautelarmente, e sem prescindir do já alegado, dispõe o artigo 212.º, n.º 2, do CPP, que a verificação da atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação da medida de coacção deverá permitir sempre a substituição por medida de coacção de menor gravidade; 10 – O recorrente é pessoa idosa, actualmente, com 57 anos de idade; 11 – Sofre de diabetes; 12 – Encontra-se o arguido/recorrente a ser acompanhado pelos serviços médicos no Hospital da Figueira da Foz; 13 – Acompanhamento e medicação que se revelam constantemente necessários; 14 – Paralelamente com contínuos episódios de urgência a que se submete em função dos seus distúrbios físicos; 15 – E, ainda, o facto de ter actividade de comerciante, sendo sócio-gerente de uma empresa, devendo com o seu ordenado prover pelo sustento do seu agregado familiar; 16 – Que dependem do arguido, nomeadamente os dois netos menores, dos quais prometeu ao filho que trataria deles quando este faleceu; 17 – As circunstâncias narradas contêm-se dentro do disposto no artigo 212.º, n.º 2, do CPP, obrigando à consideração da atenuação da medida imposta ao recorrente e independentemente da revisão trimestral a que obriga o artigo 213.º, n.º 1, do CPP; 18 – Optando-se pela medida cautelar menos gravosa que passará pela obrigação de apresentação periódica, nos termos do artigo 198.º, do CPP; 19 – Pelo que, em douto Acórdão a produzir pelos Ilustres Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Coimbra, seja a medida de coacção imposta ao recorrente imediatamente revogada OU, cautelarmente admitindo e atenta a atenuação da exigência cautelar que subjaz à prisão preventiva decretada e em sua substituição, optar-se pela obrigação de apresentação periódica, nos termos do artigo 198.º, do CPP, a qual, por si só e sem a gravidade da prisão preventiva, precaverá os aspectos consignados nos artigos 204.º, als. a) a c), do CPP.

**** 3 – Pouco tempo depois de interposto o recurso, por despacho exarado a fls. 120 e verso, em 11/10/2010, foi decidido substituir a prisão preventiva pela medida de permanência na habitação sob vigilância electrónica, não obstante o Ministério Público, em 7/10/2010 (fls. 119), ter emitido parecer no sentido do arguido dever continuar sob prisão preventiva.

Tal despacho é o seguinte: “No despacho de fls. 136 e ss, mais precisamente a fls. 141, o Tribunal já tinha afirmado que são duas as medidas que satisfazem as exigências do caso: a prisão preventiva e a permanência na habitação sob vigilância electrónica.

Aliás, o Ministério Público, aquando do 1.º interrogatório do arguido, promoveu a prisão preventiva, sem prejuízo desta medida poder ser substituída pela medida de permanência na habitação, fiscalizada por meios técnicos – cfr. fls. 135.

Pelo teor de fls. 251, constata-se que o arguido tem o seu passaporte caducado desde 20.11.2006, o que diminui o perigo de fuga – sem esquecer o Tribunal a desnecessidade de passaporte para as deslocações a Espanha, onde o arguido terá contactos e onde se desloca com alguma frequência.

Tudo ponderado e ainda tendo em consideração o teor do relatório de fls. 201 e ss, por se encontrarem verificados todos os pressupostos, decide-se substituir a medida de prisão preventiva aplicada ao arguido A... pela medida de permanência na habitação sob vigilância electrónica, a cumprir na sua residência identificada a fls. 129 e 206 – artigo 201.º, n.ºs 1 e 3, do CPP.

Desde já se autoriza o arguido a sair da sua residência para comparecer a diligências para as quais venha a ser convocado, sejam elas policiais, nos serviços do M.P. ou judiciais.

Notifique e comunique, nos termos do n.º 6 do artigo 7.º, da Lei n.º 33/2010, de 2/9 (ao arguido, respectivo mandatário, DGRS, estabelecimento prisional e órgão da polícia criminal respectivo).

Solicite à DGRS para agir em conformidade.

D.N.

” **** 4.

O Ministério Público junto do Tribunal de 1ª instância respondeu, em 2/11/2010, ao recurso interposto, manifestando-se pela improcedência total do mesmo, com a manutenção do despacho que aplicou a medida de coacção, nos termos em que foi proferido, apresentando as seguintes conclusões: 1. Na situação concreta, verificam-se os pressupostos legais para a aplicação da medida de coacção a que o arguido se encontra submetido, pois o perigo de fuga e a continuação da actividade criminosa resultam evidentes dos elementos já carreados para os autos; 2. A investigação ainda se encontra a decorrer, mas os autos já dispõem de “fortes” indícios da prática do crime em investigação, tendo-se apurado com perfeita clareza a participação do arguido nos factos consubstanciadores do ilícito criminal em análise, factos esses que se encontram bem explanados na acta de interrogatório judicial de arguido detido no decurso da qual a Mma. JIC optou por aplicar ao arguido aquela medida por haver motivos para considerar que existia risco de fuga e porque existem fortes indícios da prática do citado crime (artigo 202, n.º 1, al. a), do CPP); 3. Estas as razões pelas quais entendemos que o arguido deve aguardar os ulteriores termos do processo submetido à medida de coacção de obrigação de permanência na habitação sob vigilância electrónica, pois não se verificaram quaisquer circunstâncias que importem uma atenuação das exigências cautelares, parecendo-nos desadequado e desproporcional a substituição dessa medida cautelar por qualquer outra.

**** 4.

O recurso foi, em 5/11/2010, admitido.

Por despacho de 22/11/2010, foi mantido integralmente o despacho recorrido.

Instruídos os autos e remetidos a este Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, em 29/11/2010, emitiu douto parecer em que defendeu que deve ser negado provimento ao recurso, salientando, em resumo, que “não poderia deixar de se manter a prisão preventiva ao arguido, agora a permanência na habitação, após a decisão de fls. 120 e 120 verso, dada a gravidade e moldura penal do crime de burla qualificada, a existência dos perigos de fuga, de perturbação do processo e de continuação da actividade criminosa (fls. 110 a 111 dos autos).

” Foi cumprido o artigo 417.º, n.º 2, do CPP, não tendo sido exercido o direito de resposta.

Deixa-se aqui consignado que o ora recorrente se encontra detido desde 14/9/2010, tendo estado em prisão preventiva até 11/10/2010, data a partir da qual, como acima já referido, passou a estar sujeito à medida de permanência na habitação sob vigilância electrónica (fls. 35).

Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência.

**** B – 1) Decisão recorrida: “A detenção efectuada foi legal, uma vez ter sido efectuada ao abrigo do disposto nos artigos 254.º, n.º 1, al. a) e 257.º, n.º 2, ambos do CPP, face à situação de fora de flagrante delito e aos mandados de detenção de fls. 59 e 60.

Tal como promovido, validam-se as apreensões efectuadas nos autos.

Compulsados os autos, encontram-se indiciados os seguintes factos: O arguido A... e o J... conheceram-se em Outubro de 2008.

Desde logo, tomou conhecimento que o J... era empreiteiro, adquirindo, construindo e vendendo na actividade...

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